PATATIVA DO ASSARÉ                                      Voltar


Antônio Gonçalves da Silva  (foto) nasceu no dia 5 de março de 1909, no sítio Serra de Santana, município de Assaré.

AUTOBIOGRAFIA

Sem me desviá do rumo
Sem saí fora da tria,
Conto um pequeno risumo
Da minha biografia.
Certo dia da semana
Nesta Serra de Santana
Do município Assaré,
Por orde do Criadô
A partêra me banhou
Da cabeça até nos pé.

Foi em mil e novicento
E nove que vim ao mundo,
Meus pai naquele momento
Tivero prazê profundo,
Foi na Serra de Santana
Em uma rude chopana,
Humilde e mudesto lá,
Foi aqui onde nasci
E a cinco de março vi
Os raio da luz solá.

Pedro Gonçarve meu pai,
Mamãe, Maria Pereira,
Da minha mente não sai
Estas arma mensageira
Da paz, da fé e do afago,
Ainda comigo trago
O doce daquele amô.
Mas por infelicidade,
Nos meu nove ano de idade
Morreu o meu genitô.

Eu nasci uvindo os canto
Das ave da minha Serra
E vendo o mais lindo incanto
Que a mata bonita incerra.
Foi aqui que eu fui crescendo,
Fui lendo e fui aprendendo
No livro da Natureza,
Onde Deus é mais visive,
O coração mais sensive
E a vida tem mais pureza.

Nasci dentro da pobreza
E sinto prazê com isto,
Por vê que fui com certeza
Colega de Jesus Cristo,
Perdi meu ôio dereito,
Ficando mesmo imperfeito
Sem vê nem perto, nem longe,
Mas logo me conformei
Por saber que assim fiquei
Parecido com Camonge.

Na minha penosa lida
Eu nunca perdi a fé,
Olhei sempre para vida
Do jeito que a vida é.
Se procurando ventura,
Só incontrei amargura
Que o crué fado me deu,
Vivo sempre conformado
Pensando em argum coitado
Que sofre mais do que eu.

Quando o mil e novicento
E dezenove chegou,
Se eu já tinha sofrimento
Meu sofrimento dobrou,
Quase dizê não adianta,
De tarde não tinha janta
Nem armoço de manhã,
Com aquele padecê
Fui obrigado a sabê
Que gosto tem mucunã.

Na mais dura privação
Na minha casa era seis,
Eu com os meus quatro irmão
E mamãe na viuvez,
Nós fumo criado assim,
Eu, José, Pedro e Joaquim
E a nossa mana Maria,
No mais precaro vivê,
Sem os dono do pudê
Sabê se a gente inzistia.

No diminuto terreno
Que recebemo de herança,
Cumecei derne pequeno
Na minha penosa infança
Sendo pobre agricutô,
Topando frio e calô
De suó todo muiado,
Derne os pés inté no rosto
De tudo pagando imposto
Sem ninguém tê me ajudado.

Mas porém como a leitura
É a maió diciprina
E veve na treva iscura
Quem seu nome não assina,
Mesmo na lida pesada,
Para uma escola atrasada
Tinha uma parte do dia,
Onde estudei argum mês
Com um véio camponês
Que quase nada sabia.

Meu professô era fôgo
Na base do português,
Catálogo, era catalôgo,
Mas grande favô me fez.
O mesmo nunca esqueci,
Foi com ele que aprendi
Minhas premêra lição,
Muito a ele tô devendo,
Saí escrevendo e lendo
Mesmo sem pontuação.

Depois fiz só meus estudo,
Mas não nos livro escolá
Eu gostava de lê tudo,
Revista, livro e jorná.
Com mais uns tempo pra frente,
Mesmo vagarosamente,
Não errava nenhum nome.
Lia no claro da luz
As pregação de Jesus
E as injustiça dos home.

Sobre a minha poesia
Não é preciso eu falá,
As mesma as rádio anuncia
Aqui, ali e acolá.
Mencioná não carece
Pois todo mundo conhece
O tema que a mesma incerra,
E os meu livro, pubricado,
Anda no mundo ispaiado
Como nutiça de guerra.

O meu singelo apelido
Que com razão me pertence
Foi com amô iscuído
Por um grande cearense
Que conversando comigo,
Disse um dia, meu amigo,
Você merece carinho
Na poesia papulá
E por isso eu vou lhe dá
O nome de um passarinho.

"É ave que anda solta
E inda mais canta cativa,
Seu nome agora é Antonio
Crismado por Patativa"(1)

Sem fantasia nem arte,
Nesta rude poesia
Contei pequenina parte
De minha biografia,
Segui por este caminho
Sem companheiro, sozinho,
Não sei se político sou,
Quero justiça, verdade
E aquela fraternidade
Que Jesus Cristo pregou.

Assaré, setembro de 1981
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(1) José Carvalho de Brito - Belém do Pará - 1929

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Texto retirado do livro:
BALCEIRO - PATATIVA E OUTROS POETAS DE ASSARÉ

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