O panteísmo é sem dúvida uma das crenças mais antigas da
humanidade. Mais velho que o budismo, que o cristianismo ou
que qualquer outra religião, há mesmo quem defenda que todas
as religiões existentes não passam de simples permutações
dessa crença primordial.
Submetido à exigência metafórica de
tratar o panteísmo como se de uma pessoa se tratasse (Pan),
esta seção tem como objetivo apresentar uma retrospectiva
das várias formas que o panteísmo refletiu em diversas
personalidades que marcaram o pensamento e história da
humanidade... Que se inicie então o seu retrato biográfico!
Tales de Mileto (624-546 a.C.):
Na Grécia Antiga, vários filósofos procuraram descobrir a
base criadora do universo. Defendiam que se tratava de uma
substância (material em vez de mental ou espiritual) única e
unificadora de todas as coisas contidas no universo e cada
um deles apresentou a sua própria teoria e respectivo
elemento. Para Tales de Mileto, a substância primária seria
a água.
Anaximandro (611-546 a.C.):
Filósofo grego para o qual o ápeiron seria a origem de todas
as coisas - uma substancia ilimitada, indefinida e
indestrutível, do qual tudo surge e ao qual tudo reverte.
Dele surgiriam os quatro elementos fundamentais: o quente e
o frio (origem dos astros) e o úmido e o seco (origem do
mundo e da vida orgânica).
Anaximenes (588-534 a.C.):
Filósofo grego que identificou o ápeiron do seu mestre
(Anaximandro) com o ar, do qual surgiriam as três matérias
básicas: fogo, terra e água, e destas, tudo o resto. Para
Anaximenes, essa seria inclusivamente a origem dos Deuses.
Xenófanes (560-478 a.C.): Filósofo grego influenciado pela
escola de Mileto. Defendeu a origem natural de todas as
criaturas e criticou as crenças mitológicas. Substituiu os
vários deuses do Olimpo por um deus imanente à natureza.
Heraclito (536-470 a.C.):
Filósofo grego oriundo de Éfesos. Concebeu a natureza como
um todo racionalmente ordenado num processo continuo de
transformação, constituindo uma única realidade. Mesmo que
nesse processo não houvesse coisas estáveis, ele continuaria
a sê-lo, já que toda a mutação segue uma razão cósmica
(logos) e uma medida (metrom) invariáveis. Heraclito também
procurou um princípio comum às várias formas da matéria e
identificou-o com o fogo.
Zenão de Chipre (séc. IV-III a.C.):
Filósofo grego de origem semita que elaborou o sistema
filosófico do estoicismo. Os estóicos acreditavam entre
outras coisas que o universo era um ser animado e racional
que inclusivamente possuia uma alma (composta por uma
refinada forma de matéria).Johannes Scotus Erigena
(810-877): Escolástico irlandês cuja maior obra, "De
diviosiones naturae" declarava que "em última estância, Deus
e a criação são um só... Enquanto natural, o criador do
universo, é infinito, não está confinado por nenhum limites
superior ou inferior. Ele abarca tudo em si e é cercado por
nada."
Giordano Bruno (1548-1600):
Filósofo, astrônomo e matemático italiano. Adotou uma visão
panteísta da realidade ao defender a idéia de que a suprema
e única substância é Deus ou Natureza e que nela se encontra
contido todo e qualquer objeto, relação e evento que existe
no universo. Segundo Giordano, o princípio do mundo não
estaria fora dele, mas seria sim a força que está dentro
dele. Foi preso por heresia em 1592 e queimado vivo no dia
17 de Fevereiro de 1600.
Baruch Spinoza (1632-1677):
Filósofo holandês de origem judaica e filho de pais
portugueses (emigrados na Holanda) sendo por isso
considerado como o maior legado lusófono para a filosofia
ocidental. As suas idéias encontram-se resumidas em "Ethica",
uma obra extremamente abstrata, que não expressa nenhum amor
pela natureza, algo que seria de esperar por alguém que
identifica Deus com a Natureza. O ponto de partida de
Spinoza não é a natureza ou o cosmos, mas sim uma definição
puramente teórica de Deus. Alguns acadêmicos consideram "Ethica"
como a mais elaborada e rigorosa exposição do panteísmo em
toda a literatura filosófica.
John Toland (1670-1722):
É em "Socinianism truly stated...recommended by a Pantheist
to an orthodox friend" (1705) que surge pela primeira vez na
história da literatura o termo "panteísta", sendo por isso
atribuído a Toland a origem desta palavra. Em "Pantheisticon:
sive Formula celebrandae Sodalitatis" (1720) aprofundou as
suas idéias panteístas: defendeu a existência de um universo
sem limites; menosprezou a imortalidade pessoal afirmando
porém que "Nada morre realmente, a morte é uma coisa que
traz o nascimento de outra, por uma troca universal
recíproca, e tudo contribui necessariamente para a
preservação e bem-estar do Todo"; descreveu uma sociedade
panteísta secreta cujos membros eram conhecidos por
"associados socráticos", porém alguns historiadores
questionam se essa sociedade realmente existiu.
Johann Wolfgang Goethe (1749-1832):
Escritor e poeta alemão. Identificou-se com o panteísmo de
Spinoza e declarou "aquele que não se ergue o suficiente
para ver deus e a natureza como um só não conhece nenhum
deles".
John Burroughs (1837-1921): naturalista americano e
panteísta assumido. Em "Acepting the universe", apresenta a
sua crença panteísta:
"Quando tentamos agarrar, medir, ou definir o poder ao qual
chamamos Deus, apercebemo-nos que estamos sob um outro céu,
protetor, uma abobada, que tudo abarca.. Deus não é um ser,
não é uma entidade, mas sim aquilo que une em si todos os
seres e todas as entidades".
Albert Einstein (1879-1955):
Físico norte-americano de origem alemã. Fascinado pelo
panteísmo de Spinoza, declarou: "Acredito no Deus de Spinoza
que se revela na harmonia de tudo o que existe, não num Deus
que se preocupa com os destinos e ações do Homem", "a minha
religião é de fato o universo... em outras palavras, a
natureza, que é o nosso reflexo do universo". A sua
convicção na unidade do espirito e da matéria deu alento à
procura de uma força unificadora da natureza, à qual chamou
de "teoria dos campos unificados" (tradução livre de "unified
field theory"). Vários estudiosos puseram em causa esta
teoria, mas descobertas recentes parecem ter renovado o
interesse nela.
Paul Harrison (n. 1945):
Escritor de origem britânica, Paul Harrison é também
consultor nas áreas de população, ambiente e
desenvolvimento. É o autor de vários relatórios para as
Nações Unidas, a Organização Mundial de Saúde e a Secretária
Internacional para o Trabalho entre outras instituições.
Escreveu o livro "Elements of pantheism" (editado em 1999) e
foi igualmente o responsável pela criação da World Pantheist
Movement que visa sobretudo promover o panteísmo cientifíco,
uma forma materialista e monista do panteísmo.
Harold Wood (n. 1950): Autor de vários artigos, ensaios e
livros relacionados com o panteísmo, é juntamente com Derham
Giuliani, um dos fundadores da Universal Pantheist Society,
uma organização criada para estabelecer uma rede de
comunicações para panteístas de todas as formas (dualista,
materialista e idealista).
É
óbvio que não poderia faltar nesta biografia uma referência
à Tradição Pagã: tudo o que existe no Universo se resume a
uma única substância de devir: a Vida! Nada há de superior
ou inferior em relação a esta. Os átomos que temporariamente
dão forma ao nosso Ser, são os mesmos que dão forma às
estrelas, ao céu, às rochas, aos pássaros, aos insetos, e
por aí adiante... "Eu sou parte do Todo que existe e ele é
parte de mim". Quando contemplamos a grandiosidade e beleza
do Universo, somos obrigados a reconhecer que ele é divino,
e por inerência dos fatos, apercebemo-nos da nossa
divindade... Através da vida, somos "apenas" mais um Deus à
procura da felicidade (e ela está bem perto de nós)!
Que o Deus interior de cada um de nós possa irradiar AMOR e
LUZ!!
L. Machado.
Postado por: Associação de Estudos Gbala