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Os min�sculos gr�os de p�len

Os gr�os de p�len, c�lulas sexuais masculinas das flores, s�o t�o diversos e numerosos como as plantas de onde prov�m e as suas estrat�gias de dissemina��o. A hist�ria de cada gr�o � uma extraordin�ria aventura.

Maria Carlos Reis


Os gr�os de p�len s�o entidades verdadeiramente extraordin�rias. Do tamanho de part�culas de poeira, medindo de 0,020 a 0,250 mm, s�o produzidos em n�meros realmente incompreens�veis. Um simples amentilho (infloresc�ncia) de b�tula pode conter 5,5 milh�es de gr�os. Como uma �nica b�tula pode produzir v�rios milhares de amentilhos, as estat�sticas da produ��o de p�len dos v�rios milhares de �rvores numa floresta de b�tulas desafiam a nossa imagina��o.


A forma dos gr�os � muito diversa, existindo alguns esf�ricos, outros ov�ides e alguns afiados como arp�es. Podem parecer-se com almofadas bem cheias ou com tigelas rasas. Embora min�sculos, a sua superf�cie apresenta muitas vezes padr�es e relevos complexos: fissuras em forma de linhas serpenteantes, pequenas bolsas circulares, figuras geom�tricas complexas, etc. Estes padr�es s�o individuais e caracter�sticos e frequentemente podem ser relacionados com uma �nica esp�cie de planta.
A crosta externa que os cobre � composta por uma subst�ncia t�o est�vel e resistente � decomposi��o, que pode sobreviver dezenas de milhares de anos e ainda assim ser reconhec�vel. Por este motivo, atrav�s de testes �s sucessivas camadas de turfa de um terreno e da extrac��o, identifica��o e contagem dos gr�os de p�len ao microsc�pio, � poss�vel tra�ar a hist�ria ecol�gica de uma dada �rea e pormenorizar a chegada, o florescimento e a partida de diferentes esp�cies de plantas.


O p�len � convencionalmente descrito como as c�lulas sexuais masculinas da flor, apresentando como miss�o a uni�o com as c�lulas sexuais femininas - os �vulos - que podem ou n�o estar presentes na mesma flor. Mas esta uni�o n�o decorrer� se as c�lulas sexuais pertencerem a esp�cies diferentes. Para al�m do reconhecimento geom�trico, existem outras estimula��es e respostas bioqu�micas que permitem �s plantas n�o s� ignorar o p�len proveniente de esp�cies estranhas mas, em alguns casos, at� distinguir um gr�o de p�len por elas produzido de outro produzido por um indiv�duo da mesma esp�cie, o que quer dizer que podem evitar a auto-fertiliza��o, se tal for adequado.


Para a uni�o das duas c�lulas sexuais, diversas estrat�gias foram desenvolvidas ao longo da evolu��o. Algumas plantas que produzem gr�os de p�len de reduzida dimens�o podem confiar no vento como agente de dispers�o. � o caso das gram�neas (como o trigo, ou a relva), das con�feras (como os pinheiros ou os ciprestes) e dos carvalhos (como o carvalho-portugu�s ou o sobreiro ). As plantas que confiam no vento para o transporte do p�len produzem flores muito pequenas, que passam facilmente despercebidas. Na verdade, algumas s�o t�o modestas e simples que podem nem ser consideradas flores.
O vento como transportador � muito eficaz, podendo elevar os min�sculos gr�os a uma altura de cerca de 5800 m e afast�-los dos progenitores mais de 55000 km. Por�m, tal acontece totalmente ao acaso, e � assim que a esmagadora maioria dos milh�es de gr�os de p�len produzidos por uma �nica planta n�o consegue chegar ao seu destino, acabando por se perder. Como o p�len � rico em �leos e prote�nas, a sua produ��o constitui um gasto significativo para a economia da planta, o que significa que as perdas s�o bastante consider�veis.


� por este motivo que muitas plantas adoptaram uma estrat�gia diferente. Para reduzirem o esbanjamento de p�len investem em dispositivos de recrutamento de auxiliares - os animais, na sua maioria insectos, mas tamb�m r�pteis, aves e mam�feros. A eles cabe a importante (nalguns casos, fundamental) miss�o de recolha e entrega do p�len de uma flor para outra. � quase certo que uma planta ter� de competir com as vizinhas da mesma esp�cie para atrair a aten��o de tais prestadores de servi�os. Como as que fazem publicidade com maior �xito deixar�o mais descendentes, a competi��o acentua-se ao longo das gera��es e os "an�ncios" v�o-se tornando cada vez mais espantosos.


Mas como em qualquer contrato de presta��o de servi�os, ter� de haver uma recompensa. A forma mais simples de pagamento � permitir ao animal que fique com uma parte do que transporta. Afinal, o p�len � muito aliment�cio.


Existem muitas estrat�gias de angaria��o de auxiliares, por vezes �nicas em determinadas esp�cies de plantas. � o caso de uma esp�cie de cicad�ceas (as plantas da �poca dos dinossauros). Quando o p�len est� pronto para ser distribu�do, esta cicad�cea eleva cerca de 2�C a temperatura no cone central ,onde se encontra o p�len, o que atrai a aten��o dos gorgulhos, que nele pousam e se banqueteiam com o p�len derramado, enquanto se v�o cobrindo com ele. Depois afastam-se para descobrirem outra refei��o no centro de outra cicad�cea, carregando o p�len com eles e entregando-o de uma forma muito mais econ�mica do que o vento.
Os nen�fares s�o descendentes de uma das primeiras fam�lias que produziram flores aut�nticas. Ainda mant�m a antiga pr�tica de recompensarem os correios com uma parte da mensagem. S�o fertilizados por besouros, e a maioria n�o paga muito mais al�m do pr�prio p�len. Mas fazem poupan�as com este sistema, pois impedem que o p�len esteja � disposi��o de tudo e de todos os que o poderiam entregar em destinos errados. Em vez disso, desenvolveram um acordo exclusivo com uma �nica esp�cie de mensageiros, a quem podem incumbir, com confian�a, a tarefa de o entregarem nos �nicos lugares onde pode ser eficaz, ou seja, noutras flores da mesma esp�cie.


Todavia, a compensa��o mais generalizada consiste na ced�ncia de n�ctar, produzido em gl�ndulas especiais - nect�rios - normalmente ocultos nas profunndezas das flores. Este tipo de localiza��o tem duas vantagens: reduz a perda de n�ctar por evapora��o ou dilui��o devida � chuva e obriga um mensageiro visitante a ro�ar-se pelas anteras que cont�m o p�len, recolhendo-o deste modo. Mas esta recompensa tem de ser publicitada, sendo essa a fun��o das p�talas.


Os insectos foram, provavelmente, os primeiros correios a serem utilizados pelas plantas e ainda hoje s�o o tipo mais numeroso. As flores que os empregam t�m for�osamente de adequar os an�ncios aos sentidos dos insectos. Como a sua maioria possui um olfacto extremamente bem desenvolvido, as plantas emitem perfumes de atrac��o. Muitos s�o dotados, igualmente, de uma excelente vis�o, que � sens�vel a intensidades luminosas diferentes das percepcionadas pelos nossos olhos. Para al�m disso, t�m a capacidade de detectar radia��es totalmente invis�veis para n�s, como as ultravioleta. Muitas flores polinizadas por insectos, sobretudo as que possuem nect�rios ocultos, t�m pintas e linhas que conduzem os insectos do bordo externo, onde podem pousar, ao n�ctar e p�len no interior. A dedaleira, a �ris, o amor-perfeito e o rododendro s�o exemplos �bvios. Essas marcas s�o semelhantes �s utilizadas nas pistas dos aeroportos.
Algumas plantas n�o s�o muito selectivas no recrutamento e permitem que muitos tipos de insectos lhe transportem o p�len. As papoilas, as silvas, os ran�nculos e muitas outras plantas que produzem flores relativamente simples e muito abertas s�o muito generosas e n�o fazem discrimina��es. Contudo, o p�len entregue a flores de outra esp�cie � p�len desperdi�ado, pelo que muitas plantas desenvolveram parcerias cada vez mais especializadas, em que uma esp�cie de planta s� � polonizada por uma esp�cie de insecto. Esta grande depend�ncia de ambos os membros da pareceria torna prov�vel o desaparecimento de um, caso o outro desapare�a.


Um exemplo extremo e famoso desta parceria baseada na anatomia da flor e do polinizador est� patente na rela��o estabelecida entre uma orqu�dea e uma mariposa de Madag�scar. A flor possui um enorme espor�o rastejante com o n�ctar e s� esta esp�cie de mariposa possui uma tromba suficientemente comprida que lhe permite explorar esse recurso alimentar.


Dentro da fam�lia das orqu�deas encontram-se os mais elaborados sistemas de poliniza��o. Elas criaram verdadeiras corridas de obst�culos para os seus correios, t�o complexas que � dif�cil imaginar a raz�o por que se esfor�am tanto para conseguirem um resultado que a maior parte das outras plantas conseguiram por meios comparativamente mais simples.
Por�m, nem todos os insectos ou outros mensageiros acatam respeitosamente a persuas�o e as directivas ditadas pelas flores. Alguns tornam-se "ladr�es". Existem casos de insectos que, por n�o possuirem trombas suficientemente compridas para atingirem o n�ctar armazenado nos nect�rios, escavam buracos nas p�talas e roubam-no. Mas, se podem existir "ilegalidades" no contrato, por parte dos mensageiros, tamb�m existem plantas que actuam de forma "imoral", alcan�ando os mesmos resultados sem recompensarem, de algum modo, os seus parceiros, montando, por vezes, verdadeiras armadilhas. As orqu�deas, em particular, desenvolveram um leque de atractivos que n�o proporcionam qualquer tipo de recompensa a quem a eles sucumba. Muitas delas especializaram-se na fraude sexual de insectos, produzindo subst�ncias que mimetizam as feromonas sexuais utilizadas por estes animais na altura do acasalamento e adquirindo uma morfologia que induz ao engano.


No entanto, apesar de todas as suas t�cnicas complexas, dos encarceramentos e dos logros, dos subornos e das sedu��es, as plantas nem sempre conseguem transferir gr�os de p�len de um indiv�duo para outro. Umas vezes o vento n�o sopra na direc��o certa ou no momento certo, outras o animal mensageiro apropriado n�o descobre a flor e existem alguns casos em que parece n�tido o rompimento de uma parceria, por desaparecimento de uma esp�cie de parceiro. Mas mesmo assim, atrav�s de estrat�gias mais simples ou mais rebuscadas, as plantas t�m conseguido deixar descend�ncia e perpetuar a sua ocupa��o da Terra.
Leituras Adicionais

O P�len

A odisseia das sementes

Flores e Insectos, jogos de sedu��o Primaveril

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