PORQUE TORNEI-ME ANÁRQUICA

Anárquica me tomei quando fui deportada para a Caledônia e deveria suportar o tormento físico.

Isso não me impressionava mais.

Nossa consciência teria ficado na vara criminal, se tivesse agido diversamente de como contamos os fatos. Antes termos o dever de repreendermos, para não ter que cortar o coração do peito, porque em certas circunstâncias a autocomisseração é tratamento.

No curso de quatro meses, só vimos céu e água, e raramente aparecia no horizonte a vela branca de um navio, como um pássaro, esta imagem da distância imensa me tocava profundamente o coração havia muito tempo. No balançar do ritmo ligeiro das ondas, que se levantavam em volta como se dois braços o haviam prendido, para depois retomar para a profundidade do mar, como uma massa macia. E o vento que soprava nas velas, tombava em intervalos curtos na imensidão, para depois liberar com um assovio estridente, o navio que gemia através das ondas.

Era nos explicada o elementar e se tinha tempo para pensar. Dado que comparamos continuamente as coisas, os acontecimentos e as pessoas e porque haja visto a nossa campanha na obra da Comuna, sou chegada bem perto, a conclusão que francamente, com honestidade, se pensarmos em uma volta ao poder, somos tão incompetentes como desonestos e nocivos, e vejo a impossibilidade da liberdade poder associar-se com um poder qualquer.

O poder é maldito, é por isso que sou anárquica. Sinto que uma revolução que pretendesse uma forma governativa qualquer, não pode ter uma aparência enganosa, podendo seguir somente um passo, mas não a situação de aprisionar completamente o progresso. Sinto que as instituições do passado, que parecia-nos esvaziar, sobreviveram, só que com outro rótulo, e que tudo no velho mundo permaneceu encantado e representado por isso, um todo que devesse balançar no seu conjunto, para deixar espaço a um mundo novo, feliz, liberto, embaixo do céu.

Eu sou anárquica, porque só a anarquia pode trazer felicidade ao homem, e porque a idéia suprema, que possa ser pensada pela razão humana é a idéia anárquica. Assim como passou a época, daqueles que seguiram o progresso ainda desconhecido. O que para nós e para uma ou duas gerações pode parecer utopia, poderemos quem sabe verificar na terceira geração. Só a anarquia para entender um homem consciente, porque só ela lhe trás a liberdade, essa será sempre a diferença entre um bando de escravos versus a sociedade humana. Para todo o homem que alcança o poder, o Estado não é o que ele imaginava especular de si mesmo, ele o guarda como um cão guarda o osso que está mastigando e somente defenderá as suas vantagens. Assim como o poder torna o homem duro, egoísta e cruel, ao mesmo tempo ele o escraviza e o humilha.

A anarquia será o fim da miséria assustadora, que sempre sofre a humanidade. A humanidade vai viver e se tornar anárquica na luta desesperada para evitar o abismo, esta será uma escalada dura. Qualquer outra idéia, assemelha-se a pedra que se pisa e escorrega, quando se escala uma montanha. E não devemos combater somente de modo corajoso, mas também racionalmente. É chegado o tempo que o ideal maior e mais belo de todos os fingimentos, que o havia precedido se enche de grandeza, afim de que o povo privado de suas direções, não embeleze com seu sangue aquele sonho enganoso.

Sim, por isso eu sou anárquica!

Louise Michel

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