Gustavo Bayerl
Lima
Acadêmico de
Direito da CSVV/UVV
AÇÃO POPULAR
Introdução; Dos Requisitos e do Objeto;
Das Partes e da Competência; Do Processo e da Liminar; Da
Sentença e da Coisa Julgada; Da Execução; Conclusão;
Referências Bibliográficas.
Introdução:
Diz
o inciso LXXIII do Art. 5º da Constituição da República
Federativa do Brasil: Qualquer cidadão é parte legítima
para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à
moralidade administrativa ao meio ambiente e ao patrimônio
histórico e cultural, ficando o autor, salvo nos casos de
comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência.
Na
Constituição de 1934, o povo brasileiro já podia contar com
direito de impetrar ação popular, restrito porém aos casos
expressamente mencionados, resguardando-se a honestidade e
a imparcialidade nos julgamentos.
Não
se verificou a presença deste dispositivo nas Constituições de
1891 1937, nesta por ser antidemocrática, autoritária e
violenta, e naquela pelo fato de que o Código Civil já dispor
que qualquer um poderia demandar ação, bastando a existência
de legítimo interesse material ou moral.
Ressurge
em 1946, quando os constituintes incorporaram o texto da Carta de
1934 a extensão do pleito contra a decretação de nulidades de
atos lesivos do patrimônio das entidades autárquicas e das
sociedades de economia mista, além da União, Estados e dos
Município. Já em 1967, a garantia da ação popular foi
resumida ao seguinte contexto: Qualquer cidadão será
parte legítima para propor ação popular que vise anular atos
lesivos ao patrimônio das entidades públicas.
Pode-se
concluir que ao longo dos tempos várias foram suas formas, ora
presente, ora ausente, ora transformada, comprovando claramente a
característica relativa a historicidade dos direitos e garantias
conceituada pelo professor José A. da Silva, adequando-se às
diversas situações da vida política do país.
No
conceito atual de ação popular percebe-se que tem como
finalidade precípua não somente a defesa do patrimônio
público contra os atos que lhes são lesivos, como também para
a defesa da moralidade administrativa, do meio ambiente, do
patrimônio histórico e cultural do país. De modo a ser o meio
constitucional utilizado por qualquer cidadão para obter a
invalidação de atos e contratos administrativos, ou similares,
ilegais e lesivos do patrimônio público ou de entidade de que o
Estado participe, defendendo os interesses coletivos à
moralidade administrativa e ao meio ambiente natural ou cultural.
Dos
Requisitos e do Objeto:
A
viabilização da ação popular invoca a presença de três
requisitos fundamentais que constituem pressupostos da demanda.
São eles: a condição de cidadão, ilegalidade e lesividade.
O
ajuizamento de ação deve ser feito por cidadão brasileiro, no
gozo de seus direitos cívicos e políticos, traduzidos na
qualidade de eleitor. A cidadania justifica-se no fato de que
tendo o cidadão poder de escolher seus governantes, deve ele ter
também o direito de lhes fiscalizar.
O
procedimento a ser invalidado deve ser contrário ao Direito,
infringindo normas específicas ou por se desviar dos princípios
que regem a Administração Pública. Essa ilegalidade pode
surgir de vício formal ou substancial, inclusive desvio de
finalidade.
Quanto
a lesividade, entende-se a ação ou omissão que desfalque o
erário, prejudique a Administração, ou que ofenda os bens ou
valores artísticos, culturais, ambientais ou históricos da
comunidade.
Assim,
exigi-se o binômio ilegalidade-lesividade para propositura de
ação, dando-se tão somente sentido mais amplo à lesividade,
que pode não somente importar prejuízo patrimonial, mas lesão
a outros valores, protegido pela Constituição (Hely Lopes
Meirelles).
Utilizada
com fins preventivos e repressivos, a ação popular além de
restabelecer a legalidade, procura punir ou reprimir a atividade
administrativa ilegal e lesiva ao patrimônio público. Sendo
meio preventivo quando ajuizada antes da consumação dos fatos,
e repressiva se proposta depois de ocorrida a lesão. A sua
função corretiva obriga a Administração a atuar quando sua
omissão resulta em lesão ao patrimônio, bem como corrigindo
atividade comissiva.
O
seu caráter cívico-administrativo tende a repor a
Administração nos limites da legalidade a restaurar o
patrimônio público do desfalque sofrido.
No
que se refere a imoralidade, não será admitida para o
ajuizamento de ação popular, por envolver conceitos vagos e
subjetivos, principalmente quando se afasta do Direito positivo,
o que revela crenças pessoais. Se admitida fosse outra
interpretação, o judiciário poderia, sob o pretexto da defesa
da moralidade, estabelecer prioridades administrativas, que
interviriam na conveniência do ato, o que fere claramente a
separação tripartite de poderes.
O
objeto da ação popular é o ato ilegal e lesivo ao patrimônio
público, praticado por entidades públicas centralizadas ou
não, bem como, pelas pessoas jurídicas de direito privado que o
Estado tenha interesses econômicos predominantes.
Ainda
poderão estar sujeitos a anulação por meio de ação popular
os atos que contenham alguns dos seguintes vícios:
incompetência de quem os praticou; vícios de forma; ilegalidade
do objeto; inexistência dos motivos; ou desvio de finalidade.
Estão
incluídos nos atos lesivos e ilegais a lei de efeitos concretos,
que traz em si consequências imediatas de sua atuação, como as
desapropriações e isenções. Pois estas leis se equiparam aos
atos administrativos.
Das Partes
e da Competência:
O
cidadão no gozo de seus direitos políticos será sempre sujeito
ativo, enquanto que os sujeitos passivos poderão ser vários.
Devendo ser citados as pessoas jurídicas em nome das quais o ato
a ser anulado foi praticado, as autoridades, funcionários ou
administradores que por ação ou omissão deram origem à
lesão, e os beneficiários do ato ou contrato. Interessante
mencionar que a pessoa jurídica de direito público ou privado
chamada na ação poderá encampar o pedido do autor, desde que
seja do interesse público. Fato comum, principalmente, quando o
ato ou contrato é da gestão anterior e a lesividade só for
descoberta pela subsequente.
Cabe
ao Ministério Público participação singular no processo,
sendo a parte pública autônoma responsável pela regularidade
do processo, pelas provas e promoção da responsabilidade civil
ou criminal dos culpados. Havendo abandono da ação, verificado
o interesse público, caber-lhe-á promover seu prosseguimento.
Para
José A. da Silva, é o Ministério Público na ação popular
oficiante e fiscal da lei, ativador das provas, auxiliar do
autor, parte principal, substituto do autor, sucessor do autor e
titular originário como simples cidadão.
A
designação da jurisdição competente para processar e julgar
ação popular é de acordo com a origem do ato. Se praticado por
órgão da União, ou agente desempenhando função em seu nome,
será competente o juiz federal da Seção Judiciária em que se
consumou o ato. No caso dos Estados caberá ao juiz indicado pela
organização judiciária estadual, e quando relativa à
Município, o juiz competente será o da comarca a que o
Município pertencer.
Havendo
interesse simultâneo da União e qualquer outra pessoa ou
entidade, será competente o juiz das causas da União, se entre
Estados e Municípios, o juiz das causas do Estado. Se não
houver interesse da União, autarquia ou empresa pública
federal, sendo o sujeito passivo sociedade de economia mista,
mesmo que seu controle acionário seja federal, a competência é
da Justiça Comum Estadual.
Do Processo
e da Liminar:
Apesar
do processo da ação seguir o rito ordinário, tal como
exigido por lei complementar, apresenta as modificações aqui
enumeradas: Todos os responsáveis serão citados e o Ministério
Público intimado através do despacho inicial do juiz; Entre 15
e 30 dias deverão ser apresentados os documentos necessário;
Será ordenada a citação pessoal dos que praticaram o ato, e
por edital e nominal os beneficiários - a estes, se revéis, lhe
serão nomeados curador especial.
Depois
de definida a lide a defesa não mais poderá ser alterada, ainda
que haja substituição do diretor da entidade ou do governante,
procedimento totalmente justificável por ser a Administração
Pública una e perene.
Durante
o processo não será admitida a reconvenção, pelo fato do
autor não estar pleiteando direito próprio contra o réu, sendo
o prazo de contestação de 20 dias prorrogáveis por igual
período. Tanto o réu quanto o autor terão vistas ao processo
por 10 dias, sendo os autos conclusos nas 48 horas seguintes.
Havendo prova a ser produzida na audiência, o processo seguirá
o curso ordinário.
Estando
admitida no Art. 5º, par. 4º, da Lei 4.717/65, a liminar na
ação popular deixa de ser um instrumento de proteção ao
Patrimônio Público transformando-se em puro arbítrio do juiz,
posto que não há previsão dos requisitos mínimos, prazo de
vigência nem mesmo os recursos cabíveis. Porém, no Art. 1º,
par. 3º da Lei 8.437/92, aplicável no processo de ação
popular, que: Não será cabível liminar que esgote, no
todo ou em parte, o objeto da ação. Ainda na mesma lei, o
Art. 2º referenda que somente será concedida liminar em ação
popular, após audiência do representante judicial da pessoa
jurídica de Direito Público, que terá o prazo de 72 horas para
se manifestar.
Havendo
interesse público ou flagrante ilegitimidade, para evitar grave
lesão ao poder público, o Presidente do Tribunal, ao qual
couber conhecimento do respectivo recurso, tem competência para
suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar.
Com
a Lei 9.139/95, o agravo de instrumento passou a ser interposto
diretamente no tribunal competente, o que acelera
satisfatoriamente seu andamento na defesa da arbitrariedade da
liminar.
Da
Sentença e da Coisa Julgada:
Sendo
procedente a ação, três são as situações a considerar: a do
ato impugnado; a dos responsáveis pelo ato; a dos beneficiários
do ato. Onde a princípio todos são solidários. Porém a
invalidação do ato não vincula a condenação de todos que o
subscreveram, ou dele participaram, há de se comprovar se houve
culpa ou dolo, caso contrário não estarão sujeitos a
indenizações ou reparações pelo dano causado.
Pela
natureza civil, a ação popular não comporta condenações
políticas, administrativas ou criminais. Comprovada
infringência na norma penal ou falta disciplinar, de ofício o
juiz determinará o encaminhamento de peças ao Ministério
Público e/ou à autoridade a quem competir a aplicação da
pena.
Após
a conclusão dos autos o juiz terá 15 dias para proferir a
sentença, sob pena de ficar impedido de promoção por 2 anos e,
na lista de antiguidade, ter descontado tantos dias quantos forem
o de retardamento da decisão.
Considerada
procedente a ação terá efeito erga omnes, no entanto
torna-se necessário distinguir-se três situações: a sentença
que julga procedente a ação; a sentença que julga improcedente
a ação em seu mérito; a sentença que julga improcedente a
ação por falta de provas. Nos dois primeiros casos, quando
definitiva, tem eficácia de coisa julgada, oponível erga
omnes, não sendo aceito que outra ação tenha o mesmo
fundamento e objeto. Porém no terceiro caso, como não houve
decisão sobre o mérito, poderá ser intentada nova ação com o
mesmo fundamento se novas provas forem apresentadas.
Vale
ressaltar aqui que apesar de seu efeito erga omnes a
ação popular não se presta para substituir a ação direta de
inconstitucionalidade pelos seguintes motivos: o controle
concentrado de inconstitucionalidade é de competência exclusiva
do STF; o juiz da ação popular não exerce controle difuso,
pois esta tem efeito difuso; a ação direta de
inconstitucionalidade não pode ser proposta por qualquer
cidadão. Isto não significa que um ato que viole a
Constituição não possa ser objeto de ação popular, pois a
restrição se aplica tão somente a ato normativo, cuja
declaração de inconstitucionalidade seja regulada pela Carta
Magna.
Da
Execução:
Transitada
em julgado a sentença constitui título para execução popular.
Havendo condenação para se restituir bens ou valores, a
execução será para entrega de coisa certa, enquanto que
poderá ser por quantia certa, caso relativa a perdas e
danos, ou se determinar reposição de débitos, ou se impuser
pagamento devido. Ao réu condenado que percebe dos cofres
públicos, a execução far-se-á pelo desconto em folha e
pagamento até que se atinja o valor do dano causado, se assim
convier ao interesse público.
Poderão
promover a execução popular: o autor, qualquer cidadão,
representante do Ministério Público e as entidades chamadas na
ação. O representante do Ministério Público promoverá a
execução se após 60 dias transcorridos da publicação do
julgado condenatório seja constatada a inércia do autor ou de
qualquer cidadão. Caso não o faça nos próximos 30 dias
ficará sujeito a pena de falta grave.
Importante
lembrar que não há cabimento em se fazer a execução contra as
entidades Estatais, ou das quais façam parte a União, Estados,
Municípios de Distrito Federal, pois o processo executório visa
exatamente o ressarcimento da lesão causada ao seu patrimônio.
Conclusão:
Conforme
já demonstrado a ação popular é um remédio constitucional
que surgiu da necessidade de se melhorar a defesa do interesse
público e da moral administrativa, projetando, tanto como
direito quanto como obrigação, que todo cidadão seja um fiscal
do bem comum. Agindo como sujeito ativo desse direito, desde que
esteja no gozo de seus direito políticos, e como substituto
processual - apesar de agir em nome próprio está defendendo o
interesse alheio - poderá propor ação contra a entidade
lesada, contra os que, em seu nome, praticaram o ato impugnado, e
contra os beneficiários.
A
princípio a ação popular só deveria ser impetrada contra atos
administrativos, porém a lei não distingue entre os atos que
podem ser objeto da ação popular. Assim, em tese não deve
caber ação popular contra atos legislativos e judiciários.
Todavia, os tribunais têm ignorado a doutrina e admitido ações
populares contra leis, entendendo que os representantes do povo
às vezes praticam atos escandalosamente lesivos ao patrimônio
público.
Cabe
ressaltar que para tornar nulo ou anulável o ato, não basta que
esteja presente a lesividade se não houver a ilegalidade, ou
seja, mesmo que lesivo, estando o ato formalmente perfeito poder
nenhum tem a ação popular contra ele.
Com
o advento da Lei 4.717/65 tornou-se clara a natureza
condenatória da ação popular, que ao se decretar a invalidade
do ato, condenará a perdas e danos ou a restituir bens e valores
aqueles responsáveis pela prática do ato e seus beneficiários
No
Estado moderno, a influência exercida pelos meios de
comunicação tem grande relevância por atingir uma grande massa
da população, devendo exercer através de seus interlocutores
um papel cívico, denunciando a imoralidade e a improbidade
administrativa. Aliado a este deverá estar o desenvolvimento
cultural da população, para que tenha plenas condições para
exercer seus direitos. Quando isto ocorrer maior será a força
da ação popular que terá o apoio de um grande número de
cidadão, e o mais importante, de cidadãos conscientes e
determinado naquilo que estão propondo.
Referências
Bibliográficas:
CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Brasília, Senado Federal,
1988.
FERREIRA
FILHO, Manoel G. Curso de Direito Constitucional. 24. ed.
São Paulo, Saraiva, 1997.
MEIRELLES,
Hely L. Direito Administrativo Brasileiro. 25.ed. São
Paulo, 1994.
MEIRELLES,
Hely L. Mandado de Segurança, Ação Popular, .... 19.
ed. São Paulo, Malheiros, 1998
SAMPAIO,
Luiz A. Comentários à nova Constituição Brasileira.
São Paulo, Atlas, 1989. v. 1.
SILVA,
José A. Manual de Direito Constitucinal Positivo. São
Paulo, Malheiros Ed1998.
ROSA,
Antonio J. M. F. Curso de Direito Constitucional -
Constituição de 1988. Rio de Janeiro, EBC, 1990.
E-mail
do autor: [email protected]