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DesAcertos

 

Quero adormecer
sem esse pensamento
pendurado na ilusão
a inventar todos os sonhos do mundo.
Não quero uma nova verdade
a me arranhar a pele,
a me ferir a pálpebra,
a me amargar a boca.
Quero cerrar a lucidez
de um passado insistente
e de um inseguro presente
a repetir num riso sarcástico
os tristes e velhos enredos
de histórias turvas e tortas.
Quero adormecer
sem os atos de contrição
rezados como redenção
aos raros acertos e infinitos erros.
Quero uma noite que se faça outra
e que o pesadelo não seja o mesmo.
Quero negar a certeza espantada
de um futuro que espreita
a ranger por entre os dentes
as mesmas frases e fases
e a impor as mesmas dores
que se infiltram por entre as frestas
de um corpo trincado
pela teimosia em acreditar
que um sonho seja possível.
Quero adormecer sem memória,
sem vontade, sem roupa, sem fé,
sem mais nada no meu corpo
que não seja a minha própria pele.
Quero adormecer
sem essa palavra
entalada na garganta
a contorcer-se na vontade
de gritar todos os bastas do mundo.

 

 

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Helena C. de Araujo

 

 

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