AKJ: Almeida-1753 compatibilizada com a KJB-1611, com grafia e
gramática inspiradas na ACF-1995
LIVRO DE JÓ
Capítulos 01-10
Capítulo 1
1 Havia um
homem na terra de Uz, cujo nome era Jó; e era este homem
perfeito,
reto e temente a Deus; e desviava-se do mal.
2 E nasceram-lhe
sete filhos e três filhas.
3 E o seu
gado era de sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas
de bois e quinhentas jumentas; eram também muitíssimos os
servos a seu serviço, de maneira que este homem era maior do que
todos os
filhos do oriente.
4 E iam seus filhos e faziam banquetes em casa
de cada um dos homens no seu dia; e mandavam convidar as suas três irmãs a comerem e beberem
com eles.
5 Sucedia, pois, que, decorrido o turno de dias de seus banquetes, Jó
enviava chamado a eles,
e os santificava, e se levantava de madrugada, e oferecia holocaustos segundo
o número de todos eles; porque dizia Jó: Talvez pecaram meus
filhos, e amaldiçoaram a Deus no seu coração. Assim
fazia Jó continuamente.
6 E num dia
em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também
Satanás entre eles.
7 Então
o SENHOR disse a Satanás: Donde vens? E Satanás respondeu
ao SENHOR, e disse: De correr de uma para outra parte,
através da terra, e de passear para cima e para
baixo, através dela.
8 E disse
o SENHOR a Satanás: Observaste tu a Meu servo Jó? Porque
ninguém há na terra semelhante a ele, homem
perfeito
e reto, temente a Deus, e que se desvia do mal.
9 Então
respondeu Satanás ao SENHOR, e disse: Porventura teme Jó
a Deus debalde?
10 Porventura Tu não cercaste de sebe, a ele, e a sua casa, e a tudo quanto tem
em cada lado?
A obra de suas mãos abençoaste e o seu gado se tem aumentado
na terra.
11 Mas estende
a Tua mão, e toca-lhe em tudo quanto tem, e verás se não
blasfema contra Ti na Tua face.
12 E disse
o SENHOR a Satanás: Eis que tudo quanto ele tem está na tua
mão; somente contra ele não estendas a tua mão. E Satanás
saiu da presença do SENHOR.
13 E sucedeu
um dia, em que seus filhos e suas filhas comiam, e bebiam vinho {*}, na casa
de seu irmão primogênito,
{* <03196 yayin> pode ser qualquer líquido direta
ou indiretamente derivado de uvas. O contexto de toda a Bíblia, e contexto
local, e a santidade do verdadeiro autor das Escrituras, o Espírito Santo de
Deus, aqui exige que o sentido seja o de suco puro recém espremido (como em Gn
40:11}, ou o de
suco não fermentado e conservado por qualquer um de vários processos conhecidos
("pasteurização", fumos de enxofre, fervura e evaporação até se tornar grosso xarope,
etc., com envasilhamento estéril e hermético), mas não o sentido de vinagre,
nem o de vinho alcoólico. De
qualquer modo, quer alcoólico ou não, o líquido proveniente da uva somente
devia ser usado misturado em 3 a 20 partes de água. Ler o livro "Bible Wines: or, The Laws of Fermentation and Wine of the Ancients" - William Patton}
14 Que veio
um mensageiro a Jó, e lhe disse: Os bois lavravam, e as jumentas
pastavam junto a eles;
15 E caíram
sobre eles os sabeus, e os levaram, e aos
jovens- servos feriram ao fio da espada;
e só eu escapei para trazer-te a nova.
16 Estando
este ainda falando, veio outro e disse: Fogo de Deus {*} caiu do céu,
e queimou as ovelhas e os jovens- servos, e os consumiu, e só eu escapei
para trazer-te a nova.
{* Inspiração garante que é verdade que as palavras de
um não profeta de Deus foram ditas (e ditas como a Bíblia as cita), mas não
garante que elas expressam verdade absoluta (como se tivessem sido ditas por
Deus ou um Seu profeta inspirado). Portanto, aqui, o uso da expressão "fogo de
Deus" pelo servo pode ter duas explicações: A) Significou "raio de um
relâmpago", nada mais que isto, portanto não temos nenhum problema; B)
Significou "fogo proveniente de Deus", o que é erro do servo (não da Bíblia, que
apenas fielmente cita as palavras erradas), pois tal fogo proveio do diabo;
ademais, talvez foi o diabo que pôs estas palavras nos lábios do servo, para
tentar culpar a Deus e pôr amargura e revolta contra Ele no coração de Jó. }
17 Estando
ainda este falando, veio outro, e disse: Formando os caldeus três
tropas, deram sobre os camelos, e os tomaram, e aos
jovens- servos feriram ao fio
da espada; e só eu escapei para trazer-te a nova.
18 Estando
ainda este falando, veio outro, e disse: Estando teus filhos e tuas filhas
comendo e bebendo vinho {*}, em casa de seu irmão primogênito, {** Ver
nota 1:18}
19 Eis que
um grande vento sobreveio dalém do deserto, e deu nos quatro cantos
da casa, que caiu sobre os jovens homens, e morreram; e só eu escapei para
trazer-te a nova.
20 Então
Jó se levantou, e rasgou o seu manto, e rapou a sua cabeça,
e se lançou em terra, e adorou.
21 E disse:
Nu saí do ventre de minha mãe e nu tornarei para lá;
o SENHOR o deu, e o SENHOR o tomou: bendito seja o nome do SENHOR.
22 Em tudo
isto Jó não pecou, nem atribuiu a Deus falta alguma.
Capítulo 2
1 E, vindo
outro dia, em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR,
veio também Satanás entre eles, apresentar-se perante o SENHOR.
2 Então
o SENHOR disse a Satanás: Donde vens? E respondeu Satanás
ao SENHOR, e disse: De correr de uma para outra parte,
através da terra, e de passear para cima e para
baixo, através dela.
3 E disse
o SENHOR a Satanás: Observaste o Meu servo Jó? Porque ninguém
há na terra semelhante a ele, homem perfeito e reto, temente
a Deus e que se desvia do mal, e que ainda retém a sua
integridade,
havendo-Me tu incitado contra ele, para o consumir sem causa.
4 Então
Satanás respondeu ao SENHOR, e disse: Pele por pele, e tudo quanto
o homem tem dará pela sua vida.
5 Porém
estende a Tua mão, e toca-lhe nos ossos, e na carne, e verás
se não blasfema contra Ti na Tua face!
6 E disse
o SENHOR a Satanás: Eis que ele está na tua mão; porém
guarda a sua vida.
7 Então
saiu Satanás da presença do SENHOR, e feriu a Jó de
úlceras malignas, desde a planta do pé até ao alto
da cabeça.
8 E Jó
tomou um caco para se raspar com ele; e estava assentado no meio da cinza.
9 Então
sua esposa lhe disse: Ainda reténs a tua
integridade? Amaldiçoa
a Deus, e morre.
10 Porém
ele lhe disse: Como fala qualquer doida, falas tu; receberemos o bem de
Deus, e não receberíamos o mal? Em tudo isto não pecou
Jó com os seus lábios.
11 Ouvindo,
pois, três amigos de Jó todo este mal que tinha vindo sobre
ele, veio cada homem do seu lugar: Elifaz o temanita, e Bildade o suíta,
e Zofar o naamatita; e combinaram
vir chorar
juntamente com ele, e o consolar.
12 E, levantando
de longe os seus olhos, não o conheceram; e levantaram a sua voz e
choraram, e rasgou cada homem o seu manto, e sobre as suas cabeças
lançaram pó ao ar.
13 E assentaram-se
com ele na terra, sete dias e sete noites; e nenhum lhe dizia palavra alguma,
porque viam que a dor era muito grande.
Capítulo 3
1 Depois disto
abriu Jó a sua boca, e amaldiçoou o seu dia.
2 E Jó,
falando, disse:
3 Pereça
o dia em que nasci, e a noite em que se disse: Foi concebido um homem!
4 Transforme-se
aquele dia em trevas; e Deus, lá de cima, não tenha cuidado
dele, nem resplandeça sobre ele a luz.
5 Contaminem-no
as trevas e a sombra da morte; habitem sobre ele nuvens; a escuridão
do dia o terrifique!
6 Quanto àquela
noite, dela se apodere a escuridão; e não se regozije ela entre
os dias do ano; e não entre no número dos meses!
7 Ah! que
solitária seja aquela noite, e nela não entre voz de
cântico- retumbante- de- júbilo!
8 Amaldiçoem-na
aqueles que amaldiçoam o dia, que estão prontos para suscitar
o seu pranto.
9 Escureçam-se as estrelas da pouquíssima luz do seu
crepúsculo; que espere a luz, e não venha;
e não veja as pálpebras do alvorecer;
10 Porque
não fechou as portas do ventre da minha mãe; nem escondeu dos meus olhos
o sofrimento.
11 Por que
não morri eu desde a madre? E, em saindo do ventre, não expirei?
12 Por que
me receberam os joelhos? E por que os peitos, para que
eu mamasse?
13 Porque
já agora jazeria e repousaria; dormiria, e então haveria repouso
para mim.
14 Com os
reis e conselheiros da terra, que para si edificam lugares
desolados,
15 Ou com
os príncipes que possuem ouro, que enchem as suas casas de prata,
16 Ou como aborto oculto, não existiria; como os
infantes que nunca
viram a luz.
17 Ali os
maus cessam de perturbar; e ali repousam os cansados.
18 Ali os
prisioneiros juntamente repousam, e não ouvem a voz do exator {*}.
{* "Exator" é um opressor cobrador de impostos ou um tirano feitor}
19 Ali estão
o pequeno e o grande, e o servo está livre de seu senhor.
20 Por que
se dá luz ao miserável, e vida aos amargurados na
alma?
21 Que esperam
a morte, e ela não vem; e cavam em procura dela mais do que de tesouros
ocultos;
22 Que de
alegria saltam, e exultam, achando a sepultura?
23 Por que
se dá luz ao homem, cujo caminho é oculto, e a quem Deus
cercou ao redor?
24 Porque
antes do meu pão vem o meu suspiro; e os meus gemidos se derramam
como água.
25 Porque
o
temor que
eu temia me sobreveio; e o que receava me aconteceu.
26 Nunca estive assegurado, nem sosseguei, nem repousei, mas veio sobre mim a perturbação.
Capítulo 4
1 Então
respondeu Elifaz o temanita, e disse:
2 Se intentarmos
falar-te, enfadar-te-ás? Mas quem poderia conter as palavras?
3 Eis que
ensinaste a muitos, e tens fortalecido as mãos fracas.
4 As tuas
palavras firmaram os que tropeçavam e os joelhos desfalecentes tens
fortalecido.
5 Mas agora,
que se trata de ti, te enfadas; e tocando-te a ti, te perturbas.
6 Porventura
não é o teu temor de Deus a tua confiança, e a tua esperança a
inteireza- completude dos teus caminhos?
7 Lembra-te
agora qual é o inocente que jamais pereceu? E onde foram os sinceros
destruídos?
8 Segundo
eu tenho visto, os que lavram iniqüidade, e semeiam mal,
colhem o mesmo.
9 Com o hálito
de Deus perecem; e com o sopro da Sua ira se consomem.
10 O rugido
do leão, e a voz do leão feroz, e os dentes dos leões jovens
se quebram.
11 Perece
o leão velho, porque não tem presa; e os filhos da leoa andam
dispersos.
12 Uma coisa
me foi trazida em segredo; e os meus ouvidos receberam um sussurro dela.
13 Entre pensamentos
vindos de visões da noite, quando cai sobre os homens o sono profundo,
14 Sobrevieram-me
o terror e o tremor, e todos os meus ossos estremeceram.
15 Então
um espírito passou diante de minha face; fez-me arrepiar os cabelos
da minha carne.
16 Parou ele, porém não reconheci a sua
aparência; uma forma estava
diante dos meus olhos; houve silêncio, e ouvi uma voz que dizia:
17 Seria porventura
o homem mais justo do que Deus? Seria porventura o homem mais puro do que
o seu Criador?
18 Eis que
Ele não confia nos Seus servos e aos Seus anjos atribui loucura;
19 Quanto
menos àqueles que habitam em casas de barro, cujo fundamento está
no pó, e são esmagados
diante da traça!
20 Desde a
manhã até ao anoitecer são despedaçados; perecem
para sempre sem que disso se faça caso.
21 Porventura
não passa com eles a sua excelência? Morrem, mas sem sabedoria.
Capítulo 5
1 Chama agora;
há alguém que te responda? E para qual dos santos te virarás?
2 Porque a
ira destrói o louco; e o zelo mata o tolo.
3 Bem vi eu
o louco lançar raízes; porém logo amaldiçoei
a sua habitação.
4 Seus filhos
estão longe da salvação; e são despedaçados
às portas, e não há quem os livre.
5 A sua messe {*},
o faminto a devora, e até dentre os espinhos a tira; e o salteador
engole a sua fazenda. {* "Messe" é seara (campo de
grãos) madura, em ponto de ser colhida}
6 Porque do
pó não procede a aflição, nem da terra brota a tribulação.
7 Mas o homem
nasce para a tribulação, como as faíscas das brasas
se levantam
para voar.
8 Porém
eu buscaria a Deus; e a
Deus entregaria a minha causa.
9 Ele faz
coisas grandes e inescrutáveis, e maravilhas sem número.
10 Ele dá
a chuva sobre a terra, e envia águas sobre os campos.
11 Para pôr aos abatidos num lugar alto; e para que os enlutados se exaltem
na salvação.
12 Ele aniquila
as imaginações dos astutos, para que as suas mãos não
possam levar seus projetos a efeito.
13 Ele apanha
os sábios na sua própria astúcia; e o conselho dos
perversos se precipita.
14 Eles de
dia encontram as trevas; e ao meio dia andam às apalpadelas como
de noite.
15 Porém
ao necessitado livra da espada, e da boca deles, e da mão do forte.
16 Assim há
esperança para o pobre; e a iniqüidade tapa a sua própria boca.
17 Eis que
bem-aventurado é o homem a quem Deus repreende; não desprezes, pois, o
castigo- instrutivo do Todo-Poderoso.
18 Porque
Ele faz a chaga, e Ele mesmo a liga; Ele fere, e as Suas mãos curam.
19 Em seis
angústias te livrará; e na sétima o mal não te
tocará.
20 Na fome
te livrará da morte; e na guerra, do poder da espada.
21 Do açoite
da língua estarás encoberto; e não temerás a
assolação, quando vier.
22 Da assolação
e da fome te rirás, e os animais da terra não temerás.
23 Porque
até com as pedras do campo terás o teu acordo, e as feras
do campo serão pacíficas contigo.
24 E saberás
que a tua tenda está em paz; e visitarás (para
trazer bem) a tua habitação,
e não pecarás.
25 Também
saberás que a tua semente será numerosa e a
tua posteridade será como a erva da terra,
26 Em robusta velhice
irás à sepultura, como se recolhe o feixe de trigo a seu
tempo.
27 Eis que
isto já o havemos inquirido, e assim é; ouve-o, e
entende isso para teu bem.
Capítulo 6
1 Então
Jó respondeu, dizendo:
2 Oh! se a
minha mágoa completamente se pesasse, e a minha
calamidade juntamente
se pusesse numa balança!
3 Porque,
na verdade, mais pesada seria, do que a areia dos mares; por isso é
que as minhas palavras têm sido engolidas.
4 Porque as
flechas do Todo-Poderoso estão em mim, cujo ardente veneno suga o meu
espírito; os terrores de Deus depõem-se em ordenada linha de batalha
contra mim.
5 Porventura
zurrará o jumento montês junto à
verde da tenra grama? Ou mugirá
o boi junto à sua forragem?
6 Ou comer-se-á
sem sal o que é insípido? Ou haverá sabor na clara
do ovo?
7 As coisas que a minha
alma antes recusava tocar,
agora são minha comida de dores.
8 Quem dera
que se cumprisse o meu desejo, e que Deus me desse o que
anelo!
9 E que Deus
quisesse esmagar-me, e soltasse a Sua mão, e acabasse
comigo!
10 Isto ainda
seria a minha consolação, e saltaria de contente na
minha dor,
não me poupando Ele; porque não ocultei as palavras do Santo.
11 Qual é
a minha força, para que eu espere? Ou qual é o meu fim, para
que eu prolongue a minha vida?
12 É porventura
a minha força a força da pedra? Ou é de bronze a minha
carne?
13 Está
em mim a minha ajuda? Ou desamparou-me a verdadeira sabedoria?
14 Ao que
está aflito devia o amigo mostrar compaixão, mas
ele (o amigo) há abandonado
o temor do Todo-Poderoso.
15 Meus irmãos
aleivosamente {*} me trataram, como um ribeiro, como a torrente dos ribeiros
que passam,
{* Enganadora e traiçoeiramente}
16 Que estão escurecidos por causa do gelo, e neles se esconde a neve,
17 No tempo
em que se derretem com o calor, se desfazem, e em se aquentando, desaparecem
do seu lugar.
18 Desviam-se
as veredas dos seus caminhos; sobem ao vácuo, e perecem.
19 Os caminhantes
de Temá os vêem; os passageiros de Sabá anelam por eles.
20 Ficam envergonhados,
por terem confiado e, em chegando ali, se confundem.
21 Agora, certamente sois como eles, nada; vistes
a minha terrificante queda, e temestes.
22 Porventura disse eu "Dai-me"? Ou disse eu "Oferecei-me
subornos de vossos bens"?
23 Ou disse eu "Livrai-me das mãos do
inimigo"? Ou disse eu "Redimi-me das mãos dos
terrificadores"?
24 Ensinai-me,
e eu me calarei; e fazei-me entender em que errei.
25 Oh! quão
fortemente pressionantes são as palavras
retas! Mas que é o que
repreende
a vossa argüição?
26 Porventura imaginareis palavras para me repreenderdes, visto que as
palavras do desesperado
são como vento?
27 Mas antes
lançais sortes sobre o órfão; e cavais uma cova para
o vosso amigo.
28 Agora,
pois, se vos agrada, olhai para mim; e vede se minto
ante a vossa face.
29 Voltai,
rogo-vos, não seja isto iniqüidade;
voltai, que minha
justiça aparecerá nisso.
30 Há
porventura iniqüidade na minha língua? Ou não poderia o meu
palato distinguir coisas iníquas?
Capítulo 7
1 Porventura
não tem o homem guerra sobre a terra? E não são os seus
dias como os dias do jornaleiro?
2 Como o servo
que suspira pela sombra, e como o jornaleiro que espera pela sua paga,
3 Assim me
deram por herança meses de vanidade; e noites de trabalho me prepararam.
4 Deitando-me
a dormir, então digo: "Quando me levantarei?" Mas comprida é
a noite, e farto-me de me revolver de uma para outra
parte, na cama, até
ao alvorecer.
5 A minha
carne se tem vestido de vermes e de torrões de pó; a minha
pele está gretada, e se fez abominável.
6 Os meus
dias são mais velozes do que a lançadeira do tecelão,
e acabam-se, sem esperança.
7 Lembra-te
de que a minha vida é como o vento; os meus olhos não tornarão
a ver o bem.
8 Os olhos
dos que agora me vêem não me verão mais; os Teus olhos
estarão sobre mim, porém não serei mais.
9 Assim como
a nuvem se desfaz e passa, assim aquele que desce à sepultura nunca
tornará a subir.
10 Nunca mais
tornará à sua casa, nem o seu lugar jamais o conhecerá.
11 Por isso
não reprimirei a minha boca; falarei na angústia do meu espírito;
queixar-me-ei na amargura da minha alma.
12 Sou eu
porventura o mar, ou a baleia, para que me ponhas uma guarda?
13 Dizendo
eu: Consolar-me-á a minha cama; meu leito aliviará a minha ânsia;
14 Então
me atemorizas com sonhos, e com visões me assombras;
15 Assim a
minha alma escolheria antes a estrangulação; e antes a morte
do que a minha vida.
16 A minha
vida abomino, pois não viveria para sempre; retira-Te de mim; pois
vanidade são os meus dias.
17 Que é
o homem, para que tanto o engrandeças, e ponhas sobre
ele o Teu coração,
18 E cada
manhã o visites (para trazer bem), e cada momento o proves?
19 Até
quando não Te apartarás de mim, nem me largarás, até
que eu engula a minha saliva?
20 Eu pequei,
que farei para Ti, ó
Guardião dos homens? Por que fizeste de mim um alvo
para Ti, para que a mim mesmo me seja pesado?
21 E por que
não perdoas a minha transgressão, e não fazes passar a minha iniqüidade?
Porque agora me deitarei no pó, e de madrugada me buscarás,
e não existirei mais.
Capítulo 8
1 Então
respondendo Bildade o suíta, disse:
2 Até
quando falarás tais coisas, e as palavras da tua boca serão
como um vento impetuoso?
3 Porventura
perverteria Deus o direito? E perverteria o Todo-Poderoso a justiça?
4 Se teus
filhos pecaram contra Ele, também Ele os lançou no
poder da mão
da transgressão deles.
5 Mas, se
tu de madrugada buscares a Deus, e ao Todo-Poderoso pedires misericórdia;
6 Se fores
puro e reto, certamente logo despertará por ti, e restaurará
a morada da tua justiça.
7 O teu princípio,
na verdade, terá sido pequeno, porém o teu último
estado crescerá em extremo.
8 Pois, eu
te peço, pergunta agora às gerações passadas
e prepara-te para a inquirição de seus pais.
9 Porque nós
somos de ontem, e nada sabemos; porquanto nossos dias sobre a terra são
como a sombra.
10 Porventura
não te ensinarão eles, e não te falarão, e do seu coração
não tirarão palavras?
11 Porventura
cresce o junco sem lama? Ou cresce a espadana sem água?
12 Estando
ainda no seu verdor, ainda que não cortada- abaixo, todavia antes de qualquer
outra erva se seca.
13 Assim são
as veredas de todos quantos se esquecem de Deus; e a esperança do
hipócrita perecerá.
14 Cuja esperança
fica frustrada; e a sua confiança será como a teia de aranha.
15 Encostar-se-á
à sua casa, mas ela não subsistirá; apegar-se-á
a ela, mas não ficará em pé.
16 Ele é
viçoso perante o sol, e os seus renovos saem sobre o seu jardim;
17 As suas
raízes se entrelaçam ao redor do montão de pedras;
contempla (para penetrar) a casa de pedras.
18 Se Ele (Deus) {*}
o engolir do seu lugar, então
ele (o lugar) {**} negará a ele (o ímpio) {***},
dizendo: Nunca vi a ti (o ímpio) {****}!
{* ou o sol de v. 16} {** ou o ímpio de v. 13, ou Deus}
{*** ou Deus} {**** ou Deus}
19 Eis que
isto é a alegria do seu caminho, e outros brotarão do pó
da terra.
20 Eis que
Deus não rejeitará ao homem perfeito; nem toma pela mão aos malfeitores;
21 Até
que de riso te encha a boca, e os teus lábios de júbilo.
22 Os que
te odeiam se vestirão de confusão, e a tenda dos ímpios
não existirá mais.
Capítulo 9
1 Então
Jó respondeu, dizendo:
2 Na verdade
sei que assim é; porque, como se justificaria o homem para com Deus?
3 Se quiser
contender com Ele, nem a uma de mil coisas Lhe poderá responder.
4 Ele é
sábio de coração, e forte em poder; quem se endureceu
contra Ele, e teve paz?
5 Ele é
o que remove os montes, sem que o saibam, e o que os transtorna no Seu
furor.
6 O que sacode
a terra do seu lugar, e as suas colunas estremecem.
7 O que fala
ao sol, e ele não nasce, e sela as estrelas.
8 O que sozinho
estende os céus, e anda sobre as altas ondas do mar.
9 O que fez
a Ursa Maior, o Orion, e o Sete-estrelo, e as recâmaras do sul.
10 O que faz
coisas grandes e que não se podem esquadrinhar; e maravilhas sem número.
11 Eis que
Ele passa por diante de mim, e não O vejo; e torna a passar perante mim,
e não O percebo.
12 Eis Ele que
arrebata a presa; quem O fará
restituí-la? Quem Lhe dirá:
Que é o que fazes?
13 Deus não
revogará a Sua ira; debaixo dEle se encurvam os auxiliadores soberbos.
14 Quanto
menos Lhe responderia eu, ou escolheria as minhas palavras
para argumentar com Ele!
15 Porque,
ainda que eu fosse justo, não Lhe responderia; antes ao meu Juiz pediria
misericórdia.
16 Ainda que
chamasse, e Ele me respondesse, nem por isso creria que desse ouvidos à
minha voz.
17 Porque
me quebranta com uma tempestade, e multiplica as minhas chagas sem causa.
18 Não
me permite restaurar meu fôlego, antes me farta de amarguras.
19 Quanto
às forças, eis que Ele é o forte; e, quanto ao juízo, quem me
atribuirá um
tempo
de pleitear com Ele?
20 Se eu me
justificar, a minha boca me condenará; se eu
disser "Eu sou perfeito", então
ela me declarará perverso.
21 Se eu fosse
perfeito, ainda assim não
estimaria a minha alma; desprezaria a minha vida.
22 É tudo uma só coisa; por isso eu digo que
Ele consome ao perfeito e ao ímpio.
23 Quando
o açoite mata de repente, então Ele zomba do teste dos inocentes.
24 A terra
é entregue nas mãos do ímpio; Ele cobre o rosto dos
juízes; se não é Ele (Quem permite isso), onde
está e quem é Ele?
25 E os meus
dias são mais velozes do que um correio; fugiram, e não viram
o bem.
26 Passam
como velozes navios veleiros; como águia que se lança à comida.
27 Se eu disser:
Eu me esquecerei da minha queixa, e mudarei o meu aspecto e
confortar-me-ei,
28 Receio
todas as minhas dores, porque bem sei que não me terás por
inocente.
29 E, se eu me tornei condenado, por que trabalharei em vão?
30 Ainda que
me lave com água de neve, e purifique as minhas mãos com sabão,
31 Ainda assim Tu me
submergirás no fosso, e as minhas próprias vestes me abominarão.
32 Porque
Ele não é homem, como eu, a quem eu responda, vindo
nós juntamente
a juízo.
33 Não
há entre nós árbitro que ponha a mão sobre nós
ambos.
34 Tire Ele
a Sua vara de cima de mim, e não me amedronte o Seu terror.
35 Então
falarei, e não O temerei; mas retidão não está em mim mesmo.
Capítulo 10
1 A minha
alma tem tédio da minha vida; darei livre curso à minha queixa,
falarei na amargura da minha alma.
2 Direi a
Deus: Não me condenes; declara-me por que contendes comigo.
3 Parece-Te
bem que me oprimas, que rejeites o trabalho das Tuas mãos e resplandeças
sobre o conselho dos ímpios?
4 Tens Tu
porventura olhos de carne? Vês Tu como vê o homem?
5 São
os Teus dias como os dias do homem? Ou são os Teus anos como os
dias
de um homem,
6 Para Te
informares da minha iniqüidade, e averiguares o meu pecado?
7 Bem sabes
Tu que eu não sou iníquo; todavia ninguém há
que me livre da Tua mão.
8 As Tuas mãos me fizeram e completamente me formaram
ao redor; contudo me devoras.
9 Peço-Te
que Te lembres de que como barro me formaste e me farás voltar ao
pó.
10 Porventura
não me derramaste como leite, e como queijo não me coalhaste?
11 De pele
e carne me vestiste, e de ossos e nervos me entreteceste.
12 Vida e
misericórdia me concedeste; e o Teu cuidado preservou o meu espírito.
13 Porém
estas coisas as ocultaste no Teu coração; bem sei eu que isto
esteve conTigo.
14 Se eu pecar,
Tu me observas; e da minha iniqüidade não me absolverás.
15 Se for
ímpio, ai de mim! E se for justo, não levantarei a minha cabeça;
farto estou da minha ignomínia; e vê qual é a minha
aflição,
16 Porque
esta vai crescendo; Tu me caças como a um leão feroz; tornas
a Te mostrar maravilhoso para comigo.
17 Tu renovas
contra mim as Tuas testemunhas, e multiplicas contra mim a Tua ira; revezes
e combate estão comigo.
18 Por que,
pois, me tiraste da madre? Ah! se então eu tivera expirado, e olho nenhum
me visse!
19 Então
eu teria sido como se nunca fora; e desde o ventre seria levado à
sepultura!
20 Porventura
não são poucos os meus dias? Cessa, pois, e deixa-me, para que
por um pouco eu me conforte.
21 Antes que
eu vá para o lugar de que não voltarei, à terra da escuridão
e da sombra da morte;
22 Terra escuríssima,
como a própria escuridão, terra da sombra da morte e sem ordem
alguma, e onde a luz é como a escuridão.