ObjetivismoBR
Uma paixão contra o homem
Onkar
Ghate
(Texto original, em inglês, disponível em www.aynrand.org )
Tradução
Geraldo Boz Junior ([email protected])
A
"Paixão de Cristo" tem levado multidões ao cinema. Numerosos críticos
e cinéfilos comentam que o filme
é uma experiência transformadora. Embora muitos se
sintam forçados a virar de lado nas cenas de violência na tela, eles dizem
que a imagem sangrenta da crucificação de Jesus
tem um propósito importante. Devemos
ser lembrados do enorme sacrifício que Cristo fez por todos nós.
Ao
reagir desta forma ao filme, a platéia demonstra ter captado a mensagem dos
responsáveis pelo filme. Jim Caviezel, o ator que
representou Jesus, explica: "Somos
todos culpáveis pela morte de Cristo. Meus pecados o colocaram na cruz.
Os seus também. É sobre isto que esta história
fala." Quando Diane Sawyer perguntou
ao diretor e coautor do filme, Mel Gibson, quem matou Jesus, ele
respondeu: "A grande resposta é 'nós
todos'. Eu sou o primeiro em culpabilidade".
E, para não deixar dúvidas de que pensa assim, a única aparição
de Gibson no filme mostra apenas suas mãos
cravando os pregos no corpo de Jesus.
É
assustador que uma mensagem tão maligna possa receber tantas boas-vindas.
Quando
acusações de anti-semitismo, negadas pelos produtores, caíram sobre o
filme, antes de sua estréia, houve escândalo em
muitos círculos. Mas quando os responsáveis
pelo filme nos falaram abertamente que sua mensagem não era só
sobre os judeus, mas sobre o fato de todos os
homens estarem implicados na morte de
Jesus, as vozes do escândalo moral se calaram. (Daqui para frente, deixarei
de lado a questão sobre o sucesso do filme em
passar sua mensagens).
Então,
vamos perguntar algumas coisas que ninguém perguntou. Porque é imoral
culpar todos os judeus, mas não é imoral culpar
toda a humanidade? Como alguém pode
saber, sem considerar primeiro nossas ações e escolhas, se você ou eu somos
culpados? Como posso eu ou você sermos culpados
pela morte de um homem que foi executado
há dois mil anos? Para que a acusação possa fazer algum sentido,
deve-se reconhecer que alguém aqui está lidando
com a mesma mentalidade racista, embora
numa forma mais sofisticada. Para os anti-semitas, ser judeu é ser
maligno. Para o cristão devoto, ser humano é ser
maligno.
A
denúncia do homem como uma criatura impura por, nas palavras de Santo
Agostinho, "uma mácula radical em sua mente
e sua vontade" está infundida na
tradição
cristã. Todo atributo essencial e toda virtude do homem é atacada.
Possuir
uma mente inquisitiva, uma mente faminta de explorar o mundo e ganhar
conhecimento, é cometer o primeiro pecado.
Lembram da história de Eva? Estudar a
natureza
de forma criteriosa, desvendando suas leis e pavimentando o caminho
para que o homem domine o mundo em que vive, é
cortejar o aprisionamento e a tortura.
Perguntem para Galileu ou para algum cientista que esteja estudando
clonagem humana. Preocupar-se com a produção de
riqueza ou de bens materiais que a
vida exige, é pedir para ser condenado por "avareza" ou
"materialismo". Leia o "Sermão da Montanha" de Jesus. Cuidar
dos prazeres terrenos ou corporais, incluindo
o sexo, é ser denunciado como "egoísta" ou mesmo depravado. Consulte
os puritanos ou então a encíclica papal "Humanae
Vitae", de 1968. Orgulhar-se da sua
curiosidade, do seu conhecimento crescente a respeito do mundo, do seu
sucesso e da alegria e do prazer resultantes dele
- isto é denunciado por todos/tt> como
o cúmulo do pecado.
Nessa
abordagem anti-homem, manter-se vivo é um pecado. Para que alguém seja
plenamente purgado, deve morrer. Só uma visão
dessas a respeito dos homens pode começar a
explicar
a carga de culpa coletiva para a morte de Cristo, cujo sofrimento
indesejado nas mãos pecaminosas dos homens é, de
alguma forma, supostamente responsável
por aliviar nossa característica pecaminosa inata.
Se
a visão anti-semita da raça judia, inerentemente corrupta, é irracional e
maligna, quanto mais irracional e maligna não é
esta visão da raça humana?
Será
que "A Paixão" por si só desempenha um papel maior na difusão dessa
concepção da natureza humana? Claro que não.
Mas as platéias e os aplausos ao filme
mostram o quanto esta concepção já está disseminada. Se existe uma idéia
por trás do filme, que merece ser combatida, é
esta. Ensine o homem a enxergar a si
mesmo como um ser repelente e abjeto e ele estará pronto para qualquer
ditador místico, que vai usar o chicote
supostamente necessário para manter o
homem
consciente de suas "transgressões". Tire a autoestima do homem,
ensine-o a cuspir na sua face e pavimente o caminho para
outra idade das trevas.
Entretanto,
para se opor a esta concepção da natureza humana, alguém deve
primeiramente entender que o homem - o homem no
seu melhor, o homem racional, produtivo
e vencedor egoísta - é um ser nobre.
Onkar Ghate é Ph.D. em filosofia e membro residente do Instituto Ayn Rand, em Irvine, Califórnia, EUA. O Instituto promove o Objetivismo, a filosofia de Ayn Rand.