UM
A insanidade paira e finalmente ataca
A alma túrgida presa ao chão frio
Que vai nas palavras que agora crio
Claramente escuras, livremente aprisionadas.
Banalidades de crimes e sons,
Da palavra carne, te entorpecendo
Faminto e atento a toda prece
Inesquecível acontecimento que se esquece.
Silêncio é medo
Que nos levará ao túmulo
Tendo consigo o acúmulo
De imensuráveis quimeras.
Feias, fofas, famintas
Mergulhadas em sal e álcool
Co�a cútis parda de enfado
Sabendo que continuará calado.
Mas solte-se! O tempo das lâminas já se foi
A espada desce e nos poupa o pó
A armadura d�ouro que protege a terra
Esfacela-se sob a força primeva.
[�ndice]
DOIS
Esta noite é nossa, avulsa e sem pernas
Sem as marcas do sangue empalidecido
Plúvea e gélida, apenas o início
Envolvendo vulvas vomitando vitelos vivazes.
Te perseguindo com suas pernas de rã
Ultrapassando esquinas acesas
Borrões luminosos rasgando as trevas
Furando becos, inventando saídas.
Eternamente fechadas com tua chave espantada
Que derrama uma lágrima que oscila
Na irracional flutuação dos sentimentos.
Fecha tua porta! Ganhamos a rua.
[�ndice]
VENTO
Já tenho minhas asas
Vou levantar vôo,
Ligando horizontes
Com linhas tortas e rasas.
Desilusão afeta-me agora
Não poderei continuar
Na colisão de pensamentos
Mais um morto desancora.
Eu sou a brisa,
O tédio corrói,
Constrói teias,
Mas não me paralisa.
O vento não pára
Penetra na menor fresta
Avança sobre o maior obstáculo
Modifica, enterra, draga.
Não tenho ritos
Nem me acanho
Resgato as angústias
De seres aflitos.
Viro grito,
Cresço sempre
Em busca da fronteira
Do infinito.
[�ndice]
NOCTURNNA
Luz de varanda
Ilumina mentes,
Dos miolos quentes
A poesia emana.
Monstros são fluídos,
Almas dissipadas,
Cortes saturados
Ao alcance da mão.
Óleos secos
Lubrificam engrenagens
Que não existem mais
Mas rodam, e rodam...
Tornando pedra em vapor,
Treva em luz,
Lembrança em dor.
[�ndice]
SONETO PRAIEIRO
Lua nova, coberta com seu manto escuro,
Deixa a noite negra como tua face,
Precedendo um brilho imaturo,
Que, dois dias depois, nasce.
Nasce na aurora das trevas
Retocada com o brilho das sardas prata,
Que sorriem com a lua tão pacata,
Tão calada, como fosse mãe delas.
Revela sua luz enfadada
Como almas que se encontram
Em entrelinhas de palavras
Proferidas aleatoriamente
Em cadeias desconexas
De pensamentos ausentes.
[�ndice]
APENAS
Métara intúmina tranciste
Ectoprofundidades, apenas.
Dulcinérveas catalimórficas,
Galicídio microcefalóideo, apenas.
Casniropolíngeo estereoligárquico,
Barbuliforme neuromorfossintaxe, apenas.
[�ndice]
POESIA, POEMA
Pó-é-sia.
Mas não confundas
Com a azia,
Que é mal amargurável.
Pó-é-sim a areia do mar.
Magia do estar,
Maresia,
Mar-é.
Poema,
Poemar
Pó-e-mar;
Pó-ou-mar?
[�ndice]
EU, POEMA
Trevas que esclarecem
Não a solução de meus problemas
Porém pontos que reluzem
A problemática dos poemas.
Tantas lembranças, tantas vontades
Desfilando perante a interna visão
Tantas estranhas inexplicáveis saudades
De emoções que foram, são e serão
Cosmovisões preexistentes
Contrastam tal qual água e água
Água gelada, que sacia a sede,
Água ardente, poema e mágoa.
Memórias, experiências e desejos
Estimulam os sedentos impulsos
Preciso matar a sede; escrevo...
E o mundo, ao toque do clarim
Queima, arde
E voltamos ao fim.
[�ndice]
ABISSAL
Dádiva das águas de cristal
Fluidos úmidos da secura
Dos olhos, da carne pátria
O social, o enfermo sem a cura.
Frustrantes esperanças, emoções vãs
Edificante ilusão; alegria, trauma
Máscara momentânea da alma,
Demolindo os mais ardentes afãs
E por mais que não seja
Torna-se real, é:
Busca em paralelos
E mira, deseja, quer.
Nostalgia, anseios viris
Desesperadas viagens inconscientes
Obstáculos me derrubam
Preciso acordar, urgente!
[�ndice]
CULTO AO ZERO
Paredes etéreas
De fortalezas virtuais
Cercam os animais
Que habitam esta esfera;
Olhos atados
Ao tédio das marés
Espadas nos cercam
Morte, quem és?
O fio produz
Profundos talhos.
Abstinência de tudo
Fartura do nada.
Nada que se acaba
No nada dum suspiro,
O derradeiro dos escárnios
Da hora em que expiro.
[�ndice]
MATER MVNDI
Da água
É a nossa primeira
Molécula lá está
A nossa primeira
Bioforma mãe
Os sinos da
Matriz a
Badalar e abalar
Os sonhos surdos
Da maternidade
O ferro e a bigorna
Formando o início,
Ferindo a vida,
Ofertando o tempo.
Tempo e espaço;
Tecido do Universo,
Cerne do Existir.
[�ndice]
RE-VOLTA
Capto as multifacetadas influências
Que ao meu redor orbitam agora;
Uno as energias de tão sublime hora
Nesta criação e recriação constantes
É neste espaço que morro
Apago, sonho e acho
Cada espaço abstrato
Em poeiras da memória
A castrante ignorância
Que transpassa os limites,
Que excita e transmite
Os devaneios da dúvida
É como luz que emana
Brilhante, misteriosa, incandescente
Ilumina os obscuros desta mente
Como a cura obcecada que nos chama
Cerra teus olhos, sanidade
A pena já fere o papel
O que tu chamas de crime aconteceu
A tinta escorre... e não é mais tinta.
[�ndice]
LÓGOS
Fique!
Cale-se!
Não
Seja
Ser.
Esqueça
Hora
Fora
Morrer!
Seja
Saber
Senão
Não ser
Lembre-se:
Apenas,
Viver.
[�ndice]
A MORTE
É texto plagiado
Do existir tido.
Ser ser de novo
Como ver já visto.
É penumbra clara
Da realidade.
Maldição bendita
Derradeira aventura.
É o clarão da vida
Ao acender-se,
Incandescente cegueira
À ilusão das negras brumas.
É a vitória do Tempo
Sobre o colóide;
Ser não existindo,
Recomeço.
É... e não é
O que se tentou ser
Não é... e é
O fim de tudo.
Escuridão, frio... fim.
[�ndice]
PENUMBRA
A escuridão, salpicada de luzes
Lâmpadas, algumas acesas--pontos.
outras apagadas--nada.
Os lobos, cães e coiotes concordam;
As almas apenas seguem seus caminhos.
A aura regida pela brisa
Some ao redor de construções
A surda, fervente terra fria
Repousa entre paralelas
Estranhos seres afônicos
Na vasta escuridão do dubitável
São o que não mais são, mas foram
Donos da tão cruel verdade
Vozes distantes conversam quilômetros
Entre explosões das vagas
As ruas desaparecem entre árvores
Que somem no negro espaço
Restando vultos enormes
--Vagalhões de matéria esquecida
O mar--em sua clara nudez--
Responde aos anseios da noite,
Estupra os desavisados, e
Oculta-se em ameaças
Madrugada, virtual cegueira;
Eterna prisioneira do breu insaciável,
Vê o espirrar de lágrimas
Frias no colchão de areia,
Natural esteira do furioso mar.
Sombras e silhuetas bailam
Povoando o pavimento deserto
O crânio, enfadado, tomba
Ante o exílio da luz eterna.
[�ndice]
SOMENTE
Espragnésia
Scambaleia
Carabanteia,
Somente.
Tubicoliroscada
Anelírmena
Zarcasticósnea,
Somente.
Costronome
Vilo
Logali
Napila,
Somente.
Instrássico
Extrático
Intracolaterálico
Exodussuzelimente,
Somente.
Marcascapatuabiládico
Toi
Oi
I,
Somente.
Pingagoelepaticamente
Mucharingargúmena
Rostolhoideaatém,
Somente.
Schiphayshphawoyrâ
Estramboticamente,
Somente.
Bufudicicando
Degáiporemporgái
Iê!
Somente...
[�ndice]
...QVÆ SERA TAMEN
Libertas, que serás também
O que será também não liberto,
...ainda que tardio.
Libertinos do mundo
Berlinda decadente
Liberta-te, também.
Berço dos grilhões; Lácio.
Determinada, fixa liberdade
Unimórfica língua,
Ledo lerdo histórico engano.
Liberdade e para-realidade
No calor da brisa
Abrindo a vida
Em mar e pena.
Mente aberta com a
Imensidão marinha
Parindo liberta
A condoreira vida.
[�ndice]
INOMINÁVEL
Paixão, tu que és amargura
Explica a pureza dos sonhos
Extirpa a magia das gueixas
Acende as tais chamas do peito.
Tu que incendeias meus sentidos
Ela que me fornece a lenha
Eu que quero apagar o fogo
Não adianta, está além
Não é querer em ter,
É a linha derradeira.
Fronteira de dois mundos
Abrindo o primeiro ou último portão.
Grades que se escancaram
Em imensa ausência de luz
Queda infinita, esperança aflita
De voltar um centímetro, ao menos.
Adrenalina afogando a alma
Em turbilhões ardentes;
Intensa queima num átimo...
[�ndice]
I.M.L.
Sobre os cadáveres embalsamados
E o pó do silêncio,
Ainda resta uma partícula.
Uma centelha ao menos,
Lembrança amargurada;
Patética tentativa
De imitar a esvaída vida.
Foi-se a foice
Espalha-se o pó
Vai-se o silêncio
Detona-se a paz
Sobre a mórbida palidez
Que enruga a carne fria
Umedecida hipotônica-mente;
Letárgicos suspiros não respiram!!
[�ndice]
IDÉIAS SANGRENTAS
Substância amorfa da noite
De-forma idéias atrozes,
partos ferozes;
Massas híbridas de sangue
e mentes
Grandes olhos desapontados
Chorosos, tristes e clementes
A derramar o santo
Fluido rubro de toda a vida
O sangue que escorre
É apenas o fruto amargo,
O vinho manipulador de
Não ser total derrota.
A bruma alcoólica
Que dele evapora
Turva os sentidos,
Aflora os fantasmas,
lembranças
aterradoras
Pulsando violentas, encarnadas
Por entre as têmporas
Que se enchem e estouram
Em corrosiva agonia
Da dor que causa a vida,
Embriagado caos da morte.
[�ndice]
SONHO DESPERTO
Imensa teia negra
Envolve martírios,
Revolve os sonhos,
Evolvem os delírios.
E por mais acalentada
Que a fria pena se comporte,
Está a mão e seus tentáculos
Na úmida mãe do norte.
O medo é o calafrio
Da tinta suspensa,
Mas resta o esforço
Da letra dura e lenta.
Calma, alma terna da brisa
Chegaremos ao movimento,
Tenro conforto,
Conseqüência do momento.
[�ndice]
DECEPÇÃO
Ele procurou sentido
Na escuridão
E só encontrou vazio
E sua própria sombra
Ele procurou a vida
No âmago de sua morte
E só sentiu o frio
De sua própria alma
Ele procurou a si próprio
Em seu corpo oco
E nada encontrou:
Era só carne.
Ele procurou,
E procurou,
E se perdeu;
Passou sua existência
Buscando o inexistente.
[�ndice]
VAZIO
Sinos céticos sonolentos
Soam sozinhos
Da vida,
Recuperam o acre.
Dos sonhos,
Constróem cimento.
Acabam com as esperanças,
Ferem as almas amarguradas;
Começam os desesperos,
Morte aos espíritos sem alma!
[�ndice]
GRITO
Ah, paciência infértil
Mesmice inútil
Queimemos a bandeira branca
Já baleei a pomba imbecil
Insignificantes símbolos
De uma falsa, utópica paz;
Encaremos a realidade:
Projéteis de sangue
Perfuram os corpos de aço
Cabeças rolando
Voando no espaço
Estilhaços misturados
Ao plasma infernal
Das explosões
Bombas e gritos
Confundem ouvidos
Choros infantis
Dos velhos veteranos
Que no inferno penaram
Com os olhos esbugalhados
De terror e pseudo-glória
O pó da vitória,
Decepcionante; insossa
O sangue escorre, acinzentado
Coagulado, de ambos os lados
O fogo mostra suas cinzas
O rubro, o seu negro
Enquanto seres reerguem-se
Para morrer em segredo
A contagem dos falecidos
E o balanço do dinheiro
Gasto com metralhadoras
E balas de morteiro
Quero fetos, afetos
Que supurem o vácuo
E criem o brilho.
Não, não desperte o cão!
Jamais estoure a ira
Acorde o sono tão somente
Ao transportar-me do abandono!
[�ndice]
DESTRUIÇÃO
Lâmina rubra rasga o ar
Gela o tempo, ferve a carne
Coagula palavras, sons,
Mata o tédio.
A poeira recicla-se,
Perde-se no ar.
O silêncio está imposto,
O corpo presente...
Na analogia
A matéria morre
A alma túrgida escorre
Nos capilares do medo de estar
Passando o passado, já;
Retornando do nada
A coisa alguma.
[�ndice]
O SENHOR DAS TREVAS
Queridos monstros da agonia
Curvem-se ao Mestre Sarcasmo
Pois os podres poderes dos mitos
Não vieram da mente de Erasmo.
Mas talvez da mente maquiavélica
Do maldito príncipe empalador
Podendo ter sido o inspirador
Da obra maior da antiética.
Circundando o vulto estático
Almas entrepassadas por tristes mistérios
Corpos tremem ante o demo polidácteo
Respiramos aliviados, ainda estamos etéreos
Seremos atingidos, é certo,
Mas o final nos resgatará
Através de um ser eterno
Que não é senão amar.
Reluzente criatura da noite
Cega-nos, encarando-nos ao luar
O solo a tomar o corpo
Resta-nos apenas levantar.
[�ndice]
PERDIÇÃO
Caros caretas capengam à noite
Estuprando a extirpada coitada
Esbagaçando as feridas do açoite
Descoagulando pancada a pancada
Entre sombras, o brilho será o nada,
Em busca da noção de mal
Que move, afasta cada
Ser de seu sonho primal.
O espírito e a mente tombam
Ante o tilintar da moeda
A matéria surge como "ad æternam"
Nascendo da ignorância da Nova Era
Era nova, surge já superada
Esmagada sob seu próprio peso
E o sonho, outrora aceso,
Estraga-se no meio da estrada
Escalpos acesos ao vento
Mãos seguras ao aro
Destino, velocidade ao relento
Esperança, amparo...
[�ndice]
BOSQUE PROMÍSCUO
Enquanto eles arrotam notas de cem
Outros regurgitam a própria sorte
Sorte sem vida, esperam a morte
E os primeiros mastigam e agradecem: Amém.
E o sistema que se caracteriza digestivo
Dilacera os componentes da sociedade
Esta de estrutura secular, é verdade
Mantida pelas enzimas de efeito sedativo
Monstruosidade leviatânica vomitada,
Ergue-se sob bases enfraquecidas.
Máquina bestial, alienadora de vidas
Reduz suas almas a menos que nada.
E a esfera há tanto esquecida
Pelos medos do outro multiplicara-se.
Virá, então, a volta de quem no cárcere
Recuperou a visão da mata frígida.
[�ndice]
ETERNAMENTE
O sopro do vento do tempo
Enrugando-me o rosto
Cicatrizes fervem-me a memória
A embaçar-me a visão do mundo
A tocha do que é apenas
O todo no intervalo
Entre ser vida
E não mais respirar.
O brilho do osso partido
Refletido na gota cadente
No chão já é poça
Morte molhada, fratura exposta
E, se em desesperado esforço
Tento retornar ao "já não mais",
Frustro-me ao ver que não sou capaz;
Resta-me apenas a implosão derradeira...
[�ndice]
VÊS
Voando por entre as veias
Vazadas nas vozes tuas,
Verei o vazio de mim
Velado em sombras intrusas.
Vou, no vórtice vitral
Vivendo o vulto que eu sou,
Volátil vívere, como vês?
Afinal, de que ventre eu vim?
Vivazes raízes, memória
Violentos ventos a me abalar
Vozes veludadas vêm
Vomitam ao meu ouvido, realidade
Vácuo vívido vela o vindouro
Vivo qual Vlad, o vil vilão
Venço o vitorioso verme,
Volto a vê-lo sair do vácuo.
Como vês, a vez do vê vive
Vitoriosa como a vasta vacina
Vigorosa como Vera Virgem
(Vetando o "como", só como vendo a vaca).
[�ndice]
AVESSO
Ondas impulsionam-me a socar
O eterno infinito, o nada
Alimento-me do vibrar do sólido
A estimular-me a alma já excitada
E neste deserto tento alcançar
O resto de realidade confinada
E o cérebro, gigante bólido,
Treme ante a matéria expurgada
Cansado estou de tanto estar,
Em busca de toda essência raptada
No centro do ser sórdido,
Dentro d'alma de cada palavra.
Desloco-me de lugar a lugar,
Sempre buscando o não-nada.
Impotente sinto-me qual pólipo
Em oceano de água evaporada
É na indecisão por onde vagar
Que os cortes que fazem espadas
São dores a fugir do mórbido
Das flores que brotam caladas.
[�ndice]
UM PENSAMENTO
Inexplicavelmente tranqüilo estou,
Nos resquícios da última onda
Cristas destinam-me à sombra
A espuma misturada ao sangue de quem matou...
[�ndice]
DVRA SCRIPTA, SED SCRIPTA
Buscando as musas,...
Talvez na mente inclusas;
Inspiração? -Transpiro.
Energia dispersa, perdendo
O derradeiro estilo.
Já afogado em suor,
Cerco sinais no infinito;
Mas o infortúnio deixou-me cego
E o mundo não mais cede abrigo.
Imerso na apatia do antipatismo,
No surdo impensar do fluido,
Não sinto, não quero, mas escrevo
Procuro a chance para atingir o Tudo
Espremo o inconsciente até sangrar
Cega-me a vista da exasperação
Esbarro na escuridão da ignorância,
Meu rosto exprime a frustração
Da fadiga nascem teias
Que mumificam nossas dívidas
Às poesias das cadeias
De mentes mal-queridas.
[�ndice]
2000, UMA ODISSÉIA NA TERRA
(ou: VIVER NO DOIS, ZERO, ZERO, ZERO)
No passear por sobre ruínas
O tempo já não mais é,
Foi-se com os vultos
Do que jamais será.
No seu fluxo inexorável
Dita fim e começo;
Lembranças são fantasmas
Assombrando-nos a memória.
Vida prisioneira da glória
Glória acomunada às armas.
Sonho macabro ao verso
Duma era imutável.
Esganiçada sede a matar
Obsessão por sermos cultos
Fissura pelo Tempo, até
Grande legado de idéias divinas.
[�ndice]
AVGVSTINVS
Padre Aurelius, tu que és
Também Santo Augustinus,
Confesso-te à análise
A impureza dos meninos
À noite, no claustro do quarto
Faz-se a máscara e seu prazer.
Se não possuem um buraco negro
São, ao menos, sombras do não-ser.
Libertinagens carnais da humanidade,
Busca por um momento de explosão.
De corpos fazem usucapião
Em cáusticos atritos da promiscuidade
Impõem-lhes os castigos consciência
Corredores de um labirinto sem ar;
A natureza mostra-lhes caminhos
Que tu insistes em condenar
Conforma os presos por teu pensamento
Tu sabes o que dizes, santo vigário
Corrige as almas dos inconscientes porque
Quem está acordado ungiu-se de pecado.
[�ndice]
ANNO UM
Marco de um anno abstracto
Envelhece-se o sonho definitivo
Sólida está a letra
Corroída no tempo consumido.
Avante, vulgar vício de querer cultura
Segue as trilhas que te fazem vivo
Viaja por caminhos que te fazem feliz
Irrigando a existência de.
[�ndice]
A SETE PALMOS
No momento de escuridão
Onde os olhos não mais brilham
Nossas mágoas não mais habitam
Nos corpos a palmos do chão.
Estamos à beira do matrimônio
Com a companheira restante:
A terra, mãe e homicida
Da carne que já só sonho.
Obstinados procuramos a superfície
Quilômetros nos separam do céu
A depressão que nos corrompe
Afunda-nos até a invencionice
Mas não adianta! Deixemos
Que os saprófagos limpem as carcaças,
Findando assim o que nos ameaça:
Medo atormentado de tormentos extremos!
[�ndice]
POLÍSSONO
Cifra cálida
Acorde-mãe
Simples fermata
À clave oposta:
Produzam música,
Pré-poesia ardente.
Na partitura em branco
Manchas negras solfejam
Não o ritmo
Demarcado, mas sim
Fônicas anárquicas
Do sonho.
Som impregnado,
Animal liberto.
Música como silêncio,
Sentimento.
Infinito.
[�ndice]
A ALGUÉM
Eu estou em alguém;
Como um círculo criado
Dentro de si mesmo
À espera de parir.
Síndrome cabal do existir.
Domina-me em clausura
Própria imensidão do ser
Aprisiona o sonho de fugir
Exploração de um novo mundo
Falta-me conhecimento, razão
Tenho medo de perder, sofrer
Na eterna busca de viver
Não quero ver ninguém
Sonora dor estala sozinha
Procurando um motivo para ser
Alguém, por favor, me deixe morrer.
[�ndice]
TENTATIVA
Biorritmo alucinante
Escravizador dos sentidos,
O Desejo irrefreável
Insaciável; possuir - impossuível.
Inocente e jovem tara
Bondosa e linda malícia
Estrondosa, espalhafatosa viagem
Violenta, decepante realidade
Corte da primeira visão
No derradeiro momento.
Congelamento da espera,
Desespero.
[�ndice]
CONVERSASSÓ
O insuportável murmúrio
Queimando meu cérebro;
Neurônios aos pulos...
QUERO SILÊNCIO!!!
Desliguem as sinfonias
E a louvação às estrelas.
Quero escutar a sombra da sombra
E o cheiro das cores.
Quero ouvir o verde-musgo
Das esculturas de Rodin;
Ouvir o campo e as brumas
As confidências da terra e do ar
POR FAVOR!
Meu fôlego onde está?
Afogando-me no concreto
Tão seco quanto o mar.
Não enforquem as palavras;
Condição de ser existência.
Pois tenho algo a dizer:
-PAZ!!!!!!!
[�ndice]
CICLO ESTELAR
Se a vida é um relógio
Sua hora final está marcada.
Será no último crepúsculo
Solar do ser que se apaga.
Túmulo da estrela,
Berço do buraco negro;
Aspirador cósmico
Ceifador do medo
Energia infinita
Explode em orgasmo de luz
Supernovíssima vida,
Estrela carrega sua cruz
Satúrnica macabra
Dança negra celeste
Marcada de Mercúrio
Por Órion, cinturão-mestre.
[�ndice]
LUDWIG
Em acordes de partituras mergulho
Levado pelas sincrônicas sinfônicas,
Revolvendo as luzes da sonoridade
Marcadas pelas torturas do mito
Atordoado na imensidão do silêncio
Que expirou no enfado das loucuras
Embaladas aos delírios de seu grito:
Nota que escapa e perde-se,
Agora alimento de nuvem.
Escorrerá em sangue,
Apenas água.
-Surjo.
[�ndice]
NAGASHIMA E HIROSAKI
Eu sei, garoto.
Foram os ianques.
"Little Boy" matou mamãe.
Vá para casa, menino!
Vovó está com os cabelos em brasa.
Eu sei que você não sabe;
Mas saberá.
Não por minha boca
Ou nenhuma outra
As cinzas serão seu informante.
O sangue seu amante
Inseparável;
O grande azul é
O licor embriagado
Que vê as brancas
Estrelas da destruição
Expandindo seus núcleos de Hélio.
Catástrofe mitológica,
Criação ilógica,
Monstro de fogo e Plutônio
O avião virou herói
Encostado imponente na exposição
Esquecido foi o vulto nipônico,
Aquela mancha escura no chão.
[�ndice]
PÂNICO
...E nos olhos da noite esbugalhada,
Nas cores misturadas, filhas do alucínio
Vem o Pânico, senhor de sete caras
Deformadas, embargando o raciocínio.
A insustentável rispidez do irreal
Sentidos escancarados, arreganhados
Falta-lhe o chão, o teto
Falta-lhe a paz.
A agonia é o animal restante:
O prisioneiro fugitivo
Corroendo não o corpo,
Mas o além-alma.
Monstro mito-ilógico; inconsciente horror
Abjeto objeto não-concreto; abismo
Ação e re encadeadas explodem
Em devastador, terrificante torpor.
[�ndice]
ATO VOLITIVO
Quero ir, voltar, estar
Quero ser, continuar, re-ser
Transformar o que é em não-nada,
Revoltar, revolver, re-evoluir...
Destedificar.
Se viver é perigoso,
Quero ser o próprio risco.
A palavra não pronunciada;
O medo e seu sentido.
Quero amar, gozar, nascer...
Viajar em meu mundo e pensamento
Trafegar na estrada das minhas veias
Ser peregrino do mundo vivo dos caninos.
Mas é cada vez mais difícil,
Difícil empunhar a arma,
Arma de tão insuportável peso
Só quero dormir... nada mais.
[�ndice]
PAPIRO
Páginas pútridas, amareladas
Alimento de vorazes traças
Que dançam, mergulham na celulose.
O papel agoniza abandonado,
Debate-se solitário.
Será como é:
Vítima.
Não mais é o espelho d'alma
Abrigador dos sentimentos,
Seja mágoa outrora dor
Jamais a vida aculturada.
Ah, simples fatia branca
Para que divagar se útil ou não
Enquanto posso escrever,
Perfurar sua superfície?
A lágrima inunda o papel,
O instrumento umedecido
Não mais me serve;
Rasgo-o.
[�ndice]
DE-GRADAÇÃO
O alimento derradeiro
O desespero me afoga
Decepção tende ao infinito;
Sinto fome!
O sonho último,
O pesadelo me cerca:
Medo-mental-maníaco-subjetivo;
Sinto medo, muito medo!
O fluido polar atmosférico
Envolve meu ser,
Absorve minha térmica energia;
Sinto muito, muito frio!
A decadência me espera
O labirinto é o firmamento
Sou alma, apenas alma.
Sinto-me leve, muito leve.
O dia apresenta sua lâmina,
Calma eternidade,
Estou a caminho.
E já não sinto!
[�ndice]
MINHA PESSOA
Eis a urbana ainda verde
Pouco concreto por enquanto
Vai rompendo o virgem lacre.
Placenta esmeralda entre
Dez mil e tantos bolsões de miséria.
Terra vermelha: Parida em sangue
Mas criada na mata.
Com a dor na carteira de identidade
E um sopro de brisa na alma.
Querem degradar-te os escolhidos
Traidores acolhidos por teu carinho;
Somos todos culpados
Apesar de te amarmos demais
Que à eternidade dure,
Verde amiga verdadeira,
Essa paixão que nos embala
Que, da pena, a tinta fecunda.
[�ndice]
MONDO CARNE
Mentes podres sonham flores
Dores, fedores - um ano de saprofagia
Somos poetas, quem diria?
Abutres de ossos à procura
Das vastas, putrefatas carnes
Marcam a pilha de estrume
Que se espalha no fim da tarde.
Estrias expostas ao choque,
Secreções escorrem;
Câncer que corrói os órgãos
Droga da qual dependemos
Da existência a essência
O corpo faz o homem;
A carne sustentando a vida
E delineando o espírito.
A massa escarlate
Pulsa em explosões vitais
Gerando estranhas criaturas:
Mais que homens, menos que animais.
[�ndice]
CORROSÃO
Ígneos seres crepitam
No interminável fluxo
Sangüíneo dos rios
Ácidos, ácidos.
Cortes sangram fechados
E nunca cicatrizam.
Os rios secam,
E esqueço.
Ardência, coceira
Espremo os olhos
Altos decibéis que vibram
Os tímpanos degradam-se, pútridos
A unha do dedo da mão
Encrava até o pé -
A humilhação também enfinca
A alma à coluna cervical:
Escorre a linfa
E sofro, choro, morro.
[�ndice]
FRUSTRAÇÃO
É estar e não ser,
Tornar o potencialmente possível
Em niilismo absoluto;
Término do não-começado.
É conhecer o chão
Por dele ser vítima;
Ter a poeira como mãe
E o suor como visita.
É a falta de luz
Antes do fim da leitura.
O banho de lama;
O borrão no bom verso.
Vejo a luz no fim do túnel
Um piscar de olhos, não a vejo mais
Para onde seguir, escuridão
Ajoelho-me, choro.
[�ndice]
DOLÊNCIA
A cura da dor interna
É o corte da alma no tempo.
A fonte fluindo o farto
Dormir-se em sofrer lento.
Transcender limites em si
Bemol ou ré, num momento.
Tentar esperar sem enfado
A hora de realizar o intento.
Cada ferida é um soco na alma;
Que limites são esses que contemplo
Se todo passo do espírito
Arrasta a carne e os ossos ao vento?
Pútrida química do despertar supremo
Irrita-lhe as narinas, pobre moço
Tensos músculos deformam-lhe o rosto
Ao ingerir do destinado veneno.
[�ndice]
NADA MAIS
Shckabaraka bandoia
Margicabilica dummá
Yocabilitadeca zboya
Hicamandiqua shpirrá
-Nada mais.
Duomni sticstetu
Strakás, mihilea
Kwistchânz
Maháyi, Máhã iê, Mãháyia iê,
-Nada mais.
Abdu disse, Abdu lá:
Abababúúbabá-baba
Aê-Aê-Aê-Êêê
Cadêcu? Cadêcu?
Cumigu-guguguei
-Nada mais.
Cacaburundurara bada
Achetucabuli dudá
Eaicubila dulu
Etabulilulá minaminú
-Nada mais.
Afresgá putá ladá
Fumá tentá contá
Tentáino no paladá
Brado invistiladá.
Visticoladaficánonituracarpapr
-Nada mais.
Quenukaba numviromorto
Bacanestu cabareña lia
Esmagumuco damangabarina.
Nuncritiravil seulcabadapeiga.
-Nada mais.
Âpah,
Êpeh;
Ipih:
Ôpõh?
Upuh!
Straneakvracovaumultmiá...
-Nada mais.
Bimba, bimba, bimbôlo
Peidatáriotogamestra
Togapeida... peida, tário
Otário peida-dá... dá!
Mfede, Mfede, Mfede
(Sengoku, sengoku, bateuégôu)
-Nada mais.
Tiramaodaita damá
Dapramimdata pramitatu
Otudaonuqromaista da ca
Étaqn i tabom tambempratu
-Nada mais.
Ôôô de Hááá
Cotiplo amô deso
Iê iê iê
Sopratetê
-Nada mais.
Ahaeié-iê, só-tcháku
Mahá, mahá, mahá, máaah!
Uáhllaaahrr...
-Nada mais.
Kitucanticudizamenoia
Metotahip-hip... bebobebun
Pilombetada da ficumdéla
Scomaria lambrodaria
Da pratalaria bundía!
-Nada mais.
Caracala-cala... calacara
Caracalacaga, cagacara
Cagacala, cagacalacaga
Shhhbllurrrgh...
Glaugloug-gloug-gloug
(Glurugluruglu)
-Nada mais.
Etchagotaserena shao
Avediabocõnumda dá
Surubabubabo tirá
Numdadedadenum chuao
-Nada mais.
Deandráctilo
Deodiláctilo
Depitompáctilo
Depabláctilo
Dezeáctilo
Deiêpraocê!
-Nada mais!!!
[�ndice]
Copyright ©1994-2001, by Polidactilia