projecto museu do vidro

 

O VIDRO DE FARMÁCIA

 

Investigações arqueológicas empreendidas na década de 80 revelaram que a produção de vidros para botica e laboratório em Portugal já se efectuava no século XVIII, inicialmente na Real Fábrica de Coina (1719-1747). Durante as escavações encontraram-se fragmentos que demonstram ter-se aí fabricado almofarizes e boiões, bem como vidros para uso laboratorial, como tubos para barómetros e outros aparelhos de medida para usos químicos.

De facto, no século XVIII «o país podia produzir uma gama variada de vidros especiais para hospital, maternidade, farmácia e experiências de laboratório», como atestam os dois catálogos de vidro, os mais antigos conhecidos em Portugal, os quais, independentemente da sua origem (Coina ou Marinha Grande), revelam uma especialização neste género de produtos: para botica, almofarizes, com e sem mão, frascos para tabaco, garrafas octavadas e quadradas, peras, potes para pomada, boiões, ventosas, sanguissugueiros, etc.; para laboratório, garrafas para Solimão, retortas, bombas, alambiques, etc.; para higiene pesoal, mamadeiras, urinóis, bacios. Muitos destes objectos, com o tempo e a evolução da medicina e as transformações da cultura material, perderam naturalmente a sua função, sendo hoje objectos de museu.

«A variedade de produtos oferecida não correspondiam contudo à procura. Nos registos anuais das vendas as referências ao vidro de laboratório é limitada a poucas quantidades e menos qualidades. As vendas mais usuais ligavam-se aos vidros de uso pessoal (urinóis e mamadeiras), aos almofarizes, aos boiões e às ventosas. Estas, com a sua característica forma de bolbo, lisas ou caneladas em moldes arcaicos, mantiveram-se no mercado até finais da 1ª metade do séc. XX, o que é um documento insofismável da persistência de mentalidades médicas anteriores à era de Pasteur.

Se a procura do vidro de laboratório português era diminuta, a explicação talvez se encontre na preferência dada ao vidro estrangeiro, especialmente ao da Boémia.

Aliás, o fabrico de vidro de laboratório e de botica havia-se desenvolvido nos países que mais directamente contribuiram para o desenvolvimento das ciências da natureza e da medicina experimental. Já no séc. XVIII, o inglês Cristovão Hervet considerava que os vidros especiais para estas novas funções deviam muito aos alquimistas e experimentadores de sais e alcalis.

Em Portugal, o ramo destes artigos necessitou de um grande impulso no séc. XIX, depois da implantação do liberalismo. No oitocentos, a medicina e a farmacopeia têm entre nós um surto correspondente ao desenvolvimento da civilização. Por essa razão não é estranho que nos catálogos da Nacional e Nova Fábrica de Vidros, como o de 1901, os artigos de farmácia estivessem racionalmente organizados e com uma nomenclatura mais precisa».

Entre as várias categorias de artigos, os frascos, por exemplo, «destinam-se a produtos cujos nomes nos evocam uma era anterior às tendências da actual química: bandolina, água-forte, cela forte, opodeldoc, pílulas de Blancard, Kola, quina, ferro Quevenne, água de alcatrão...».

«Entretanto, outras unidades vidreiras começam também a dedicar-se a este novo ramo. Em primeiro lugar, deverá citar-se a fábrica das Gaivotas, em Lisboa. Na 2ª metade do século XIX e 1ª metade do século XX desenvolve-se uma gama de artigos de perfumaria e farmácia que se vulgarizaram pelos baixos preços».

«O boom vidreiro da Marinha Grande e de Oliveira de Azemeis no 1º quartel do século XX levou a que as especialidades não fossem segredo para ninguém. O mercado torna-se o principal motor do fabrico de vidros de farmácia e as tecnologias, ao evoluírem, permitem produzir em quantidade e depois em série. Só os objectos muito especiais continuam a ser laborados à mão. O aparecimento da Penicilina e da seringa acarreta o surgimento de novas variedades de frasquinhos e de tubos especiais, cuja lógica não podia estar presa à produção manual. A máquina aparece pois, nos ramos de grande consumo para obter índices nunca alcançados de produtividade».

 

Adaptação e extracção de excertos do texto da autoria do Prof. Jorge Custódio

«O vidro de farmácia», in Agenda do Farmacêutico, 1991

 

 

Projecto Museu do Vidro da Marinha Grande

 

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