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 A NARRATIVA NA LÍNGUA PORTUGUESA

ANTONIO OLINTO

Meus amigos, o meu assunto é um assunto que todos apreciam, é a narrativa, e vem, desde a narrativa oral do homem na caverna, até a narrativa da novela de hoje, na TV Globo. Nós narramos e narramos sempre. Então, começo dizendo que, no começo, era a palavra, mas, no começo, também era a narrativa. Tudo se narra, narra-se tudo. Narrativa é tempo e é espaço. Na realidade, a linguagem foi desenvolvida pela necessidade de narrar. O homem da caverna, quando saía na sua caça e voltava, ele queria contar aos seus companheiros o que tinha feito naquele dia, de que maneira o animal tinha fugido, de que maneira o tinha perseguido, de que maneira o tinha matado, e trazia ali a carne, que era o alimento de todos eles.

Ele não usava a palavra, evidentemente; usava gestos, usava sons, que ainda não eram uma linguagem, mas esses sons deram início à linguagem de hoje, esses sons fizeram a literatura oral. Aliás, é uma contradição dizermos "literatura oral", porque a literatura é letra, literatura não é literatura, – isto é, homem de letras – um jornal de letras – e é uma cultura de letras. Quando falamos em letras, falamos na escrita; quando falamos na linguagem oral, não é a escrita. E não pensem que a linguagem oral esteja liquidada, terminada.

Eu passei três anos na África, em missão diplomática e dando aulas. Em várias aldeias do interior da África Ocidental, fui descobrir uma profissão, nova há 10 mil ou 20 mil anos, e nova para eles ainda hoje, que era o historiador oral da aldeia. Como eles não têm escrita, o historiador guarda de cor toda a história da aldeia, desde a sua fundação, há 500 anos, com os reis que foram passando. Por quê? Ele foi decorando, cada um foi decorando a história de sua terra, para contar os momentos graves ou os momentos festivos da sua aldeia. E essa história, alguém da família, um jovem, já ia aprendendo para que, quando ficasse doente ou morresse o historiador oficial da terra, ele assumisse o lugar. Isto em 1964/65, quando eu morava na África.

Tenho certeza e tenho notícias de que em muitas dessas aldeias, Orió, Oxovô, bem longe da costa, o historiador oficial continua existindo. E foi uma grande alegria, quando fui rever uma pequena cidade chamada Uori, no delta do rio Niger, e o historiador – contando a história – aludiu a uma visita que eu tinha feito ao rei, três anos antes. Isso significa que eu já tinha entrado na história oficial da cidade de Uori. Tudo oral, nada escrito.

Mas, quando o homem aprendeu a letra, aprendeu a transformar aqueles sons, aqueles gritos, aquela emoção, em algo de escrito, ele atingiu a eternidade. Aí começa a eternidade, a imortalidade. Se dizem que nós da Academia somos imortais, talvez, esse título de imortalidade se deva ao fato de vivermos da escrita e da escrita ser imortal. Já diziam os latinos que verba volant scripta manent, as palavras voam, as escritas ficam. E a escrita continuou fazendo descrição e narração.

Vejam que a primeira das grandes obras de arte do mundo, que foi a Ilíada, e depois a Odisséia, eram narrativas puras, em versos, e de tal maneira essas duas narrativas foram fortes que, até hoje, tudo na vida está na Ilíada e na Odisséia. Por quê? A Ilíada é a aventura, a Odisséia é o regresso. Nós nascemos, às vezes, numa aldeia do interior do Brasil, em Minas ou São Paulo, e dali saímos para a grande aventura do mundo, viemos para aqui, vamos para o Rio, vamos para a Europa. Vencemos ou não, mas vamos lutar. E vencendo ou não, certas vezes, você quer regressar, como foi o regresso da Odisséia.

O regresso é sempre uma Odisséia, e se formos examinar todas as obras literárias, de todos os tempos, em todos os países elas estão ligadas, presas, ou à aventura ou ao regresso. O regresso, muitas vezes, não é tanto o regresso à terra, é o regresso a si mesmo, o regresso a um amor antigo, é um regresso à sua família, um regresso àquilo com que você sonhou, na sua infância e adolescência, e não conseguiu ter. Chega numa certa fase, você tem que voltar. Portanto, quando começou a escrita, quando Homero fez os seus dois poemas, ele marcou, para todo o sempre, esses dois momentos únicos do homem, o de sair ou ir embora, e o de voltar; o da aventura e o do regresso.

E é claro que a narrativa dos tempos antigos tinha que ficar ligada à religião. O grande livro da nossa civilização, que é a Bíblia, é um livro de narrativas. A cada instante, ensina, e foi até o Novo Testamento, quando Jesus Cristo, para ensinar, contava parábolas. É muito mais fácil ensinar, através de uma história, do que ensinar através de idéias abstratas.

A idéia abstrata já exige um certo estágio, a idéia abstrata exige até um certo conhecimento, ou formal ou natural, da Filosofia. Já a história não; na história, você vê o exemplo, na história vê-se uma realidade, na história você vê o outro, o próximo. Você vê, dentro da história, de que maneira o homem age e reage. É por isso que a narrativa de Adão no Paraíso é uma grande história, até hoje. E as outras histórias da Bíblia se formos colecioná-las todas, vejam que maravilhas de histórias! O livro de Jó! Haverá algo mais belo do que O livro de Jó? É uma história. Uma história também parecida com a de Homero, que é a da queda, a da decadência e da ressurreição, e da volta e da recuperação.

E assim veremos em todas as histórias, mas não só na Bíblia: no Mahabhárata, no Kalévala, que foi, digamos, o livro clássico da Finlândia, em todos os livros teutônicos, da mitologia teutônica. Não sei se sabem que mythos, em grego, quer dizer lenda; então, quando pegamos os mitos, que são as lendas, nós narramos, nós contamos.

*

Passemos agora à língua portuguesa e à narrativa em nossa língua. O primeiro grande livro da língua portuguesa, que foi Os Lusíadas, é a narração das singraduras de Vasco da Gama, saindo de Portugal até a Índia. Foi uma das grandes aventuras do mundo, se examinarmos o trajeto da Odisséia – de Tróia até a Grécia que, hoje, se pode fazer a remo, tão próxima é uma da outra. Se formos examinar sair naqueles ovinhos chamados "caravelas", frágeis, de Lisboa, percorrer todo o Atlântico, atravessar o Cabo do Cão, agora da Boa Esperança, passar por Moçambique, ir até Calicute, vejam que, aí sim, foi uma façanha heróica! E o português só conseguiu fazer isso por causa de uma universidade; ele teve uma universidade, que foi a Escola de Sagres.

O que fez essa universidade? Inventou o computador? Inventou a caravela. O que era a caravela? Era um navio que tinha um cadastro, um leme de cadastro e forte, e uma vela latina, de tamanho especial. Os navios que estavam no Mediterrâneo, encontravam um mar tranqüilo, fácil, um mar mediterrâneo (no meio das terras). Eram navios que podiam singrar com toda a facilidade, porém, quando esses navios chegavam ao Atlântico, eram afundados. O Atlântico exigia uma nova tecnologia. E Henrique, o Navegador e seus alunos e seus professores descobriram e inventaram a tecnologia da época, o computador da época.

Então, saíram os portugueses pelo mundo, e os espanhóis atrás, e todos eles atrás, com a sua caravela, com o seu instrumento. E Camões foi o único dos grandes poetas que viveram aquilo que escreveram. Homero não participou da Guerra de Tróia, ele soube da Guerra de Tróia. Virgílio não participou da viagem de Enéias, quando escreveu a Eneida, e ele a descreveu. Camões, não. Ele pegou o navio e foi para a Índia; da Índia, foi parar em Macau, isto é, ele viveu cada um daqueles momentos e conheceu o mar, o grande mar. O que ele escreve sobre o grande mar antecede, de muitos séculos, o que escreveu o grande poeta brasileiro do mar, que foi Vicente de Carvalho. Para se ver que, entre os dois, a gente sente a força do mar, que os outros poetas raramente compreendem, porque não andaram nele, não andaram por ele e não o dominaram.

Relendo Camões, nos dias de hoje, nós vemos de que maneira ele concebeu aquela narrativa em língua portuguesa, mas antes dele, qual foi o grande homem que narrou bem o Brasil? Chamou-se Pero Vaz de Caminha. A releitura, hoje, da Carta de Pero Vaz (a gente deve escrever com C maiúsculo, é A Carta), com as descrições dos acontecimentos, a narração da presença dos portugueses em Porto Seguro e em toda aquela região da Bahia, é de uma beleza vocabular, beleza de estilo. É uma descrição, é uma narrativa que você vai acompanhando, visualmente, como se Pero Vaz estivesse com uma câmera, filmando.

Gostaria de ler, inclusive, o trecho modelar, em que ele faz uma descrição narrativa, ao relatar um folguedo dos portugueses com os índios. "E além do rio, andavam muitos deles dançando e folgando (é um belo verbo este), uns diante dos outros, sem se tomarem pelas mãos, e faziam-no bem. Passou-se, então, para a outra banda do rio, Diogo Dias, que fora almoxarife de Sacavém, com o qual é homem gracioso e de prazer. E levou consigo um gaiteiro nosso, com a sua gaita, e meteu-se a dançar com eles, tomando-os pelas mãos (o português dançava de mão-em-mão, o índio, não) e eles folgavam e riam e andavam com ele, muito bem, ao som da gaita".

Nós estamos vendo a cena, está acontecendo ali, agora. Nós estamos vendo os índios, que estavam dançando as suas danças típicas; o português vai com a sua gaita e com o seu gaiteiro, e toca a gaita e começa a dançar, segurando-lhe as mãos, e eles entram naquela dança portuguesa, marcando o início de uma civilização no Brasil. A dança e a música são a base da civilização, são as coisas do ouvido, antes da palavra, até da melodia, e antes de qualquer coisa, o movimento do corpo que constitui a dança.

Vejam, então, o estilo narrativo de Pero Vaz de Caminha; da primeira palavra à última palavra, é não só a nossa certidão de nascimento, mas, também, o primeiro documento decisivo da língua portuguesa no Brasil. Foi aí que a língua portuguesa tomou conta do Brasil. Antes que todos viessem, antes que viessem as Capitanias Hereditárias, antes que viessem os governadores, aquela língua falada por aqueles portugueses e aquela língua escrita por aquele escriba, escrivão, escritor ficou, para todo o sempre, conosco.

Daí para a frente, temos uma série de narrativas em língua portuguesa, sempre mutável, sempre mutante. Temos Vieira, português, que chegou ao Brasil com seis anos, inteiramente brasileiro. Vieira era barroco, então, escrevia barrocamente, e vejam, num sermão que ele pregou na Capela Real de Lisboa, no ano de 1655, há precisamente trezentos e quarenta e quatro anos, ele começa a falar dos ministros. É um bom assunto, em qualquer lugar e qualquer época.

Aí, ele diz: "Quando fazem os ministros o que fazem? (É uma pergunta). E quando fazem o que devem fazer? Quando respondem? Quando deferem? Quando despacham? Quando ouvem? Que até para uma audiência, são necessários muitos quandos. Se fazer-se hoje, o que se pudera fazer ontem, se fazer-se amanhã, o que se devera fazer hoje, é matéria em meio de tantos escrúpulos e de danos, muitas vezes irremediáveis. Aqueles quandos são dilatados, aqueles quandos tão desatendidos."

Então, diz Vieira: "Antigamente, na República hebréia, e em muitas outras Repúblicas, os tribunais e os ministros ficavam às portas das cidades. Ali estavam os ministros, para atender aos que chegavam com problemas e demandas. Vinha o lavrador, vinha o soldado, vinha o estrangeiro com a sua demanda, com a sua pretensão, com o seu requerimento, e sem entrar na cidade, voltava respondido, no mesmo dia, para a sua casa".
Aí, Vieira termina: "Antigamente, estavam os ministros às portas das cidades, hoje, estão as cidades às portas dos ministros". Se formos traduzir isso para hoje - Brasil, 1999, entrando no século XXI e no Terceiro Milênio - , não mudou nada. Isto é, a segunda alternativa, de que nós é que vamos a eles, e não chegamos jamais a eles, a não ser em casos muito especiais.

Ele escreve isso naquele estilo do orador, do pregador de sermões e do homem que cobrava as coisas dos reis, cobrava as coisas do papa. Ele foi a Roma e fez sermões em italiano, em português; foi à Holanda e fez sermões; e debateu com o Grande Rabino sobre qual era a melhor ética, a judaica ou a cristã, e os dois concordaram muito bem, que ambas eram boas. Essa foi uma discussão entre Vieira e acho que Geri, em Israel, o rabino Geri, antes de ele ir para Roma, no próprio ano de 1655.

*

Mas vejamos que a língua portuguesa, no Brasil, continuou muito ligada à poesia. Nós tivemos Gregório de Matos, tivemos Caramuru, que era uma descrição, tivemos Uraguai na realidade, Uraguai, fazendo outra descrição. E aqueles versos continuaram nos nossos ouvidos: "Tanto era bela no seu rosto a morte..." e vários outros versos de descrição mostrando a terra, mostrando a gente, até chegarmos, de fato, à Independência, porque a ficção brasileira só pôde surgir depois da Independência.

Eu lhes confesso que prefiro a ficção à História. A ficção tem uma verdade, que a História não tem. Quando voltei da África, depois de três anos de trabalho, escrevi um livro factual, chamado Brasileiros na África, contando a história dos ex-escravos que tinham regressado à África, falando português, cantando Bumba-meu-boi, católicos, isto é, com toda uma cultura brasileira. Eles trouxeram a cultura deles e levaram a nossa cultura para a África. Isso que eu tinha visto lá, escrevi. Aí, pensei: - Ninguém vai dar atenção, porque é a verdade. Se eu transformar isso num romance, vou chegar à verdade da ficção. E a verdade da ficção fixa-se nas pessoas.

Portanto, escrevi. Se o outro livro saiu em português, e ficou por isso mesmo, o segundo que fiz, contando a história em ficção, A casa da água, saiu em dezenove idiomas. Por isso é que acredito que, de fato, a ficção nos revela. E se chegamos a nosso começo do romance, para, então, ler que: "Era no tempo do rei...", quando Manuel Antônio de Almeida começa a contar a história de Leonardo, e com aquela definição, já se sabia que era D. João VI, não havia outro rei no Brasil, não tinha havido outro rei no Brasil, era ele. Então, "Era no tempo do rei." Era no tempo do rei. Ponto. Com cinco palavras, o autor definiu o tempo.

E Machado de Assis, o que fazia? "O ano foi de 1868, mês: abril." Ponto. E aí, ele começava a história. Ele situava as coisas no ano, no tempo, e às vezes, no lugar, dentro daquele princípio de que tudo é tempo ou espaço. Não há nada fora do tempo ou do espaço, a não ser a imaginação; essa pode vencer tempo e espaço. E daí? Um romântico dirá, a não ser o amor, que também vence o tempo e o espaço. Concordo. Vá lá, vá lá que seja possível, e que haja outras emoções que possamos ter para vencer tempo e espaço.

Mas tempo e espaço estão aí, por isso que Proust se transformou no grande romancista do nosso século. Ele saiu em busca do tempo perdido e, ao mesmo tempo em que saiu em busca do tempo perdido, ele estava num espaço muito concreto, que era aquele espaço francês; e depois da derrota de 1870, entrou na Belle Époque, que durou até 1914; entrou naquele período de paz, em que a França deu um salto em tudo: na literatura, na música, na pintura. E no meio daquilo, estava Proust olhando, vendo e tentando aprender, tentando interpretar e tentando lembrar a sua infância, tentando recapturar o seu tempo.

Entretanto não é só a memória do meu tempo, do seu tempo, do tempo dele ou dela; é a memória do tempo de todos. Isso é a história de um país. A história de um país é a memória desse país. Nós da Academia Brasileira de Letras - e sobre isso o nosso presidente, o educador e escritor Arnaldo Niskier, insiste sempre - temos que manter, permanentemente, a memória da Academia e dos acadêmicos, e através deles, a memória do Brasil.

Ouso dizer até que a memória brasileira passa pela Academia Brasileira de Letras, de tal modo nos preocupamos com isto. Nós nos preocupamos, permanentemente. De tudo aquilo que já passou, temos que dar testemunho, temos que ler, temos que reler, temos que falar e discutir. Até discutir contra ou a favor mas temos que discutir, porque, assim, se guarda uma memória. Um povo sem memória está morto e não sabe. Porque não possui nem memória, para saber que está morto. No nosso caso, não. Nós precisamos manter a nossa memória. Vivê-las, então, depois...

De Vieira selecionei aqui, por exemplo, alguns textos de descrição e, ao mesmo tempo, de narração, em que vemos a que ponto chegou aquele estranho homem que dá o nome à nossa Academia, que dá o nome à literatura brasileira, que é, foi e ainda é Machado de Assis. Por exemplo, no final de Quincas Borba, depois de Quincas e Rubião, quando o personagem está realmente louco, Machado de Assis termina com o seguinte trecho de narrativa que é um dos pontos altos da narrativa brasileira:

"Poucos dias depois, morreu. Não morreu súbito, nem vencido. Antes de principiar a agonia que foi curta, pôs a coroa na cabeça - uma coroa que não era sequer ao menos um chapéu velho ou uma bacia, onde os espectadores palpassem a ilusão. Não, senhor, ele pegou em nada, levantou nada e cingiu nada. Só ele via a insígnia imperial, pesada de ouro, rútila de brilhantes e outras pedras preciosas."

"O esforço que fizera para erguer meio corpo não durou muito; o corpo caiu outra vez, o rosto conservou, porventura, uma expressão gloriosa: - Guardem a minha coroa, murmurou - Ao vencedor, as batatas. A cara ficou séria, porque a morte é séria. Dois minutos de agonia, um trejeito horrível e estava assinada a abdicação."

Isto é a grande descrição de um grande romancista, que termina o seu romance com essas poucas linhas, e nessas poucas linhas, você vê a culminância daquele personagem, que havia passado por tantas desventuras até morrer.

Estamos, agora, comemorando o centenário de Dom Casmurro. O livro foi escrito há, precisamente, cem anos, e não sei se, na época, todos se deram conta da importância daquele romance. Era o terceiro de um tríptico, não era uma trilogia. Era um tríptico: Memórias póstumas de Brás Cubas, em 1889; depois, Quincas Borba, em 1890; e Dom Casmurro, em 1899. Em Dom Casmurro, Machado de Assis lançou, de fato, um romance que conquistou o mundo inteiro. Estudando o quê? Um dos sentimentos básicos do homem, que é o ciúme. O ciúme é, realmente básico; lá, bem no fundo, encontramos o ciúme em tudo. Na Bíblia, encontramos o ciúme de David; em toda parte, encontramos o ciúme. E Othelo é o sinônimo do ciúme, o grande personagem de Shakespeare, refazendo, mostrando o que é o crime.

Foi em Dom Casmurro, quando Bentinho começou a desconfiar que o filho não era dele, que o filho de Capitu era de Escobar, o amigo que tinha morrido. Quando ele chegou a dizer ao filho, que o chamava: - Meu pai, meu pai. - Nesse momento dramático da ficção brasileira, ele responde: - Eu não sou seu pai. - E Capitu ouve. E nessa noite foi ao teatro e representava-se justamente Othelo - "Que eu não vira, nunca (diz o personagem), sabia apenas o assunto e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mour,o por causa de um lenço, um simples lenço."

E aqui dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou para acender os ciúmes de Othelo, e compor a mais sublime tragédia deste mundo. "Os lenços perderam-se, hoje, são necessários os próprios lençóis. Alguma vez, nem lençóis há, e valem só as camisas, tais eram as idéias que me iam passando pela cabeça, vagas e turvas, à medida que o mouro rolava convulso e Iago destilava a sua calúnia".

Vejam esse trecho, que é decisivo no romance, mas do qual ninguém se lembra muito, porque, nesse minuto, Bentinho havia pensado em tudo; primeiro, em se matar, com veneno; depois ele matava o filho; e aí pensou em matar Desdêmona, isto é, Capitu. Pensou nas três mortes, e como bom brasileiro, optou por nenhuma. É preciso ver isso, também: o personagem é um brasileiro.

Ele, então, fez a pior das vinganças, a pior. Mandou a mulher embora para a Europa, ele tinha dinheiro, mandou o filho, continuou vivendo a sua vida. Foi à Europa várias vezes, não procurou a mulher, e quando o filho vem visitá-lo, já homem, ele olha para o filho e vê o amigo Escobar. E o filho começa a falar, do mesmo modo como o amigo Escobar falava. Bentinho janta com um amigo e diz: "... e ele comia com a cabeça abaixada, exatamente, como o outro".

Assim vemos que o ciúme continuou, continuou, continuou, e dezenas de anos depois, quando o menino já era grande, e ele vê o filho - tem a plena certeza de que o filho não era dele. Aí, eu conto uma história, que já narrei várias vezes, em conferências e discursos, e que assisti, uma vez, na Universidade de Nova York, história relativa ao julgamento de Capitu.

O professor William Grossman, que era um machadiano, especialista em toda a obra de Machado, telefonou um dia e disse assim: - Queria que você viesse aqui, porque vou promover um julgamento de Capitu. - Julgamento? - É, os alunos todos leram o livro e vamos ter um corpo de jurados, promotor, advogado de defesa (aliás, era uma advogada), e então, quero que você assista.

Lá fui eu, não ia perder uma coisa dessas, não é? Uma Universidade americana fazendo o julgamento de Capitu. E, realmente, foi muito bom, porque, pessoalmente, mostrou que todos tinham lido bastante. E esses incidentes que eu citei do Othelo, que ele foi ver naquela noite e brigou com ela, todos foram citados pelo advogado de defesa, pelo promotor.

Sabem qual foi o resultado? Capitu foi absolvida! Até hoje, eu acho que, perguntei: - Mas foi...? - Foi absolvida, ela ganhou, os jurados resolveram. - E qual foi o argumento da advogada de defesa? - Não há um minuto, um segundo, uma palavra, em que Machado diga que ela traiu o marido. É tudo na cabeça do Bentinho. Está tudo com o personagem Bentinho e seus ciúmes.

É a grande façanha da narrativa brasileira, porque ele narra aquilo desde o começo, desde o tempo de crianças, Capitu e Bentinho, crianças, morando vizinhos, e aquele amor de criança, e ele vai para o seminário, e sai do seminário e casa-se com ela, e continua aquilo tudo. E ele vai descrevendo aquilo de tal maneira, que - não diz! Ele está inteiramente de fora, é como se dissesse: - Vocês leitores, que julguem, eu não sei se ela traiu. - Quer dizer, nem ele sabia se ela tinha traído ou não.

A semelhança do menino com Escobar, isso pode acontecer muito, de semelhanças que não são de famílias. Afinal, os moldes do rosto humano não são tão grandes assim. Quantas vezes já vimos uma pessoa e pensamos: é Fulano. Mas não era. Era uma outra. De modo que a absolvição de Capitu não me espantou. Foi mais uma lição que aprendi na vida, porque, até aquele instante, eu estava certo de que ela tinha traído. Talvez, por ser homem, a gente julgue sempre que a mulher está traindo. Mas não.

Aí, passei a admitir que, realmente, aqueles alunos americanos tinham dado, pelo menos, uma demonstração de que tanto podia ser, de um lado, como podia ser, do outro. Eles escolheram o lado mais gentil à Capitu. Vejam, então, aí como é que a descrição da nossa ficção, do nosso romance, chegou em Machado de Assis a um ápice, e um ápice diferente, porque ele, de certa maneira, esgotou, dentro da ficção brasileira, essa linha. E daí nós tivemos que dar um salto até bem depois, até Mário de Andrade, com Macunaíma; até Rachel de Queiroz, com O Quinze e João Miguel; até Jorge Amado, com os Capitães de areia etc.

Tivemos que dar um salto para, depois da Semana de 22, um interregno, surgisse o extraordinário, genial, mas diferente, Lima Barreto – Lima Barreto o sucedeu, publicou seu primeiro livro em 1909, um ano depois da morte de Machado. Era como se ele tivesse apanhado o facho, o fogo da literatura brasileira, para levá-lo até a Semana de Arte Moderna. Ele morreu em 1922, quer dizer, ele existiu, literariamente, de 1909 a 1922. Em 1922, mudou tudo. Aí veio a Semana de Arte Moderna, e tudo passou a ser diferente. Nesse período, tivemos o grande Lima Barreto.

Depois disso, fomos mudando cabalmente, porque passamos a conhecer um Brasil do interior, que estava mais ou menos longe da nossa ficção. Passamos a conhecer o João Miguel de Rachel, passamos a conhecer um José Lins do Rego e todo aquele interior da Paraíba. Passamos a conhecer o Graciliano Ramos, do interior de Alagoas. Viemos descendo. Portanto, quando faço conferências no exterior, principalmente nos Estados Unidos, dependuro o mapa do Brasil, e vamos do Amazonas ao Rio Grande de Sul, e digo: - No Amazonas, temos Daládio Jurandir, nascido na Ilha de Marajó, romancista que escreveu Marajó, Belém do Grão-Pará etc. etc. Depois vamos ao Maranhão; no Maranhão, pegamos desde Aluísio de Azevedo até Josué Montello. No Ceará, pegamos a Rachel.

E vamos de Estado a Estado, mostrando, inclusive, como a ficção revela o país. Mostrando a cana-de-açúcar, em todos os romances de José Lins do Rego. Mostrando o cacau, em todos os romances de Jorge Amado. Mostrando o gado do interior do Brasil, nas aventuras dos romances de Guimarães Rosa. E vamos até o Rio Grande do Sul com Érico Veríssimo, mostrando, por inteiro, o Rio Grande do Sul, durante cinqüenta anos de História. O romance mapeia o Brasil. E quando surgiu Bernardo Ellis, com o seu livro O Tronco, eu o li e disse: - Afinal, Goiás; podemos demonstrar mais um mapa na literatura brasileira, o mapa de Goiás, que estava ali vivo, no romance de Bernardo Ellis.

É curioso, também, observar que todos os produtos estão na ficção brasileira: o cacau, a cana e o gado. O café não está. O café, que se transformou no mais importante produto brasileiro, não entrou na nossa ficção com essa força; houve um Café, mas foi uma ópera, feita pelo Mário de Andrade, era uma história para dali se fazer a música, então, não foi uma obra em si. Houve O café, do Luiz Martins, mas que é, muito mais, a história da venda de café em Santos, de São Paulo para Santos, do que sobre a produção de café. No futuro, alguém ainda pegará o café, como um grande assunto de romance. O ouro, nós temos, temos o romance do ouro, mas não temos ainda o do café.

E nessa distribuição toda, chegamos a Guimarães Rosa. Era um estranho homem, em sua relação com a língua portuguesa. Pode parecer que ele saiu da língua portuguesa. Não. Ele voltou. Porque, num exame detido do estilo dele, vamos encontrar palavras do tempo de Camões, que havíamos esquecido. Como eu, que uma vez cheguei a Cordisburgo, a terra de Guimarães Rosa, e vi uma gaiola muito bonita. Comentei com o vendeiro: – Mas que gaiola bonita!– Ele me disse: – Fui eu que engenhei. - Existe esse verbo, mas ninguém o usa, embora se usasse naquele tempo. Foi ele quem "engenhou", foi ele quem inventou e fez, é obra dele.

E Guimarães Rosa também usa muito essa palavra: "engenhar". É um estilo como esse, de pontos, é quase que aquele do caboclo, mas não é bem o caboclo, é o "geralista". Existe essa palavra: é o homem das "gerais". Certa vez, eu estava observando um pássaro, em Cordisburgo, e indaguei a alguém: - Que pássaro é este? - O senhor está vendo aquele homem de barba, lá? - Disse: - Estou. - Vai perguntar a ele, ele é geralista. - Isso significava uma profissão, era uma especialidade, o homem conhecia tudo sobre "as gerais". Conhecia os rios, a paisagem, os bichos e os pássaros.

Então, o geralista diz, no Grandes Sertões:Veredas: "O senhor vê.(ponto) Contei tudo.(ponto) Agora estou aqui, quase barranqueiro.(ponto) Para a velhice vou, com ordem e trabalho.(ponto) Sei de mim?(travessão) - Cumpro. (ponto)".

Esse "cumpro" também é um negócio bem antigo, daquele interior de Minas. Não é a Minas nem do ouro, nem a Minas do café. É a Minas do sertão. Por isso que é Grande Sertão:Veredas. "Está tudo dito. Cumpro. Fiz o que devia. Faço e não me arrependo". Vale dizer, engloba uma porção de coisas: cumpro. "O rio São Francisco que, de tão grande se comparece – parece é um pau grosso em pé enorme... Amável, o senhor me ouviu, minha idéia confirmou: que o diabo não existe.(ponto) Pois não?(interrogação) O senhor é um homem soberano circunspecto.(ponto) Amigos somos.(ponto) Nonada.(ponto) E diabo não há!(exclamação) É o que eu digo, se for...(reticências) Existe é homem humano.(ponto) Travessia.(ponto)"

A palavra "travessia" existe no romance dele, quase do começo ao fim, às vezes, solta. Tem uma frase que diz: "A travessia é perigosa. É sempre. A travessia de uma rua, a travessia da vida. A travessia de um oceano. Qualquer coisa que se faça é uma travessia", e esse é o sentido que ele dá em todo o livro. A travessia. Passando de Guimarães Rosa para um Jorge Amado pouco conhecido, encontramos Jorge Amado, falando de si mesmo, no começo de um romance, que é Tocaia Grande. Ele diz: – "Digo não, quando dizem sim, em coro uníssono. Quero descobrir e revelar a face obscura, aquela que foi varrida dos compêndios de História, por infame e degradante. Quero descer ao renegado começo, sentir a consistência do barro amassado com lama e sangue; capaz de enfrentar e superar a violência, a ambição, a mesquinhez, as leis do homem civilizado. Quero contar do amor impuro, quando ainda não se erguera um altar para a virtude. Digo não, quando dizem sim. Não tenho outro compromisso".

É uma declaração de princípios do romancista, que não está ali para agradar a ninguém. Não está ali para agradar aos poderosos. Quando dizem que as personagens (mulheres) de Jorge Amado são quase todas prostitutas, é porque, de fato, ele via, naquela classe perseguida, as mulheres mal vistas, sob todos os aspectos, e as defendera.

Presenciei, uma vez, uma coisa muito bonita. Um grupo de prostitutas do Rio resolveu fazer uma espécie de Sindicato ou Sociedade, e a presidente delas, na hora do discurso, pediu a presença de Jorge Amado, e disse: - Jorge Amado é o nosso patrono. - E, realmente, é. Ele ficou muito honrado e veio da Bahia (ele agora não está bem de saúde), mas ele veio da Bahia e foi ao Rio, para se encontrar com a presidente do sindicato das prostitutas.

Depois, em Salvador, fizemos um seminário sobre a obra de Jorge Amado; foi quando Gabriela fez trinta anos. Gabriela foi de 58, portanto, aí já foi em 88. Esse seminário foi muito bom; compareceu o Moacyr Scliar, do Sul, morando lá, mas baiano; compareceu o Jorge Medanur; também minha mulher, Zora, ali falou. E foi ela a presidente das prostitutas, que melhor discursou sobre a obra de Jorge Amado, foi a que mais aplausos teve. Não só porque falou bem, mas porque nós todos estávamos preocupados com a parte estética, a parte literária, a descrição - e ela, não. Ela queria falar da vida, daquilo que Jorge Amado dizia da vida que ela tivera, porque, naquele instante, ela já não era mais prostituta. Presidente do Sindicato, com a presença de Jorge Amado, e os jornais fazendo entrevistas, naturalmente, ela saiu daquela vida, e passou a ter um outro tipo diferente de vida. Mas a presença dela no Seminário foi, realmente, uma beleza! Ela falando sobre os romances do Jorge Amado, em relação a si mesma e às companheiras dela.

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Vou terminar com o grande nome do romance brasileiro, que foi Clarice Lispector. Nascida na Ucrânia, Clarice veio para o Brasil com dois meses de idade. Usou a língua portuguesa de um modo tão diferente, e ao mesmo tempo, tão forte, tão expressivo, tão claro, tão aberto, tão obscuro, ao mesmo tempo, significando coisas que as palavras não significavam, dando outro significado à palavra que significava aquilo que parecia significar de fato, por quê? Porque ela buscava uma outra realidade, uma realidade interior, dentro de todos os livros dela, desde o começo, desde Perto do coração selvagem, que é obra de 1944, quando tinha 24 anos (ela nasceu em 1920).

E vejam coisas curiosas. Rachel de Queiroz, publicou, com 19 anos, O Quinze. Logo depois, em 1920 ou 1921, publicou João Miguel. O começo é espetacular. No começo de João Miguel, ela mostrando o momento em que foi esfaqueado, em que o assassino fica olhando o homem estrebuchando e morrendo na frente dele, isso não é de uma menina de 21 anos. É uma coisa por dentro, pois, de fato, ela é uma grande romancista.

E a nossa Clarice Lispector, anos depois, repetiu isso, de modo diferente. Uma era aquela cearense de fazenda do interior, "cabra macho", "cabra da peste", gente que matava e gente que morria. Já Clarice era a européia, criada no Recife e em Alagoas. Ela morou em Alagoas até os cinco anos, foi para o Recife e, aos 12 anos, veio para o Rio de Janeiro, então, uma brasileira que tinha lido Joyce. Perto do coração selvagem é uma frase de Joyce, ela pegou a frase de Joyce e colocou. Portanto, foi um tipo diferente de romancista. Não era a romancista que beijava a terra, que punha a mão na terra, que esfregava a terra na mão. Não. Esfregava pensamento, esfregava emoção. Ela vendia pura emoção.

Clarice Lispector tem a história de uma moça, uma moça que vai feliz na vida, no casamento, vai feliz com o seu homem, e que passa o dia na cama, e não sai da cama, e bebe na cama, e não acontece nada e acontece tudo. Ela está ali, vivendo toda aquela situação, como se ela própria tivesse vivenciado momentos assim. Sabem que ela morreu jovem, relativamente; morreu com 57 anos, em 1977. Nós da Academia estamos acostumados a ter 80 anos, ou mais de 80, ou então, ter 102, como o nosso querido Barbosa Lima Sobrinho, que está com 102 anos. A propósito, uma comunicação aos presentes: eu fiz 80 anos, este ano, de modo que estou, inteiramente, dentro da imortalidade.

Clarice, com 24 anos, escreveu esta coisa que não é nada, é assim: "A máquina do papai batia tac-tac-tac-tac-tac; o guarda roupa dizia o quê? roupa, roupa, roupa. Entre o relógio, a máquina e o silêncio havia uma borboleta grande, cor-de-rosa e morta. Os seres todos estavam ligados pela luz do dia e pelo ranger das folhinhas na árvore, que se esfregavam umas nas outras radiantes". Quer dizer, até essa idéia de "se esfregar radiante."

Ela tem um outro texto, que diz assim (um filho dizendo para a mãe): "Mamãe, eu vi um filhote de tufão ali, pertinho daquela árvore, mas era um filhote tão fraquinho, que ele só movimentava umas poucas folhas". Quer dizer, é outro tipo de coisa, que ela inventava, não é?
"Encostando a testa na vidraça brilhante e fria, olhava para o quintal do vizinho, para o grande mundo das galinhas, que não sabiam que iam morrer, e devia se sentir, como se estivesse bem próxima de seu nariz, a terra quente socada, tão cheirosa e seca, onde bem sabia, bem sabia, uma ou outra minhoca se espreguiçava, antes de ser comida pela galinha, que as pessoas iam comer. Houve um momento grande, parado, sem nada dentro ("um momento sem nada dentro" é um negócio bem de Clarice). Dilatou os olhos, esperou, nada veio - branco, mas, de repente, num estremecimento, deram corda no dia e tudo recomeçou a funcionar; a máquina trotando, o cigarro do pai fumegando, o silêncio assumia, os frangos pelados, a claridade, as coisas revivendo, cheias de pressa, como uma chaleira a ferver. Só faltava o tic lento do relógio, que enfeitava tanto. Fechou os olhos para escutá-lo e, ao som da música inexistente, ritmada, ergueu-se na ponta dos pés, deu três passos de dança bem leves, alados."

Esse é o início de Perto do coração selvagem e é a história de uma jovem, como ela mesma era, começando a conhecer a vida, e a entrar em contato com os movimentos, com as coisas, com as folhas, com tudo aquilo que nos cerca em nosso dia-a-dia.

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O Brasil tem, certamente, uma literatura que o revela, que o mostra, tanto na sua poesia, como no seu romance e na sua ficção. Estamos todos lá. Estamos todos em Macunaíma, estamos todos dentro de Gabriela, estamos todos dentro do ciclo da cana-de-açúcar, estamos todos dentro daquela Angústia de Graciliano Ramos. Estamos todos nos poemas de Jorge de Lima. Estamos todos nos poemas de Lêdo Ivo, que aqui está. Quer dizer, eles nos representam, o romance é o que nós somos. Só somos isso. E somos isso em quê? Em língua portuguesa. Porque pensamos em português, sonhamos em português. Toda a nossa constituição está na palavra. No começo, era a palavra, claro, e no começo era, também, a narrativa. E essa narrativa e essa palavra nos acompanham, a cada instante. Mesmo quando fazem maus discursos e prometem coisas que não vão cumprir, eles, os políticos, falam em português, a gente entende, e é bom até que os entenda para depois cobrar, que os entenda para não acreditar, que os entenda para fazer votos de que tudo seja verdade. No romance, na descrição, nas narrativas, nos poemas, estamos nós, inteiros, de corpo, alma, sangue, sexo, tudo. Está tudo lá.

OCUPANTE DA CADEIRA NÚMERO 8 ( ABL )

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