A destruição dos Mura
Brasil Indígena - 500 anos de Resistência

 
Os índios Mura, verdadeiros ciganos aquáticos, cujas habitações no inverno eram as canoas e, no verão, pequenas palhoças nas praias, tinham seu habitat na região do baixo Purus. Percorriam o emaranhado de canais que desemboca ao longo do rio Solimões e do Madeira. Foram eles que mais se destacaram entre os grupos tribais, pelo fato de evitar contato com a civilização branca e rechaçar qualquer tentativa de invasão de seus territórios. A rejeição nascera de um profundo ódio contra tudo que limitasse sua liberdade: resgates, descimentos, aldeamentos e missões.
Francisco X. Ribeiro Sampaio colecionava documentos que levassem a opinião pública a um consenso: a destruição total dos índios Mura. Argumentando que faziam emboscadas, impedindo assim a comunicação, a colonização e o comércio, chegou à conclusão de que se devia destruir esta nação, que “por sua natureza conserva cruel e irreconciliável inimizade com todas as demais nações (...), que professa por instinto de pirataria, grassando por todos os lugares de público trânsito em que deve haver maior segurança (...), que nas suas guerras e assaltos usa a mais bárbara tirania, não perdoando mesmo aos mortos, em que cometem inenarráveis crueldades, esfolando e rompendo cadáveres (...)”.

Desde aquela época, os índios Mura adotaram um novo sistema de combate, atacando por guerrilhas (...). Embora fossem massacrados, não desistiam da luta.

Um autor anônimo conta que no sítio de Guatazes uma divisão desta tropa [portuguesa] surpreendera uma maloca às 6 horas da tarde, “fazendo-lhe uma linha de cerco por água e terra. Os homens, rompendo a linha, fugiram. As mulheres com suas crianças e todos os rapazes e meninas lançaram-se à água querendo ganhar uma ilha fronteira em tempo, onde estavam as canoas (...) morrendo todos afogados, em número de trezentos ou mais”.

H. J. Wilkens, o autor do poema “Muhraida – Conversão e Reconciliação do Gentio Muhra”, escrito na vila de Ega em 1789, logo após a “rendição incondicional”, exaltou euforicamente o genocídio dos índios Mura.

Wilkens alega ter sido Deus que permitiu que Mathias Fernandes buscasse meios de os atrair, infundindo-lhes sentimentos de confiança e desejo de se comunicar com as povoações de Ega, Alvarães e Arvellos. Dentro de pouco tempo, os Mura foram batizados pelo frei José de Santa Teresa Neves, na localidade de Nogueira, e o próprio comandante Mantel teve a honra de ser padrinho de todos.

Uma vez aldeados  e levados à civilização, os Mura tinham o dever civil de colaborar no extermínio de outras nações, como era o caso dos Mundurucu e Juma, recebendo, para essa finalidade, armas de fogo.

A revogação do Diretório Pombalino, a abolição da escravidão indígena e a declaração da liberdade total do nativo pouco mudaram seu destino: escravo ou livre, servia de mão-de-obra no sistema econômico colonial.

KROEMER, Gunter. Cuxiuara, o Purus dos indígenas. São Paulo, Loyola. 1985. p.37-41.
 



Brasil Indígena: 500 anos de resistência / Benedito Prezia, Eduardo Hoomaert. - São Paulo: FTD, 2000.
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