CAPÍTULO 1

(Chove torrencialmente na cidade. Estamos no Rio de Janeiro em 1971. Uma casa é vista de longe e podemos perceber que alguém olha na janela contemplando a chuva. A câmera aproxima lentamente e logo dois olhos infantís são percebidos no lado de dentro da casa. Trata-se de um menino de dez anos que parece hipnotizado com o que vê).

FADE

CLÍNICA PSIQUIATRICA

(Um casal está diante do PSIQUIATRA que examina alguns laudos)

MARIDO
Por favor, Doutor... Viemos aqui pra saber dos resultados...

(A MULHER parece apreensiva. Muito tensa e de certa forma é tranquilizada pelo marido)


PSIQUIATRA
Vamos por partes. Ele teve uma grande melhora. Se levarmos em conta que entrou aqui em crise. Praticamente surtando... Mas alguns cuidados precisam ser tomados...

MULHER
Quais doutor? Por favor, fale logo!!!

PSIQUIATRA
Ele sofre de um desvio comportamental muito perigoso. Ou seja. Não sabe lidar bem com determinados desafios. Acha que a melhor forma de vencê-los é simplesmente se livrar do que o aborrece.

MARIDO
Por isso ele fica violento?

PSIQUIATRA
Exatamente. Vocês vão precisar cuidar muito bem dele. Muita atenção, dedicação. E principalmente, observação.

MULHER
O senhor não imagina o que aconteceu da última vez...

PSIQUIATRA
Eu posso imaginar...

MARIDO
Ele já puxou a faca pra mim, doutor.

PSIQUIATRA
O senhor me contou...

MULHER
E pelo trabalho que fizeram aqui? Ele está curado, Doutor?

PSIQUIATRA
Só o tempo dirá. Eu sei que parece uma resposta vaga demais mas sabemos que muitos destes comportamentos podem ficar adormecidos numa pessoa até algo disparar novamente todos aqueles processos. É por isso que eu peço a vocês. Tratem este menino com carinho e muito amor. No momento é o que de fato ele precisa..

(Os olhos da MULHER estão cheios de lágrimas)

CORREDOR DA CLÍNICA

(A ASSISTENTE SOCIAL está com o menino PEDRO PAULO nas mãos. Ele é o mesmo que estava na janela olhando a chuva. Permanece ali com um olhar penetrante. O mesmo olhar que contemplava a chuva na janela.. O casal caminha até ele que apenas olha para os dois. O MARIDO se agacha diante dele).

MARIDO (pai de PEDRO PAULO)
Vamos pra casa, filho...

(Após dar um abraço apertado nele, os três caminham para fora da clínica sobre os olhares preocupados do PSIQUIATRA que observa tudo).

FADE

(Estamos em 1987. Uma MENINA de treze anos usando uniforme de escola conversa com suas coleguinhas na saída . Parece não perceber que uma estranha mulher a observa de longe. Uma de suas amigas chama a atençào dela . Aquela ESTRANHA MULHER faz sinal para que a MENINA se aproxime. Receosa, ela vai. A MULHER entrega um envelope para ela. Só as duas ouvem o diálogo. Após entregar o envelope, a MULHER vai embora. A MENINA fica olhando para aquilo espantada.

BANHEIRO DA ESCOLA

(A MENINA lê a carta e a cada linha parece expressar perplexidade. Fica confusa com o que acabou de ler. Logo está se debulhando em lágrimas. Chora compulsivamente enquanto suas lágrimas molham as linhas da carta).

FADE

RESIDÊNCIA DE GUSTAVO SARMENTO

(Já estamos em 2001. O dia está ensolarado e tomando banho de sol, temos DEBORAH, sua amiga NANA e a outra amiga SUZY que acabara de dar um mergulho)

NANA
E aí? Animada pra festa?

DEBORAH
Animada, eu? Desde quando eu sou animada pra festa?

NANA
Mas até agora você não me explicou direito porque essa festa. Pelo que me consta não é aniversário de ninguém

DEBORAH (Rindo)
Você não tá sabendo?

NANA
Sabendo do que?

DÉBORAH
O Breno tá de namoradinha nova!!!

NANA
Não me diga!!!

(SUZY se aproxima perplexa)

SUZY
Como é que é?

DEBORAH
Pois é... Voltou de Mato Grosso com essa novidade. Trouxe a garota a tira-colo...

SUZY
Não acredito, Déborah. O gato do teu irmão não faria isso comigo...

DEBORAH
Quem mandou não dar o bote...

NANA
A Suzy ainda tem muito que aprender sobre os homens...

DEBORAH
Deixa ela...

NANA
Olha a Déborah, por exemplo. Agarrou o contabilista com unhas e dentes...

DEBORAH
Não é bem assim, Nana... Existe amor entre a gente...

NANA
Claro... Mas se você der bobeira...

DEBORAH
Como assim?

NANA
Ele é homem, né? E com todo respeito, amiga. É bonitão...

DEBORAH (tranquila)
O Pedro Paulo não... Duvido...Eu conheço o homem que eu tenho... Boto a mão no fogo por ele...

(NANA e SUZY apenas se olham)

MOTEL

(Em seu interior, um HOMEM abotoa sua camisa. Trata-se de PEDRO PAULO, já com seus 40 anos. Na cama, está GILMARA que logo saberemos quem é).

GILMARA
Pra que a pressa?

PEDRO PAULO
Ficou maluca? Não liguei ainda pra Déborah. Desde ontém sem contato...

GILMARA
E daí? Ela vai mandar a polícia atrás de você?

PEDRO PAULO
Sem deboches tá?

GILMARA
As vezes essa tua coisa com a Déborah me irrita!!!

PEDRO PAULO
Você sabia que tinha que ser assim. Desde o começo. Não fui em quem começou alimentando......

GILMARA
Não falei isso...

PEDRO PAULO
Devia estar preocupada com o teu marido... Onde ele pensa que você está?

GILMARA
Garanto que a cabeça dele neste momento está todinha pros negócios...

PEDRO PAULO
As vezes... Eu penso em dar um tempo nisso tudo...

GILMARA
Você não tá falando sério...

PEDRO PAULO
Você vê sentido nisso? A gente aqui... Logo eu serei praticamente seu genro...

GILMARA
Vejo... vejo sim... Eu me apaixonei por você...

PEDRO PAULO
Eu sei... E enquanto não me teve não sossegou...

GILMARA
Você pensa que é fácil né? Conviver com aquele velhote maluco e obcecado!!!

PEDRO PAULO
Talvez seja esse o preço a pagar quando se dá o golpe do baú...



(ELE pega a roupa dela e atira na cama)

PEDRO PAULO
Coloca a tua roupa. Tá mais do que na hora...

(GILMARA a contra gosto se levanta e se troca no banheiro. PEDRO PAULO aproveita para fumar um cigarro).

EM FRENTE AO CASARÃO DE GUSTAVO SARMENTO – Ext/Noite

(O carro de PEDRO PAULO pára em frente. ELE está em companhia de DÉBORAH).

DEBORAH
E Então? Animado pra festinha do Breno, amanhã...

PEDRO PAULO (Cara de pouco caso)
Olha bem pra mim...

DEBORAH
Pára com isso, vai... É só você se portar com cordialidade... Eu também não curto esse tipo de coisa. Mas sabe como é meu pai. Faz tudo pelo bem estar dos filhos...

PEDRO PAULO
E não é isso que eu tento fazer o tempo todo? Buscar o seu bem estar?

DEBORAH
Agora eu não entendí...

PEDRO PAULO
Você tá cansada de saber o que o seu pai pensa sobre a nossa relação...

(DÉBORAH apaixonada, tenta silenciá-lo com um beijo. ELE acaba retribuindo).

(Na janela que dá para o quarto de GILMARA, é possível para ELA observar tudo. O que ela faz com uma expressão revoltada. Na cama, está GUSTAVO SARMENTO, um homem bem mais velho que ela mas que parece bem disposto. ELE está acabando de tomar uma pílula).

GUSTAVO
Até quando vai ficar na janela vigiando a Déborah?

GILMARA
Ah, não me enche. Pelo amor de Deus!!!

GUSTAVO
Eu tive um dia exaustivo hoje no escritório. Chego em casa. Quero a minha mulher do meu lado e não tenho...

GILMARA ( Se aproximando do marido)
Desculpa... Eu tô nervosa...

GUSTAVO
Com o que?

GILMARA
Ah, sei lá... Amanhã o jardim vai estar cheio de gente...

GUSTAVO
E daí? Você sempre gostou de festas...

GILMARA
Voc6e não se preocupa com a relaçào do Breno com essa menina?

GUSTAVO
Agora você tá falando como se fosse mãe dele...

GILMARA
De certa forma, eu sou. Quando eu me casei com você eles eram meninos...

GUSTAVO
Eu sei... E você uma garota linda e adorável!!!

(Quando ELE vai beijá-la, mais uma vez ELA se afasta e vai para a janela. Vê que no carro, PEDRO PAULO e DÉBORAH ainda se beijam)

GILMARA
Mas que tanto se beijam aqueles dois...

GUSTAVO
Pára com isso, Gilmara. Deixa eles em paz... Vem pra cama... vem...

( É visivel o quanto GILMARA parece sofrer vendo aquela cena diante de seus olhos).

FADE

JARDIM DO CASARÃO – Ext/Dia

(O Clima é realmente de festa. Pessoas de todos os tipos na beira da piscina e nos arredores. Bebendo, uns conversando, paquerando. Garçons circulando pelo local e servindo os convidados. Mais adiante bem reservado, está PEDRO PAULO com um copo de whisk na mão. DÉBORAH se aproxima dele com um salgadinho para colocar em sua boca. ELE aceita)

PEDRO PAULO
Seu pai convidou a socialite toda, HEIM...

DEBORAH
E você não sabe como ele é...

PEDRO PAULO
E seu irmão que não chega com a caça dotes...

DEBORAH
Pra que essa amargura toda?

PEDRO PAULO
Desculpa... Foi uma brincadeira infeliz...

DEBORAH
A Gilmara acordou hoje toda nervosa...

PEDRO PAULO
E por quê?

DEBORAH
Sei lá... Diz ela que é por causa da organização da festa...

PEDRO PAULO
Vai ver foi seu pai enchendo o saco dela...

DEBORAH
Falando nisso, você nem cumprimentou ele ainda...

PEDRO PAULO
Me dá um tempo, tá bom?

DÉBORAH
Pedro, é sério. Pra voc6e pode não representar muito, mas pra ele representa...

PEDRO PAULO
Sabe qual é o problema do seu pai? Se achar Deus...

DEBORAH
Vamos mudar de assunto... A Nana tá chegando aí...

PEDRO PAULO
E ainda mais essa!!!

(DEBORAH faz sinal pra NANA que se aproxima)

NANA
Oi, gente. Tá animado aqui...

PEDRO PAULO
Pra quem gosta...

NANA
Ah, Pedro Paulo... Tudo bem?

PEDRO PAULO
Vai se indo...

NANA
Cadê teu irmão?

DEBORAH
Ainda não chegou. E cadê a Suzy?

NANA
Tentei carregar ela pra cá de todo jeito. Não quis... parece que se decepcionou mesmo...

DEBORAH
Deixa ela, depois esquece...

(Mais adiante, GUSTAVO conversa com um HOMEM de sua idade que parece ser um empresário. GILMARA está sentada a mesa sozinha. Aproveita para observar PEDRO PAULO que acaba também olhando pra ela. ELE percebe que GILMARA quer lhe falar algo).

PEDRO PAULO
Sua madrasta parece precisar de alguma coisa...

DEBORAH
Se incomoda de ver o que ela quer?

PEDRO PAULO
Claro que não... Fica aí que eu já volto.

(ELE caminha e aproveita para se aproximar)

PEDRO PAULO
Tá aí sózinha, deslocada...

GILMARA
Meu marido parece que encontrou companhia melhor...

(ELE olha e avista GUSTAVO com o AMIGO).

PEDRO PAULO
E você? Por que não fica do lado dele?

GILMARA
Não disfarça não...

PEDRO PAULO
Do que voc6e tá falando?

GILMARA
Precisa ficar agarrando ela debaixo da minha janela?

PEDRO PAULO
Ah, é isso?

GILMARA
Eu não dormi a noite toda com isso engasgado...

PEDRO PAULO
Seria te pedir muito pra você ver se eu tô lá na esquina?

(E dizendo isso ele caminha de volta para DEBORAH deixando GILMARA ainda mais possessa).

DEBORAH
E aí?

PEDRO PAULO
Tá chateada porque seu pai não tá dando atenção pra ela...

DEBORAH
As vezes eu sinto pena da Gilmara. Mais jovem que meu pai. Sabe que eu já me perguntei se ela não tem outra pessoa?

PEDRO PAULO
Isso não é problema nosso...

DEBORAH
É... Tem razão...

(ELA pula no pescoço dele e voltam a se beijar. GILMARA olha tudo com ódio. Logo, DEBORAH percebe que BRENO chegou).

DEBORAH
Finalmente ele chegou...

(ELA se solta de PEDRO PAULO que com puro desdém dá as costas e parece nem querer saber de BRENO e da namorada. BRENO já está abraçando GUSTAVO).

GUSTAVO
Meu filho!!! Quantas saudades!!! Não via o dia da sua volta!!!

BRENO
Eu também, pai. Tava cheio de saudades!!! Esta aquí é a Nanda... A minha namorada...

(FERNANDA é uma bela mulher, olhos cor de mel, cabelos longos, sedutora por natureza. GUSTAVO beija a sua mão).

GUSTAVO
Seja bem vinda a esta casa.

FERNANDA
É um prazer conhecer o senhor...

(DÉBORAH se aproxima e abraça o irmão com ternura).

BRENO
Minha irmã... Que saudades!!! Deixa eu te apresentar a Nanda...

DEBORAH
Olá... Nossa!!! Como ela é bonita, Breno!!!

FERNANDA
Brigada. Voce também é...

(As duas se cumprimentam com beijinhos).

BRENO
E o cunhadão?

DEBORAH
Tá lá no cantinho dele...

BRENO
Como sempre, na dele. Reservadão...

DEBORAH
Vamos até lá...

(ELES se aproximam de PEDRO PAULO que se serve com mais whisk. Logo sente DEBORAH tocá-lo. Se vira e se depara com BRENO abraçado a FERNANDA. Ao olhar para ELA, sente algo estranho em seu corpo).

DEBORAH
Olha quem está aqui, Pedro...

BRENO
E Aí, cunhado?

PEDRO PAULO
Oi...

DEBORAH
Essa é a Fernanda. A tão esperada namorada do Breno...

(Os dois se olham de forma diferente, PEDRO PAULO sente uma atraçào instantânea por FERNANDA enquanto estende a mão para ela. FERNANDA parece também Ter sentido algo enquanto se cumprimentam. Um clima de sedução surge no ar).

ESCRITO POR:
Marco Souza
&
Tina Welch

Hosted by www.Geocities.ws

1