Mario
de Miranda Quintana nasceu na cidade de Alegrete (RS), no dia 30 de julho
de 1906, quarto filho de Celso de Oliveira Quintana, farmacêutico,
e de D. Virgínia de Miranda Quintana. Com 7 anos, auxiliado pelos
pais, aprende a ler tendo como cartilha o jornal Correio do Povo.
Seus pais ensinam-lhe, também, rudimentos de francês.
No
ano de 1914 inicia seus estudos na Escola Elementar Mista de Dona Mimi
Contino.
Em
1915, ainda em Alegrete, freqüentou pela a escola do mestre
português Antônio Cabral Beirão, onde conclui o curso
primário. Nessa época trabalhou na farmácia
da família. Foi matriculado no Colégio Militar de Porto Alegre,
em regime de internato, no ano de 1919. Começa a produzir
seus primeiros trabalhos, que são publicados na revista Hyloea,
órgão da Sociedade Cívica e Literária dos alunos
do Colégio.
Por
motivos de saúde, em 1924 deixa o Colégio Militar. Emprega-se
na Livraria do Globo, onde trabalha por três meses com Mansueto
Bernardi. A Livraria era uma editora de renome nacional.
No
ano seguinte, 1925, retorna a Alegrete e passa a trabalhar na farmácia
de seu pai. No ano seguinte sua mãe falece. Seu conto, A
Sétima Personagem, é premiado em concurso promovido pelo
jornal Diário de Notícias, de Porto Alegre.
O
pai de Quintana falece em 1927. A revista Para Todos, do Rio
de Janeiro, publica um poema de sua autoria, por iniciativa do cronista
Álvaro Moreyra, diretor da citada publicação.
Em
1929, começa a trabalhar na redação do diário
O Estado do Rio Grande, que era dirigida por Raul Pilla. No ano
seguinte a Revista do Globo e o Correio do Povo publicam
seus poemas.
Vem,
em 1930, por seis meses, para o Rio de Janeiro, entusiasmado com
a revolução liderada por Getúlio Vargas, também
gaúcho, como voluntário do Sétimo Batalhão
de Caçadores de Porto Alegre.
Volta
a Porto Alegre, em 1931, e à redação de O Estado
do Rio Grande.
O
ano de 1934 marca a primeira publicação de uma tradução
de sua autoria: Palavras e Sangue, de Giovanni Papini. Começa
a traduzir para a Editora Globo obras de diversos escritores estrangeiros:
Fred Marsyat, Charles Morgan, Rosamond Lehman, Lin Yutang, Proust, Voltaire,
Virginia Woolf, Papini, Maupassant, dentre outros. O poeta deu uma imensa
colaboração para que obras como o denso Em Busca do Tempo
Perdido, do francês Marcel Proust, fossem lidas pelos brasileiros
que não dominavam a língua francesa.
Retorna
à Livraria do Globo, onde trabalha sob a direção de
Erico Veríssimo, em 1936.
Em
1939, Monteiro Lobato lê doze quartetos de Quintana na revista lbirapuitan,
de Alegrete, e escreve-lhe encomendando um livro. Com o título Espelho
Mágico o livro vem a ser publicado em 1951, pela Editora Globo.
A
primeira edição de seu livro A Rua dos Cataventos,
é lançada em 1940 pela Editora Globo. Obtém
ótima repercussão e seus sonetos passam a figurar em livros
escolares e antologias.
Em
1943, começa a publicar o Do Caderno H, espaço diário
na Revista Província de São Pedro.
Canções,
seu segundo livro de poemas, é lançado em 1946 pela Editora
Globo. O livro traz ilustrações de Noêmia.
Lança,
em 1948, Sapato Florido, poesia e prosa, também editado
pela Globo. Nesse mesmo ano é publicado O Batalhão de
Letras, pela mesma editora.
Seu
quinto livro, O Aprendiz de Feiticeiro, versos, de 1950, é
uma modesta plaquete que, no entanto, obtém grande repercussão
nos meios literários. Foi publicado pela Editora Fronteira, de Porto
Alegre.
Em
1951 é publicado, pela Editora Globo, o livro Espelho Mágico,
uma coleção de quartetos, que trazia na orelha comentários
de Monteiro Lobato.
Com
seu ingresso no Correio do Povo, em 1953, reinicia a publicação
de sua coluna diária Do Caderno H (até 1967). Publica,
também, Inéditos e Esparsos, pela Editora Cadernos do
Extremo Sul - Alegrete (RS).
Em
1962, sob o título Poesias, reúne em um só volume
seus livros A Rua dos Cataventos, Canções, Sapato Florido,
Espelho Mágico e O Aprendiz de Feiticeiro, tendo a primeira
edição, pela Globo, sido patrocinada pela Secretaria de Educação
e Cultura do Rio Grande do Sul.
Com
60 poemas inéditos, organizada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos,
é publicada sua Antologia Poética, em 1966, pela Editora
do Autor - Rio de Janeiro. Lançada para comemorar seus 60 anos,
em 25 de agosto o poeta é saudado na Academia Brasileira de
Letras por Augusto Meyer e Manuel Bandeira, que recita o seguinte poema,
de sua autoria, em homenagem a Quintana:
Meu Quintana, os teus cantares
Não são, Quintana, cantares:
São, Quintana, quintanares.Quinta-essência de cantares...
Insólitos, singulares...
Cantares? Não! Quintanares!Quer livres, quer regulares,
Abrem sempre os teus cantares
Como flor de quintanares.São cantigas sem esgares.
Onde as lágrimas são mares
De amor, os teus quintanares.São feitos esses cantares
De um tudo-nada: ao falares,
Luzem estrelas luares.São para dizer em bares
Como em mansões seculares
Quintana, os teus quintanares.Sim, em bares, onde os pares
Se beijam sem que repares
Que são casais exemplares.E quer no pudor dos lares.
Quer no horror dos lupanares.
Cheiram sempre os teus cantaresAo ar dos melhores ares,
Pois são simples, invulgares.
Quintana, os teus quintanares.Por isso peço não pares,
Quintana, nos teus cantares...
Perdão! digo quintanares.
A Antologia
Poética recebe em dezembro daquele ano o Prêmio Fernando
Chinaglia, por ter sido considerado o melhor livro do ano. Recebe inúmeras
homenagens pelos seus 60 anos, inclusive crônica de autoria de Paulo
Mendes Campos publicada na revista Manchete no dia 30 de julho.
Preso
à sua querida Porto Alegre, mesmo assim Quintana fez excelentes
amigos entre os grandes intelectuais da época. Seus trabalhos
eram elogiados por Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de
Morais, Cecília Meireles e João Cabral de Melo Neto, além
de Manuel Bandeira. O fato de não ter ocupado uma vaga na
Academia Brasileira de Letras só fez aguçar seu conhecido
humor e sarcasmo. Perdida a terceira indicação para
aquele sodalício, compôs o conhecido Poeminha do Contra
Todos esses que aí estão
atravancando meu caminho,
eles passarão...
eu passarinho!
A Câmara
de Vereadores da capital do Rio Grande do Sul — Porto Alegre — concede-lhe
o título de Cidadão Honorário, em 1967. Passa
a publicar Do Caderno H no Caderno de Sábado do Correio
do Povo (até 1980).
Em
1968, Quintana é homenageado pela Prefeitura de Alegrete com
placa de bronze na praça principal da cidade, onde estão
palavras do poeta: "Um engano em bronze, um engano eterno". Falece
seu irmão Milton, o mais velho.
1973.
Nesse ano o poeta e prosador lançou, pela Editora Globo — Coleção
Sagitário — o livro Do Caderno H. Nele estão seus
pensamentos sobre poesia e literatura, escritos desde os anos 40, selecionados
pelo autor.
Em
1975 publica o poema infanto-juvenil Pé de Pilão,
co-edição do Instituto Estadual do Livro com a Editora Garatuja,
com introdução de Erico Veríssimo. Obtém
extraordinária acolhida pelas crianças.
Quintanares
é impresso em 1976, em edição especial, para ser distribuído
aos clientes da empresa de publicidade e propaganda MPM. Por ocasião
de seus 70 anos, o poeta é alvo de excepcionais homenagens. O Governo
do Estado concede-lhe a medalha do Negrinho do Pastoreio — o mais
alto galardão estadual. É lançado o seu livro de poemas
Apontamentos de História Sobrenatural, pelo Instituto Estadual
do Livro e Editora Globo.
A
Vaca e o Hipógrifo, segunda seleção de
crônicas, é publicado em 1977 pela Editora Garatuja.
O autor recebe o Prêmio Pen Club de Poesia Brasileira, pelo
seu livro Apontamentos de História Sobrenatural.
Em
1978 falece, aos 83 anos, sua irmã D. Marieta Quintana Leães.
Realiza-se o lançamento de Prosa & Verso, antologia para didática,
pela Editora Globo. Publica Chew me up slowly, tradução
Do Caderno H por Maria da Glória Bordini e Diane Grosklaus
para a Editora Globo e Riocell (indústria de papel).
Na
Volta da Esquina, coletânea de crônicas que constitui o quarto
volume da Coleção RBS, é lançado em 1979, Editora
Globo. Objetos Perdidos y Otros Poemas é publicado
em Buenos Aires, tradução de Estela dos Santos e organização
de Santiago Kovadloff.
Seu
novo livro de poemas é publicado pela L&PM Editores - Porto
Alegre, em 1980: Esconderijos do Tempo. Recebe, no dia 17
de julho, o Prêmio Machado de Assis conferido pela Academia Brasileira
de Letras pelo conjunto de sua obra. Participa, com Cecília Meireles,
Henrique Lisboa e Vinicius de Moraes, do sexto volume da coleção
didática Para Gostar de Ler, Editora Ática.
Em
1981, participa da Jornada de Literatura Sul Rio-Grandense, uma iniciativa
da Universidade de Passo Fundo e Delegacia da Educação do
Rio Grande do Sul. Recebe de quase 200 crianças botões
de rosa e cravos, em homenagem que lhe é prestada, juntamente com
Josué Guimarães e Deonísio da Silva, pela Câmara
de Indústria, Comércio, Agropecuária e Serviços
daquela cidade. No Caderno Letras & Livros do Correio do Povo,
reinicia a publicação Do Caderno H. Nova Antologia
Poética é publicada pela Editora Codecri - Rio de Janeiro.
O
autor recebe o título de Doutor Honoris Causa, concedido
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no dia 29 de outubro de
1982.
É
publicado, em 1983, o IV volume da coleção Os Melhores
Poemas, que homenageia Mario Quintana, uma seleção de
Fausto Cunha para a Global Editora - São Paulo. Na III Festa
Nacional do disco, em Canela (RS), é lançado um álbum
duplo: Antologia Poética de Mario Quintana, pela gravadora
Polygram. Publicação de Lili Inventa o Mundo,
Editora Mercado Aberto - Porto Alegre, seleção de Mery
Weiss de textos publicado em Letras & Livros e outros livros do autor.
Por aprovação unânime da Assembléia Legislativa
do Estado do Rio Grande do Sul, o prédio do antigo Hotel Magestic
(onde o autor viveu por muitos e muitos anos), tombado como patrimônio
histórico do Estado em 1982, passa a denominar-se Casa de Cultura
Mario Quintana.
Em
1984 ocorrem os lançamentos de Nariz de Vidro, seleção
de textos de Mery Weiss, Editora Moderna - São Paulo, e O Sapo
Amarelo, Editora Mercado Aberto - Porto Alegre.
O
álbum Quintana dos 8 aos 80 é publicado em 1985, fazendo
parte do Relatório da Diretoria da empresa SAMRIG, com texto analítico
e pesquisa de Tânia Franco Carvalhal, fotos de Liane Neves e ilustrações
de Liana Timm.
Ao
completar 80 anos, em 1986, é publicada a coletânea 80 Anos
de Poesia, organizada por Tânia Carvalhal, Editora Globo. Recebe
o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade do Vale
dos Sinos (UNISINOS) e pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul (PUCRS). Lança Baú de Espantos,
pela Editora Globo, uma reunião de 99 poemas inéditos.
Em
1987, são publicados Da Preguiça como Método de
Trabalho, Editora Globo, uma coletânea de crônicas publicadas
em Do Caderno H, e Preparativos de Viagem, também
pela Globo, reflexões do poeta sobre o mundo.
Porta
Giratória, pela Editora Globo - Rio de Janeiro, é lançada
em 1988, uma reunião de crônicas sobre o cotidiano, o tempo,
a infância e a morte.
Em
1989 ocorre o lançamento de A Cor do Invisível pela
Editora Globo - Rio de Janeiro. Recebe o título de Doutor
Honoris Causa pela Universidade de Campinas (UNICAMP) e pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É eleito o Príncipe
dos Poetas Brasileiros, entre escritores de todo o Brasil.
Velório
sem Defunto, poemas inéditos, é lançado pela Mercado
Aberto em 1990.
Em
1992, a editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) reedita,
em comemoração aos 50 anos de sua primeira publicação,
A Rua dos Cataventos.
Poemas
inéditos são publicados no primeiro número da Revista
Poesia Sempre, da Fundação Biblioteca Nacional/Departamento
Nacional do Livro, em 1993. Integra a antologia bilíngüe
Marco Sul/Sur - Poesia, publicada Editora Tchê!, que reúne
a poesia de brasileiros, uruguaios e argentinos. Seu texto Lili Inventa
o Mundo montado para o teatro infantil, por Dilmar Messias. Treze de
seus poemas são musicados pelo maestro Gil de Rocca Sales, para
o recital de canto Coral Quintanares - apresentado pela Madrigal
de Porto Alegre no dia 30 de julho (seu aniversário) na Casa de
Cultura Mario Quintana.
Alguns
de seus textos são publicados na revista literária Liberté
- editada em Montreal, Quebec, Canadá - que dedicou seu 211º
número à literatura brasileira (junto com Assis Brasil e
Moacyr Scliar), em 1994. Publicação de Sapato Furado, pela
editora FTD - antologia de poemas e prosas poéticas, infanto - juvenil.
Publicação pelo IEL, de Cantando o Imaginário do
Poeta, espetáculo musical apresentado no Teatro Bruno Kiefer
pelo Coral da Casa de Cultura Mario Quintana, constituído de poemas
musicados pelo maestro Adroaldo Cauduro, regente do mesmo Coral.
Falece,
em Porto Alegre, no dia 5 de maio de 1994, próximo de seus 87 anos,
o poeta e escritor Mario Quintana.
Escreveu
Quintana: Amigos não consultem os relógios quando um dia
me for de vossas vidas... Porque o tempo é uma invenção
da morte: não o conhece a vida - a verdadeira - em que basta um
momento de poesia para nos dar a eternidade inteira.
E,
brincando com a morte: "A morte é a libertação total:
a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos".
Bibliografia:- Em português:
- A Rua dos Cataventos (1940)
- Canções (1946)
- Sapato Florido (1948)
- O Batalhão de Letras (1948)
- O Aprendiz de Feiticeiro (1950)
- Espelho Mágico (1951)
- Inéditos e Esparsos (1953)
- Do Caderno H (1973)
- Pé de Pilão (1975) - literatura infanto-juvenil
- Apontamentos de História Sobrenatural (1976)
- Quintanares (1976) - edição especial para a MPM Propaganda.
- A Vaca e o Hipogrifo (1977)
- Na Volta da Esquina (1979)
- Esconderijos do Tempo (1980)
- Lili Inventa o Mundo (1983)
- Nariz de Vidro (1984)
- O Sapo Amarelo (1984) - literatura infanto-juvenil
- 80 Anos de Poesia (1985)
- Da Preguiça como Método de Trabalho (1987)
- Preparativos de Viagem (1987)
- Porta Giratória (1988)
- A Cor do Invisível (1989)
- Velório sem Defunto (1990)
- A Rua dos Cataventos (1992) - reedição comemorativa aos 50 anos da
primeira publicação.
- Sapato Furado (1994)- Em espanhol:
- Objetos Perdidos y Otros Poemas (1979)
- Em inglês:
- Chew me up slowly (1978)
Antologias:
- Poesias (1962)
- Antologia Poética (1966)
- Prosa e Verso (1978)
- Nova Antologia Poética (1981)Discos:
- Antologia Poética de Mario Quintana - Gravadora Polygram (1983)
Música:
- Recital Canto Coral Quintanares (1993) - treze poemas musicados pelo
maestro Gil de Rocca Sales.
- Cantando o Imaginário do Poeta (1994) - Coral Casa de Mario Quintana - poemas musicados pelo maestro Adroaldo Cauduro.Teatro:
- Lili Inventa o Mundo (1993) - montagem de Dilmar Messias.
Sobre o autor:
- Quintana dos 8 aos 80 (1985)
Dados obtidos em livros do e sobre o autor e páginas na Internet, em especial a da Casa de Cultura Mario Quintana/Suzana Kanter.
®
@njo
13-02-2001
Arnaldo
Nogueira Jr.
www.releituras.com/maqui_ntan.htm
Espelho
Por acaso, surpreendo-me no espelho:
Quem é esse que me olha e é tão mais velho que eu? (...)
Parece meu velho pai - que já morreu! (...)
Nosso olhar duro interroga
"O que fizeste de mim?" Eu pai? Tu é que me invadiste.
Lentamente, ruga a ruga... Que importa!
Eu sou ainda aquele mesmo menino teimoso de sempre
E os teus planos enfim lá se foram por terra,
Mas sei que vi, um dia - a longa, a inútil guerra!
Sorrir nesses cansados olhos um orgulho triste..."
estiver disposto e dar, mas você receberá em troca.
O Mapa
Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...(E nem que fosse o meu corpo!)
Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...Há tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, deliciosoQue faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)E talvez de meu repouso...
Poema da Gare de Astapovo
O velho Leon Tolstoi fugiu de casa aos oitenta anos
E foi morrer na gare de Astapovo!
Com certeza sentou-se a um velho banco,
Um desses velhos bancos lustrosos pelo uso
Que existem em todas as estacoezinhas pobres do mundo
Contra uma parede nua...
Sentou-se ...e sorriu amargamente
Pensando que
Em toda a sua vida
Apenas restava de seu a Gloria,
Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas
Coloridas
Nas mãos esclerosadas de um caduco!
E então a Morte,
Ao vê-lo tão sozinho aquela hora
Na estação deserta,
Julgou que ele estivesse ali a sua espera,
Quando apenas sentara para descansar um pouco!
A morte chegou na sua antiga locomotiva
(Ela sempre chega pontualmente na hora incerta...)
Mas talvez não pensou em nada disso, o grande Velho,
E quem sabe se ate não morreu feliz: ele fugiu...
Ele fugiu de casa...
Ele fugiu de casa aos oitenta anos de idade...
Não são todos que realizam os velhos sonhos da infância!
Quem sabe um dia
Quem sabe um dia
Quem sabe um seremos
Quem sabe um viveremos
Quem sabe um morreremos!Quem é que
Quem é macho
Quem é fêmea
Quem é humano, apenas!Sabe amar
Sabe de mim e de si
Sabe de nós
Sabe ser um!Um dia
Um mês
Um ano
Um(a) vida!Sentir primeiro, pensar depois
Perdoar primeiro, julgar depoisAmar primeiro, educar depois
Esquecer primeiro, aprender depoisLibertar primeiro, ensinar depois
Alimentar primeiro, cantar depoisPossuir primeiro, contemplar depois
Agir primeiro, julgar depoisNavegar primeiro, aportar depois
Viver primeiro, morrer depoisDa Inquieta Esperança
Bem sabes Tu, Senhor, que o bem melhor é aquele
Que não passa, talvez, de um desejo ilusório.
Nunca me dê o Céu... quero é sonhar com ele
Na inquietação feliz do Purgatório.
Dos Milagres
O milagre não é dar vida ao corpo extinto,
Ou luz ao cego, ou eloquência ao mudo...
Nem mudar água pura em vinho tinto...
Milagre é acreditarem nisso tudo!
Dos Nossos Males
A nós bastem nossos próprios ais,
Que a ninguém sua cruz é pequenina.
Por pior que seja a situação da China,
Os nossos calos doem muito mais...
Quem Ama Inventa
Quem ama inventa as coisas a que ama...
Talvez chegaste quando eu te sonhava.
Então de súbito acendeu-se a chama!
Era a brasa dormida que acordava...
E era um revôo sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressurreições...
Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente,
Ou sozinhos, num ritmo tristonho...
Ó! meu pobre, meu grande amor distante,
Nem sabes tu o bem que faz à gente
Haver sonhado... e ter vivido o sonho!
As Coisas
O encanto
sobrenatural
que há
nas coisas da Natureza!
No entanto, amiga,
se nelas algo te dá
encanto ou medo,
não me digas que seja feia
ou má,
é, acaso, singular...
E deixa-me dizer-te em segredo
um dos grandes segredos do mundo:
--- é simplesmente porque
não houve nunca quem lhes desse ao menos
um segundo
olhar!
Poema de circunstância
Onde estão os meus verdes?
Os meus azuis?
O arranha-Céu comeu!
E ainda falam nos mastodontes, nos brontossauros, nos
tiranossauros.
Que mais sei eu ...
Os verdadeiros monstros, os Papões, são eles, os arranhas-céus!
Daqui
Do fundo
Das suas goelas.
Só vemos o céu, estreitamente, através de suas gargantas
ressecas.
Para que lhes serviu beberem tanta luz?!
Defronte
À janela onde trabalho
Há uma grande árvore ...
Mas já estão gestando um monstro de permeio!
Sim, uma grande árvore ...
Enquanto há verde,
Pastai, pastai, olhos meus...
Uma grande árvore muito verde ... Ah!
Todos os meus olhares são de adeus
Como o último olhar de um condenado!
Bilhete
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grite de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...