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UM DIA NA VIDA DO BRASILINO

  PAULO GUILHERME MARTINS

 

 "Não existe imperialismo no Brasil."

CARLOS LACERDA,

na "Tribuna da Imprensa"

 

"Essa história de imperialismo não passa de invenção de falsos nacionalistas

que pretendem impedir o progresso da nação."

Em "O Estado de São Paulo"

 

Não sei se você conhece o Brasilino? Mas isso não importa...

Brasilino - é um homem qualquer, que mora num apartamento qualquer, numa cidade qualquer. . . Situemo-lo em Santos, por exemplo.

Brasilino, como todo o bom burguês, começa o dia acordando; sim, porque o operário, êste, levanta-se ainda dormindo a fim de chegar a tempo ao serviço.

Brasilino acorda e aperta o botão da campainha à cabeceira da cama, campainha essa que soa na copa; porém soa, consumindo energia - energia que é da Light, e, assim, o Brasilino inicia o seu dia pagando dividendos ao CAPITAL ESTRANGEIRO. Mas Brasilino não pensa nisso e começa o seu dia, feliz

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  Pouco depois, Brasilino encontra-se na Via Anchieta, dirigindo-se a São Paulo. Ao passar por Cubatão e ao ver a Refinaria Presidente Bernardes, põe-se a pensar : "Porcaria essa Petrobrás agora que a gasolina é nacional, custa cinco vêzes mais". - Sim, porque  Brasilino não reflete que a gasolina custa, agora, muito mais, por um motivo muito simples : ao tempo em que a gasolina era importada, o dólar custava Cr$ 18,72 e, atualmente, para a importação de óleo bruto, custa Cr$ 200,00. - Não sabe, também, que o dólar está caro porque é escasso, e é escasso devido à procura, e a procura é muito grande, porque os dólares obtidos com a exportação brasileira, mal dão para fazer face às remessas  de royalties e dividendos do CAPITAL ESTRANGEIRO.

A irritação do nosso herói, contudo, logo desaparece, pois a algumas centenas de metros à frente, Brasilino vê surgirem os dutos da Light e uma grande tabuleta com os seguintes dizeres: LIGHT AND POWER, a maior usina hidrelétrica da América do Sul - 1.200.000 KW. - Aí, Brasilino exulta e monologa com eentusiasmo - "Isto sim A Light que fêz a grandeza de São Paulo." Sim, porque Brasilino confunde Light com Energia. ÊIe não sabe que o que fêz a grandeza de São Paulo não foi a Cia. Light e sim a Energia e que, se a Energia não pertencesse à Light, São Paulo seria dez vêzes maior, ou o Brasil dez vêzes menos miserável. O interessante é que Brasilino nunca perguntou, a si mesmo, que seria da Inglaterra se não existissem as Lights pelo mundo.

Brasilino prossegue a viagem e, logo mais, atinge o o altiplano, onde vê descortinar-se o panorama grandioso do progresso industrial, que êle julga ser do Brasil : "Volkswagen do Brasil" - "Mercedes Benz do Brasil" - "Willys overland do Brasil" - "General Motors do Brasil" - "Rolls Royce do Brasil" - "Cia. Brasileira de Peças de Automóveis" - "Simca do Brasil" - "Plásticos do Brasil" e inúmeras outras "do Brasil" e "brasileiras", mas todas elas ESTRANGEIRAS.

Brasilino, afinal, chega a São Paulo. Estaciona o seu carro em uma das ruas do centro e, a pé, alcança a Rua Líbero Badaró, para concluir um negócio. Brasilino recorda-se de que Líbero Badaró foi um homem que, ao ser assassinado, exclamou : "Morre um liberal, mas não morre a Liberdade " E Brasilino conclui : "Que sujeito burro  que interessa a Liberdade para um homem que já morreu?"

Enquanto assim pensa, Brasilino chega aos escritórios da "Crescinco, Cia, de Investimentos", pertencente ao Sr.Rockefeller. Brasilino sente-se orgulhoso de emprestar o seu dinheiro a um dos homens mais ricos do mundo, mas que, para financiar as suas indústrias, prefere usar o dinheiro  dos próprios brasileiros, atraindo-os com a vantagem de juros de 2% ao mês e livre do imposto de renda. Brasilino não sabe que, entre o dia em que êle entregou o dinheiro, e o dia em que êsse mesmo dinheiro lhe foi devolvido, a desvalorização da moeda foi de 4% ao mês e assim, ele está menos rico, pois êsse juro e mais os lucros da Cia. Investidora terão, forçosamente, de ser acrescentados ao custo das utilidades, saindo, conseqüentemente., da própria pele do Brasilino. Mas Brasilino não sabe disso e recebe o seu dinheiro e os seus juros, feliz.

  Liquidado o negócio, Brasilino vai almoçar. – Entra num restaurante onde lhe é servido, como antepasto : frios da "Armour do Brasil", que é americana, Margarina "Clay-Bon", de "Anderson Clayton" que é americana, toma uma "Coca-Cola" e saboreia um prato de massa, preparado com farinha do "Moinho Paulista", que é inglês, e, depois, come um filé com fritas, cuja carne foi fornecida pelo "Frigorífico Wilson" e as batatas foram fritas com óleo "Mazola", da "Refinações de Milho Brazil" (Brasil com Z). Como sobremesa, comeu um pudim feito com "Maizena Duryea", também da "Refinações de Milho Brazil" e, assim, até para comer, Brasilino tem que pagar dividendos ao CAPITAL ESTRANGEIRO.

  Após o almoço, Brasilino passeia pela cidade, a fim de fazer hora para o cinema, gastando a sola do sapato com saltos de borracha "Good Year", pagando, até para andar, dividendos ao CAPITAL ESTRANGEIRO.

Brasilino entra no Cine Metro, onde passa a tarde, deliciando-se com um filme, que é americano e, para passar algumas horas distraídas, Brasilino paga dividendos ao CAPITAL ESTRANGEIRO.

Ao sair do Cinema, Brasilino sente uma leve indisposição ; entra numa farmácia e toma um "Alka-Seltzer."

E, assim, até para prevenir uma indigestão, Brasilino precisa pagar dividendos ao CAPITAL ESTRANGEIRO.

Toma novamente o seu carro e volta para Santos. Chegando à casa, faz novamente a sua toilette, liga o rádio de cabeceira, marca "G. E." da "General Electric do Brasil", e deita-se sobre um colchão de espuma de borracha "Foamex" da "Firestone do Brasil" e repousa a cabeça, sobre um travesseiro do mesmo material, dormindo, feliz, o sono da inocência.

Não sei porque, mas a história do Brasilino traz sempre, à mente, -aquelas magníficas palavras do Sermão da Montanha : "Bem-aventurados os pobres de espírito porque será dêles o reino dos céus."

Mas uma coisa jamais será do Brasilino: O REINO EM SUA PRÓPRIA TERRA.

Por isso, leitor, se alguém lhe disser que não existe imperialismo económico, no Brasil, é porque está ENGANADO, ou porque ESTÁ ENGANANDO VOCÊ.

 

 

Santos, Outono de 1961.

 

 

Edição especial para distribuição grátis.

 

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