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Ensino público ou ensino privado

Genismar Luiz Bordin Borges*

Está em evidência nos meios de comunicação de massa, processo que teve início no governo Colior, um discurso privatista em várias áreas da economia. Esse discurso estende-se, inclusive, na área da educação, hoje responsabilidade do Estado.

O discurso privatizante que vem tendo amplo espaço, mistifica o privado e despreza o sentido democrático do público. Este, construído ao longo da história com muita luta, que é o sentido de direito de todos e igualdade perante a

No momento conjuntural do Brasil, coloca-se em questionamento a “competência” do Estado em administrar os setores que ele controla. Nesse sentido, o debate fica apenas no âmbito da administração, como se fosse apenas uma questão de competência administrativa e basta o setor privado administrar para solucionar o problema da “competência e eficiência”. No entanto, não se discute a formação do nosso Estado, quem o controla, porque este Estado não é competente. Ou melhor, o que é competência, eficiência, ensino público e privado?

Na esfera da educação, o debate se restringe ao ensino público e privado. Antes de examinar a eficiência do ensino público ou privado, é preciso caracterizar este Estado burguês, parto da seguinte pergunta: basta que o estado monopolize a educação para que se torne público? Se a resposta for não, devemos formular uma outra questão: por que o Estado tem o monopólio da educação, mas não é público, no sentido de. dar uma qualificação a todos em igualdade de oportunidades? O setor privado se encarregaria de dar educação de qualidade a todos arcando com o ônus de milhões de analfabetos, marginalizados do mercado de trabalho e consumo?

A defesa do ensino público começou com a Revolução Francesa. A burguesia tomou esse discurso como forma de substituir o monopólio da Igreja na área da educação por um ensino laico e universal. Era necessário, com a formação do capitalismo, que os cidadãos, principalmente os proletários, se instruíssem para acompanhar o desenvolvimento tecnológico da sociedade capitalista. Para isso, era importante que todos tivessem acesso a educação. No Brasil, vivendo a época colonial, um sistema político absolutista e pré-capitalista, implementou, de acordo com a tradição portuguesa, uma administração pesada e ineficiente, que teve inicio com a vinda da família real ao Brasil, no governo de D. João VI.

É obvio que não basta ter acesso à educação para todos, sem questionar que tipo de educação queremos. O ensino público como um direito conquistado com a Revolução Francesa (conquista de todos os cidadãos e não apenas da burguesia), é importante como condição necessária e anterior a um processo mais amplo: a democracia real em todas as esferas da sociedade. E democracia real entendo como a igualdade formal, mas também o acesso de todos os cidadãos, sem distinção de renda, raça, credo ou cor, à educação, saúde, trabalho, consumo, lazer, informação, organização política, etc.

Nesse aspecto, o ensino privado fere o principio constitucional de igualdade que está ligado à concepção de ensino público como dever do Estado e direito de todos. O ensino privado é discriminatório por natureza, nesse sentido, pois é visto como uma mercadoria que apenas consome quem tem dinheiro e a educação não é vista como emancipação do indivíduo, crítico em relação à própria sociedade ou ao Estado dominado por uma elite que quer privatizá-lo. No setor privado é necessário a exclusão e exploração para que se dê o lucro. De onde vem o lucro, senão da exploração de uma classe pela outra? Não questiono aqui o papel da iniciativa privada nas diferentes esferas da sociedade questiono, isto sim, o discurso “privatista” como solução para todos os males de nossa sociedade, como substituição do “público” e até mesmo do papel do próprio Estado.

Acho que o ensino público não é público e não é de qualidade (embora o ensino superior público é melhor que o privado), não porque o Estado por si só fosse incompetente, mas porque nosso Estado, que é privado na sua administração, não atingiu a democracia real. Por isso, é preciso que a educação seja um direito de todos e dever do Estado, como condição necessária e anterior a um processo mais amplo: a democratização do Estado e da sociedade como um todo. O Estado deve ser realmente democrático no âmbito econômico, nas decisões política, na justiça, no bem comum. Assim também, a escola e a sociedade como um todo tem que se democratizar num processo constante em que não depende apenas do Estado, mas da sociedade civil, ou seja, dos cidadãos.

Quanto ao discurso da “eficiência e competência”, tem servido como uma forma ideológica de dominação por parte da elite dirigente. Discurso supostamente livre de ideologia, de que a sociedade dá papéis diferenciados a cada indivíduo (divididos em funções ou especialização), que, na sua função, deve desempenhar seu papel da melhor forma, sem questionar o todo dessa máquina que é o sistema capitalista. É preciso desmistificar o discurso da competência. O que é realmente competência e eficiência? Para que e para quem isso interessa? Essas e outras perguntas, como: o que é ensino público? O que se aprende e a quem vai servir esse conhecimento, devem prescindir ao debate em tomo de quem deve deter o monopólio da educação: o Estado a iniciativa privada.





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