Do Amanhecer...


Santa Cecília, Espanha; presente

Héctor sente-se um crápula. A noite havia sido demasiado cansativa, mas sentia-se aliviado, pois assim que entregasse aquele, poderia finalmente ir para casa dormir. Mesmo assim é triste vê-lo. São 3h17 da manhã. Ele percorre o corredor do necrotério da cidade, o barulho da pequena roda da maca ecoa no piso frio de mármore. As paredes brancas, levemente sujas pelo tempo, formam em seu acabamento circular um corredor convidativo a uma longa passagem. Longa passagem. Sempre que passava por lá imaginava que, quando morresse, apareceria um corredor igual àquele e levaria-o para o céu. Mas lá estaria cheio de anjos e querubins e, no final, haveria uma grande luz. Uma pequena batida nos vãos do piso sujo por constantes passagens, típicos de locais públicos, mesmo esse não sendo necessariamente um, fez Héctor sair de seu devaneio. Continuou levando o corpo do garoto e colocou-o ao lado da outra maca, localizada no final do corredor, na sala de necrópsias. Esse primeiro corpo era de uma jovem. Provavelmente eram namorados. Ficarão ali até de manhã, para quando o legista chegar constatar o óbvio: assassinato. Ela com um tiro e ele com três.

Seu nariz respingou. Realmente o lugar era frio apesar de lá fora fazer um calor infernal. Héctor achou melhor ir embora logo, para não pegar um resfriado. Olhou novamente os sacos pretos onde jaziam os corpos. Era triste, afinal eram tão novos... Sempre pensava na morte como uma perda muito grande. Tantas impressões, pensamentos, idéias, sonhos, fantasias, localizados em cada um, dispersados pelo éter. Tanta coisa que poderia ser entendida do comportamento humano, morto junto com os prováveis gênios, que se foram cedo demais. Logo Héctor afastou esses pensamentos da mente. Afinal, era seu trabalho, e se ficasse lamentando a todos, logo estaria junto com eles. Na sua única certeza: um dia todos se vão.

Será mesmo?

Cerca de quinze minutos após Héctor deixar o necrotério, o saco preto estava sendo rasgado. Pelo lado de dentro. Um garoto de dezoito anos sente em seu corpo um estranho espasmo que faz seus órgãos voltarem a funcionar. Num misto de instinto e desespero, salta da mesa de onde estava, e arrepia-se. O que raios estaria fazendo num necrotério?

Seu peito arfa ferozmente, sua pulsação está extremamente acelerada, tem os pêlos eriçados e as mãos tremulas. Tenta ocultar do vazio o medo e a confusão que estava sentindo. Milhões de imagens passam por seu cérebro. Seus olhos não permanecem parados em lugar algum. Ele tenta não pensar no que aconteceu, temendo a resposta...

 

O NOVO ALVORECER
Do Amanhecer...

Suas espadas cruzam-se novamente. Uma pequena nuvem de faíscas salta devido ao encontro. Escuta-se somente o barulho do protesto metal contra metal. Uma Musketeer-Gold encontra-se com uma Swept~Hilt Rapier. E também a respiração ofegante de ambos. As lâminas permanecem juntas, mas nenhum dos dois aplica-lhes força. Os olhos verdes de Krasendof, ou Kres para os poucos amigos, encontram os olhos castanhos e profundos de Enrique. Em sua face, um respingo de suor desce vagarosamente, e então Kres tem a oportunidade de olhar novamente seu adversário: Enrique Muñoz, em seus um metro e oitenta e cinco, metido em uma calça jeans e camisa de gola alta, ambas pretas, sobretudo bege. A bandana, também preta, cobria os cabelos castanho-escuros caídos até os ombros. Seus lábios finos vagarosamente começam a mover-se, revelando sua rápida voz:

- Krasendof, quanto tempo desde a última vez! O que está fazendo aqui? Não acha que sou velho demais para você?

Sua voz extremamente fria e desprovida de sentimentos disse algum escárnio em russo.

Num súbito movimento, Kres ruma a espada em direção ao ombro esquerdo de Enrique. Este desvia com um movimento circular de sua Musketeer e sobe-lhe um contragolpe quase até o peito, sendo aparado pela espada do adversário. As lâminas separam-se e ambos dão um passo para trás. Passa-se um microssegundo no qual os dois fitam-se novamente e ao beco sujo onde se encontram. Uma lixeira e um carro, este quase não foi notado por nenhum dos dois. Os altos muros dos dois prédios que os rodeavam estavam por inteiro pichados. Na extremidade, outro muro e a saída para rua, esta quieta em demasia. Havia jornais e outros lixos amontoados pelo chão. Então uma nova série de movimentos começa. Ataque e defesa. Balé e luta. O som das espadas chocando-se e a luzes faiscantes provocadas por elas dominam o escuro e o silêncio. Agora Kres estava no ataque enquanto habilmente Enrique desviava, afastando-se para trás. Enrique sentiu-se tocando agora a frente do carro enquanto evitava os ataques de Kres, o qual preparou-lhe um golpe abaixo do estômago. E, na única saída visível, Enrique passou a espada da mão direita para a esquerda, apoiando a primeira no capô do carro, lançando-se à 180º do chão, levantando seus pés até ficar totalmente equilibrado em sua mão enquanto a outra golpeava a espada, desviando-a.

Totalmente estupefato pela manobra excêntrica, que havia sido extraordinariamente oportuna, Kres corrigiu sua base e atacou a mão com que Enrique se apoiava. Era um golpe devastador, afinal deceparia seu braço. A luta estaria acabada.

Tão rapidamente quanto veio o golpe veio sua anteposição. Enrique ignorou as câimbras e, concentrando-se em seu ponto de equilíbrio, usou toda sua força para conseguir "pular" com a mão. Sentiu seu corpo no espaço e a lâmina cortando o vento abaixo de si. E, tão rápido quanto subiu, Enrique desceu, batendo e quebrando sua omoplata esquerda no pára-choque, levando com as dores o farol direito do carro e deixando-lhe outra boa parte amassada.

Os olhos de Kres romperam-se em manchas de ódio que invadiram toda sua face. Enrique percebeu a espada que faiscava com a eletricidade que a invadia, saindo do corpo magro e esguio de Krasendof, e entendeu o que ele iria fazer. Seu corpo inteiro protestou e seus ombros latejaram quando bruscamente levantou-se, correndo para longe do carro que, com um golpe certeiro de Kres, explodiu numa grande bola de fogo, jogando-o ao chão. Enrique virou-se logo em seguida. Todo o ar saiu-lhe dos pulmões quando viu a figura escura de Kres saindo do meio das chamas e jogando o blazer em chamas no chão.

- Hoje você vai morrer, Enrique.

- Disse que deveria continuar a procurar garotos sem experiência para lutar. Já que não o fez...

Algumas horas atrás

Juan González passeia alegremente com sua namorada: Anne. O parque por onde andavam era um oásis em meio à cidade. Aquele era um refúgio onde os dois se demoravam, a devanear, um lugar no qual as preocupações e problemas permaneciam do lado de fora. Um santuário imaculado, feito pelas mãos da natureza. Árvores de copas altas misturavam-se com os arbustos e a grama rasteira, cortada pelos caminhos e bancos de cimento. As variadas flores exalavam seus convidativos perfumes levando a um relaxamento quase sobrenatural. Casais iam alegremente indo e vindo, até desaparecer com o passar das horas, deixando o lugar mais mágico, sob o doce cheiro da meia-noite. Conversavam normalmente: amor, escola, a vida e seus problemas, seu futuro. Futuro: uma doce ilusão! Sentaram-se em um banco e depois de demorado beijo ela olhou-o com extrema ternura:

- É incrível que já fazem dois anos que estamos juntos...

Ele interrompeu-a com outro beijo.

- Estaremos sempre juntos.

Às vezes Juan acreditava estar mentindo. Como podiam jurar amor e felicidade eternos juntos, se eram só garotos? Eternidade: uma palavra sem sentido. "A eternidade é agora" - costumava dizer. Mas então sentia seus lábios tocando os dela, suas mãos se encontrando, seu corpo tocando o dela. E a frase se explicava. Queria ficar com ela para sempre. Era incrível, por mais nervoso ou frustrado que pudesse estar sempre sentia-se bem em seus braços. Uma antiga mágica. Um doce mel. Mas às vezes os problemas da trivial vida o atingia - uma ocasional briga com os pais adotivos, com os quais ele não se dava muito bem. Juan era fechado e mais pareciam inquilinos na mesma casa do que uma família. Mesmo assim ele os amava - e ela sempre estava pronta a ajuda-lo.

O vento seco da Espanha soprou balançando as árvores ao seu redor, revelando um farfalhar de folhas que embalava mais ainda seu desejo, fazendo-o devanear em lembranças de passeios antigos, nos quais estavam sempre juntos. Passeios cercados de brincadeiras típicas de adolescentes, que acabavam num dia exaustivo, numa roda de conversas e histórias ou em lânguidas horas de amor. As árvores balançaram novamente. Era hora de voltar.

Seguiram calmamente até o carro do pai dele, emprestado às custas de alguns favores. Já estavam entrando quando dois rapazes, com cerca de vinte anos, vestidos em jeans pretos e com camisetas de uma banda esdrúxula qualquer, a qual tinha uma caveira ensangüentada como símbolo, vociferando palavrões e fazendo movimentos rápidos, mandaram que entrassem no carro. Seu coração disparou e acelerou-se ainda mais com as lágrimas de Anne. Eles mostravam o Glock-17, uma pistola leve de 9mm. Depois, amarraram Juan no banco do passageiro, saindo logo em seguida em disparada, fazendo os pneus cantarem. Estava desesperado. Um dos assaltantes, o mais magro, que mascava freneticamente um chiclete e usava pequenos óculos escuros que eram pouco maiores que seus próprios olhos, foi na frente dirigindo, trocando a marcha com grande violência e fazendo rugir o pesado motor do carro. Em sua cara esquelética, as grandes olheiras tornavam sua face parecida com um zumbi das antigas histórias que Fabiola, a doce señorita que tomava conta de Juan no orfanato, lhe contava. Enquanto isso o outro mais falante, com um piercing enorme, bem mais musculoso e grande, com uma corrente rodeando sua cintura e servindo de cinto para a desbotada calça rasgada no joelho direito, largou-se pesadamente no banco de trás ao lado de Anne. Usava uma bandana preta, encobrindo-lhe o cabelo loiro, e tinha a barba por fazer. Andaram cerca de meia hora. Ouviam-se os suspiros de Anne, sua respiração rápida entre os gritos do maior com o primeiro, reclamando: hora da velocidade, hora do choro dela, hora do silêncio de Juan.

Quando estavam o bastante longe da cidade, desceram os quatro à beira da estrada. Jogado ao chão com o mais franzino atrás de si, segurando a pistola contra sua nuca, Juan viu-se chorando e impotente. Lembrou de uma passagem bíblica na qual uma mulher dava à luz e um dragão esperava para devorar a criança. Olhou e viu a pequena criança sendo destroçada entre os dentes mortais e pontiagudos do dragão! Um tesouro, que afundava em lágrimas ao mar revolto! Em sua frente o maior dos bandidos freneticamente violava seu grande tesouro. Ela lutava, queria viver. Mas o monstro não permitiu. Um tiro certeiro no meio do peito. Juan sobressaltou-se, derrubando o que estava atrás de si, gritando como um animal raivoso, que só foi parado com mais três estampidos surdos. O primeiro atingiu seu peito acima do coração, o segundo, no meio de seu abdômen e o terceiro junto à sua cintura. Sentiu seu corpo cair junto ao de Anne, enquanto os assassinos corriam para o carro, ligando o motor e fugindo noite adentro.

Num supremo sacrifício, Juan virou-se para Anne, suplicando que agüentasse, que ficariam eternamente juntos. Mas era tarde. Chamou seu nome pela última vez:

- A-Anne! A-Aan... - O sangue escorria-lhe da boca.

Presente

Kres uivava de ódio enquanto tentava atacar. Era uma criança que berrava de manha. Não porque achava que ia perder. Pois sabia que não ia. Mas por que Enrique já havia tirado-o do sério, e dessa vez não ia fugir. Não ia perder.

Enrique, ao contrário, só alimentava um profundo desprezo por seu atacante. Krasendof era famoso entre os Imortais por procurar aqueles que não sabiam de sua condição. Forçava-os à primeira morte e depois, sem que estes soubessem defender-se, matava-os, sugando o pouco conhecimento que possuíam. Era a mais baixa escala de vivência. Um porco nojento e aproveitador. A cada golpe, seu asco aumentava. Mal havia abandonado o aeroporto e já encontrara esse infeliz. Devia tê-lo matado na primeira vez que o encontrou, mas hoje ele não fugirá novamente.

As espadas continuavam a gritar. Estavam perto das chamas. Logo a polícia e os bombeiros chegariam, precisavam terminar isso logo. Surpreendentemente um golpe deferido por Kres ultrapassou-lhe a defesa, abrindo-lhe um corte na altura do ombro esquerdo. Kres soltou um gemido de prazer por finalmente acertá-lo. Passou a língua pelos lábios carnudos e repetiu o mesmo ataque.

Dessa vez, Enrique estava com a perna direita esticada, com a parte de trás do joelho próxima ao chão, enquanto o outro estava dobrado. Parecia que estava sentando como um pássaro sobre uma das pernas. A lâmina da Musketeer estava atrás de sua própria nuca, travando a Swept~Hilt Rapier de Kres perto de seu próprio pescoço, numa posição extremamente delicada.

- Ah! Cony! Cony! Que saudades! Senti tanto não poder matá-lo! - Kres falava com um ar zombeteiro.

O semblante de Enrique fechou-se mais duramente.

- Que pretende, Enrique? - Kres cuspia as palavras - Conheci bem Connor. Esse golpe, se estivesse sendo executado corretamente, nunca funcionaria comigo.

Uma sombra de preocupação passou-lhe pelos olhos. Agora estava com medo do que se transformou num sorriso gótico de Enrique. Sabia o quanto ele era habilidoso com uma espada, o quanto ele arriscava-se em golpes que davam as costas ao oponente numa única chance de defesa para reagir com um contra-golpe fatal, o quanto ele não hesitara em ficar de pernas pro ar, num movimento arriscadíssimo e, mais que tudo: estava assustado com o que ele poderia fazer.

Seus olhos fitaram os de Enrique, que começou o movimento. Não visava o pescoço como o golpe original, mas sim, vinha por baixo. E Kres entendeu.

Tarde demais.

A espada de Enrique subiu ferindo a lateral de seu corpo até abaixo das axilas, fazendo-o gritar com o corte que decidira a luta: havia arrancado seu braço direito.

A visão de seu braço voando com sua espada horrorizou-o mais do que o sangue que escapava da enorme ferida. Gritava como uma criança assustada por fantasmas em seu quarto no meio da noite. Era um grito gutural, do fundo de sua alma.

Enrique aproximou-se, seus lábios movendo-se com a palavra "Connor" e, como se despertasse de um longo transe, olhou para Krasendof. Esse babava e vociferava maldições quando viu seu olhar.

Então parou.

De seus olhos saltou uma lágrima solitária, um pedido de perdão pela vida de mortes, por tudo...

Tudo.

Nada.

- No final, só pode haver um.

A lâmina atingiu-lhe o pescoço. Não tão duramente quanto o coração de Enrique. Isso teria que acontecer?

A lágrima de Kres foi correspondida com outra.

Uma faísca atravessou o ar perto do rosto de Enrique. Um grande campo de energia surgiu, elevando seus pés a alguns centímetros do chão. Feixes de luzes cortavam o ar. O barulho de eletricidade aumentava até culminar na explosão de um poste perto da rua. Os jornais e papéis que estavam espalhados pelo chão rodopiavam levemente num pequeno tornado de brisas vindas de lugar algum. E rodavam em torno de Enrique. Muito. Tudo. Uma vida passava diante de seus olhos. Conhecimentos, vivências, esperanças, alegrias e tristezas. Um raio cortou-lhe o tórax. Outra explosão. Agora não conseguia identificar de onde estava vindo. E tão subitamente como começou, o vento e o barulho pararam. Tudo se tornou um silêncio fúnebre. Só escutavam-se sirenes ao fundo. Chegariam logo.

Enrique fechou os olhos, tentando acalmar o coração, ainda palpitante devido ao turbilhão de sensações. Olhou uma última vez o corpo de Kres. Poderia finalmente seguir viagem. Mas não... Ainda não havia acabado. Sentia algo. Alguém. Agora entendeu o que Kres fazia nesse lugar. Tudo só estava começando. Agachou-se para pegar as duas espadas, quando viu as luzes das sirenes.

Cambaleando, Enrique deixou o local.

*************

Juan encheu os pulmões de ar. Preparava-se para o que iria ver. O ar frio do necrotério invadiu-o, reconfortante. A pouca luz, que provinha de uma pequena janela, era a única da sala. Começou olhar ao redor como se procurasse forças; as paredes pareciam andar sob seu olhar, diminuindo a sala, e uma claustrofobia invadiu-o. As gavetas, os instrumentos cirúrgicos e até a mesa onde ele próprio estivera deitado assumiam uma aparência fantasmagórica. As sombras o espreitavam, passavam-lhe em frente aos olhos num balé demoníaco. Encheu novamente os pulmões e, tremendo, abriu o outro saco preto. Saltou aos seus olhos um tufo de cabelo negro e liso, e a cada centímetro que abria, sua mão tremia ainda mais. Um calafrio gélido invadiu sua espinha, ao mesmo tempo em que suas pernas bamboleavam, levando-o de joelhos ao chão. A face de Anne estava serena, diferente da face com o terror explícito de algumas horas atrás - agora ela repousava alegremente em um doce sonho. Lágrimas invadiram-lhe os olhos. Encostou-se aos ombros dela e chorou. Amargamente. Como nunca havia chorado antes. A pele de Anne, antes rosada, agora era uma massa branca e gélida. Seus lábios não estavam sorrindo, não sorririam nunca mais. E ele também não. As lágrimas escorriam pelo braço de Anne. Juan inconscientemente esperava que ela se levantasse, pegasse-o no colo a acariciá-lo e a dizer palavras doces de motivação em seus ouvidos. Não havia motivação. Nem Anne. Sua cabeça levantou-se pesadamente na direção da porta. Não estava sozinho. Segurava nas mãos dela, não queria deixá-la, mas precisava. A luz que vinha da pequena janela sorriu-lhe. "Adeus Anne".

As lágrimas ainda caíam enquanto ele corria. Exalava um cheiro misto de sangue seco e suor. Os fiapos da camisa branca que lhe restaram, agora cheios de manchas vermelhas, pareciam pesar infinitamente. Transeuntes olhavam o rapaz magro e esbelto correr a lugar nenhum. Seus rostos olhavam fixamente para ele. Todos olhavam-no e não o deixavam. Espectros e vultos. Todos olhavam-no, mas ele estava morto, não?

- Não me olhem, não estou aqui e não sou ninguém! - Murmurava baixinho para si.

Mas estava. Caso contrário, não sentiria uma sensação estranha invadir-lhe o corpo. Um zunido em sua cabeça. Vindo de suas próprias entranhas a explodir no cérebro. Um calafrio selvagem. Andava entre ruas que assustadoramente eram iguais. Um labirinto urbano. Os becos que escondiam demônios lânguidos e meigos que lhe sorriam. O farol de um carro ultrapassou-o. Uma buzina ensurdecedora. Estava no meio da rua e não percebera. Foi tomado pelo desespero de não saber o que estava acontecendo. Do por que estar andando e de não ter Anne para compartilhar essas sensações. Então todo aquele zunido e mal-estar duplicaram e amenizaram, num simples estalo de olhar. Olhava outro homem.

Enrique olhava um garoto. Só. Assustado. Como um animal em fuga. Suas roupas, um trapo imundo, manchado de sangue. Sabia do que se tratava. E compadeceu-se, estendendo-lhe a mão.

O outro homem estendia-lhe as mãos. E, quando tocaram-se, Juan sentiu um único sentimento de segurança. Como uma figura mística que vinha em seu auxilio e, como sinal universal, estendia-lhe a mão. Uma mãe a carregar um bebê. Essa foi a imagem que passava-lhe pela cabeça quando ouviu a voz calma do outro, contrastando com seu peito arfante:

- Acalme-se. Venha comigo.

Mesmo que não quisesse, mesmo que tentasse evitar, não poderia. Aquelas mãos suaves forneceram-lhe o único caminho. E ele o seguiu. Até calmamente, no meio da rua, sumirem-lhe os sentidos. E permanecer uma nuvem escura e reconfortante.

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Esta fanfic é dedicada a Connor MacLeod.

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Agradecimentos:
Aka Draven MacWacko
Thiago Salviatti

Próximo Episódio:

"Uma Escada Para o Céu e Para o Inferno"


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"O Novo Alvorecer"

Converse com o autor: Nuno Theodoro

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