O sexo dos anjos
Débora Crivellaro e Thiago Cordeiro

Publicado na Revista Epoca em 21/01/2001

Na manhã da sexta-feira 11 o frei franciscano Alexander Nicolaus Weber, de 34 anos, acordou cedo para tomar café da manhã na Pousada Raposo Chalé, em Rio de Contas, município perto da Chapada Diamantina. Quando começava a se servir, foi interrompido por uma professora hospedada em um chalé a 15 metros do seu. A mulher o acusava de ter tirado fotografias pornográficas de seu filho de 6 anos. Perplexo, frei Weber afirmou que havia algum engano. Ainda assim, concordou em levar sua câmera fotográfica para a delegacia mais próxima. Durante o interrogatório, ele se disse surpreso com aquilo tudo - e chorou. Revelado às pressas, o filme de sua máquina mostrou apenas flagrantes de paisagens. Frei Weber estava prestes a ser liberado por falta de provas quando a mãe do menino resolveu continuar a investigação por conta própria. Voltou para a pousada e invadiu o quarto do padre. Encontrou uma máquina fotográfica digital em cima da cama e a levou para o distrito. Quando as novas fotos foram exibidas, restou ao frei pedir desculpas. "Perdi o controle", confessou ele, conforme consta do boletim de ocorrência. A reportagem de ÉPOCA conversou com cinco pessoas que viram as fotos, em momentos diferentes. Todas descrevem uma seqüência de 19 poses, em que o garoto aparece deitado em uma cama, tirando as roupas e sendo tocado pelo padre. Na última da série, é o próprio frei quem aparece, em foto tirada pelo menino.

Frei Weber está preso em Brumado, a 70 quilômetros de Rio de Contas. É acusado de atentado violento ao pudor, crime que pode lhe render de seis a dez anos de cadeia. Seus advogados tentam agora enquadrá-lo no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que pune quem fotografa menores em situações pornográficas. Nesse caso, a pena é de um a quatro anos de reclusão. "As fotos são chocantes, pornográficas. Mas foi um caso isolado. O frei não demonstra nenhuma tara", diz José Gomes, advogado do padre.

Ameaçado pelos outros 55 presos do distrito, frei Weber está em uma cela adaptada, de 3 metros quadrados. Em entrevista a ÉPOCA, falou de sua trajetória no Brasil, mas se recusou a comentar o episódio. "Não vou dizer se foi a primeira vez porque isso vai ser definido pelas investigações. Mas sei que vou ser expulso da Congregação", disse. O padre nasceu em Rheda-Wiedenbrück, uma vila rural no oeste da Alemanha. Foi alfabetizado por padres e passou a adolescência no seminário. Em 1989, entrou para a Ordem dos Frades Menores, que costuma enviar missionários e recursos para obras sociais no Brasil. Quatro anos depois, foi cuidar de crianças desnutridas em hospitais de Pernambuco. "Descobri minha vocação para ser enfermeiro. Achei a coisa mais importante do mundo lidar com crianças tristes e ver o olhar ganhar vida de novo, a pele voltar a ter cor", conta. Até um mês atrás, ele trabalhava em uma creche em João Pessoa que abrigava 45 crianças - fechada por falta de verbas.

Na noite da quinta-feira 10, a professora precisou deixar a pousada para participar de um curso e não teve medo de deixar o filho por ali, perto de pessoas respeitáveis. Quando voltou, encontrou o garoto dormindo. Mas, na manhã seguinte, o menino disse: "O tio tirou fotos minhas no chalé dele". Em seguida, contou que foi chamado pelo frei para brincar de artista de televisão. Aos poucos, foi dando mais detalhes. Quando soube da denúncia, um casal de amigos alemães que viajava com o padre, Iris Zenker, de 44 anos, e Dirk Ruhling, de 43, duvidou que ele pudesse ter cometido o crime. Depois de ver as fotos na delegacia, no entanto, Iris gritou: "Você é um monstro e merece passar o resto da vida na cadeia!". Liberados, os turistas voltaram para a Alemanha. Desde que viu as fotografias, a professora mergulhou na apatia. O menino ainda não entendeu o que aconteceu. Diz que ficou amigo do frei - pediu para brincar com ele outra vez.

Cinco dias após a prisão de Weber, outro integrante da Ordem dos Frades Menores foi alvo de um escândalo, desta vez em Santana do Acaraú, município de 26 mil habitantes a 250 quilômetros de Fortaleza. Na quarta-feira passada, a mãe de uma adolescente foi até uma delegacia dizer que sua filha havia sido molestada pelo frei Sebastião Luiz Tomaz, de 69 anos. Quando soube da denúncia, o padre saiu da cidade. A notícia se espalhou e, horas depois, o distrito registrava relatos de 19 meninas - com idade entre 10 e 16 anos - que diziam ter tido algum tipo de contato sexual com o padre em troca de roupas e dinheiro. A casa em que ele mora foi cercada por uma multidão.

Na manhã da sexta-feira, nove crianças e adolescentes submeteram-se a exames no Instituto Médico-Legal de Fortaleza. Frei Luiz é ligado à linha progressista da Igreja. Nos anos 70, foi auxiliar do bispo dom Adriano Hypólito, no Rio de Janeiro. Em 1998, foi seqüestrado na Baixada Fluminense e pediu transferência para o Ceará. O bispo de Sobral, dom Aldo Di Cillo Pagotto, afirmou que um conselho presbiteral deverá se encarregar do caso. E frei Luiz será afastado até que se apurem as denúncias. "Se ele for condenado, o Direito Canônico reforça a opção de ajudar a pessoa a se recuperar - e não a vingança", diz o bispo

IGREJA

Como demonstrou o caso Escola Base - em que donos de um colégio infantil em São Paulo tiveram a vida destruída depois de uma falsa denúncia de pedofilia -, todos os padres apontados são inocentes até prova em contrário e merecem o benefício da dúvida até o fim das investigações. Ainda assim, a proliferação das denúncias de pedofilia dentro da Igreja é constrangedora, para os próprios padres, que aceitam o celibato como parte do compromisso cristão, e para os fiéis, que depositam uma confiança sem limites em homens de carne e osso que representam Deus na Terra. Especialistas afirmam que não se pode dizer se há aumento de casos de abuso cometidos por integrantes do clero. O que se pode concluir é que hoje as vítimas denunciam mais - e acabam por forçar a Igreja a assumir posições em público.

Em 1995, relatório feito pela freira e médica americana Maura O'Donohue apontou casos em que padres e missionários obrigavam freiras a fazer sexo com eles e - em alguns deles - a abortar. Por conta disso, a Santa Sé divulgou documento em que reconheceu abusos sexuais em 23 países, entre eles Brasil, Estados Unidos, Itália e Irlanda. Há duas semanas, o papa João Paulo II soltou o segundo documento em menos de um ano, no qual estabelece regras de conduta em casos de denúncias. A ordem é apurar os fatos, sempre.

A Igreja Católica do Brasil é a maior do mundo. São quase 270 dioceses, com cerca de 400 bispos e mais de 15 mil padres. Nessa imensidão, os sopros de transparência ainda são raros. "É bom que seja grande a repercussão dos casos. A experiência mostra que, quando não há exposição pública, o religioso que cometeu o abuso não se emenda", diz o teólogo João Carlos de Almeida, diretor da Faculdade Dehoniana, de Taubaté, em São Paulo.

Os casos, de fato, pipocam no país inteiro. Há pouco menos de um mês, no Recife, uma adolescente de 15 anos teve um bebê. O menino é filho de um padre, Valdeijânio de Souza Melo, de 32 anos. No início do ano passado, ele convidou a garota para ir a um encontro de jovens em uma casa de veraneio. Chefe do grupo de coroinhas da Paróquia de Nossa Senhora de Fátima, ela topou. Quando chegou na praia, encontrou a casa vazia. "Perguntei o que estava acontecendo. Ele sorriu para mim e me beijou", conta ela. A garota ameaçou denunciá-lo. Ele respondeu que, entre um padre e uma menina, todos escolheriam o lado de Deus. As investidas do padre seguiram por mais cinco meses. Em junho do ano passado, a garota descobriu que estava grávida. Valdeijânio reconheceu a paternidade da criança em acordo extrajudicial firmado no dia 30 de agosto na Promotoria de Justiça de Paulista, cidade vizinha. Nele, compromete-se a registrar a criança e enviar cerca de 80% do salário mínimo. Até agora, só cumpriu o pagamento da pensão. O sacerdote ainda está vinculado à Paróquia da Várzea, no Recife. Mas foi suspenso das atividades religiosas. "Isso já é uma grande punição", diz o padre Tarcísio Paiva, responsável pela paróquia. "Eu virei a culpada. As pessoas me xingam nas ruas", reclama a menina. No Rio de Janeiro, o ex-seminarista Alexandre Wander de Almeida também diz ter se transformado em vidraça. Em 1997, ele denunciou o monsenhor José Alves Guedes, o segundo homem na hierarquia eclesiástica de Niterói. Contou que foi molestado por ele no Carnaval de 1991, no confessionário. Quando as denúncias foram publicadas, Alexandre recebeu ameaças por telefone e perdeu o emprego. Hoje é enfermeiro da prefeitura de São Gonçalo. Monsenhor Guedes, que continua no topo da hierarquia de Niterói, não se pronunciou sobre o assunto.

Integrantes do clero envolvidos em denúncias de pedofilia e abuso sexual são julgados por um tribunal eclesiástico com juízes, advogados e promotores formados no Tribunal da Rota Romana, na Itália. Nesses casos, o padre está sujeito à perda da ordenação. No geral, no entanto, a Igreja costuma esperar o resultado do processo que corre na Justiça comum. Enquanto o sacerdote não é condenado pelo Código Penal, recebe da Igreja apenas tratamento psicológico - quando muito.

De qualquer forma, os casos de condenação são raros. No ano passado, o frei capuchinho gaúcho José Ari Degrandis foi condenado a 24 anos de prisão por estuprar duas mulheres. Uma delas, Patrícia Rodrigues, de 21 anos, tinha 16 anos quando foi atacada duas vezes. "Ele me pegou na saída da escola, me jogou em um carro e me levou para um motel", diz ela. Quando a denúncia chegou à Justiça, o padre foi transferido para a Bahia. Já está de volta a Porto Alegre, mas não pode rezar missas. Alega inocência e já recorreu da decisão.

Por sua selvageria, há quem defina a pedofilia e abusos sexuais como o pior crime. Não se pode julgar uma instituição pelos atos de alguns maus integrantes. Mas, quando praticados por integrantes do clero, esses crimes ganham agravantes. "Causado por um religioso, torna-se ainda mais grave", diz dom Angélico Sândalo Bernardino, responsável pelo setor de Vocações e Ministérios da CNBB. "As pessoas se aproximam dos sacerdotes na expectativa do amor gratuito. Os estragos de um abuso praticado por eles são devastadores", diz Gino Nasini, padre italiano que é autor do primeiro estudo sobre abuso sexual cometido por padres no Brasil. Publicado no final do ano passado, o livro Um Espinho na Carne (Editora Santuário) resultou de uma tese apresentada na Andover Newton Theological School em 2000. Questionários distribuídos para 62 padres que se dispuseram a falar sob o manto do anonimato chegaram a dados reveladores. Entre os sacerdotes ouvidos, por exemplo, 77% disseram saber de algum ato de abuso em sua diocese. Quando se descobrem os casos, dizem os pesquisados, a reação geral é tentar salvar a imagem dos padres envolvidos. Os casos das últimas semanas, como se vê, são apenas a face indisfarçável do drama em curso nas sacristias.

Os padres se revelam Novos casos e pesquisa inédita mostram como ocorrem atos de pedofilia e abuso sexual cometidos por padres

Pesquisa inédita com padres brasileiros mostra que os atos de abuso sexual são mais comuns do que se imagina

Você conhece algum caso de abuso sexual em sua diocese, desde 1985?

Os casos que você conhece envolvem um sacerdote e um(a):

Os religiosos envolvidos nessas situações...

FOTOS DOS INSTRUMENTOS DA INQUISIÇAO

http://www.minguta.com.br/tortura/viocom.htm

NOVAS REVELAÇÕES DE PEDOFILIA DE SACERDOTES CATÓLICOS NOS EUA

NOVA YORK, 5 mar (AFP) - A recente condenação de um ex-sacerdote em Boston e a avalanche de revelações em várias cidades do país provocaram suspeitas contra a Igreja Católica dos Estados Unidos, acusada de se silenciar durante décadas sobre os abusos sexuais de sacerdotes pedófilos.

No dia 21 de fevereiro, o ex-sacerdote John Geoghan, de 66 anos de idade, suspenso em 1994 e proibido de ministrar o sacerdócio em 1998, foi condenado a dez anos de prisão por agressão sexual a um menor de idade. Os advogados de dezenas de outros acusadores calculam em 130 o número de suas vítimas.

Algumas semanas antes, o jornal Boston Globe havia revelado que o arcebispo de Boston, o cardeal Bernard Law, sabia há muito tempo dos antecedentes pedófilos de John Geoghan, o que não impediu o então sacerdote de continuar realizando suas atividades clericais.

Submetido a uma intensa pressão dos fiéis e da Justiça, Bernard Law entregou ao promotor da cidade de Boston uma lista com os nomes de 90 sacerdotes, ativos ou aposentados, acusados de agressões sexuais contra menores de idade, o que significa 10% do clero do distrito.

Em todo o país os casos de pedofilia de sacerdotes aumentam, tanto que na semana passada a revista Newsweek consagrou ao assunto a capa de sua edição nacional, com a manchete "Sexo, Vergonha e a Igreja Católica".

Na cidade de Saint Louis (Missouri), o arcebispado anunciou no domingo passado a suspensão de dois sacerdotes suspeitos de comportamentos pedófilos. Na semana passada aconteceu o mesmo com membros do clero católico da Pensilvania, com direito a pedido de desculpas públicas do arcebispo local.

O jornal Los Angeles Times informou na segunda-feira que mais de seis párocos, acusados de atos pedófilos, receberam solicitações para que abandonem suas paróquias ou se aposentem da vida sacerdotal.

Ex-coroinhas e estudantes de estabelecimentos religiosos rompem anos de silêncio e começam a depor.

Uma associação com base em Chicago, Linkup, reúne desde 1991 os "sobreviventes de abusos cometidos pelo clero".

"As investigações realizadas mostram que esses delitos envolvem de 3 a 10% dos membros do clero", acusa seu presidente, Tom Economus. "As investigações também demonstram que durante sua vida, cada pedófilo agride uma média de 265 vítimas".

Para tentar reduzir a revolta de algumas pessoas, o presidente da Conferência Episcopal dos Estados Unidos, o arcebispo Wilton Gregory, manifestou em 19 de fevereiro em um comunicado sua "profunda tristeza por alguns de nossos sacerdotes terem sido culpados desses abusos".

"Confiamos na circunstância de que o número de sacerdotes envolvidos em tais atividades criminosas é baixo", acrescentou, "mas os danos causados não têm medida. Vamos continuar nos desculpando às vítimas e seus pais por este fracasso em nossas responsabilidades pastorais".

Ordens religiosas irlandesas pagarão US$ 116 milhões por abuso

da France Presse, em Dublin (Irlanda) em 30/01/2002 - 21h45

Diversas congregações religiosas irlandesas pagarão cerca de US$ 116 milhões de indenização às vítimas de abusos sexuais e maus tratos em suas instituições de assistência, anunciou hoje o governo da Irlanda.

O governo irlandês também irá indenizar as vítimas de abusos sexuais cometidos nas instituições financiadas pelo Estado administradas por ordens religiosas. Com isso, o valor total a ser pago pode ficar entre US$ 225 e US$ 450 milhões.

O governo irlandês tem um ano para chegar a um acordo com a Igreja sobre esta compensação financeira, que faz parte de um projeto de lei que o parlamento estuda atualmente.

Em 2000, a Irlanda criou uma comissão para esclarecer as violências e abusos sexuais contra crianças recolhidas em orfanatos, centros para menores delinquentes, hospitais e outras instituições.

Esta comissão começou a trabalhar depois que o primeiro-ministro irlandês, Bertie Ahern, pediu perdão às vítimas em nome do Estado, acusado de não cumprir seu papel de vigilância sobre estas instituições.

Mais de 3.000 pessoas se comprometeram a testemunhar perante a comissão sobre os abusos sexuais e os maus tratos sofridos quando eram crianças. A polícia continua investigando várias instituições religiosas e diversos administradores foram presos.

Católico quebra silêncio de 7 anos para descrever os abusos sofridos na igreja

Publicado no Jornal NY TIMES em 18 de Março de 2002

Autor:Richard Lezin Jones

MENDHAM, New Jersey - Mark Vincent Serrano divulgou seu nome, finalmente. Confiança. Paz de espírito. Isso deve vir depois. Mas Serrano, que foi pago em um acordo de uma corte de 1987 pela diocese onde morava a viver em silêncio e anonimato, acredita que agora - especialmente agora - ele não pode mais viver assim.

Principalmente agora, quando cada dia parece trazer uma nova revelação sobre o escândalo sexual de padres da Igreja Católica. E agora que as histórias de tantas outras pessoas friamente relembram a sua história e trazem uma chance de que crianças possam estar sendo vítimas dos mesmos abusos.

"Essas pessoas foram capazes de sobreviver com esse segredo", disse Serrano. "A verdade é tão importante e o segredo é tão prejudicial. Não somente para as pessoas que foram abusadas, mas todas as pessoas precisam ver essa terrível verdade".

A vida de Serrano foi coberta por duas décadas de cicatrização que incluíram, primeiro, uma compreensão do abuso, e progrediu para sessões de psicólogos, passando por memórias reprimidas que de vez em quando estouravam em sua cabeça como flash-back, e agora, enquanto ele fala sobre isso.

Serrano afirmou que quando era coroinha da Igreja St. Joseph foi molestado pelo pastor da época, o reverendo James T. Hanley. Os assédios - uma triste descrição que incluíram sodomia, sexo oral e masturbação forçada - duraram 7 anos, entre 1974 e 1981.

"Era um ritual", declarou recentemente. "Era uma série de abusos demorados".

No começo dos anos 90, o escritório do promotor do município de Morris investigou Hanley, que agora tem 64 anos e foi suspenso da igreja após as acusações, mas decidiu não abrir um caso contra ele porque a lei que permite a abertura desse tipo de casos havia expirado.

As acusações foram anunciadas publicamente em 1995 quando um dos sucessores de Hanley, um padre dissidente que rompeu com o pensamento da igreja, informou a congregação da paróquia das acusações.

Hanley, assim como tem feito desde que as acusações se tornaram públicas, não comenta o assunto.

Quase uma década antes das acusações contra Hanley se tornarem públicas, Serrano e sua família processaram a diocese e em silêncio fizeram um acordo que totalizou US$ 241 mil.

Como parte desse acordo, Serrano e sua família concordaram não discutir o caso. Mas agora, com a igreja sendo alvo de acusações pelos casos de pedofilia contra padres, Serrano decidiu se apresentar.

"A maior barreira a ser vencida é o segredo", declarou.

E como Serrano, jovens de todo o país estão divulgando seus casos de abusos cometidos por padres. Na maioria dos casos, esses jovens também estão quebrando os acordos de confidencialidade estabelecidos sabendo que no atual clima eles têm poucas chances de sofrerem ações legais.

A reavaliação da política das igrejas está sendo impulsionada pelas revelações sobre antigos documentos que mostram que autoridades de igrejas em Boston mesmo sabendo dos casos de abusos permitiram que esses padres continuassem seus trabalhos.

Um desses padres, John J. Geoghan foi condenado no mês passado por molestar um garoto de 10 anos. E no dia 11 de março, a Arquidiocese de Boston concordou em pagar cerca de US$ 30 milhões para as 86 vítimas de Geoghan, que enfrenta ainda outra acusação criminal.

Esses acordos estão além dos US$ 15 milhões pagos para outras acusações contra Geoghan.

Os acontecimentos de Boston se espalharam pelo país e estimularam uma espécie de recompensa para as vítimas de abusos sexuais por clérigos.

"Esse dia ia chegar", afirmou David Clohessy, diretor executivo da associação de vítimas de abusos por padres (Survivor's Network of Those Abused by Priests). "Já dizia Martin Luther King disse? ´Nenhuma mentira vive para sempre´".

Clohessy afirmou que os eventos das últimas semanas se concentraram na questão de abuso sexual cometido por clérigos e algumas vítimas começaram a agir contra isso.

"Eu vejo duas coisas: desespero e esperança", afirmou Clohessy. "É difícil quando você é um sobrevivente dizer a verdade a seus parentes, mais difícil ainda é dizer ao líder da igreja e não é mais fácil repetir isso várias vezes".

"Por esse motivo os sobreviventes estão relutantes para se mostrarem, a não ser que isso ajude a salvar outra criança", afirmou. "Agora eles estão vendo o que as autoridades religiosas estão fazendo em relação a isso".

Geralmente, afirmam os especialistas legais, as vítimas não podem prestar acusações criminais contra esses padres porque a lei estabelecida - que varia de estado para estado - já foram expiradas quando as vítimas apresentam suas queixas.

"Isso é uma dissimulação", afirmou Stephen C. Rubino, advogado da cidade de Margate, em New Jersey, que representa as vítimas de mais de 300 casos de abuso sexual em cerca de 50 dioceses.

Durante a última semana, Rubino disse que perdeu a noção de quantos telefonemas recebeu em seu escritório. "Mais de 200", afirmou. "E nenhuma delas dentro do período da lei que permite a abertura de um caso".

Uma dessas pessoas em particular contou sobre um caso de abuso cometido por padres. "Ele tem 43 anos, e eu fui a primeira pessoa a saber disso", disse Rubino. "E eu não pude fazer nada por ele".

"Estou sendo pressionado", afirmou. "Algumas barreiras psicológicas foram quebradas e as pessoas agora dizem, ´Estou pronto para falar sobre isso´".

Uma dessas pessoas é Mark Vincent Serrano.

A quinta de sete crianças de uma família de católicos, o jovem Mark, assim como a maior parte de sua família, sempre esteve envolvido nas atividades da igreja. Seu pai, Louis, um policial aposentado, era orador da igreja e sua mãe, Patricia, ajudava os grupos de mulheres da paróquia. Mark, assim como seus irmãos, era coroinha da igreja.

Por causa da grande participação da família na igreja, não era incomum que padres como Hanley - ou padre Jim, como era conhecido - interagisse com a família. Na verdade, entre os fiéis era um honra que padres, por exemplo, se reunissem com a família para um jantar ou levasse as crianças para passeios. A confiança não era algo duvidoso.

Então, quando o padre Jim começou a convidar Mark para a paróquia da igreja após a escola, ninguém desconfiou de nada.

"Pelo que eu sabia", diz Mark agora. "Eu estava passeando com meu amigo Jim". Em uma rápida retrospectiva, afirmou Mark, ele percebe que essa era apenas uma desculpa.

"Ele estava me enrolando", afirmou. No começo ele promovia festas. Depois, ele deixou que Mark olhasse revistas pornográficas. Então, os dois assistiam filmes pornográficos em um escritório da paróquia. Eventualmente, afirmou Serrano, o padre começou a tocar o garoto.

"Foi assim que tudo começou", declarou Rubino. "A maior parte das ofensas começaram devagar e depois chegaram a terríveis abusos".

De lá, várias vezes por semana por cinco anos, os abusos aumentaram. No final, deixou Mark com terríveis lembranças para o resto de sua vida.

"Eu ainda me lembro da primeira vez que ele se expôs para mim", recorda. "Eu me lembro da vez que ele me mostrou como se dava um beijo de língua".

"Ele tinha alguns vibradores. Eu me lembro do terrível sentimento que acontecia quando a adrenalina corria pelo meu corpo".

"É uma terrível dicotomia", afirmou Mark recentemente. "Esse homem diz para você que está tudo bem, que esse é nosso segredo. E quando você passa por isso, novas sensações surgem e o contexto que você vive é bizarro".

Hoje, passadas duas décadas, os pais de Mark se arrependem por não terem visto o que acontecia. "É uma dor terrível no coração", declarou a mãe de Mark, Patricia Serrano. "Algumas coisas aconteceram e nós, infelizmente, não vimos". Ela transformou sua dor em uma missão. Uma missão para que outras crianças não passem por isso. Ela patrocinou palestras sobre o assunto na igreja que freqüenta, e organizou seminários que pretendiam alertar as pessoas sobre a situação. "Eu rezo para Deus para que dessa vez eu faça a coisa certa", afirmou.

O pai de Mark também está fazendo sua parte. Um tempo atrás foi à casa de Hanley em New Jersey.

"Oi, Jim", disse. "Eu só quero que você saiba que eu ainda sei onde você mora". Ele disse que o ex-padre simplesmente ficou parado.

E Mark Vincent Serrano continua com o que ele chama de um eterno processo de cicatrização. Ele sabe que tem mais sorte do que a maioria das vítimas de abusos sexuais. Ele é casado e tem três filhos, e ele e sua mulher, Stacy, estão esperando o quarto. Ele também é presidente de uma firma de consultoria em Leesburg, na Virgínia chamada ProActive Communications.

Mesmo assim ele ainda tem que lidar com algumas questões do passado. E hoje ele é um pai superprotetor.

"Se meus filhos quiserem ter aulas de violino, adivinhe? Eu vou participar". E ele está determinado a espalhar sua mensagem.

"Eu conversava com uma pessoa muito religiosa", disse. "Eu perguntei o que essa pessoa achava sobre o escândalo ocorrido em Boston. E ela me respondeu que era um caso isolado. Então eu contei meu caso para ela".

"Quando eu terminei, me levantei e fui embora. Ela pegou na minha mão. Disse que sentia muito", lembrou. "E eu respondi, ´Não sinta isso. Só fique atenta, muito atenta".

Arcebispo polonês renuncia depois de escândalo sexual

Publicado em 28/03/2002

Autor: Katarzyna Mala

VARSÓVIA (Reuters) - O arcebispo polonês acusado de molestar jovens padres renunciou na quinta-feira devido a pressões para acabar com o pior escândalo sexual da história da Igreja Católica na Polônia.

O arcebispo Juliusz Paetz, de 67 anos, disse diante de um comitê de clérigos na diocese de Poznan que iria deixar o posto para proteger a "unidade e a estabilidade" da Igreja, disse a agência de notícias oficial da Igreja católica na Polônia, KAI.

"Nem todo mundo entendeu minha extroversão genuína e espontaneidade em relação às pessoas", disse Paetz, que nega as acusações de abuso sexual, durante sua missa de despedida. "Meus gestos e palavras foram mal-interpretados".

O Vaticano em Roma confirmou que o papa João Paulo II aceitou a renúncia de Paetz, que trabalhou como organizador das viagens do pontífice de 1978 a 1982. O papa não comentou sobre o escândalo em seu país natal.

Uma reportagem de jornal no mês passado dizendo que Paetz forçava jovens padres e seminaristas a envolver-se em atos homossexuais criou a maior crise da Igreja católica na Polônia, onde a hierarquia religiosa ainda exerce grande influência.

Paetz é acusado por outros padres de fazer visitas noturnas aos dormitórios dos seminaristas, de afagar jovens clérigos em público e de usar um túnel subterrâneo de 200 metros para fazer visitas-surpresa a seus eleitos em seus dormitórios.

Padres locais teriam feito uma extensa campanha para conseguir o afastamento de Paetz, conseguindo finalmente que o Vaticano enviasse uma equipe de investigação ao país em novembro.

O escândalo ocorre em um período difícil para a Igreja católica no mundo, que tem sido acusada de não agir adequadamente para impedir o abuso sexual de padres a crianças nos Estados Unidos e na Irlanda.

Na semana passada, o papa quebrou o silêncio sobre o assunto, dizendo em uma carta aos clérigos que os padres católicos que abusam sexualmente de menores estão promovendo a pior forma possível da maldade.

Paetz não foi acusado de pedofilia, mas de anos de abuso homossexual de jovens padres e seminaristas.

ESCÂNDALOS NA IGREJA AINDA ESTÃO SEM RESPOSTA MAUREEN DOWD

Publicado no Jornal O ESTADO DE S. PAULO em 26-03-2002

O papa é infalível, mas nem sempre tem razão. O Santo Padre lançou uma carta com breves observações a respeito da praga de perversidade que devasta a Igreja Católica. Mas não escreveu a carta nem a leu em voz alta e seu principal tema foi a penitência. Ao que parece, o Vaticano pensa que a penitência é para as outras pessoas.

As poucas frases a respeito do escândalo de pedofilia são mais simpáticas aos padres acusados do que às vítimas maltratadas. O papa João Paulo II jamais se dirigiu aos católicos cujas vidas foram gravemente feridas. A ferida que mais o preocupa é a ferida da Igreja. Admitir que existem algumas 'laranjas podres' é uma coisa inteiramente inadequada.

O papa cita "nossos irmãos" que sucumbiram ao "mysterium iniquitatis" (mistério da iniqüidade). Chamar isso de mistério do mal é vaporizar o problema. Não existe nada de muito misterioso no caso da pedofilia. É simplesmente um crime.

Ao usar uma linguagem eclesial para caracterizar esse fato, o papa simplesmente reforça o imenso conceito institucional que levou à grande cobertura desses fatos pela Igreja: a sensação de que a estrutura hierárquica semelhante a um Exército nunca fala honestamente a respeito de suas próprias falhas. [e]

Original em: http://www.estado.com.br/editorias/2002/03/26/ger007.html

UMA 'CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO', EM NOME DA FÉ

Autor: MICHAEL KELLY, The Washington Post

Publicado no Jornal O ESTADO DE S. PAULO em 24-03-2002

Durante pelo menos algumas décadas, um grande número de padres usou seus escritórios - e a excepcional confiança manifestada pelo título de "padre" que lhes é conferido - para se lançar como predadores sobre meninos adolescentes que aprenderam a considerá-los, literalmente, como figuras paternas. Esse padrão de abuso criminoso não se limitou a alguns poucos padres ou algumas paróquias, mas envolveu a Igreja Católica nos Estados Unidos como um todo e como uma instituição. Até agora, 2 mil sacerdotes foram formalmente acusados. Em todos os casos se pode ver o mesmo padrão: primeiramente, existem suspeitas de que um padre está abusando de coroinhas, então vêm as queixas, e depois, queixas e mais queixas. Os superiores diocesanos são informados. Os advogados da diocese também tomam conhecimento do fato. Pede-se então aos queixosos que se mantenham em silêncio pelo bem da Igreja e da fé. Ninguém fala aos paroquianos, ninguém conta à polícia, ninguém diz nada às crianças. Os advogados (bons católicos) fazem obstrução; os médicos (também bons católicos) declaram que o padre está curado ou suficientemente curado; o bispo ordena a transferência do padre para outra paróquia. E toda a coisa terrível se repete. Quando necessário, a Igreja paga para que as pessoas não falem, comprando assim mais alguns crimes de silêncio. Finalmente, depois que muitas vidas foram estragadas, vêm a revelação pública, o escândalo e um constrangido pedido de desculpas. Vamos falar claramente: não se trata de atos criminosos individuais ou de falhas individuais na liderança. Trata-se da corrupção sistemática de uma instituição. Trata-se da Igreja como hierarquia. Trata-se de uma instituição poderosa, que usa seu poder para ocultar e perpetuar - conscientemente - crimes (e pecados) da mais perversa natureza contra as almas mais inocentes e vulneráveis, que confiaram na Igreja.

Original em: http://www.estado.com.br/editorias/2002/03/24/ger008.html

ESCÂNDALOS ACIRRAM DISCUSSÃO SOBRE CELIBATO

Publicado no Jornal O Estado de S. Paulo em 24/03/2002

Monsenhor di Falco é bispo auxiliar de Paris. É um homem muito bonito, sedutor, brilhante. Durante muito tempo, administrou as relações públicas da diocese de Paris, de modo que foi introduzido nos meios mais "em moda" da capital. Hoje, monsenhor di Falco é objeto de uma denúncia na Justiça. Um homem de 41 anos garante que foi violentado diversas vezes por monsenhor di Falco, na época em que foi capelão de uma escola de Paris. A denúncia foi julgada inadmissível, pois os supostos fatos se deram em 1972 e, portanto, prescreveram. Há poucos anos, o teólogo alemão Eugene Drewermann calculou que, na Alemanha, dois de cada três padres viviam em concubinato. No Zimbábue, na África, quebra-se a cabeça para encontrar um candidato à dignidade de bispo, pois não há quase nenhum padre sem uma concubina. Sustenta-se que, nos Estados Unidos, 20 mil dos 40 mil padres respeitam a lei do celibato.

Original em: http://www.estado.com.br/editorias/2002/03/24/ger004.html



RELIGIÃO É VENENO

Voltar

Hosted by www.Geocities.ws

1