Publicado na Revista Epoca em 21/01/2001
Na manhã da sexta-feira 11 o frei
franciscano Alexander Nicolaus Weber, de 34 anos, acordou cedo
para tomar café da manhã na Pousada Raposo Chalé,
em Rio de Contas, município perto da Chapada Diamantina.
Quando começava a se servir, foi interrompido por uma
professora hospedada em um chalé a 15 metros do seu. A
mulher o acusava de ter tirado fotografias pornográficas
de seu filho de 6 anos. Perplexo, frei Weber afirmou que havia
algum engano. Ainda assim, concordou em levar sua câmera
fotográfica para a delegacia mais próxima. Durante
o interrogatório, ele se disse surpreso com aquilo tudo -
e chorou. Revelado às pressas, o filme de sua máquina
mostrou apenas flagrantes de paisagens. Frei Weber estava
prestes a ser liberado por falta de provas quando a mãe
do menino resolveu continuar a investigação por
conta própria. Voltou para a pousada e invadiu o quarto
do padre. Encontrou uma máquina fotográfica
digital em cima da cama e a levou para o distrito. Quando as
novas fotos foram exibidas, restou ao frei pedir desculpas. "Perdi
o controle", confessou ele, conforme consta do boletim de
ocorrência. A reportagem de ÉPOCA conversou com
cinco pessoas que viram as fotos, em momentos diferentes. Todas
descrevem uma seqüência de 19 poses, em que o garoto
aparece deitado em uma cama, tirando as roupas e sendo tocado
pelo padre. Na última da série, é o próprio
frei quem aparece, em foto tirada pelo menino.
Frei Weber está preso em Brumado, a
70 quilômetros de Rio de Contas. É acusado de
atentado violento ao pudor, crime que pode lhe render de seis a
dez anos de cadeia. Seus advogados tentam agora enquadrá-lo
no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente,
que pune quem fotografa menores em situações
pornográficas. Nesse caso, a pena é de um a quatro
anos de reclusão. "As fotos são chocantes,
pornográficas. Mas foi um caso isolado. O frei não
demonstra nenhuma tara", diz José Gomes, advogado do
padre.
Ameaçado pelos outros 55 presos do
distrito, frei Weber está em uma cela adaptada, de 3
metros quadrados. Em entrevista a ÉPOCA, falou de sua
trajetória no Brasil, mas se recusou a comentar o episódio.
"Não vou dizer se foi a primeira vez porque isso vai
ser definido pelas investigações. Mas sei que vou
ser expulso da Congregação", disse. O padre
nasceu em Rheda-Wiedenbrück, uma vila rural no oeste da
Alemanha. Foi alfabetizado por padres e passou a adolescência
no seminário. Em 1989, entrou para a Ordem dos Frades
Menores, que costuma enviar missionários e recursos para
obras sociais no Brasil. Quatro anos depois, foi cuidar de crianças
desnutridas em hospitais de Pernambuco. "Descobri minha
vocação para ser enfermeiro. Achei a coisa mais
importante do mundo lidar com crianças tristes e ver o
olhar ganhar vida de novo, a pele voltar a ter cor", conta.
Até um mês atrás, ele trabalhava em uma
creche em João Pessoa que abrigava 45 crianças -
fechada por falta de verbas.
Na noite da quinta-feira 10, a professora
precisou deixar a pousada para participar de um curso e não
teve medo de deixar o filho por ali, perto de pessoas respeitáveis.
Quando voltou, encontrou o garoto dormindo. Mas, na manhã
seguinte, o menino disse: "O tio tirou fotos minhas no chalé
dele". Em seguida, contou que foi chamado pelo frei para
brincar de artista de televisão. Aos poucos, foi dando
mais detalhes. Quando soube da denúncia, um casal de
amigos alemães que viajava com o padre, Iris Zenker, de
44 anos, e Dirk Ruhling, de 43, duvidou que ele pudesse ter
cometido o crime. Depois de ver as fotos na delegacia, no
entanto, Iris gritou: "Você é um monstro e
merece passar o resto da vida na cadeia!". Liberados, os
turistas voltaram para a Alemanha. Desde que viu as fotografias,
a professora mergulhou na apatia. O menino ainda não
entendeu o que aconteceu. Diz que ficou amigo do frei - pediu
para brincar com ele outra vez.
Cinco dias após a prisão de
Weber, outro integrante da Ordem dos Frades Menores foi alvo de
um escândalo, desta vez em Santana do Acaraú, município
de 26 mil habitantes a 250 quilômetros de Fortaleza. Na
quarta-feira passada, a mãe de uma adolescente foi até
uma delegacia dizer que sua filha havia sido molestada pelo frei
Sebastião Luiz Tomaz, de 69 anos. Quando soube da denúncia,
o padre saiu da cidade. A notícia se espalhou e, horas
depois, o distrito registrava relatos de 19 meninas - com idade
entre 10 e 16 anos - que diziam ter tido algum tipo de contato
sexual com o padre em troca de roupas e dinheiro. A casa em que
ele mora foi cercada por uma multidão.
Na manhã da sexta-feira, nove crianças
e adolescentes submeteram-se a exames no Instituto Médico-Legal
de Fortaleza. Frei Luiz é ligado à linha
progressista da Igreja. Nos anos 70, foi auxiliar do bispo dom
Adriano Hypólito, no Rio de Janeiro. Em 1998, foi seqüestrado
na Baixada Fluminense e pediu transferência para o Ceará.
O bispo de Sobral, dom Aldo Di Cillo Pagotto, afirmou que um
conselho presbiteral deverá se encarregar do caso. E frei
Luiz será afastado até que se apurem as denúncias.
"Se ele for condenado, o Direito Canônico reforça
a opção de ajudar a pessoa a se recuperar - e não
a vingança", diz o bispo
IGREJA
Como demonstrou o caso Escola Base - em
que donos de um colégio infantil em São Paulo
tiveram a vida destruída depois de uma falsa denúncia
de pedofilia -, todos os padres apontados são inocentes
até prova em contrário e merecem o benefício
da dúvida até o fim das investigações.
Ainda assim, a proliferação das denúncias
de pedofilia dentro da Igreja é constrangedora, para os
próprios padres, que aceitam o celibato como parte do
compromisso cristão, e para os fiéis, que
depositam uma confiança sem limites em homens de carne e
osso que representam Deus na Terra. Especialistas afirmam que não
se pode dizer se há aumento de casos de abuso cometidos
por integrantes do clero. O que se pode concluir é que
hoje as vítimas denunciam mais - e acabam por forçar
a Igreja a assumir posições em público.
Em 1995, relatório feito pela
freira e médica americana Maura O'Donohue apontou casos
em que padres e missionários obrigavam freiras a fazer
sexo com eles e - em alguns deles - a abortar. Por conta disso,
a Santa Sé divulgou documento em que reconheceu abusos
sexuais em 23 países, entre eles Brasil, Estados Unidos,
Itália e Irlanda. Há duas semanas, o papa João
Paulo II soltou o segundo documento em menos de um ano, no qual
estabelece regras de conduta em casos de denúncias. A
ordem é apurar os fatos, sempre.
A Igreja Católica do Brasil é
a maior do mundo. São quase 270 dioceses, com cerca de
400 bispos e mais de 15 mil padres. Nessa imensidão, os
sopros de transparência ainda são raros. "É
bom que seja grande a repercussão dos casos. A experiência
mostra que, quando não há exposição
pública, o religioso que cometeu o abuso não se
emenda", diz o teólogo João Carlos de
Almeida, diretor da Faculdade Dehoniana, de Taubaté, em São
Paulo.
Os casos, de fato, pipocam no país
inteiro. Há pouco menos de um mês, no Recife, uma
adolescente de 15 anos teve um bebê. O menino é
filho de um padre, Valdeijânio de Souza Melo, de 32 anos.
No início do ano passado, ele convidou a garota para ir a
um encontro de jovens em uma casa de veraneio. Chefe do grupo de
coroinhas da Paróquia de Nossa Senhora de Fátima,
ela topou. Quando chegou na praia, encontrou a casa vazia. "Perguntei
o que estava acontecendo. Ele sorriu para mim e me beijou",
conta ela. A garota ameaçou denunciá-lo. Ele
respondeu que, entre um padre e uma menina, todos escolheriam o
lado de Deus. As investidas do padre seguiram por mais cinco
meses. Em junho do ano passado, a garota descobriu que estava grávida.
Valdeijânio reconheceu a paternidade da criança em
acordo extrajudicial firmado no dia 30 de agosto na Promotoria
de Justiça de Paulista, cidade vizinha. Nele,
compromete-se a registrar a criança e enviar cerca de 80%
do salário mínimo. Até agora, só
cumpriu o pagamento da pensão. O sacerdote ainda está
vinculado à Paróquia da Várzea, no Recife.
Mas foi suspenso das atividades religiosas. "Isso já
é uma grande punição", diz o padre
Tarcísio Paiva, responsável pela paróquia. "Eu
virei a culpada. As pessoas me xingam nas ruas", reclama a
menina. No Rio de Janeiro, o ex-seminarista Alexandre Wander de
Almeida também diz ter se transformado em vidraça.
Em 1997, ele denunciou o monsenhor José Alves Guedes, o
segundo homem na hierarquia eclesiástica de Niterói.
Contou que foi molestado por ele no Carnaval de 1991, no
confessionário. Quando as denúncias foram
publicadas, Alexandre recebeu ameaças por telefone e
perdeu o emprego. Hoje é enfermeiro da prefeitura de São
Gonçalo. Monsenhor Guedes, que continua no topo da
hierarquia de Niterói, não se pronunciou sobre o
assunto.
Integrantes do clero envolvidos em denúncias
de pedofilia e abuso sexual são julgados por um tribunal
eclesiástico com juízes, advogados e promotores
formados no Tribunal da Rota Romana, na Itália. Nesses
casos, o padre está sujeito à perda da ordenação.
No geral, no entanto, a Igreja costuma esperar o resultado do
processo que corre na Justiça comum. Enquanto o sacerdote
não é condenado pelo Código Penal, recebe
da Igreja apenas tratamento psicológico - quando muito.
De qualquer forma, os casos de condenação
são raros. No ano passado, o frei capuchinho gaúcho
José Ari Degrandis foi condenado a 24 anos de prisão
por estuprar duas mulheres. Uma delas, Patrícia
Rodrigues, de 21 anos, tinha 16 anos quando foi atacada duas
vezes. "Ele me pegou na saída da escola, me jogou em
um carro e me levou para um motel", diz ela. Quando a denúncia
chegou à Justiça, o padre foi transferido para a
Bahia. Já está de volta a Porto Alegre, mas não
pode rezar missas. Alega inocência e já recorreu da
decisão.
Por sua selvageria, há quem defina
a pedofilia e abusos sexuais como o pior crime. Não se
pode julgar uma instituição pelos atos de alguns
maus integrantes. Mas, quando praticados por integrantes do
clero, esses crimes ganham agravantes. "Causado por um
religioso, torna-se ainda mais grave", diz dom Angélico
Sândalo Bernardino, responsável pelo setor de Vocações
e Ministérios da CNBB. "As pessoas se aproximam dos
sacerdotes na expectativa do amor gratuito. Os estragos de um
abuso praticado por eles são devastadores", diz Gino
Nasini, padre italiano que é autor do primeiro estudo
sobre abuso sexual cometido por padres no Brasil. Publicado no
final do ano passado, o livro Um Espinho na Carne (Editora Santuário)
resultou de uma tese apresentada na Andover Newton Theological
School em 2000. Questionários distribuídos para 62
padres que se dispuseram a falar sob o manto do anonimato
chegaram a dados reveladores. Entre os sacerdotes ouvidos, por
exemplo, 77% disseram saber de algum ato de abuso em sua
diocese. Quando se descobrem os casos, dizem os pesquisados, a
reação geral é tentar salvar a imagem dos
padres envolvidos. Os casos das últimas semanas, como se
vê, são apenas a face indisfarçável
do drama em curso nas sacristias.
Os padres se
revelam Novos casos e pesquisa inédita mostram
como ocorrem atos de pedofilia e abuso sexual cometidos por
padres
Pesquisa inédita com padres
brasileiros mostra que os atos de abuso sexual são
mais comuns do que se imagina
Você conhece algum caso de abuso
sexual em sua diocese, desde 1985?
![](http://epoca.globo.com/semanal/_materias/soci1d.jpg)
Os casos que você conhece
envolvem um sacerdote e um(a):
![](http://epoca.globo.com/semanal/_materias/soci1e.jpg)
Os religiosos envolvidos nessas situações...
![](http://epoca.globo.com/semanal/_materias/soci1f.jpg)
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FOTOS DOS INSTRUMENTOS DA INQUISIÇAO
http://www.minguta.com.br/tortura/viocom.htm
NOVAS REVELAÇÕES
DE PEDOFILIA DE SACERDOTES CATÓLICOS NOS EUA
NOVA YORK, 5 mar (AFP) - A recente condenação
de um ex-sacerdote em Boston e a avalanche de revelações
em várias cidades do país provocaram suspeitas
contra a Igreja Católica dos Estados Unidos, acusada de
se silenciar durante décadas sobre os abusos sexuais de
sacerdotes pedófilos.
No dia 21 de fevereiro, o ex-sacerdote
John Geoghan, de 66 anos de idade, suspenso em 1994 e proibido
de ministrar o sacerdócio em 1998, foi condenado a dez
anos de prisão por agressão sexual a um menor de
idade. Os advogados de dezenas de outros acusadores calculam em
130 o número de suas vítimas.
Algumas semanas antes, o jornal Boston
Globe havia revelado que o arcebispo de Boston, o cardeal
Bernard Law, sabia há muito tempo dos antecedentes pedófilos
de John Geoghan, o que não impediu o então
sacerdote de continuar realizando suas atividades clericais.
Submetido a uma intensa pressão dos
fiéis e da Justiça, Bernard Law entregou ao
promotor da cidade de Boston uma lista com os nomes de 90
sacerdotes, ativos ou aposentados, acusados de agressões
sexuais contra menores de idade, o que significa 10% do clero do
distrito.
Em todo o país os casos de
pedofilia de sacerdotes aumentam, tanto que na semana passada a
revista Newsweek consagrou ao assunto a capa de sua edição
nacional, com a manchete "Sexo, Vergonha e a Igreja Católica".
Na cidade de Saint Louis (Missouri), o
arcebispado anunciou no domingo passado a suspensão de
dois sacerdotes suspeitos de comportamentos pedófilos. Na
semana passada aconteceu o mesmo com membros do clero católico
da Pensilvania, com direito a pedido de desculpas públicas
do arcebispo local.
O jornal Los Angeles Times informou na
segunda-feira que mais de seis párocos, acusados de atos
pedófilos, receberam solicitações para que
abandonem suas paróquias ou se aposentem da vida
sacerdotal.
Ex-coroinhas e estudantes de
estabelecimentos religiosos rompem anos de silêncio e começam
a depor.
Uma associação com base em
Chicago, Linkup, reúne desde 1991 os "sobreviventes
de abusos cometidos pelo clero".
"As investigações
realizadas mostram que esses delitos envolvem de 3 a 10% dos
membros do clero", acusa seu presidente, Tom Economus. "As
investigações também demonstram que durante
sua vida, cada pedófilo agride uma média de 265 vítimas".
Para tentar reduzir a revolta de algumas
pessoas, o presidente da Conferência Episcopal dos Estados
Unidos, o arcebispo Wilton Gregory, manifestou em 19 de
fevereiro em um comunicado sua "profunda tristeza por
alguns de nossos sacerdotes terem sido culpados desses abusos".
"Confiamos na circunstância de
que o número de sacerdotes envolvidos em tais atividades
criminosas é baixo", acrescentou, "mas os danos
causados não têm medida. Vamos continuar nos
desculpando às vítimas e seus pais por este
fracasso em nossas responsabilidades pastorais".
Ordens religiosas
irlandesas pagarão US$ 116 milhões por abuso
da France Presse, em Dublin (Irlanda) em
30/01/2002 - 21h45
Diversas congregações
religiosas irlandesas pagarão cerca de US$ 116 milhões
de indenização às vítimas de abusos
sexuais e maus tratos em suas instituições de
assistência, anunciou hoje o governo da Irlanda.
O governo irlandês também irá
indenizar as vítimas de abusos sexuais cometidos nas
instituições financiadas pelo Estado administradas
por ordens religiosas. Com isso, o valor total a ser pago pode
ficar entre US$ 225 e US$ 450 milhões.
O governo irlandês tem um ano para
chegar a um acordo com a Igreja sobre esta compensação
financeira, que faz parte de um projeto de lei que o parlamento
estuda atualmente.
Em 2000, a Irlanda criou uma comissão
para esclarecer as violências e abusos sexuais contra
crianças recolhidas em orfanatos, centros para menores
delinquentes, hospitais e outras instituições.
Esta comissão começou a
trabalhar depois que o primeiro-ministro irlandês, Bertie
Ahern, pediu perdão às vítimas em nome do
Estado, acusado de não cumprir seu papel de vigilância
sobre estas instituições.
Mais de 3.000 pessoas se comprometeram a
testemunhar perante a comissão sobre os abusos sexuais e
os maus tratos sofridos quando eram crianças. A polícia
continua investigando várias instituições
religiosas e diversos administradores foram presos.
Católico quebra
silêncio de 7 anos para descrever os abusos sofridos na
igreja
Publicado no Jornal NY TIMES em 18 de Março
de 2002
Autor:Richard Lezin Jones
MENDHAM, New Jersey - Mark Vincent Serrano
divulgou seu nome, finalmente. Confiança. Paz de espírito.
Isso deve vir depois. Mas Serrano, que foi pago em um acordo de
uma corte de 1987 pela diocese onde morava a viver em silêncio
e anonimato, acredita que agora - especialmente agora - ele não
pode mais viver assim.
Principalmente agora, quando cada dia
parece trazer uma nova revelação sobre o escândalo
sexual de padres da Igreja Católica. E agora que as histórias
de tantas outras pessoas friamente relembram a sua história
e trazem uma chance de que crianças possam estar sendo vítimas
dos mesmos abusos.
"Essas pessoas foram capazes de
sobreviver com esse segredo", disse Serrano. "A
verdade é tão importante e o segredo é tão
prejudicial. Não somente para as pessoas que foram
abusadas, mas todas as pessoas precisam ver essa terrível
verdade".
A vida de Serrano foi coberta por duas décadas
de cicatrização que incluíram, primeiro,
uma compreensão do abuso, e progrediu para sessões
de psicólogos, passando por memórias reprimidas
que de vez em quando estouravam em sua cabeça como
flash-back, e agora, enquanto ele fala sobre isso.
Serrano afirmou que quando era coroinha da
Igreja St. Joseph foi molestado pelo pastor da época, o
reverendo James T. Hanley. Os assédios - uma triste
descrição que incluíram sodomia, sexo oral
e masturbação forçada - duraram 7 anos,
entre 1974 e 1981.
"Era um ritual", declarou
recentemente. "Era uma série de abusos demorados".
No começo dos anos 90, o escritório
do promotor do município de Morris investigou Hanley, que
agora tem 64 anos e foi suspenso da igreja após as acusações,
mas decidiu não abrir um caso contra ele porque a lei que
permite a abertura desse tipo de casos havia expirado.
As acusações foram
anunciadas publicamente em 1995 quando um dos sucessores de
Hanley, um padre dissidente que rompeu com o pensamento da
igreja, informou a congregação da paróquia
das acusações.
Hanley, assim como tem feito desde que as
acusações se tornaram públicas, não
comenta o assunto.
Quase uma década antes das acusações
contra Hanley se tornarem públicas, Serrano e sua família
processaram a diocese e em silêncio fizeram um acordo que
totalizou US$ 241 mil.
Como parte desse acordo, Serrano e sua família
concordaram não discutir o caso. Mas agora, com a igreja
sendo alvo de acusações pelos casos de pedofilia
contra padres, Serrano decidiu se apresentar.
"A maior barreira a ser vencida é
o segredo", declarou.
E como Serrano, jovens de todo o país
estão divulgando seus casos de abusos cometidos por
padres. Na maioria dos casos, esses jovens também estão
quebrando os acordos de confidencialidade estabelecidos sabendo
que no atual clima eles têm poucas chances de sofrerem ações
legais.
A reavaliação da política
das igrejas está sendo impulsionada pelas revelações
sobre antigos documentos que mostram que autoridades de igrejas
em Boston mesmo sabendo dos casos de abusos permitiram que esses
padres continuassem seus trabalhos.
Um desses padres, John J. Geoghan foi
condenado no mês passado por molestar um garoto de 10
anos. E no dia 11 de março, a Arquidiocese de Boston
concordou em pagar cerca de US$ 30 milhões para as 86 vítimas
de Geoghan, que enfrenta ainda outra acusação
criminal.
Esses acordos estão além dos
US$ 15 milhões pagos para outras acusações
contra Geoghan.
Os acontecimentos de Boston se espalharam
pelo país e estimularam uma espécie de recompensa
para as vítimas de abusos sexuais por clérigos.
"Esse dia ia chegar", afirmou
David Clohessy, diretor executivo da associação de
vítimas de abusos por padres (Survivor's Network of Those
Abused by Priests). "Já dizia Martin Luther King
disse? ´Nenhuma mentira vive para sempre´".
Clohessy afirmou que os eventos das últimas
semanas se concentraram na questão de abuso sexual
cometido por clérigos e algumas vítimas começaram
a agir contra isso.
"Eu vejo duas coisas: desespero e
esperança", afirmou Clohessy. "É difícil
quando você é um sobrevivente dizer a verdade a
seus parentes, mais difícil ainda é dizer ao líder
da igreja e não é mais fácil repetir isso várias
vezes".
"Por esse motivo os sobreviventes estão
relutantes para se mostrarem, a não ser que isso ajude a
salvar outra criança", afirmou. "Agora eles estão
vendo o que as autoridades religiosas estão fazendo em
relação a isso".
Geralmente, afirmam os especialistas
legais, as vítimas não podem prestar acusações
criminais contra esses padres porque a lei estabelecida - que
varia de estado para estado - já foram expiradas quando
as vítimas apresentam suas queixas.
"Isso é uma dissimulação",
afirmou Stephen C. Rubino, advogado da cidade de Margate, em New
Jersey, que representa as vítimas de mais de 300 casos de
abuso sexual em cerca de 50 dioceses.
Durante a última semana, Rubino
disse que perdeu a noção de quantos telefonemas
recebeu em seu escritório. "Mais de 200",
afirmou. "E nenhuma delas dentro do período da lei
que permite a abertura de um caso".
Uma dessas pessoas em particular contou
sobre um caso de abuso cometido por padres. "Ele tem 43
anos, e eu fui a primeira pessoa a saber disso", disse
Rubino. "E eu não pude fazer nada por ele".
"Estou sendo pressionado",
afirmou. "Algumas barreiras psicológicas foram
quebradas e as pessoas agora dizem, ´Estou pronto para
falar sobre isso´".
Uma dessas pessoas é Mark Vincent
Serrano.
A quinta de sete crianças de uma
família de católicos, o jovem Mark, assim como a
maior parte de sua família, sempre esteve envolvido nas
atividades da igreja. Seu pai, Louis, um policial aposentado,
era orador da igreja e sua mãe, Patricia, ajudava os
grupos de mulheres da paróquia. Mark, assim como seus irmãos,
era coroinha da igreja.
Por causa da grande participação
da família na igreja, não era incomum que padres
como Hanley - ou padre Jim, como era conhecido - interagisse com
a família. Na verdade, entre os fiéis era um honra
que padres, por exemplo, se reunissem com a família para
um jantar ou levasse as crianças para passeios. A confiança
não era algo duvidoso.
Então, quando o padre Jim começou
a convidar Mark para a paróquia da igreja após a
escola, ninguém desconfiou de nada.
"Pelo que eu sabia", diz Mark
agora. "Eu estava passeando com meu amigo Jim". Em uma
rápida retrospectiva, afirmou Mark, ele percebe que essa
era apenas uma desculpa.
"Ele estava me enrolando",
afirmou. No começo ele promovia festas. Depois, ele
deixou que Mark olhasse revistas pornográficas. Então,
os dois assistiam filmes pornográficos em um escritório
da paróquia. Eventualmente, afirmou Serrano, o padre começou
a tocar o garoto.
"Foi assim que tudo começou",
declarou Rubino. "A maior parte das ofensas começaram
devagar e depois chegaram a terríveis abusos".
De lá, várias vezes por
semana por cinco anos, os abusos aumentaram. No final, deixou
Mark com terríveis lembranças para o resto de sua
vida.
"Eu ainda me lembro da primeira vez
que ele se expôs para mim", recorda. "Eu me
lembro da vez que ele me mostrou como se dava um beijo de língua".
"Ele tinha alguns vibradores. Eu me
lembro do terrível sentimento que acontecia quando a
adrenalina corria pelo meu corpo".
"É uma terrível
dicotomia", afirmou Mark recentemente. "Esse homem diz
para você que está tudo bem, que esse é
nosso segredo. E quando você passa por isso, novas sensações
surgem e o contexto que você vive é bizarro".
Hoje, passadas duas décadas, os
pais de Mark se arrependem por não terem visto o que
acontecia. "É uma dor terrível no coração",
declarou a mãe de Mark, Patricia Serrano. "Algumas
coisas aconteceram e nós, infelizmente, não vimos".
Ela transformou sua dor em uma missão. Uma missão
para que outras crianças não passem por isso. Ela
patrocinou palestras sobre o assunto na igreja que freqüenta,
e organizou seminários que pretendiam alertar as pessoas
sobre a situação. "Eu rezo para Deus para que
dessa vez eu faça a coisa certa", afirmou.
O pai de Mark também está
fazendo sua parte. Um tempo atrás foi à casa de
Hanley em New Jersey.
"Oi, Jim", disse. "Eu só
quero que você saiba que eu ainda sei onde você mora".
Ele disse que o ex-padre simplesmente ficou parado.
E Mark Vincent Serrano continua com o que
ele chama de um eterno processo de cicatrização.
Ele sabe que tem mais sorte do que a maioria das vítimas
de abusos sexuais. Ele é casado e tem três filhos,
e ele e sua mulher, Stacy, estão esperando o quarto. Ele
também é presidente de uma firma de consultoria em
Leesburg, na Virgínia chamada ProActive Communications.
Mesmo assim ele ainda tem que lidar com
algumas questões do passado. E hoje ele é um pai
superprotetor.
"Se meus filhos quiserem ter aulas de
violino, adivinhe? Eu vou participar". E ele está
determinado a espalhar sua mensagem.
"Eu conversava com uma pessoa muito
religiosa", disse. "Eu perguntei o que essa pessoa
achava sobre o escândalo ocorrido em Boston. E ela me
respondeu que era um caso isolado. Então eu contei meu
caso para ela".
"Quando eu terminei, me levantei e
fui embora. Ela pegou na minha mão. Disse que sentia
muito", lembrou. "E eu respondi, ´Não
sinta isso. Só fique atenta, muito atenta".
Arcebispo polonês
renuncia depois de escândalo sexual
Publicado em 28/03/2002
Autor: Katarzyna Mala
VARSÓVIA (Reuters) - O arcebispo
polonês acusado de molestar jovens padres renunciou na
quinta-feira devido a pressões para acabar com o pior escândalo
sexual da história da Igreja Católica na Polônia.
O arcebispo Juliusz Paetz, de 67 anos,
disse diante de um comitê de clérigos na diocese de
Poznan que iria deixar o posto para proteger a "unidade e a
estabilidade" da Igreja, disse a agência de notícias
oficial da Igreja católica na Polônia, KAI.
"Nem todo mundo entendeu minha
extroversão genuína e espontaneidade em relação
às pessoas", disse Paetz, que nega as acusações
de abuso sexual, durante sua missa de despedida. "Meus
gestos e palavras foram mal-interpretados".
O Vaticano em Roma confirmou que o papa João
Paulo II aceitou a renúncia de Paetz, que trabalhou como
organizador das viagens do pontífice de 1978 a 1982. O
papa não comentou sobre o escândalo em seu país
natal.
Uma reportagem de jornal no mês
passado dizendo que Paetz forçava jovens padres e
seminaristas a envolver-se em atos homossexuais criou a maior
crise da Igreja católica na Polônia, onde a
hierarquia religiosa ainda exerce grande influência.
Paetz é acusado por outros padres
de fazer visitas noturnas aos dormitórios dos
seminaristas, de afagar jovens clérigos em público
e de usar um túnel subterrâneo de 200 metros para
fazer visitas-surpresa a seus eleitos em seus dormitórios.
Padres locais teriam feito uma extensa
campanha para conseguir o afastamento de Paetz, conseguindo
finalmente que o Vaticano enviasse uma equipe de investigação
ao país em novembro.
O escândalo ocorre em um período
difícil para a Igreja católica no mundo, que tem
sido acusada de não agir adequadamente para impedir o
abuso sexual de padres a crianças nos Estados Unidos e na
Irlanda.
Na semana passada, o papa quebrou o silêncio
sobre o assunto, dizendo em uma carta aos clérigos que os
padres católicos que abusam sexualmente de menores estão
promovendo a pior forma possível da maldade.
Paetz não foi acusado de pedofilia,
mas de anos de abuso homossexual de jovens padres e
seminaristas.
ESCÂNDALOS NA
IGREJA AINDA ESTÃO SEM RESPOSTA MAUREEN DOWD
Publicado no Jornal O ESTADO DE S. PAULO
em 26-03-2002
O papa é infalível, mas nem
sempre tem razão. O Santo Padre lançou uma carta
com breves observações a respeito da praga de
perversidade que devasta a Igreja Católica. Mas não
escreveu a carta nem a leu em voz alta e seu principal tema foi
a penitência. Ao que parece, o Vaticano pensa que a penitência
é para as outras pessoas.
As poucas frases a respeito do escândalo
de pedofilia são mais simpáticas aos padres
acusados do que às vítimas maltratadas. O papa João
Paulo II jamais se dirigiu aos católicos cujas vidas
foram gravemente feridas. A ferida que mais o preocupa é
a ferida da Igreja. Admitir que existem algumas 'laranjas
podres' é uma coisa inteiramente inadequada.
O papa cita "nossos irmãos"
que sucumbiram ao "mysterium iniquitatis" (mistério
da iniqüidade). Chamar isso de mistério do mal é
vaporizar o problema. Não existe nada de muito misterioso
no caso da pedofilia. É simplesmente um crime.
Ao usar uma linguagem eclesial para
caracterizar esse fato, o papa simplesmente reforça o
imenso conceito institucional que levou à grande
cobertura desses fatos pela Igreja: a sensação de
que a estrutura hierárquica semelhante a um Exército
nunca fala honestamente a respeito de suas próprias
falhas. [e]
Original em:
http://www.estado.com.br/editorias/2002/03/26/ger007.html
UMA 'CONSPIRAÇÃO
DO SILÊNCIO', EM NOME DA FÉ
Autor: MICHAEL KELLY, The Washington Post
Publicado no Jornal O ESTADO DE S. PAULO
em 24-03-2002
Durante pelo menos algumas décadas,
um grande número de padres usou seus escritórios -
e a excepcional confiança manifestada pelo título
de "padre" que lhes é conferido - para se lançar
como predadores sobre meninos adolescentes que aprenderam a
considerá-los, literalmente, como figuras paternas. Esse
padrão de abuso criminoso não se limitou a alguns
poucos padres ou algumas paróquias, mas envolveu a Igreja
Católica nos Estados Unidos como um todo e como uma
instituição. Até agora, 2 mil sacerdotes
foram formalmente acusados. Em todos os casos se pode ver o
mesmo padrão: primeiramente, existem suspeitas de que um
padre está abusando de coroinhas, então vêm
as queixas, e depois, queixas e mais queixas. Os superiores
diocesanos são informados. Os advogados da diocese também
tomam conhecimento do fato. Pede-se então aos queixosos
que se mantenham em silêncio pelo bem da Igreja e da fé.
Ninguém fala aos paroquianos, ninguém conta à
polícia, ninguém diz nada às crianças.
Os advogados (bons católicos) fazem obstrução;
os médicos (também bons católicos) declaram
que o padre está curado ou suficientemente curado; o
bispo ordena a transferência do padre para outra paróquia.
E toda a coisa terrível se repete. Quando necessário,
a Igreja paga para que as pessoas não falem, comprando
assim mais alguns crimes de silêncio. Finalmente, depois
que muitas vidas foram estragadas, vêm a revelação
pública, o escândalo e um constrangido pedido de
desculpas. Vamos falar claramente: não se trata de atos
criminosos individuais ou de falhas individuais na liderança.
Trata-se da corrupção sistemática de uma
instituição. Trata-se da Igreja como hierarquia.
Trata-se de uma instituição poderosa, que usa seu
poder para ocultar e perpetuar - conscientemente - crimes (e
pecados) da mais perversa natureza contra as almas mais
inocentes e vulneráveis, que confiaram na Igreja.
Original em:
http://www.estado.com.br/editorias/2002/03/24/ger008.html
ESCÂNDALOS
ACIRRAM DISCUSSÃO SOBRE CELIBATO
Publicado no Jornal O Estado de S. Paulo
em 24/03/2002
Monsenhor di Falco é bispo
auxiliar de Paris. É um homem muito bonito, sedutor,
brilhante. Durante muito tempo, administrou as relações
públicas da diocese de Paris, de modo que foi introduzido
nos meios mais "em moda" da capital. Hoje, monsenhor
di Falco é objeto de uma denúncia na Justiça.
Um homem de 41 anos garante que foi violentado diversas vezes
por monsenhor di Falco, na época em que foi capelão
de uma escola de Paris. A denúncia foi julgada inadmissível,
pois os supostos fatos se deram em 1972 e, portanto,
prescreveram. Há poucos anos, o teólogo alemão
Eugene Drewermann calculou que, na Alemanha, dois de cada três
padres viviam em concubinato. No Zimbábue, na África,
quebra-se a cabeça para encontrar um candidato à
dignidade de bispo, pois não há quase nenhum padre
sem uma concubina. Sustenta-se que, nos Estados Unidos, 20 mil
dos 40 mil padres respeitam a lei do celibato.
Original em:
http://www.estado.com.br/editorias/2002/03/24/ger004.html