Publicado no Jornal O Estado de São
Paulo em 12/09/1998
Durante culto na Lapa, pastor pede
contribuições em dinheiro entre leituras da "Bíblia"
Na igreja com poucos fiéis, rola um
som estranho. A letra fala em Jesus ao ritmo de rock'n roll. Às
15 horas em ponto, quando o pastor entra e posiciona-se no púlpito,
frente a um cartaz que reproduz uma paisagem com cachoeiras,
muda a música, agora ao vivo. O partner do pastor toca órgão
e contracena com ele. Ambos ajoelham-se diante de uma cruz, no
altar enfeitado com flores de plástico e todos, umas 20
pessoas, levantam-se.
No templo da Igreja Universal do Reino de
Deus, na Lapa, o pastor Anderson, um garoto de 16 anos, de calça
preta de tergal, camisa branca, gravata, cabelos brilhantes de
gel, dirige-se aos "homens e mulheres desesperados que
vieram aqui porque não sabem o que fazer". Manda que
eles abaixem a cabeça e se curvem. Conta uma passagem bíblica.
"Jesus disse: a vara do homem que eu escolher, essa
florescerá".
Depois de dizer que "a vara de Abraão
floresceu porque ele era fiel", o pastor pede que homens e
mulheres provem a sua fidelidade fazendo uma doação.
"Levante a mão quem já pegou o envelope para
o dízimo!", diz, olhando um a um. "Da mesma
maneira que ele foi fiel você deve ser, está
ligado?" Todos batem palmas. "Têm pessoas que
criticam o dízimo, mas não acham ruim parar em um
bar, comprar cerveja e cigarro", continua. "Nesse
caso, está dando o dízimo a quem?", pergunta.
A platéia responde prontamente: "Ao
diabo". "A sua confiança tem de estar em Deus,
não é isso?" As pessoas balançam a
cabeça, concordando. O jovem pastor critica "o tal
do dr. Fritz", os que guardam imagens de santos, os que
freqüentam terreiros de macumba e os que "acreditam
nos homens". "Se você crê em Jesus venha
pegar o seu envelope", insiste. Ao longo do culto, os "fiéis"
vão ser incitados muitas a vezes a fazer oferendas.
O pastor chama as pessoas para perto. Começa
uma cerimônia de exorcismo. "Essa pessoa está
ficando arrepiada, com medo, porque o demônio está
nela", diz. "Manifesta agora!", ordena. A mulher
entra em transe. Depois, tem a sessão de cura onde a doença
é tirada aos berros de "sai, sai". Em troca de
algumas gotas do "óleo da abundância", o
pastor pede doações. No fim do culto, uma menção
às vítimas de Osasco, na mesma oração
em prol dos candidatos evangélicos e do bispo Edir
Macedo.
Mulher acusa integrantes da Universal
Publicado no Jornal O Estado de São
Paulo em 14/01/1998
Funcionária afirma que foi agredida
por dois obreiros da igreja em templo de Campinas
Autor: CLAYTON LEVY
CAMPINAS - A funcionária pública
Vera Lúcia Ferreira Sampaio, de 43 anos, acusou dois
integrantes da Igreja Universal do Reino de Deus de agressão
a ela e a sua filha J.S.P., de 14 anos. O fato, registrado em
boletim de ocorrência no plantão do 1º
Distrito Policial, teria ocorrido anteontem, após um
culto em um dos principais templos da instituição
em Campinas, na Avenida Campos Salles.
Segundo a funcionária, as duas
foram trancadas no banheiro da igreja, onde receberam ``tapas,
chutes e pontapés'' dos dois homens que integram o grupo
de obreiros da Universal. As duas passaram por exame de corpo de
delitoe identificaram um dos agressores como Claudinei Fernando
de Paula Cachino.
Vera, que se recupera de uma queimadura,
causada por um acidente doméstico, disse estar
traumatizada. Sua filha tem marcas da agressão nas
costas, nos braços e nas pernas.
A funcionária pública disse
que apanhou porque insistiu em falar com um dos dirigentes da
igreja. Há cerca de uma semana, segundo ela, esse
dirigente, conhecido como bispo Oswaldo, pediu-lhe que vendesse
sua linha telefônica para dar o dinheiro à igreja.
``Não concordei porque já havia dado muito
dinheiro a eles e fui lá tirar satisfações'',
afirmou.
Vera disse que os integrantes da igreja já
a hostilizavam havia algum tempo porque ela se recusava a dar
dinheiro para a chamada ``fogueira santa'', ritual pelo qual os
pastores recolhem pedidos e dinheiro, com a promessa de serem
atendidos por Deus.
``Não dei o dinheiro, mas pedi ao
pastor uma oração para conseguir um objetivo'',
contou. O desejo que a funcionária gostaria de ver
realizado é a demissão de seu marido, Carlos
Francisco Pereira, de 46 anos, dos quadros da Ferrovia Paulista
S.A. (Fepasa), antes que a estatatal seja privatizada.
``Houve um acordo e quem for dispensado
antes receberá uma indenização maior.'' O
casal disse que cansou de dar dinheiro à Universal.
``Tinha de dar o dízimo, a fogueira santa e outras
contribuições'', contou o marido. Chegaram a pedir
dinheiro emprestado para atender à igreja.
``Eles diziam que Deus nos devolveria em
dobro, mas depois que entramos na Universal deu tudo errado'',
disse o ferroviário. "Em menos de um ano, minha
mulher sofreu um acidente, minha filha foi assaltada."
Ontem, a reportagem do Estado esteve no templo, mas não
conseguiu falar com ninguém da Universal. Um pastor, que
se identificou como Alexandre, disse que não tinha nada a
declarar.