Ou dá ou...
Luiz Caversan

Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 29/12/95

RIO DE JANEIRO _ Apesar de ter sido superbacana, o programa de Regina Casé sobre Portugal não foi o mais interessante da semana televisiva. Tampouco o especial de Claudia Raia _bela, engraçada e esbelta_ ficou em primeiro lugar.

Não, nenhum dele consegue, por mais criativos que tenham sido, desbancar o "25ª Hora" no qual os bispos de Edir Macedo tentaram a todo custo explicar a fita que detona a Igreja Universal.

O programa transbordava talento. Talento para a desfaçatez e ao mesmo tempo para a autenticidade. Talento para o convencimento e também para a defesa lógica e convicta do indefensável. Talento, enfim, para dizer às pessoas: nós somos assim e quem quiser que goste da gente assim mesmo.

"A igreja é iniciativa privada", disse e repetiu o bispo Didini, para não deixar dúvidas quanto ao caráter de livre iniciativa de seu empreendimento.

"O papa vai esquiar e a gente não tem nada a ver com isso", declarou corretamente o pastor Honorilton.

"O Estado cobra em impostos 26,16% do que a gente ganha. O PT fica com 30% do salário dos políticos eleitos. Por que não posso dar 10% para a Universal?, indagou a "professora de linguística" convocada para explicar no programa "o contexto" da expressão "ou dá ou desce" perpetrada por Edir Macedo.

"Ou dá a contribuição ou desce para o inferno" foi a "tradução" encontrada pela professora. Genial.

E a mordomia dos bispos mostrada pela fita? Ora, "todo mundo gosta de mordomia", concluiu a professora, deixando a linguística um pouco de lado e partindo para a sociologia.

Pode-se acusar a Igreja Universal de quase tudo, menos de falta de autenticidade.

Eles pedem dinheiro mesmo, prometem o paraíso na terra mesmo, e dizem que o negócio é esse mesmo. Quem quiser que acredite, quem quiser que ajude.

Agora vêm os ex-fiéis arrependidos querendo reaver, na Justiça, as colaborações que enviaram à igreja. Se dizem logrados. Primeiro agem na base do "me engana que eu gosto", agora se arrependem? Ora, a Justiça deveria mandá-las reclamar com o bispo.

Universal tenta se desvincular de Macedo

Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 29/12/95

Autor: CLÁUDIA TREVISAN Da Reportagem Local

Líderes da Igreja Universal do Reino de Deus iniciaram uma ofensiva para tentar desvincular a imagem da igreja da de seu fundador, o bispo Edir Macedo.

A nova orientação estará refletida na manchete do jornal "Folha Universal" que será distribuído neste domingo: "Igreja Universal está acima do bispo".

A estratégia já foi adotada pelo bispo Carlos Rodrigues, de Minas Gerais, no programa "25ª Hora" transmitido anteontem à noite pela Rede Record.

"A igreja não vai acabar porque não é só o bispo Macedo. A igreja é feita de milhares de obreiros, de milhares de pastores, dezenas de bispos", afirmou Rodrigues.

Esse discurso deverá ser repetido nas igrejas pelos pastores, por determinação dos dirigentes da Universal. A orientação é que os pastores, nos cultos, atribuam a Cristo os benefícios e graças eventualmente obtidos pelos fiéis.

Rodrigues deu uma prévia desse discurso no programa da Record. "Não foi o bispo Macedo quem morreu na cruz por nós, não foi o bispo Macedo quem deu seu sangue por nós, não foi ele quem nos curou nem nos salvou. Quem fez isso foi Jesus Cristo", disse.

Essa estratégia foi decidida na semana passada, depois da divulgação dos vídeos gravados pelo pastor dissidente Carlos Magno.

O texto da "Folha Universal" sobre o assunto diz que "o bispo Macedo tem afirmado inúmeras vezes que a Igreja Universal do Reino de Deus é maior que ele".

O objetivo final é claro: salvar a instituição do desgaste que a imagem de Macedo pode sofrer pela exibição das cenas em que aparece ensinando seus seguidores a arrecadar dinheiro.

A tentativa de justificar as cenas que estão nas fitas divulgadas por Carlos Magno ocupou parte do "25ª Hora" de anteontem.

Participaram do programa Rodrigues, o bispo Honorilton Gonçalves, o pastor Ronaldo Didini e a professora de linguística Josenia Vieira da Silva.

Todos afirmaram que as imagens mostradas pela TV estavam desvinculadas do contexto em que foram realizadas (ver quadro).

Também adotaram a linha de apresentar Macedo e os integrantes da Universal como seres humanos sujeitos a falhas.

"O bispo Macedo nunca disse para mim que era um santo, que nunca pecava, que nunca pecaria", disse Rodrigues.

Didini afirmou que a postura agressiva na arrecadação do dízimo é típica das igrejas pentecostais e neopentecostais.

Segundo ele, os fiéis que derem ofertas e dízimos com "o coração puro" serão abençoados. "Se não der para Deus, vai dar comprando cocaína, gastando milhões tratando de seu filho que está nas drogas", afirmou.

Coube a Didini tentar justificar o uso da expressão "ou dá ou desce" pelo bispo Macedo. De acordo com ele, quem não der o dízimo para provar sua fé "desce para um abismo, desce para um barranco e nunca mais se levanta".

Ex-advogado de igreja tenta recuperar bens

Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 29/12/95

O advogado Grigore Avram Valeriu, 50, tenta na Justiça reaver os bens que vendeu para doar à Igreja Universal. Ele foi membro da igreja entre 1988 e 1992 e frequentava o templo do Recreio dos Bandeirantes (zona oeste do Rio).

Durante um ano, o advogado transformou em doações seis apartamentos, três lojas, ações, automóveis e jóias de família trazidas da Romênia. Ele não sabe estipular o valor do patrimônio perdido.

Valeriu disse que as jóias doadas pelos fiéis eram derretidas em uma oficina no Rio, de um parente do pastor Honorilton Gonçalves, transformadas em barras de ouro e contrabandeadas para os EUA.

O advogado integrou o departamento jurídico da igreja. Ele acredita que sua vitória na Justiça será um modo de mostrar a milhares de fiéis "que estão na igreja enganados". Ele está escrevendo um livro em que relata sua passagem por lá. Disse que duas editoras estão interessadas em publicá-lo, mas aguarda outras propostas. A Universal nega as acusações.

PF recebe três pedidos de inquérito

Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 29/12/95

O diretor da Polícia Federal, Vicente Chelotti, recebeu ontem três requerimentos do procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, para abertura de inquéritos apurando eventuais crimes cometidos pelo bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus.

Brindeiro havia anunciado na terça-feira que pediria os inquéritos à PF. O único bispo citado nominalmente é Macedo. Mas Brindeiro pede que sejam apurados também eventuais crimes dos "demais dirigentes" da igreja.

O procurador-geral pede que seja apurada prática de evasão de divisas, sonegação fiscal e o envolvimento dos suspeitos com o narcotráfico internacional.

Ele cita sinais externos de riqueza e aparente "estelionato em detrimento da fé pública". Chelotti enviou os requerimentos para a Coordenação Central Judiciária da PF, que vai examinar a possibilidade de abrir os inquéritos.

A PF já havia decidido abrir três inquéritos semelhantes na superintendência do Rio de Janeiro, a partir do dia 2 de janeiro. Agora, os inquéritos podem ser abertos em Brasília, abrangendo atividades da igreja em todo o país.

As suspeitas de Brindeiro têm como fundamento as imagens de vídeo divulgadas pelo pastor Carlos Magno, dissidente da igreja, transmitidas pela Rede Globo.

Ceará

O procurador-geral da República no Ceará, Francisco Macedo, enviou ofício ontem à Receita Federal pedindo uma investigação da situação fiscal da Igreja Universal no Ceará, Piauí e Maranhão.

Francisco Macedo disse que decidiu pedir a investigação depois de ouvir uma declaração do secretário de Finanças de Fortaleza, Edmo Linhares, de que a Universal estava registrada com a razão social de Igreja Universal do Reino de Deus S.A.

Linhares disse que suas declarações foram mal-interpretadas. "Eu disse que achava que a Igreja Universal estava registrada como sociedade anônima, mas não dei certeza disso", afirmou.

Segundo ele, a direção da Universal e a Prefeitura de Fortaleza brigam na Justiça pelo pagamento de IPTU. Em maio, advogados da Universal pediram a isenção do pagamento do imposto.

Em Fortaleza, existem 19 prédios em nome da Universal. O advogado da igreja, Isaac Rocha, disse que tem "convicção" de que a razão social da Universal é Igreja Universal do Reino de Deus

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