Evangélicos lutam contra reforma política

Publicado na REVISTA VEJA on-line - Edição 1807 - 18 de junho de 2003

http://veja.abril.uol.com.br/

Não, não e não

Bancada evangélica descobre que pode ser esmagada com a reforma política e, com fervor religioso, luta para sobreviver.

Reportagem de Maurício Lima

Na semana passada, a comissão de parlamentares que estuda a reforma política, destinada a colocar alguma ordem no caótico universo partidário do país, teve de adiar seus planos. A comissão, com 38 membros, pretendia votar um princípio central da reforma: ampliar, de um para dois anos, o período em que um parlamentar é obrigado a estar filiado ao partido pelo qual pretende concorrer na eleição seguinte. A decisão acabou adiada devido ao esforço militante de uma bancada aguerrida e, é claro, multipartidária. Trata-se da bancada dos evangélicos, que reúne 57 parlamentares, distribuídos em seis legendas diferentes. Os evangélicos, até agora, têm sido o principal obstáculo ao avanço da reforma partidária. Eles perceberam que a reforma pode feri-los de morte, já que deve diminuir o ímpeto do troca-troca de partidos e evitar o clientelismo - dois pecados dos quais os evangélicos são praticantes contumazes. O líder da bancada é o Bispo Rodrigues (PL-RJ), para quem fidelidade partidária é como casamento. "Se até os casados descumprem o sagrado compromisso do matrimônio, por que os políticos têm de cumprir o matrimônio com o partido?", diz.

Na realidade, a bancada está preocupada com seu futuro. Além de ampliar o prazo de fidelidade partidária, a reforma pretende criar o instituto da chamada "lista fechada". Ou seja: o eleitor passa a votar na legenda, e não mais no candidato a vereador ou a deputado estadual ou federal. E cabe ao partido distribuir os votos que recebe aos candidatos da lista. Assim, caso o partido só tenha votos para eleger um único candidato, o eleito será o primeiro nome da lista. Se a legenda tem votos para eleger cinco, os beneficiados serão os cinco primeiros da lista, e assim por diante. Juntando a fidelidade partidária à lista fechada, cria-se um quadro adverso aos evangélicos - a valorização do partido em detrimento do candidato. De eleição em eleição, a bancada dos evangélicos vem aumentando sua presença no Congresso Nacional. Na legislatura passada, eram pouco mais de 45 deputados, e nenhum senador. Agora, são 55 deputados e dois senadores, Marcelo Crivella e Magno Malta. O crescimento se dá por cima dos muros que separam os partidos.

A atuação dos evangélicos tem sido sempre suprapartidária. Hoje seus 57 parlamentares estão concentrados em duas legendas, o PL e o PTB, mas há filiados distribuídos pelo PMDB, PSDB, PFL e PP. A cada eleição, a cúpula dos evangélicos se debruça sobre o mapa eleitoral do país, estuda as regiões em que eles têm mais chances de sucesso e despacha um candidato para aquele colégio eleitoral - onde o candidato se filiará ao partido que estiver disponível. O deputado Philemon Rodrigues, por exemplo, ganhou três mandatos em Minas Gerais. Na eleição passada, entregou legenda e domicílio eleitoral a um colega, o deputado João Paulo Silva, e candidatou-se pelo PTB da Paraíba. Os dois foram eleitos. Com a fidelidade partidária ampliada para dois anos, esse jogo fica mais difícil. Com a lista fechada, pior ainda. Afinal, que partido dará ao evangélico recém-chegado à legenda o primeiro lugar na lista fechada?

Desde que o Palácio do Planalto e os líderes partidários concordaram com uma proposta mínima de reforma política, três semanas atrás, a bancada evangélica passou a militar com fervor religioso. Num primeiro movimento, os evangélicos se empenharam em ocupar o maior número de cadeiras na comissão que estuda o assunto no Congresso. Dos 38 membros da comissão, emplacaram oito - quatro filiados ao PL, dois ao PMDB e dois ao PTB. Na rotina de trabalho, eles têm uma tática clara: jogar toda e qualquer decisão para as calendas gregas, manobra em que o deputado Lincoln Portela (PL-MG) é craque. Para tanto, vivem pedindo vista aos projetos e apartes aos colegas e sempre se inscrevem para falar. Na semana passada, conseguiram adiar a votação sobre a fidelidade partidária. Em outra tática protelatória, estão agora pedindo que, antes de o assunto ser votado, a comissão ouça a opinião dos presidentes de todos os partidos do país. São 27 legendas. Se a exigência for aceita, a comissão terá reuniões exatamente como deseja a bancada evangélica: inconclusivas e intermináveis.

Segura na mão de Deus

Os evangélicos ignoram partidos, mas são muito disciplinados na hora de obedecer às suas igrejas.

Sasse complica Garotinho

Publicado no Jornal do Brasil em 20/02/2003

Ex-secretário acusa ex-governador de acobertar sonegadores, politizar a nomeação de fiscais e ser íntimo de Rodrigo Silveirinha

Daniela Dariano

Repórter do JB

O ex-secretário de Fazenda, Carlos Antônio Sasse, implicou a governadora Rosinha Matheus, o ex-governador do Rio, Anthony Garotinho, e pelo menos quatro deputados estaduais na rede de corrupção criada por fiscais do Estado. No depoimento mais revelador prestado à CPI da Assembléia Legislativa que investiga a remessa de US$ 32 milhões para bancos suíços, Sasse disse ontem que o secretário de Planejamento de Rosinha, Fernando Lopes, foi informado do esquema, do qual participava o fiscal Rodrigo Silveirinha, pelo menos uma semana antes de o caso se tornar público. Garotinho, segundo Sasse, teria ainda protegido sonegadores de Campos.

Nas cerca de três horas em que falou à CPI, Sasse contou que Silveirinha confessou a David Birman, seu ex-assessor de informática, sua participação e de outros fiscais no esquema de corrupção. Silveirinha teria pedido a Birman que cuidasse de seus filhos e de sua família caso algo acontecesse com ele. Birman, que depõe hoje na CPI, teria telefonado a Sasse para contar sobre a con-fissão do fiscal.

- Marquei um encontro (dia 4 de janeiro) com Birman e o atual secretário de Planejamento e Controle e Gestão, Fernando Lopes, para conversarmos. Birman nos contou tudo e Fernando Lopes ficou encarregado de informar o caso à governadora Rosinha Matheus - disse Sasse.

O ex-secretário afirmou também que foi Garotinho quem nomeou Silveirinha para o cargo de subsecretário de Administração Tributária do Rio. Segundo Sasse, dos quatro fiscais acusados de corrupção, ele conhecia apenas Lúcio Picanço, que foi seu chefe de gabinete durante os nove meses em que ficou à frente da secretaria, em 1999. O ex-secretário disse ainda que Silveirinha, Carlos Eduardo Ramos e Rômulo Gonçalves ocuparam cargos na secretaria por causa do bom trabalho durante a fase de transição do governo Marcello Alencar para o de Anthony Garotinho.

Garotinho teria feito queima de arquivo

Ao pedir demissão em 1999, depois de nove meses como secretário de Fazenda de Garotinho, Carlos Sasse calou-se. Ontem, o ex-secretário disse que deixou o cargo porque foi impedido pelo então governador do Rio de continuar a fiscalização de empresas em Campos, berço político de Anthony Garotinho. Segundo Sasse, Garotinho protegia empresas sonegadoras.

- Quem protegeu o sonegador foi o governador, ao suspender a fiscalização. Foi quase uma queima de arquivo, porque eu queria que as investigações fossem até o fim.

Garotinho afirmou que destacou Sasse para apurá-las. Segundo Garotinho, as denúncias foram confirmadas, mas, como Sasse não tomou providência alguma, foi demitido.

- Sasse deixou o governo por se recusar a demitir fiscais acusados de extorsão - diz a nota do ex-governador.

Ligações perigosas

Fiscal teria sido alertado em casa por Garotinho

Uma ligação telefônica pode desmentir a alegação do ex-governador Anthony Garotinho de que não conhecia Rodrigo Silveirinha quando surgiram as denúncias de que o fiscal teria mais de US$ 8 milhões em uma conta na Suíça. Segundo depoimento do ex-secretário de Fazenda de Garotinho, o ex-governador teria telefonado para a casa de Silveirinha no dia em que soube dos fatos.

- Alguém que não conheça intimamente a pessoa teria o telefone de sua casa? Eu não tenho o telefone de Silveirinha - alfinetou Sasse.

Na nota oficial divulgada por Garotinho, não foi feita menção específica a essa acusação do ex-secretário. Anthony Garotinho limitou-se a negar participação no esquema milionário e a acusar Sasse de contradição.

A CPI que investiga corrupção na Fazenda decidirá, até segunda-feira, se vai convocar Garotinho para depor. Também não está descartada a possibilidade de serem ouvidos pela comissão três deputados estaduais acusados pelo ex-secretário estadual de Fazenda de indicar pessoas para assumir cargos nas inspetorias de Fazenda.

Fonte: http://www.jb.com.br/jb/papel/cidade/2003/02/20/jorcid20030220001.html

Garotinho era íntimo de Silveirinha, dizem secretários

Publicado no Jornal O Estado de S. Paulo em 21/02/2003

Dois ex-secretários de Fazenda do Rio - Carlos Sasse e Fernando Lopes - acusaram ontem o ex-governador Anthony Garotinho (PSB) de envolvimento com os funcionários investigados por corrupção e remessa ilegal de US$ 33,4 milhões para contas na Suíça. Sasse disse que Garotinho era íntimo do ex-subsecretário Rodrigo Silveirinha, principal suspeito do desvio do dinheiro, e tinha até mesmo o telefone de sua casa.

Já Lopes afirmou que Silveirinha despachava com o ex-governador freqüentemente. O ex-secretário confirmou que esteve com Garotinho e com Silveirinha em várias reuniões. As declarações, feitas em depoimentos à CPI dos Fiscais na Assembléia do Rio, complicam a situação de Garotinho, que negava ter envolvimento com os acusados. Agora, ele poderá ser convocado para depor.

Sasse também afirmou que Garotinho protegeu empresários sonegadores e fiscais corruptos de Campos (RJ), suspendendo a fiscalização do comércio da cidade, à sua revelia, para acobertá-los. O ex-secretário contou que se demitiu do governo em 99, por não concordar com a atitude.

O ex-governador, que sempre negou ter ligação com Silveirinha, reagiu divulgando nota, acusando Sasse de ter se recusado a demitir fiscais sob suspeita. Garotinho afirma que nunca "compactuou, acobertou ou foi conivente com corrupção". Segundo ele, "o ex-secretário deixou o governo por se recusar a demitir fiscais do município de Campos acusados de extorsão". "Jamais compactuei com qualquer prática que fere a lei", diz a nota.

DEPUTADO PROPÕE LEI PARA 'RECUPERAR' GAYS

Publicado no Jornal O ESTADO DE S. PAULO em 05-09-2003

Militantes gays planejam "acampar" na Assembléia Legislativa do Rio para protestar contra o projeto de lei do deputado e pastor Édino Fonseca (Prona), que propõe a criação de programas de auxílio às pessoas que "voluntariamente optarem pela mudança da homossexualidade para a heterossexualidade".

Pelo projeto, o poder público terá de financiar iniciativas para a "prevenção, apoio e/ou possibilidade de reorientação sexual das pessoas que vivenciam a homossexualidade". Na prática, disse o deputado, o governo seria obrigado a manter programas em organizações não-governamentais (ONGs) e igrejas, como os já existentes na Assembléia de Deus, da qual Fonseca é pastor.

Para representantes das ONGs Rede Internacional de Cultura Gay, Arco- Íris e Atobá, o projeto contribuiu para aumentar o preconceito contra os homossexuais. Eles vão tentar barrar a tramitação da proposta - apresentada na terça-feira e ainda sem data para ser votada - antes mesmo de ela ir ao plenário. Caso não consigam, pretendem levar centenas de gays às galerias da Assembléia para evitar a aprovação do texto.

"Esse projeto é um desserviço. O que ele quer é o repasse de dinheiro público para igrejas evangélicas", criticou Claudio Nascimento, coordenador do Arco-Íris. "Além disso, ele dá legalidade à perseguição de gays."

O deputado, pastor há 35 anos, mostrou-se surpreso com a reação ao projeto e negou ter preconceito contra homossexuais. "Na igreja, sempre recebi pessoas em conflito que não tinham a quem recorrer quando decidiam deixar de ser gays. Esse é um problema que existe e que deve ser assumido pelo Estado."

Ele também negou que o projeto beneficie a Assembléia de Deus. "Esse tipo de trabalho não é feito só pelas igrejas evangélicas, mas por várias religiões e organizações."

A produtora gráfica Carla Pinheiro, do grupo cristão Exodus (que "recupera" gays), disse que foi lésbica durante 17 anos, mas conseguiu "resolver problemas emocionais" e voltar a ter parceiros homens. "Nunca deixei de ser heterossexual. Eu estava homossexual e acho que isso aconteceu porque sofri abusos emocionais na infância", disse Carla, de 41 anos.

Luiz Carlos Raposo, de 35 anos, disse ter deixado de ser gay aos 19 "Não sabia o que estava fazendo, mas procurei ajuda na igreja e acabei me apaixonando por minha mulher." Hoje, trabalha aconselhando pessoas que querem "se transformar". Raposo disse que já foi vítima de violência de grupos homossexuais. "Eles é que têm preconceito. Já fui atacado na rua por fazer o que faço." Como teme novos ataques, ele não divulga o nome do grupo ao qual pertence. [e]

Fonte: http://www.estado.com.br/editorias/2003/09/05/ger015.html

O jogo evangélico cresce perigosamente, com uma política de massas conduzida por aprendizes de Hitler.

Por José Arbex Jr.

"Não quero que meus netos se eduquem em uma sociedade materialista, em que o bem-estar da população é medido pelo PIB. Quero um mundo onde a qualidade de vida seja medida pela presença de Jesus no coração (...) Nosso Senhor Jesus sempre me ensinou que a verdadeira religião é o amor a Deus. Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor."

Duvido que você descubra quem é o autor deste trecho. Pois é ninguém menos que Paulo Salim Maluf, candidato pelo PPB ao governo de São Paulo. Quando? Numa quinta-feira, 25 de junho. Onde? Em Osasco, reduto eleitoral do pedetista Francisco Rossi, durante a inauguração do primeiro comitê evangélico de apoio à candidatura malufista. Por quê? Uma das razões é óbvia: Maluf deseja capturar votos do evangélico Rossi, conhecido por usar em suas campanhas o refrão "segura na mão de Deus". Mas o mais importante - e também preocupante, como veremos - é que os evangélicos já são uma força política na conjuntura nacional, e contam com uma impressionante capacidade de mobilização (há cerca de 22.000 igrejas evangélicas no Estado de São Paulo, 8.000 só na capital).

O coordenador da vertente bíblica da campanha de Maluf é um certo Estevam Hernandes, presidente da Igreja Renascer em Cristo. Desde 1993, a Renascer e outras denominações evangélicas organizam, uma vez por ano, sempre em maio, uma certa Marcha para Jesus, que atrai, invariavelmente, centenas de milhares de pessoas, a maioria jovens. A marcha, que em São Paulo é tradicionalmente realizada na zona norte, faz parte de uma estratégia de mobilização internacional, e ocorre simultaneamente em vários países. Segundo Hernandes, o ato de 1993, em São Paulo, reuniu 300.000 pessoas. O último, realizado em 30 de maio, atraiu o dobro. Maluf foi o único político sem cargo público convidado ao evento. A explicação dada por Hernandes: "Ele (Maluf foi o responsável pela inclusão da marcha no calendário oficial da cidade".

Maluf e Rossi estão muito longe de ser os únicos políticos a flertar com o poder evangélico. Também o presidente Fernando Henrique Cardoso, que em 1985 perdeu votos por se dizer agnóstico, aderiu à ala dos recém-convertidos. Em setembro de 1997, FHC encerrou o 2º Congresso Mundial das Assembléias de Deus, no Campo de Marte (São Paulo), com a saudação dos crentes: "Aleluia!" Dias depois, levou a família para receber a bênção do papa João Paulo II. Nada mau para um sociólogo da Sorbonne... Instalou-se no Brasil, de fato, uma florescente indústria de apoio de pastores evangélicos a candidatos a cargos eletivos. E quem o afirma não pode ser acusado de antievangelismo: Ronaldo Didini, ex-braço direito de Edir Macedo (chefe da Igreja Universal do Reino de Deus), agora pastor da Assembléia de Deus Nipo-Brasileira e candidato do PPB a deputado estadual. Segundo Didini, o apoio político de um pastor evangélico pode ser comprado por até 100.000 reais na época das eleições (Folha de S. Paulo, 7/6/98, página 1-17).

"Sei que um microcandidato pagou cerca de 100.000 vivos (em dinheiro) a um pastor da Assembléia de Deus, que iria fazer a campanha dele. Não teve um voto naquela região. O candidato perdeu a eleição e o pastor está para perder a igreja dele", disse Didini. "Não quero falar quem é para não criar polêmica. Mas são várias as denominações que fazem isso." E o pastor, certamente, sabe o que diz, depois de doze anos fazendo campanhas pelos candidatos de Edir Macedo. "Há negociação financeira. Algumas lideranças recebem dinheiro para que determinados candidatos se apresentem nas igrejas. Aí ele vai lá, fala e vai embora. Na outra semana vai outro, de um partido diferente, dá dinheiro e fala. Os votos (dos fiéis) são vendidos descaradamente por falsos pastores, que cobram fortunas dos políticos."

Curiosamente, em julho de 1996, às vésperas das eleições municipais, a Associação Beneficente Cristã (ABC), entidade ligada à Universal, e então presidida pelo "verdadeiro pastor" Didini, recebeu 800.000 da Prefeitura de São Paulo. Mais curioso, ainda: a política partidária foi uma das principais causas da ruptura de Didini com Edir Macedo, em agosto de 1997. A discordância foi publicamente revelada em 1996, quando Didini, que apresentava o programa 25ª Hora da TV Record, decidiu apoiar o então candidato a prefeito de São Paulo, Celso Pitta (PPB). Edir Macedo era favorável a José Serra (PSDB), por razões estratégicas. Em agosto de 1996, a imprensa denunciou, amplamente, um acordo entre o ex-ministro das Comunicações Sérgio Motta e a Igreja Universal. O acordo previa a regularização de concessões de TVs e a suspensão das investigações da Receita Federal sobre a igreja. Maluf entrou com recurso no TRE, pedindo abertura de sindicância para investigar a relação entre tucanos e bispos da Universal O governo, é claro, negou tudo. Em quem você acredita?

Mas esse microcosmo de relações entre as correntes evangélicas e os políticos apenas reflete um fenômeno muito mais profundo: a crescente influência que o movimento exerce sobre a população brasileira. Claro, o Brasil ainda é o maior país católico do mundo (83 por cento dos brasileiros se dizem católicos). Mas é visível o fato de que a Igreja já não tem a capacidade de manter a completa hegemonia sobre a vida espiritual, exercida durante quase quinhentos anos de história. A nova visita de João Paulo II ao Brasil, em outubro de 1997, foi a confissão disso. Consciente do significado dessa visita, aliás, Edir Macedo organizou um ato que reuniu 140.000 crentes da Universal, no estádio do Mineirão, Belo Horizonte, no mesmo momento em que o papa se despedia do Brasil. O ato, intitulado Concentração de Fé - a Família ao Pé da Cruz, pretendeu discutir os valores da família, exatamente como fez João Paulo II. Mas, ao contrário do papa, Edir Macedo manifestou apoio ao aborto quando a mãe corre risco de vida ou é vítima de estupro. E - supremo cinismo - também garantiu que foi casual a coincidência das datas dos dois eventos.

Uma pesquisa realizada no Rio, em 1996, pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser), mostrou que a cada ano 100.000 pessoas se convertem aos grupos evangélicos. A maior parte delas (61 por cento) é originária da Igreja Católica. O restante vem da umbanda e do candomblé (16 por cento) e do kardecismo (6 por cento). O estudo durou cerca de um ano e abrangeu 53 denominações evangélicas diferentes, reunidas em seis grupos: Assembléia de Deus, Igreja Batista, Igreja Universal do Reino de Deus, Igrejas Históricas (como a anglicana e a luterana), Outras Igrejas Pentecostais e Renovadas. Foram visitados 40.172 domicílios. Na etapa final, 1.322 pessoas, selecionadas por amostragem estatística, responderam a longos questionários, que abordavam temas como participação dos fiéis na vida da igreja, família e vida política.

O estudo indicou que apenas na região metropolitana do Rio existiam, então, cerca de 1,5 milhão de crentes (15 por cento da população) de todos os ramos do protestantismo.

Significativamente, as denominações que mais crescem - a Igreja Universal e a Assembléia de Deus - são também as que abrigam os fiéis mais pobres. Na Universal, segundo o Iser, 63 por cento dos seguidores ganham menos de dois salários mínimos, 50 por cento têm menos de quatro anos de escolaridade e 70 por cento são negros e mulatos. Na Assembléia, 62 por cento ganham até dois salários mínimos. Calcula-se que a Universal e a Assembléia tenham, hoje, algo em torno de 3 milhões de adeptos cada. O número de convertidos já é significativo o suficiente para provocar mudanças no comportamento da população. Um exemplo é a redução da taxa de natalidade, já que as famílias de evangélicos têm, em média, 25 por cento menos filhos do que seus vizinhos pertencentes a outras religiões. Isso também contribui para o envelhecimento da população. O Rio é a capital que, segundo o IBGE, concentra o maior índice de velhos do país: 12 por cento dos habitantes têm mais de sessenta anos.

Mas esse crescimento não ocorre sem disputas internas. Segundo o Iser, a Universal é campeã em rejeição no próprio meio evangélico. Quando se pediu aos entrevistados que dessem notas a outras igrejas, a do bispo Macedo ficou com a pior média: 6,7. Os protestantes conseguem rivalizar com a esquerda quando o assunto é divisão causada por divergências doutrinárias. Há três grandes blocos evangélicos: os históricos (igrejas Luterana, Batista e Metodista); os pentecostais (Congregação Cristã no Brasil, Assembléia de Deus e Igreja do Evangelho Quadrangular); e, a partir dos anos 70, os neopentecostais (O Brasil para Cristo, Deus É Amor, Universal etc.). De acordo com a Bíblia, no Pentecostes (o qüinquagésimo dia após a ressurreição de Cristo), o Espírito Santo, manifesto sob a forma de línguas de fogo, concedeu aos apóstolos dons como o de falar línguas estranhas (glossolalia) e o de curar. As seitas pentecostais utilizam aquilo que alegam ser dons do Espírito Santo para atrair fiéis. Atraem também as críticas dos evangélicos tradicionais, que desconfiam daqueles que transformam os templos em supermercados de cura.

A pobreza ofende Deus

As promessas pentecostais explicam boa parte do crescimento do movimento evangélico. Sem fazer, aqui, qualquer tratado de sociologia, basta notar aquilo que é mais evidente. Aos pobres, os pastores - todos muito bem treinados na arte da retórica - dizem que enriquecer não é pecado, mas que, ao contrário, a pobreza é uma ofensa aos olhos de Deus; para enriquecer, basta ter fé, freqüentar o templo e... pagar o dízimo...

Trata-se de uma mensagem que, essencialmente, em nada difere dos livros de auto-ajuda de autores como Lair Ribeiro. Aos doentes, aos drogados, aos casais em crise, aos que têm sua vida destruída por problemas familiares e profissionais, os pastores garantem a solução, com rituais catárticos de exorcismo do Satã, o grande inimigo, aquele que está por trás de todos os problemas, de todas as dúvidas e angústias. Aos solitários, os pastores propiciam o ingresso em uma comunidade que compartilha os mesmos valores. A todos, propõem a substituição das dúvidas por uma fé intransigente na Bíblia, a inquestionável palavra impressa de Deus. Para passar sua mensagem, usam ao máximo os poderes da televisão, desenvolvendo no Brasil o mesmo televangelismo já tão consagrado nos Estados Unidos.

A intensa participação da juventude nesse processo é visível a olho nu, dispensa qualquer estudo estatístico. Basta presenciar as tais Marchas para Jesus de Estevan Hernandes, ou os festivais de rock gospel, em que grupos de cabeludos, barbudos e moças de minissaia ou roupa de couro, que bem poderiam ser confundidos com gente que estava em Woodstock, cantam letras religiosas ao som de guitarras pesadas. Ou basta acompanhar, ainda que pela televisão, os cultos evangélicos. Os jovens estão lá, em massa. Marcham, com entusiasmo, empunhando nas ruas bandeiras e faixas que anunciam a volta de Cristo; choram, emocionados, quando o pastor fala da restauração da família e do amor bíblico; condenam as drogas e o "amor livre" como "coisa do demônio"; pagam o dízimo, mesmo quando ganham muito pouco; acreditam no exorcismo de Satã e no poder milagroso da cura pela fé; e acham que enriquecer é uma forma de prestar homenagem a Deus.

Isso talvez ajude a explicar a razão pela qual gente como Mara Maravilha, Gretchen, Jece Valadão e Monique Evans tenham resolvido aderir ao movimento evangélico. Se até Maluf e FHC podem posar de evangélicos...

A Igreja Católica reage com a agilidade de um paquiderme reumático. Atada ao fundamentalismo conservador de João Paulo II, a Igreja se vê impotente quando se trata de dar algum conforto aos fiéis pobres, a uma classe média perplexa e aos jovens cada vez mais sem perspectivas. Uma das alternativas é proposta pela Renovação Carismática Católica (RCC), movimento conservador surgido no interior da Igreja, nos Estados Unidos, há três décadas, e que é seguido por 4 por cento da população brasileira.

Avessos à Teologia da Libertação e às denominações evangélicas, os carismáticos adotam práticas que se assemelham às dos grupos pentecostais que pretendem combater. Acreditam que os carismas (nove, ao todo) são dádivas de Deus que devem ser usadas pelos bem-aventurados: os dons da glossolalia, das interpretações e das profecias; dons do poder (fé, cura, milagre); dons das revelações (sabedoria, ciência e discernimento). Ao contrário de se interessar por problemas sociais e políticos, preocupam-se com a vida íntima, com o controle moral da família, dos costumes e da sexualidade.

O totalitarismo

O maior e mais barulhento ícone do extraordinário crescimento dos evangélicos é, certamente, a Igreja Universal, e a TV Record é, de longe, sua vitrine mais visível. A emissora, que antes pertencia ao apresentador Sílvio Santos e ao empresário Paulo Machado de Carvalho, foi adquirida por 45 milhões de dólares, em 1990, pelo bispo Edir Macedo, segundo circunstâncias até hoje um pouco obscuras.

Conforme Carlos Magno de Miranda, ex-pastor da Universal, a compra da rede teve participação direta do então presidente Fernando Collor de Mello e de seu tesoureiro de campanha, PC Faria. Collor e PC, de acordo com o pastor, foram "fiadores" do bispo e garantiram as "facilidades" para o fechamento do negócio. Pela primeira vez na história do Brasil, uma denominação religiosa não controlada pela Igreja Católica assumiu o controle de sua própria rede nacional de televisão. O fato contribuiu para acirrar os ânimos entre evangélicos e católicos, e pôs rapidamente à prova o tão propalado mito da "tolerância religiosa" brasileira.

O sinal de franca hostilidade foi dado, em outubro de 1995, pelo famoso chute de Sérgio von Helde Luiz, bispo da Universal, na imagem de Nossa Senhora Aparecida, diante das câmaras da TV Record. Helde foi condenado a dois anos e dois meses de prisão, por crimes de discriminação religiosa e vilipêndio de imagem. Mas o contra-ataque foi dado, de fato, pela Globo (que assumiu, não por acaso, o papel de porta-voz do establishment católico), que passou a fazer uma campanha direta contra a Universal (incluindo a divulgação de uma fita de vídeo, em que Macedo e seus bispos, de quatro, e entre gestos obscenos, contavam uma montanha de dinheiro ofertado por crentes). A Universal respondeu, por intermédio da Record. E assim, durante um certo tempo, o Brasil viveu uma verdadeira "guerra santa" mediática, só encerrada mediante a intervenção direta do governo federal (os podres que vinham à tona, de ambos os lados, ameaçavam comprometer muita gente acima de qualquer suspeita).

Até 1996, a Record amargava o mais baixo índice do Ibope. Sua programação era carregada de programas evangélicos, em que pastores que davam shows de exorcismo e o demônio eram as grandes estrelas. Em 1998, as coisas mudaram. O combate a Satã foi relegado às madrugadas e manhãs, permitindo que a emissora assumisse um tom comercial em seu horário nobre. A rede recebeu injeção de 100 milhões de dólares da Universal, e seus diretores passaram a adotar uma programação que, ironicamente, espelha a da Globo - e o fizeram com tanta competência que, em certos momentos, chega a rivalizar, em audiência, com a vênus do Jardim Botânico. Atualmente, a Record investe em telejornalismo (com a contratação de Boris Casoy), programas de auditório (seu carro-chefe é o indecente Ratinho Livre), novela (Estrela de Fogo, versão algo bizarra da global Rei do Gado), alguns bons filmes (como O Paciente Inglês) e seriados norte-americanos (como Arquivo X e Chicago Hope). Se em 1997 a Record faturou 70 milhões de dólares (o que significou um prejuízo de 50 milhões de dólares), este ano o faturamento previsto é de 130 milhões de dólares. Atualmente, a rede é formada por dezessete emissoras e mais de cem afiliadas. No mercado externo, a Universal possui um canal de televisão na África do Sul, com programação local, e pretende montar uma emissora em Portugal.

O quadro que emerge é triste, dramático e perigoso. Triste por ser o sintoma de uma época. As ruas de São Paulo, Rio e outras cidades, que nos anos 60, 70 e 80 serviram de palco à luta de jovens e trabalhadores pela democracia, hoje ecoam cânticos religiosos entoados por jovens e trabalhadores que preferem depositar sua confiança e energia em Deus, identificando como inimigo o igualmente abstrato Satã. A guerra santa substitui a luta de classes, a fé ocupa o lugar da explicação. Dramático, porque o jogo evangélico expõe milhões e milhões de vidas à influência de denominações que se atiram à mais sórdida politicagem, incluindo compra e venda de votos, negociando a genuína fé dos crentes.

Perigoso, porque a mensagem dos pastores é autoritária: exige total subserviência a um Deus que promete recompensa aos fiéis e castigos terríveis aos inimigos - isto é, a todos os que não rezam pela mesma cartilha. É a prática de uma política de massas que abomina a política, a interlocução, o pluralismo, que promete a execução do outro no Juízo Final. Numa palavra, é o totalitarismo.

Exagero? Dificilmente. Basta participar de uma das marchas e observar os grupos de jovens "seguranças" bem disciplinados e em formação paramilitar, ou as faixas que proclamam a volta de Jesus (isto é, de um ser transcendental, extraterreno) com uma convicção absoluta, ou ainda o entusiasmo de uma multidão que enfrenta, durante horas, sol e chuva para ouvir intermináveis discursos de pastores que condenam às chamas o "inimigo". E, se não for suficiente, ouça os depoimentos ultra-emocionados, em geral cheios de lágrimas, daqueles que se dizem "salvos" por Cristo do perverso mundo das drogas, do sexo e do rock'n'roll (profano, não gospel).

Ou basta ler os jornais e verificar que, quando necessário - por exemplo, no final de abril -, pastores abandonam as preocupações com o outro mundo e mobilizam suas tropas de choque para defender, se necessário fisicamente, terráqueos como o prefeito de São Paulo, Celso Pitta, cujo impeachment estava então sendo pedido por sindicatos, associações de professores e estudantes e partidos de esquerda. É um quadro por demais preocupante, ainda mais quando se considera que, em certas circunstâncias históricas, mesmo um medíocre pintor fracassado pode, com o discurso radicalizado, mobilizar massas desesperadas em busca de garantias.

A Igreja Católica é responsável por esse quadro. Autoritária, arrogante, corrupta, distante dos pobres e tradicional aliada ao poder financeiro e político, a Igreja jogou na lama a fé nela depositada, durante quinhentos anos, pela imensa maioria da nação. Não que os teólogos da libertação fossem mais tolerantes, democráticos e pluralistas que os evangélicos: também eles impunham a escolha totalitária entre céu e inferno, também eles tinham como pressuposto salvacionista a fé em Cristo e nos poderes sobrenaturais (definitivamente, a mistura entre religião e política é sempre, e em qualquer hipótese, grávida de tragédias). Independentemente disso, foi no abismo entre a Igreja Católica e a nação brasileira que vicejaram a Universal, a Renascer e outras denominações que sabem mobilizar a juventude e os trabalhadores para atingir seus próprios fins políticos, financeiros e econômicos. A mensagem absolutamente reacionária, intolerante e obsoleta de João Paulo II só joga fogo na fogueira evangélica.

Se é certo que a extrema-direita procura "cavalgar" o movimento evangélico, como é o caso de Paulo Salim Maluf, os políticos tradicionais, de FHC a Francisco Rossi, passando por arrivistas como Fernando Collor, têm sua parcela de responsabilidade por um quadro social que estimula o seu crescimento. Em primeiro lugar, porque eles negociam com os evangélicos a compra e a venda de votos e influência (a longa entrevista-comício que FHC concedeu a Boris Casoy, em junho, foi um significativo aceno da presidência a Edir Macedo). Mas também - talvez principalmente - porque sua maneira de praticar política ajudou a afastar dos partidos e das instituições representativas milhões de jovens e trabalhadores, todos decepcionados com os escândalos de corrupção e com o descaso com que os três poderes tratam a questão social. Os evangélicos dão respostas, quando os políticos só oferecem evasivas; conclamam à ação, quando os políticos propõem a paralisia; oferecem conforto espiritual e saídas para a crise, quando os políticos multiplicam os impostos, cortam os gastos com educação e saúde, desprezam os anseios e esperanças dos mais pobres.

As organizações de esquerda, incluindo o PT, o PCdoB, a CUT e tantas outras, são também responsáveis, claro que em outra escala, por esse quadro Perplexas e impotentes diante das reviravoltas do mundo após a queda do Muro de Berlim, em novembro de 1989, as organizações de esquerda jamais encontraram algo de realmente novo e significativo para dizer aos jovens e trabalhadores que querem encontrar respostas no mundo tecnológico dos anos 90. A tradicional retórica escatológica da esquerda, sempre adiando para o futuro a resolução dos problemas sentidos hoje pelos excluídos ("amanhã será o paraíso na Terra", "um dia a justiça prevalecerá"), não pode mais concorrer com a escatologia evangélica, especialmente porque nada conseguirá colocar à prova o etéreo paraíso divino, ao passo que a vida destruiu a experiência socialista quando confrontada ao mundo real.

Desprovidas de utopias, as organizações de esquerda passaram a adotar, com alarmante freqüência, o pior tipo de "pragmatismo" - aquele que, em política, não passa de puro oportunismo carreirista -, deixando-se envolver pelo jogo político e eleitoral dos partidos tradicionais, muitas vezes com eles se confundindo e mesclando.

Resta o desafio de encontrar um caminho sem escatologias nem oportunismos, mas capaz de oferecer perspectivas. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) oferece indícios do que pode ser uma ação sistemática, de massas, por uma vida digna. O MST recuperou o sentido da atividade política, recriou o espaço público, onde a prática da solidariedade faz parte do cotidiano, de um certo modo de vida. Atribuiu, finalmente, nova eficácia a um discurso que se cola à ação prática, eliminando o abismo entre um e outra, tão característico da vida de nossos homens públicos. E é sobretudo significativo o fato de que o MST se impôs como movimento de esquerda, não por assim se proclamar, mas por força de uma prática social e política que desmonta o sólido edifício oligárquico brasileiro, construído por quinhentos anos de vigência do latifúndio. O MST, em síntese, transmite um legado que pode servir de antídoto à ação corrosiva e estupefaciente dos pastores evangélicos e da extrema-direita mobilizada: ação solidária, não-ideológica, imediata, em benefício dos excluídos, dos marginalizados, dos homens de boa-fé.

O problema está posto: milhões de jovens e trabalhadores são mobilizados por aprendizes de Hitler, enquanto o Brasil caminha a passos largos para uma imensa crise social, cujo pano de fundo é o desemprego. Há alternativas, desde que a esquerda saiba delas se apropriar. É isso ou a tragédia. A história - desnecessário dizê-lo - é riquíssima em exemplos.

Benedita vai a encontro evangélico na Argentina com dinheiro público

Rodrigo Rangel

BRASÍLIA. Em mais uma das várias viagens que tem feito ao exterior desde o início do governo Lula, a ministra da Assistência Social, Benedita da Silva, embarcou ontem à noite para Buenos Aires. Só que, desta vez, para participar de um encontro evangélico às custas dos cofres públicos brasileiros.

Como é praxe em casos de deslocamentos internacionais de servidores, a autorização para a viagem de Benedita foi publicada no Diário Oficial da União. O despacho do presidente da República em exercício, José Alencar, autoriza a ministra, que é evangélica, a se afastar do país a fim de participar do "12 Desayuno Anual de Oración". Em português: "café da manhã anual de oração", um evento religioso promovido por igrejas evangélicas argentinas.

Gabinete se esforça para justificar a viagem

O despacho publicado no Diário Oficial provocou constrangimento entre os funcionários do gabinete de Benedita, que se esforçaram para justificar a viagem. Até o início da tarde, perguntados sobre a agenda de hoje da ministra, assessores diziam apenas que ela estaria em Buenos Aires, sem detalhes. Depois, informaram que a ministra se encontraria com ministros argentinos para tratar da implantação do Instituto Social Brasil-Argentina, entidade que servirá para que os dois países troquem experiências em programas sociais.

Perguntados sobre o encontro religioso, os funcionários do gabinete disseram desconhecer esse item da agenda. Em seguida, a assessoria da ministra alegou que, durante o café da manhã religioso, Benedita se encontraria com representantes do governo argentino responsáveis pelo acordo bilateral que permitirá a instalação do instituto.

- Há pessoas que vão neste encontro que fazem parte das negociações para implantação do Instituto Social Brasil-Argentina - disse a assessora de imprensa da ministra.

No meio da tarde, funcionários do Ministério do Desenvolvimento Social da Argentina informaram que desconheciam qualquer encontro entre Benedita e a titular da pasta, a ministra Alicia Kirchner, irmã do presidente Néstor Kirchner. Só mais tarde o encontro foi confirmado pelo governo argentino.

Benedita é um dos ministros de Lula que mais viajam para o exterior. Na semana passada, esteve nos Estados Unidos. Antes, já tinha ido à Argentina e também à África do Sul. Apesar de pouco interferir nas decisões do governo, a ministra demonstra ter prestígio junto ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde o início do governo, nomeou 37 aliados políticos para ocupar cargos na administração federal. Entre os beneficiados estão ex-companheiros que integraram o governo do Rio nos nove meses em que ela esteve no comando, ano passado.

Benedita embarcou ontem à noite em Brasília num vôo comercial com destino a Buenos Aires e retorna ainda hoje. As passagens foram pagas pelo erário.

COLABORARAM Lisandra Paraguassú (Brasília) e Janaína Figueiredo (Buenos Aires)

LEI BRASILEIRA N�O PERMITE PESQUISA SIMILAR

Publicado no Jornal O ESTADO DE S. PAULO em 15-02-2004

Enquanto outros pa�ses avan�am na pesquisa com c�lulas-tronco embrion�rias (CTE), cientistas brasileiros lutam pela libera��o dos estudos no Pa�s. A pesquisa requer a destrui��o de embri�es, o que � proibido pela atual Lei de Biosseguran�a e pelo Conselho Federal de Medicina. Por for�a da bancada evang�lica, a proibi��o foi mantida no texto atual do novo projeto de lei para o setor, considerado um retrocesso por especialistas da �rea.

"� a pior coisa que poderia acontecer", resumiu o pesquisador Antonio Carlos Campos de Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Instituto do Mil�nio de Bioengenharia Tecidual. Ele trabalha desde 2000 com o uso de c�lulas-tronco adultas - extra�das de tecidos do organismo j� desenvolvido - para o tratamento de doen�as card�acas. E, apesar dos resultados positivos, considera o estudo das c�lulas embrion�rias indispens�vel.

As CTEs, explica Carvalho, s�o as �nicas reconhecidamente pluripotentes - ou seja, que podem dar origem a qualquer tecido do organismo. J� as c�lulas-tronco adultas s�o, a princ�pio, multipotentes - podem dar origem a apenas alguns tipos de tecido - apesar de alguns experimentos j� terem indicado sua pluripot�ncia. "S�o estudos que est�o sendo duramente questionados", disse Carvalho. "Dentro desse cen�rio, acho desastroso n�o poder utilizar as c�lulas embrion�rias."

A principal quest�o sobre o uso dos embri�es gira em torno da defini��o do in�cio da vida. Ser� que um blastocisto - est�gio inicial do embri�o, do qual as c�lulas-tronco s�o extra�das - representa um indiv�duo? "A defini��o do in�cio da vida � absolutamente aleat�ria; voc� pode colocar onde quiser", argumenta Marco Segre, especialista em �tica m�dica da Faculdade de Medicina da Universidade de S�o Paulo (USP).

Para muitos pesquisadores, o tema deveria ser tratado em uma lei espec�fica. "N�o d� para misturar soja transg�nica com embri�o", disse Carvalho. [i]

Fonte: http://txt.estado.com.br/editorias/2004/02/13/ger011.html

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