Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 04/09/96

Em encontro com pastores evangélicos, anteontem à noite, o candidato do PDT à Prefeitura de São Paulo, Francisco Rossi, recebeu ''manifestação do Espírito Santo'', conforme sua própria versão.

O pedetista falou palavras desconhecidas, com sílabas desconexas, entre estrofes do hino religioso ''As Águas do Mar da Vida'', que foi convidado a cantar.

O encontro _um jantar oferecido pelo candidato a vereador do PDT, Humberto Martins, evangélico, da Igreja Comunidade da Graça_ foi na churrascaria Novilho's, no Jardim Aricanduva (zona leste).

Palavras desconexas

Ao jantar compareceram 433 pastores e fiéis de igrejas batistas, metodistas, presbiterianas, da Assembléia de Deus, da Comunidade da Graça e da Época da Graça, segundo disse à Folha o pastor Vanderlei Amaral, da Igreja Evangélica de Vila Iara, de Osasco.

Amaral é velho amigo de Rossi e um dos coordenadores da campanha do pedetista.

Rossi entrou no salão lotado, foi aplaudido e cantou, junto com os demais, diversos hinos religiosos.

Sobre cada prato havia um guardanapo em que estava escrito, com letras douradas: ''Se Deus é por nós, quem será contra nós - Agradecemos sua presença e contamos com seu apoio. Francisco Rossi -12 e Humberto Martins -12.613''.

Em certo momento, Rossi começou a circular pelo salão, cumprimentando os presentes. Chamado ao palco, pediu o voto da platéia e iniciou ''As Águas do Mar da Vida'', fechando os olhos.

A certa altura, começou a falar, sem parar, palavras ininteligíveis, sendo acompanhado por Martins, que estava a seu lado.

Encerrada ''a manifestação do Espírito Santo'', Rossi cantou os últimos versos do hino.

Em entrevista à Folha, o pedetista afirmou que o que aconteceu com ele ''é coisa comum entre os pentecostais''.

''Língua dos Anjos''

''É a 'língua dos anjos', em que se exalta e glorifica Deus, sem se ter a preocupação de identificar ou entender a língua em que se está falando'', disse.

''São palavras que o Espírito Santo coloca em sua boca para agradar a Deus. É como se não houvesse palavras no dicionário para exaltar Deus.''

Rossi disse que essa ''manifestação'' ocorre com ele sempre que está orando. Segundo ele, a primeira vez em que esse ''dom'' se manifesta significa ''o batismo do Espírito Santo''.

O pedetista frisou que não estava ''em transe'', nem perdeu a consciência enquanto falava na ''língua dos anjos''.

''Jantar da virada''

Depois do encontro com os evangélicos, Rossi foi a outro jantar, o ''da virada'' do PL, partido de seu vice, Marcos Cintra.

Cerca de 800 pessoas lotaram churrascaria alugada para a reunião, em Perdizes (zona oeste).

Entenda o que é a manifestação

Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 04/09/96

Entenda o que é a manifestação

''O Espírito Santo é a terceira pessoa da Santíssima Trindade'', diz o padre Fernando Altemeyer Júnior, 39, mestre em Teologia da Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção.

''É uma pessoa divina, sem rosto, que se manifesta sempre unida e em comunhão com as outras pessoas da Santíssima Trindade: o Pai (Deus) e o Filho (Jesus Cristo). O nome do Espírito Santo é amor''.

Para o padre Oscar Quevedo, 65, teólogo e parapsicólogo, o ''dom de línguas'' (de falar línguas estrangeiras) é ''milagre raro'', acontecido, por exemplo, com São Pedro, São Francisco Xavier e São Vicente Ferrer.

Segundo Quevedo, eles falavam perfeitamente dezenas de idiomas que nunca haviam estudado e eram entendidos pelos diferentes povos a quem pregavam.

Quevedo considera que, em consequência de fenômeno parapsicológico, alguém pode falar uma língua estrangeira que não conheça, mas de forma inteligível.

''A algaravia (palavras desconexas) é fruto de estado exaltado da consciência, de histeria, simulação ou fingimento'', afirma.

''Os carismáticos consideram 'dom de línguas' essa algaravia, mas isso é erro de interpretação. Um bispo e parapsicólogo muito conhecido disse, e eu concordo, que isso é macumba católica''.

O coordenador do movimento de Renovação Carismática da Igreja Católica de São Paulo, Adilson Carvalhal, 54, empresário, diz que ''o dom de orar em línguas é bíblico e qualquer pessoa que abrir seu coração pode recebê-lo''.

Segundo Carvalhal, as palavras desconexas ''são entendidas por Deus e agradam a ele''.

A algaravia, em sua opinião, ''é linguagem de louvor e súplica'' e ''manifestação do Espírito Santo''.

''Não é histeria. Muitas vezes não sabemos o que pedir e oramos com gemidos inefáveis, como diz a Bíblia'', afirma. ''O papa João Paulo 2º, que fala mais de 50 idiomas, diz que ora com gemidos.''

O pastor César Lacerda de Moura Campos, 53, professor da Faculdade Metodista Livre, diz que sua religião não interfere com a experiência pessoal. ''Cada cristão pode expressar-se da maneira que achar melhor.''

Pessoalmente, acha que a glossolalia (dom sobrenatural de falar línguas desconhecidas) ''está mais no nível do emocional''.

''Não há base bíblica que fundamente a glossolalia como manifestação do Espírito Santo

Nota do Site Realidade: Para saber mais sobre a manifestação do Espírito Santo, clique aqui.