Publicado no Jornal Expresso de Portugal
em 27/01/2001
O reverendo Jackson assumiu a defesa moral
de Clinton no Monicagate. Entretanto, levava a amante grávida
à Sala Oval
O reverendo norte-americano Jesse Jackson
foi apanhado com a boca na botija. Na passada semana,
antecipando-se às parangonas do sensacionalista "National
Enquirer", confessou ter tido uma relação
extraconjugal da qual nasceu uma filha agora com vinte meses. O
caso seria um assunto estritamente privado não fosse
estar envolvido em contornos picantes e ser igualmente um ponto
final irónico à era Clinton. Durante o auge do escândalo
Monica Lewinsky, Jackson ofereceu conforto espiritual e conselho
ao presidente adúltero. A presença do reverendo
baptista na Casa Branca emprestava à escapadela de
Clinton uma aura de redenção, mas nesse preciso
momento já ele tinha engravidado a amante do momento,
Karin Stanford.
Por isso as palavras do líder negro
de 59 anos - que é muitas vezes apelidado de sucessor de
Martin Luther King e que foi duas vezes candidato à
presidência dos EUA -, em que exortava quem nunca pecou a
atirar a primeira pedra, ganharam uma dimensão nova: ele
parecia estar a preparar a sua defesa. Hipócrita é
a palavra que está na mente de muitos norte-americanos.
Jesse conheceu a professora universitária
Karin Stanford, vinte anos mais nova, em meados dos anos 90.
Stanford escreveu uma biografia do reverendo activista e passou
de seguida a dirigir a delegação de Washington do
grupo de pressão de direitos humanos Rainbow-PUSH, de que
Jackson é fundador e presidente. Em Dezembro de 1998,
Jackson, já entretanto voluntário na defesa moral
do presidente, acompanhou a amante à Sala Oval.
Fotografias da época registaram Stanford, grávida
de quatro meses, a cumprimentar Clinton.
Quando a criança nasceu, Karin
escreveu "pai desconhecido" na certidão de
nascimento. E entretanto, segundo o que os jornais agora
revelaram, já se tinha mudado para Los Angeles, não
sem receber da PUSH- Rainbow um "subsídio" de
35 mil dólares (7 mil e 500 contos) pelo incómodo
da deslocação. E é em torno deste subsídio,
que oportunamente removeu a directora do gabinete de Washington
da cena do crime, que a polémica está a crescer.
Muito claramente, diz-se que Jackson utilizou fundos de caridade
(a associação não governamental funciona
com donativos) para pagar o silêncio da amante. Outro
pormenor revelado pelos jornais é que houve testes de ADN
que garantem que a menina é também uma Jackson.
Mas se houve testes é porque alguém estava com dúvidas,
ou estava a tentar não assumir responsabilidades, certo?
A fama de mulherengo de Jackson é
antiga. A sua mulher de há 38 anos e mãe dos seus
cinco filhos adultos, Jacqueline, numa entrevista concedida, em
1966, a um biógrafo terá dito: "Sei
perfeitamente que há outras mulheres atraídas por
ele, mas não sou das que acreditam em vasculhar os lençóis.
O meu quinhão dele é só meu". Contudo,
na altura em que Karin engravidou, o caldo familiar entornou um
bocado. Jacqueline chegou a irromper no gabinete de Karin para a
acusar de ter engravidado para tramar o marido.
Jackson anunciou agora uma breve retirada
da cena pública para "cicatrizar as feridas abertas
na família" e para "reconstruir" o seu espírito,
tendo desistido de liderar as manifestações na
Florida e em Washington contra a tomada de posse de Bush.
Acrescentou que se arrependia do seu comportamento e que ao
longo destes meses tem fornecido apoio emocional e financeiro à
criança e à mãe, o que foi um dado
importante para o crescimento do coro de vozes que desculpam o
deslize.
Apoiado na coincidência temporal
entre a revelação pública de um boato
antigo e a sua recente militância na causa pró-Al
Gore e a favor da ilegitimidade do mandato do Presidente George
W. Bush, Jackson sustenta estar a ser vítima da mesma
conspiração de direita que quase depôs
Clinton. Os detractores, porém, entre os quais há
muitos provenientes da sua ala política e do interior do
Rainbow, fartos da arrogância moral e sede de protagonismo
de Jackson, acusam-no ser um embaraço para a causa dos
direitos humanos. O colunista negro da "Time" Jack E.
White sustenta até que se a nação permitir
que Jackson volte a uma posição de liderança
após a retirada sabática é porque está
tudo doido.
Pensamento:
"A educação seria muito mais efetiva se seu
propósito fosse assegurar que quando eles deixassem a
escola, todo menino e menina deveria saber o quanto eles não
sabem, e serem imbuídos com um desejo vitalício de
sabê-lo." Sir William Haley
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