Publicado no Jornal Folha de S. Paulo em
19 de junho de 2001
Uma solução para o processo
de "desencantamento do mundo" pode estar em outro
lugar que não no caminho corriqueiro -aquele em que o
indivíduo encontra a fé religiosa, se converte a
esta ou aquela religião-, pode estar no ato de vender a
própria fé.
Artigo do "The New York Times"
publicado pela Folha domingo último, intitulado "Vendem-se
religiões", expunha exatamente a visão de
sociólogos americanos sobre o assunto: eles afirmam que
as leis de mercado também regem os movimentos religiosos
e explicam a diversidade de crenças nos Estados Unidos.
A mesma coisa -e não é de
agora- acontece por aqui. Segundo os sociólogos, é
a concorrência que molda os aspectos terrenos das religiões
e sua popularidade. "As pessoas que ocupam os bancos das
igrejas são consumidoras volúveis, prontas a
transferir sua lealdade a uma marca concorrente se a atual lhes
parecer gasta ou pouco inspirada."
A partir desse ponto de vista, pode-se
dizer que uma nova marca de igreja vem ganhando a concorrência:
a Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra, a mesma que
acaba de tirar da cena da MPB o jovem vocalista da banda
Raimundos.
Rodolfo Abrantes, 29 -também o
principal letrista da banda que canta, em refrão do
recente e debochado "Reggae do Maneiro", "Ô,
mãe, vê se me manda um dinheiro que aqui no
estrangeiro não tem nem papel pra cagar"-, "converteu-se
geral", segundo disse em entrevista à revista
Capricho, e deu por encerrada sua participação no
quarteto que ganhou o público adolescente exatamente pela
irreverência, pela postura de desafio a certa moral "careta".
"Estava na lama. Jesus Cristo me
salvou", ele conta. Diz que foi salvo do "diabo"
a que o mundo estaria entregue, salvo das drogas (era viciado
desde os 13 anos) e de uma "maré de problemas"
para os quais não via solução.
Desde a conversão do roqueiro -na
semana passada-, a Sara Nossa Terra virou a igreja da vez. Sua
missão, segundo seu site na internet, é "sarar
a nossa geração, adestrando um exército de
santos, treinados para a conquista de cidades e territórios".
A Sara Nossa Terra, fundada em Brasília,
tem templos em todo o país e é tida como igreja de
bacanas e famosos. Acaba de inaugurar um novo templo em São
Paulo, na rua Augusta, nos Jardins, bairro classe A. Tudo para
satisfazer a clientela de estrelas que devem engordar muito seu
dízimo, entre as quais citam-se os jogadores de futebol
Marcelinho Carioca e Evair, a atriz Leila Lopes e a cantora
Paula Hunter.
Como diz o estudioso Reginaldo Prandi
sobre as igrejas neopentecostais como a Universal do Reino de
Deus ou a Sara Nossa Terra, a linguagem utilizada por elas é
bem direta (e confirma a abordagem econômica da religião
feita pelos sociólogos ianques): "Dê o dízimo
e receberás setenta vezes sete. É o "toma lá
dá cá", o "é dando que se recebe",
marca da Teologia da Prosperidade do neopentecostalismo."
Abrir uma igreja pode ser a solução
para vencer o desencantamento do mundo -quer dizer, enriquecer.
Os donos das igrejas estão, certamente, muito bem de
vida. Pode-se também virar deputado ou senador. É
fazer como fizeram 55 deputados federais na semana passada.
Aumentaram em até 1.600% os salários de parentes e
assessores. Desconfia-se de que o dinheiro fique mesmo no bolso
dos deputados. Não há desencantamento do mundo que
resista a essa verdadeira farra.
Cientistas buscam no cérebro
origem da fé
Publicado no Jornal O Globo em 23/06/2001
WASHINGTON. Na Filadélfia, um
pesquisador descobriu áreas do cérebro ativadas
durante a meditação. Nas universidades da Califórnia
e de Duke, médicos estudam como a epilepsia e certas
drogas alucinógenas podem provocar experiências
religiosas. E no Canadá, um neurocientista testa um
capacete que produz experiências "espirituais".
[...]
- Esse tipo de estudo reforça o ateísmo
e faz a religião parecer inútil. Se você
pode explicar a fé apenas como um fenômeno
cerebral, você não precisa de Deus - afirmou Nancey
Murphy, professora de filosofia cristã do Fuller
Theological Seminary, na Califórnia.
Para alguns cientistas, a ciência
mostra que não há prova da existência de
Deus. Mas outros argumentam que estão simplesmente
tentando entender como a mente produz a sensação
de espiritualidade.
Original em :
http://oglobo.globo.com/framenoticia.asp?mat=/ciencia/538143.htm