Grupo é acusado de tortura para curar gay
Antonio Flávio Arantes

Publicado no Jornal Folha de São Paulo em 31/05/97

A comunidade evangélica Ministério Hermon, de Curitiba (PR), utiliza a humilhação pública, a punição, a delação e a penitência como métodos para a "cura" de homossexuais.

O pastor Ronaldo Reis, que dirige a entidade, não usa a palavra "cura". O "tratamento" dura entre nove meses e um ano.

A entidade, que tem 300 internos, também recebe viciados em droga, álcool, além de prostitutas e doentes de Aids.

Uma das dinâmicas de grupo aplicadas aos internos homossexuais chama-se "cadeira do réu". O homossexual senta-se numa cadeira. Em seguida, os outros internos passam a fazer acusações contra o "réu".

Os homossexuais afeminados são repreendidos. "A Bíblia diz que os afeminados não entrarão no reino do céu", diz Freire.

Tortura

Para Tony Reis, do Grupo Dignidade, Conscientização e Emancipação Homossexual de Curitiba, a comunidade usa práticas de tortura mental. O grupo elaborou em 95 um dossiê com relatos que narram casos de tortura.

O documento traz o depoimento de oito ex-internos, identificados apenas pelas iniciais do nome.

"Houve um caso, que eu presenciei, de um rapaz que já não estava bem por causa de pressionarem ele lá dentro. ...Um dia eles levaram-no até o parque da Boa Vista, que é atrás da chácara, deram um banho nele, jogaram no lago. Ele voltou todo ensopado, ainda o pegaram, ligaram dois fios na tomada de 100 volts e deram choque nele ...mais tarde ele começou a sangrar pelo nariz e eles não estavam nem aí", diz trecho de um dos depoimentos.

Tony Reis disse que o dossiê foi elaborado porque o grupo estava recebendo denúncias de maus-tratos. "Depois elas pararam. Eu não sei dizer se hoje a situação ainda é esta", afirmou.

O pastor Ronaldo Reis disse que as acusações do dossiê são mentirosas. Ele usa uma teoria da filosofia existencialista _atéia e libertária por natureza_ para explicar o processo de partida para a conversão dos internos. "As pessoas não são, elas estão".

Aidéticos não têm remédios

A comunidade Ministério Hermon tem, segundo o pastor Ronaldo Reis, 300 internos, entre homens e mulheres adultos, adolescentes e crianças. Desses, cerca de 150 são soropositivos. A comunidade recolhe qualquer pessoa.

Reis diz que a comunidade não tem medicamentos para a terapia de doentes de Aids _como o AZT e o inibidor de protease.

A Secretaria Estadual da Saúde informou que não fornece os medicamentos à comunidade porque esta não dispõe de um profissional para monitorar o uso.

No dossiê sobre maus-tratos na comunidade, elaborado por seis grupos de direitos humanos de Curitiba (PR), ex-internos soropositivos afirmam que não recebiam medicamentos.

''Disseram que eu não podia tomar remédio e que tinha que confiar em Deus'', diz trecho de um dos depoimentos.

O pastor nega. ''Nunca deixei de dar remédios aos internos'', disse.

A Agência Folha visitou a comunidade. As condições de higiene são precárias. Os quartos têm até 6 m2. O cheiro de urina nos corredores é intenso. As refeições são servidas a céu aberto.

Reis, que afirma pertencer à igreja Assembléia de Deus, diz que não tem recursos para manter a instituição, que sobrevive de caridade.

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