Miséria favorece transformação da religião em mercadoria
Rita Célia Faheina

Publicado no Jornal O Povo em 29/08/2000

Sociólogo e religiosos criticam a surgimento de igrejas em cada esquina, principalmente das que exploram a aflição das pessoas.

Miséria e o desejo de encontrar uma significação para a sua existência. São os motivos que levam o homem a buscar determinada crença, na opinião do sociólogo e professor Diatahy Bezerra de Menezes. Ele considera que a fé tornou-se uma mercadoria rendosa, daí a proliferação dos grupos religiosos.

De um modo geral, diz o sociólogo, as religiões exploram a aflição das pessoas fazendo promessas de emprego, riqueza e saúde. Na opinião do pastor Otoniel Martins, da Igreja Presbiteriana de Fortaleza, muitas pessoas ficam influenciadas ou têm curiosidade de conhecer o novo ``e vão atrás de rotulagem''. Mas, quando descobrem que não era o que esperavam, acabam retornando às origens.

Otoniel Martins compara o surgimento de determinadas igrejas aos partidos políticos. Muitos são fundados, mas somente os que têm base histórica e demonstram credibilidade continuam a existir. ``Tem de existir seriedade'', acrescenta.

O pastor da Igreja Presbiteriana de Fortaleza diz que para se inaugurar um novo templo são adotados alguns critérios, como o número de membros suficientes, pessoas capazes de assumir e conduzir a igreja com um conselho de presbíteros e uma junta de diáconos e as condições financeiras para a sua própria manutenção. A Igreja Presbiteriana tem 117 anos no Ceará e congrega atualmente 22 templos na Capital.

O vigário geral da Arquidiocese de Fortaleza, monsenhor Antônio Souto, diz também que há critérios para inaugurar cada novo templo católico: que seja situado num local onde haja um grande número de fiéis e que tenha um alcance pastoral, além da disponibilidade de um pároco ou vigário. ``Sem ter um padre que dinamize o trabalho pastoral e dê assistência aos fiéis, não pode existir a igreja''.

Monsenhor Souto acredita que, no decorrer dos anos, muitos católicos ficaram perdidos, sem evangelização, por isso é tão fácil desviá-los para outras igrejas. Ele concorda que a Igreja Católica vem perdendo um número considerável de seguidores para as outras religiões, mas acredita que isso pode até ser providencial. Os que ficam são muito mais fervorosos.

O vigário geral da Arquidiocese de Fortaleza acha que os movimento surgidos mais recentemente entre os católicos, como a Renovação Carismática Católica e, antes, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), resgataram muitos que estavam se afastando da igreja. ``Eles são muito responsáveis'', conclui.

Universal cresce sob polêmica

Entre as igrejas evangélicas, a que tem causado mais polêmica, no mundo inteiro, é a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Considerada seita em alguns países, como a França, a IURD demonstra um crescimento assustador a partir dos anos 80 e, 23 anos após sua fundação no prédio onde funcionava uma modesta funerária no subúrbio carioca, já registra a média de nove templos inaugurados por mês no Brasil. Calcula-se que pelo menos 4 milhões de pessoas vão aos cultos diários.

A IURD detém pelo menos 21 emissoras de televisão e cerca de 80 rádios, todas registradas em nome de pastores, bispos, deputados e executivos da igreja. A primeira rádio adquirida pelo bispo Edir Macedo (seu fundador) foi a Rádio Copacabana (RJ) e a emissora de televisão foi a TV Record (SP), em 1989 por US$ 45 milhões. A compra da sede da emissora no Rio, e equipamentos sofisticados, em 1995, ainda é alvo de investigação pelo Ministério das Comunicações, Ministério Público, Polícia Federal e Receita Federal.

Há cinco anos, dois escândalos envolveram a IURD no Brasil. Edir Macedo foi acusado de sonegação fiscal, estelionato, charlatanismo, curandeirismo e incitação ao crime. Naquele ano, estimava-se que o império de Macedo arrecadaria R$ 350 milhões por ano e havia a acusação de que estaria envolvido até com o tráfico de drogas. Outro escândalo nacional foi quando no dia 12 de outubro daquele ano, no programa de TV ``Palavra de Vida'', o pastor Sérgio Von Helde chutou, esmurrou e xingou uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. Ele foi acusado de ``vilipêndio a objeto religioso, além da prática, indução e incitação à discriminação e preconceito religioso''.

No Ceará, divergências entre o bispo Edir Macedo e o pastor Carlos Magno de Miranda terminaram pela dissidência de Magno, que estaria sendo preparado para suceder Macedo no comando da Igreja Universal do Reino de Deus no Brasil. Macedo ficaria, então, livre para se preocupar com o crescimento da igreja no mundo. Mas, com o rompimento, Carlos Magno passou a denunciar que o dinheiro arrecadado dos fiéis (ofertas) enriquecia o bispo. Disse ainda que a Record tinha sido comprada a um preço superior ao declarado por Macedo, que estaria burlando a Receita. Carlos Magno, que atualmente mora em Recife, disse ainda que os pastores recebiam prêmio de acordo com o arrecadado nos cultos, variando entre 5% a 10% das ofertas.



Cristianismo avança mais em países pobres

Publicado no Jornal O Estado de S. Paulo em 15/04/2001

Igreja ganha fiéis em áreas tradicionalmente dominadas por outras religiões

KENNETH WOODWARD - Newsweek

É domingo em Agbor, um afastado povoado no sudoeste da Nigéria, onde as galinhas ciscam em ruas de terra e há mais bicicletas do que carros. Durante toda a manhã, mulheres vestidas com roupas de colorido vivo, crianças de olhos grandes segurando as mãos de seus pais que trajam camisas brancas e calças pretas, seguem em bandos para igrejas.

Há mais de 20 templos no espaço de 1 quilômetro quadrado na cidade. Muitos deles católicos, anglicanos e protestantes - frutos da ação de missionários ocidentais. Mas, em sua maioria, são de origem puramente africana, como a Igreja Celestial de Cristo, a Igreja do Milagre Apostólico e a Capela dos Vencedores. O mesmo ocorre em todo o subcontinente africano, onde o cristianismo faz parte da vida de quase um terço da população.

O papa João Paulo II visitou a África dez vezes - mais do que qualquer outro continente fora da Europa - e por um bom motivo. Lá, o cristianismo está se espalhando mais rapidamente do que em qualquer outra época ou lugar. Entre os mais notáveis cristãos africanos está o cardeal Francis Arinze, um nigeriano funcionário do Vaticano, considerado um dos principais candidatos a tornar-se o primeiro papa negro da história.

Em 1900 - o início do que os protestantes norte-americanos batizaram como o século cristão -, 80% dos cristãos eram europeus ou norte-americanos. Hoje, 60% deles são cidadãos da África, Ásia e América Latina. "O centro do cristianismo mudou para o sul", diz Andrew Walls, da Universidade de Edimburgo, na Escócia, especialista em história das missões cristãs. "Os acontecimentos que estão moldando o cristianismo do século 21 ocorrem na África e na Ásia."

Pós-cristã - A Europa é agora uma sociedade pós-cristã. Na Escócia, menos de 10% dos cristãos vão regularmente à igreja, enquanto nas Filipinas esse número é de quase 70%. Só na Nigéria, os anglicanos são sete vezes mais numerosos do que os episcopalianos em todo Estados Unidos. Lá, há também quatro vezes menos presbiterianos que na República da Coréia.

A maré crescente dos cristãos não-ocidentais está alterando o mapa do cristianismo mundial e revertendo também a influência dentro do mundo católico e protestante.

Em fevereiro, o papa ampliou o Colégio dos Cardeais e, dos 135 aptos a eleger seu sucessor, 41% são de nações não-ocidentais. E, à medida que o cristianismo se torna uma religião verdadeiramente global, os teólogos da Índia e outras partes da Ásia estão desenvolvendo novas interpretações da fé, baseadas em seus contatos com tradições hindus e budistas.

O surgimento do cristianismo não-ocidental tem muitas causas convergentes.

Na Índia, por exemplo, o crescimento é principalmente entre os pertencentes às castas mais desprezadas, que encontram no cristianismo a esperança e a dignidade, negadas a eles pelo rígido sistema.

Em toda a parte onde se espalha, o cristianismo é também encarado como a religião do Ocidente bem-sucedido. Os missionários norte-americanos jamais foram tão ativos no mundo em desenvolvimento como agora, atingindo, por meio da televisão, os lares humildes com mensagens de milagre e salvação. Como resultado, pela primeira vez na história, o cristianismo tornou-se uma religião particularmente dos pobres, dos marginalizados, dos destituídos de poder e dos oprimidos.

Seminaristas - Os cristãos do Ocidente já estão experimentando os efeitos dessa grande mudança demográfica. Países que antes eram considerados terras cristãs transformaram-se em territórios de missão do novo milênio. Evangelizadores procedentes da América Latina e da África fazem hoje cruzadas em Londres e Berlim. Em Roma, os seminaristas de antigos países de missão são agora tão numerosos quanto os da Europa e da América do Norte. Os Estados Unidos costumavam ser a fonte primária de novos recrutas para os jesuítas. Atualmente, a Índia é o maior fornecedor dos seus noviços.

Mas, para milhões de cristãos na África e na Ásia, palavras como "protestante" e "católico" inspiram pouco. Segundo David Barrett, co-autor da Enciclopédia Mundial Cristã, existem agora 33.600 denominações cristãs diferentes. Como no passado, os novos cristãos de hoje tendem a tirar da Bíblia tudo o que atende a suas necessidades e a ignorar o que não combina com suas tradições. Na Índia, onde o pecado é identificado com o "mau carma" nesta vida e em vidas anteriores, muitos convertidos interpretam a cruz como um sacrifício de Jesus que retira suas próprias falhas cármicas, libertando assim suas almas de futuros renascimentos.

Em algumas partes da África, onde a urbanização dissolveu a antiga moralidade tribal, muitos novos cristãos substituíram essa moral pelo rigoroso "código de pureza" que rege o comportamento pessoal que eles encontram esboçado no Livro do Levítico.

Pensamento: "Os que me falam em religião, querem o meu dinheiro ou a minha liberdade" Proudhon



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