Publicado no Jornal Folha de São
Paulo em 20/01/94
Os dez brasileiros presos em setembro do
ano passado na Argentina, junto com outros 250 membros da seita
Meninos de Deus (que mudou seu nome para A Família),
ainda não podem voltar para o Brasil. O grupo foi acusado
pelo juiz federal Roberto Marquevich de corrupção
de menores. No dia 13 de dezembro, o Tribunal Federal de Apelação
de San Martin (distrito próximo a Buenos Aires) libertou
os acusados por falta de provas que justificassem a prisão.
O inquérito passou para a esfera estadual e os
brasileiros só poderão deixar o país após
a sentença.
A carioca Valéria Maria Vicente
Vieira, que foi presa com o grupo, disse ontem à Folha
por telefone de Buenos Aires, que passou três meses "de
horror" em uma instituição para crianças
infratoras. Ela acompanhava seus cinco filhos, uma delas
brasileira, que estavam sob guarda da Justiça.
"Não havia a mínima
condição de higiêne e as crianças não
podiam sair para passear", disse. Valéria reclamou
também de não poder sair do país. "Eu
me sinto prisioneira".
Em setembro, após reportagem da
Folha mostrar as precárias condições em que
estava alojada a filha brasileira de Valéria -Ananda, 10-
houve uma rápida ação diplomática e
ela se tornou a primeira, entre os 250 detidos, a ser libertada.
A assessoria do consulado do Brasil em
Buenos Aires afirmou que está dando a assistência
jurídica necessária para os brasileiros, mas que não
pode intervir na Justiça argentina.
Segundo o porta-voz da seita em Buenos
Aires, o norte-americano Tomy Nelson, a sentença da corte
de apelação enumera todos os exames realizados nas
crianças dos Meninos de Deus: "Nenhuma delas
apresentou sinais de abuso sexual", disse. Ainda segundo o
porta-voz, elas foram examinadas por piscólogos que as
consideraram em excelente estado de saúde.
Para Nelson, os Meninos de Deus ainda estão
em julgamento devido a pressões da Igreja Católica
e de grupos da extrema-direita argentina. "A decisão
da Corte de Apelação seria suficiente para o
processo ser arquivado, mas os juízes não quiseram
assumir esta responsabilidade e passaram o para a esfera
estadual", disse.
O juiz Marquevich determinou a invasão
da sede da seita, em setembro do ano passado, em Buenos Aires,
baseado em uma acusação de sequestro feita por um
casal de norte-americanos. Eles alegavam que um de seus filhos
teria sido levado contra a vontade para a seita . A acusação
de sequestro não foi provada. A de sedução
de menores ainda está sendo analisada pela Justiça
estadual.