Sala de Física

Biografias


Robert Boyle

  

 (1627 - 1691)

Opinião dominante na atualidade situa o nascimento da Química - como uma coleção de informações - na Alexandria do início da nossa era. Foi nesse grande centro comercial do Egito que se fundiu o conhecimento prático adquirido pelos egípcios com as idéias filosóficas dos pensadores gregos. Quando os árabes invadiram a região, absorveram esse conhecimento (que os habitantes da cidade denominavam chemia) e o desenvolveram, descobrindo e investigando inúmeras substâncias. Assim nasceu a Alquimia, a precursora da Química, posteriormente divulgada no Ocidente pelas invasões muçulmanas.

Apesar das importantes descrições de experimentos químicos e das informações práticas que legou, a Alquimia não conseguiu se libertar de seus componentes de magia e misticismo. Um de seus mitos era a fórmula mágica de transformação dos metais em ouro, que preocupou os europeus durante quase toda a Idade Média.

Apenas na Renascença haverá o desabrochar de uma nova mentalidade, mas somente no século XVII é que a Química se transformará em um campo de estudo com objetivos e métodos perfeitamente delimitados. Nesta evolução coube um papel de destaque a Boyle que, com seu Químico Cétíco, publicado em 1661, deu um passo decisivo para a afirmação da Química como uma área de pesquisa autônoma. Seguindo o exemplo das obras de seu mestre Galileu, Boyle redigiü seu livro em forma de um diálogo entre três personagens - um aristotélico, um defensor das teorias da Química Médica de Paracelso e um químico cético -, tomando a posição deste último, que antevia novos horizontes para a Química. A obra conclui com a defesa da teoria atomista de Pierre Gassendi e do emprego de um método de raciocínio científico como o propagado por Descartes, baseado em idéias "claras e distintas". Com essas teses Boyle salientava, de forma definitiva, como e por que a observação de substâncias individuais e suas transformações deveria constituir um tema especial de estudo, tanto quanto o comportamento das estrelas e planetas, a natureza dos números ou as doenças do corpo humano. Assim, como representante de um grupo típico de cientistas ingleses dos séculos XVI e XVII - cientistas amadores, em muitos casos ocupando alta posição social -, Boyle destacou-se principalmente por sua ajuda ao desenvolvimento teórico da ciência, em especial da química. Tomava, pois, uma posição diferente em relação aos pesquisadores do continente, na maioria das vezes farmacêuticos de profissão, que se destacavam pela descoberta de substâncias e reações, desenvolvendo o conhecimento empírico das coisas.

Robert, Boyle nasceu no castelo de Lismore, na Irlanda, a 25 de janeiro de 1627. Era o sétimo dos catorze filhos do duque de Cork, homem abastado, senhor de terras e membro influente da corte. Sua educação foi primorosa. Ainda criança aprendeu o latim e o francês e, com apenas oito anos, foi mandado para Eton, escola tradicional, freqüentada pelos filhos das mais afortunadas famílias inglesas. Ali permaneceu até 1638, quando, em companhia de um tutor francês, partiu em viagem pela Europa. O roteiro incluía uma estada em Florença (de 1641 a 1642), onde o jovem inglês assistiu aos últimos anos da vida de Galileu Galilei, tendo ocasião de estudar de perto "os paradoxos do grande espectador de estrelas". Pôde, desta forma, assimilar sua posição crítica perante a filosofia aristotética e adquiriu com ele a certeza de que a experiência é a fonte clara e pura dos conhecimentos científicos.

Indo para a França, entrou em contato com a obra de Pierre Gassendi, cientista e professor de Matemática no Collège de France, defensor da teoria atômica da matéria, esquecida desde os tempos de Leucipo e Demócrito na antiga Grécia. Conheceu também a obra de Descartes e, embora não concordasse com sua concepção de um Universo totalmente preenchido por um "éter" onipresente, nem com sua teoria da descontinuidade da matéria, Boyle deu extrema atenção ao método cartesiano de raciocínio e sempre buscou, como o filósofo francês, expressar suas idéias de maneira clara e precisa.

De volta à Inglaterra, começou a aplicar os conhecimentos recém-adquiridos. Sendo um homem de posses, podia dedicar-se totalmente à ciência, ao contrário de alguns cientistas da época, que encontravam grandes dificuldades em desenvolver seus projetos, muitas vezes por falta de recursos mínimos de sobrevivência.

Em 1644, Boyle mudou-se para Oxford, onde passou a freqüentar reuniões de um grupo de jovens interessados em desenvolver a chamada Filosofia Experimental (ciências físicas e químicas). Reunindo gente importante como John Wilkins (teólogo e filósofo), John Wailis (teólogo e geômetra), Samuel Foster (astrônomo), Jonathan Goddard (professor de Medicina), eles começaram a encontrar-se sistematicamente, a princípio na Buil Head Tavem (Taverna da Cabeça de Touro) e depois no Gresham College. Para defender seus propósitos, o grupo fundou inicialmente o Philosophical College e depois a Philosophical Society, da qual muitos membros, inclusive Boyle, acabaram por fundar a Royal Society of London - a Sociedade Real de Londres, para o desenvolvimento das ciências naturais.

Durante sua permanência em Oxford, Robert Boyle foi imensamente fecundo. Por seu laboratório passaram diversos assistentes que depois se notabilizariam no mundo da ciência, como Robert Hooke e Denis Papin. Em 1660 publicou sua primeira obra científica Novas Experiências Físico-Mecânicas, Concernentes à Elasticidade do Ar e Seus Efeitos -, onde relata uma série de estudos e observações a partir dos trabalhos de Galileu, Pascal e Torricelli sobre o peso do ar (pressão atmosférica) e o vácuo. Para essas experiências, serviu-se da bomba pneumática idealizada pelo alemão Otto von Guericke, adaptada por Robert Hooke para uso em laboratório.

Tratando-se de uma obra essencialmente não aristotélica, levantou grande celeuma na época: logo em seguida foram publicados dois livros com violentos ataques tanto às experiências como às interpretações de Boyle. Um desses trabalhos era de autoria do famoso teórico de Filosofia Política Thomas Hobbes, ardente defensor da não-existência do vácuo e da teoria do "éter" que preencheria todo o Universo. O outro livra foi escrito por um obscuro adepto das postulações aristotélicas, o jesuíta Franciscus Linus, que tinha objeções a todo o esquema conceitual sobre o peso do ar e o vácuo, desenvolvido por Pascal a partir do barômetro de Torricelli, ao qual Boyle havia feito algumas complementações.

Em 1662, Boyle publicou sua resposta aos ataques, num livro contendo novas experiências e argumentos suficientes para rebater tanto Hobbes como Linus. Na segunda metade do Apêndice - intitulado Onde Se Examina a Hipótese Funicular dos Adversários - ele incluiu sua famosa lei da relação entre a pressão e o volume dos gases.

Nessa parte do livro, Boyle escrevia: "Pode-se notar que, além de tudo, a hipótese do adversário é desnecessária, visto que ele não recusa que o ar tenha algum peso e elasticidade, mas, sim, afirma serem essas qualidades insuficientes para realizar tão grandes trabalhos como o de contrabalançar uma coluna de mercúrio de 75 cm, como nós dissemos; vamos, portanto, procurar, mostrar-lhe que a elasticidade do ar é capaz de realizar muito mais do que o simplesmente necessário para confirmar a experiência de Torricelli".

Para isso, o cientista descreve sua famosa experiência. Preparando um tubo de vidro com a forma de uma letra J (com o braço menor fechado e o maior aberto), despejou mercúrio pela extremidade aberta, até que a diferença entre o nível de mercúrio do braço menor para o maior fosse de 75 em. Concluiu, daí, que a pressão do ar fechado no braço mais curto era duas vezes maior que a pressão atmosférica que agia no outro braço, observando então, "não sem prazer e satisfação", que o volume do ar comprimido no braço menor tinha se reduzido à metade do volume total.

Em seus trabalhos sobre as relações entre pressão e volume dos gases, Boyle não faz qualquer alusão explícita à influência da temperatura nos resultados obtidos. Na verdade, ele chegou a destacar o fato de expandir-se o ar com o calor e de contrair-se com o frio; mas, nesse caso, ele estava preocupado apenas em saber se o ar comprimido se comportaria da mesma forma. Por isso, aqueceu com uma vela o braço mais curto do tubo, resfriando-o, a seguir, com água. Devido à qualidade rudimentar dos aparelhos empregados, a análise quantitativa dos dados obtidos não indicou uma variação significativa, por isso o cientista não deu destaque especial à influência da temperatura. Hoje em dia, sabe-se que a pressão de um dado volume de gás, à temperatura ambiente, aumenta em 1/273 do seu valor, para uma elevação de temperatura de 1 grau Celsius.

(Acessórios da bomba de ar utilizada por Boyle nas suas pesquisas
sobre a elasticidade do ar, o que o conduziu à enunciação
da sua lei, relacionando pressão e volume)

Atualmente, quando se pretende uma medida rigorosamente correta da relação entre pressão e volume de um gás, é indispensável que se fixe antes a temperatura empregada. Algumas experiências mais recentes demostram que, mesmo à temperatura ambiente, a Lei de Boyle (P1 V1 = P2 V2, à temperatura constante) é apenas aproximadamente verdadeira. Quanto maior a pressão de um gás , maior será o desvio da lei e, se o gás estiver perto do seu ponto de liquefação, o desvio encontrado será realmente muito grande. Entretanto, dependendo do rigor desejado nos cálculos, para uma dada faixa de temperatura e pressão, podemos enunciar a lei de Boyle da seguinte maneira: para gases ideais, a uma temperatura fixa, a pressão é inversamente proporcional ao volume.

Entretanto, é realmente no campo da química teórica que se situam as maiores contribuições do cientista inglês. Um de seus grandes méritos foi o de trazer para esta ciência a visão mecânica da natureza, que então triunfava na Física, sob a influência de Galileu. Como ele próprio dizia: "Até hoje os químicos sempre pensaram que seu trabalho fosse limitado à preparação de beberagens ou à transmutação dos metais. Em vez disso, eu procuro considerar a Química de modo diferente, não como poderia fazer um médico ou um alquimista, mas como um filósofo.

Boyle construiu sua própria visão do universo mecânico, no qual as qualidades fundamentais eram a matéria e o movimento. Essas idéias ele as expôs no livro A Origem das Formas e Qualidades, publicado em 1666. Nele, o cientista faz a defesa da teoria atômica, afirmando que qualquer combinação química é o resultado de uma reação entre partículas elementares. Sobre isso, escreveu: "Existem conjuntos nos quais as partículas não se ligam intimamente entre si, mas podem encontrar-se com corpúsculos de outra denominação, e estarem dispostas a se unir mais intimamente com algumas delas do que entre si mesmas". Portanto, sua concepção do Universo baseava-se na existência inicial de partículas sólidas, fisicamente indivisíveis. Estas associavam-se em grupos maiores que, por sua vez, agiam como unidades nas reações químicas (é o que se conhece atualmente pelo nome de moléculas). Para ele, o tamanho e a forma dessas unidades é que dariam as propriedades físicas das substâncias.

Além disso, Boyle também foi o primeiro a dar uma definição de elemento químico: "Entendo por elementos, como aqueles químicos que falam categoricamente pelos seus Princípios, certos corpos primitivos e simples ou perfeitamente não misturados que, não sendo constituídos por outros corpos, ou um do outro, são os ingredientes dos quais todos os corpos perfeitamente mistos são imediatamente compostos, e nos quais estes se resolvem quando divididos até as últimas conseqüências Por "corpos perfeitamente mistos" ele entende as substâncias compostas, consideradas distintas das misturas mecânicas. Entretanto, o cientista não foi muito claro na sua discussão dos elementos químicos. Considerava os diferentes elementos como constituídos de alguma "matéria primária", e a variação das suas propriedades era atribuída a formas e movimentos diferentes das partículas dessa "matéria".

Apesar de se destacar como teórico, Boyle era um hábil experimentador, tendo realizado várias descobertas importantes nesse campo. Desenvolveu, entre outros, o método para o isolamento do fósforo - a partir de sugestões dadas pelo descobridor desse elemento, H. Brand, e usou a nova substância em suas investigações sobre a natureza do ar. A respeito, escreveu dois livros - The Aerial Noctiluca (1680) e The Icy Noctiluca (1681) nos quais descreve essas atividades experimentais com o fósforo. Também investigou os ácidos e os álcalis, o uso de indicadores, e descreveu vários testes úteis para análise química qualitativa.

Assim como em Ciência, Boyle também foi um fértil escritor em Teologia. Seu primeiro livro, Seraphic Love, publicado em 1659, teve muito destaque. Nele aparece uma tentativa interessante de usar a ciência em apoio da religião (assim como o fez Descartes). Também escreveu A Excelência da Teologia quando Comparada com a Filosojta Natural (1674), ao qual anexou, curiosarnente, Algumas Reflexões Ocasionais sobre a Excelência e o Avanço da Filosofia Mecânica.

Robert Boyle morreu em Londres, a 30 de dezembro de 1691, reverenciado pelos cientistas de toda a Europa e especialmente pelos membros da Royal Society. Fora eleito presidente desta associação em 1680, mas declinara da honra, por considerar-se não merecedor do posto. Em toda a sua vida sempre evitou honrarias e distinções, dedicando-se unicamente à ciência. 

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