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Biografias


Guglielmo Marconi

  

 (1874 - 1937)

Oficinas mecânicas no quintal, laboratórios no sótão, experiências financiadas por parentes e amigos. Durante os primeiros 150 anos da Revolução Industrial - entre 1760 e as primeiras décadas deste século -, as invenções brotavam espetacularmente desse cenário romântico.

Guilherme Marconi, inventor do telégrafo sem fio, foi talvez o último dos inventores individuais que marcaram essa fase da civilização. Concentrado no objetivo exclusivo da transmissão radiofônica, venceu as objeções científicas de seu tempo, superou o ceticismo míope do governo italiano e tremendas dificuldades materiais para vencer ainda jovem.

Como tantos outros grandes cientistas, Marconi teve de enfrentar muito cedo a discrepância entre seus interesses espontâneos e os métodos convencionais de ensino. As lições da escola eram para ele um aborrecimento intolerável.

(Casa onde nasceu)

Nascido a 25 de abril de 1874, em Bolonha, desde os primeiros anos de aprendizado se entediava com o espírito acadêmico e estreito que norteava o ensino italiano da época. Era um aluno irregular, cheio de idéias próprias, que os professores puniam com más notas e repreensões. Mas a mãe, uma irlandesa, acreditava no talento do filho, estimulava seu interesse espontâneo e unilateral pela física e tomava seu partido nas divergências com os professores.

Convenceu o marido a apoiar os estudos especializados do filho, que passou a tomar lições particulares. Um dos professores, Augusto Righi, de Bolonha, ele mesmo um físico de talento, viu enormes possibilidades no seu jovem aluno, e levou o velho Marconi a custear a instalação de um pequeno laboratório no sótão da casa, onde o jovem Guilherme começou a aprender o que ainda não figurava nos livros da época.

Com seus vinte anos, Marconi já tinha definido para si um objetivo de estudo e um programa de vida: desenvolver as descobertas de Hertz, publicadas sete anos antes, para encontrar um processo de telegrafia sem fio.

Nessa época, o telégrafo já era mais que uma invenção vitoriosa: era um empreendimento de grandes proporções econômicas e de vasto alcance militar. Todas as maiores cidades se achavam interligadas pelo telégrafo, inclusive através do Atlântico. Também o telefone já fora inventado havia uns vinte anos.

O mundo ainda não estava refeito da introdução dessas maravilhas. Mas, para Marconi, elas apresentavam intoleráveis imperfeições. Os cabos de cobre eram caríssimos e sujeitos a furto (como até hoje) nas regiões desabitadas que atravessavam. Além disso, as estações de recepção e de transmissão de telégrafo e de telefone tinham de ser obrigatoriamente fixas, prisioneiras da teia dos fios de cobre. Marconi sonhava com a telegrafia e a telefonia através do espaço.

Mas sonhava de pés no chão, como tantos outros pesquisadores. Em parte, os inconvenientes da telegrafia convencional já haviam sido superados pelo telégrafo óptico. Espelhos e faróis especiais eram equipamento comum de exércitos e de armadas, para comunicações em código Morse, a curta distância.

E Marconi partia dessa mesma idéia: afinal, Hertz demonstrara que as ondas eletromagnéticas se comportavam de modo semelhante ao das ondas luminosas.

Hoje parece uma idéia simples. No tempo de Marconi, contudo, ninguém sabia como superar certas dificuldades. Para transmitir mensagens pelas ondas hertzianas, seria preciso saber como é que elas poderiam transpor os obstáculos naturais do caminho. As ondas de luz, por exemplo, não podem atravessar uma colina; as de rádio o poderiam? Além disso, quando se tratasse de enviar mensagens a grandes distâncias, a curvatura da Terra estabeleceria uma dificuldade insuperável: se as ondas hertzianas se propagam em linha reta, como a luz, também elas não acompanhariam a curva do planeta. Mas, antes mesmo de pensar nessas dificuldades, Marconi tinha de resolver um problema preliminar: como modular as ondas e os sinais a serem transmitidos.

Numa primeira etapa de desenvolvimento, Marconi procurou conjugar e reproduzir as experiências de Hertz, Righi e outros pesquisadores. Objetivo: emitir ondas de um aparelho, captá-las a curta distância e "revelá-las". Isto é, tornar a recepção perceptível.

Para a transmissão, Marconi construiu osciladores elétricos excitados por uma bobina de Ruhmkorff. Para a recepção, utilizou tubinhos de vidro cheios de carvão ou limalha de ferro. Quando atravessados por ondas eletromagnéticas, esses toscos receptores se tornam condutores de eletricidade, e as próprias oscilações do fluxo da corrente assinalam a presença das ondas.

(Primeiro transmissor, 1895)

Na primavera de 1895, Marconi colhia o primeiro êxito. Do laboratório onde manipulava o transmissor, viu, jubilosamente, que seu assistente, colocado a uma centena de metros, acenava um lenço branco: as ondas haviam chegado aos receptores.

A segunda etapa era verificar se essas ondas poderiam superar acidentes naturais do terreno. Nos Apeninos, em região próxima a Bolonha, o transmissor e o receptor foram dispostos de modo a que entre eles houvesse uma grande colina: as ondas atravessaram-na e o assistente, no receptor, acusou o recebimento com o disparo de um tiro, como combinado.

Os resultados dessas experiências eram importantes sob um aspecto: provavam o princípio físico em torno do qual deveria desenvolver-se a pesquisa. Mas era apenas o fim de um longo começo. Os transmissores e os receptores precisavam ser aperfeiçoados para virem a ter sentido prático. Era preciso testar inúmeros materiais e dispositivos, em laboratórios muito mais bem equipados do que a oficina rudimentar de Marconi. Enfim, um empreendimento que só grandes empresas, milionários ou governos poderiam financiar.

Marconi tentou o governo. Argumentou com o alcance militar e econômico da invenção, mas não teve êxito: uma autoridade sentenciou que o telégrafo sem fio não apresentava "nenhum interesse prático" para o governo.

Sem desanimar, Marconi procurou apoio externo. Seguiu para Londres, onde parentes de sua mãe o ajudaram a fazer contato com os círculos governamentais que o interessavam.

O apoio veio rápido, generoso e decidido, na pessoa de Sir W. Peerce, engenheiro-chefe do Ministério dos Correios. Peerce, inventor de um sistema de transmissão a curta distância, associou-se a Marconi. O invento foi patenteado e, em função dele, fundou-se a Companhia de Sinais Comerciais de Telégrafo sem Fio.

Outras provas bem sucedidas foram efetuadas na planície de Salisbury e no canal de Bristol. A invenção estava em vias de ganhar aplicação prática. Mas, levado por um sentimento patriótico, Marconi (que recusara nacionalizar-se inglês, apesar das vantagens) voltou a oferecer suas patentes ao governo italiano, em troca de apoio ao prosseguimento das pesquisas. Sem muito entusiasmo, permitiram-lhe fazer algumas experiências a bordo do navio San Martino. Mas entre Marconi e os burocratas italianos nunca pôde haver cooperação útil nessa fase. Em pouco tempo, o inventor desistia outra vez e voltava à Inglaterra.

Entre outras dificuldades a superar, nessa época, Marconi se torturava com um problema: como vencer a curvatura terrestre? Os matemáticos e os físicos diziam que tal coisa era impossível; as ondas, mesmo geradas a alta potência para vencer centenas de quilômetros, nunca iriam acompanhar a curvatura da Terra. Elas se propagariam em linha reta, subiriam mais e mais em relação à superfície do planeta.

Marconi sabia que, de fato, as ondas não viajariam rasteiramente pela superfície do planeta. Mas queria experimentar, assim mesmo. Afinal, pensava, a curvatura representaria um obstáculo semelhante ao da colina que suas ondas haviam cruzado nos Apeninos.

(Receptor)

Em 1898, já havia desenvolvido transmissores e receptores de longo alcance. Nesse ano, conseguiu estabelecer contato entre a Cornualha e a ilha de Wright, na distância de uns 300 quilômetros. E, até aí, nenhum problema com a curvatura terrestre. Naquele tempo não se sabia ainda que as ondas de rádio são refletidas pela ionosfera.

Finalmente, em 1901, Marconi já dispunha de recursos técnicos e financeiros para a experiência decisiva: uma transmissão transatlântica. A estação transmissora foi construída sob a supervisão pessoal de Marconi, em Pldhu (Cornualha, sul da Inglaterra). A recepção se faria na Terra Nova, numa localidade que passou a chamar-se Signal Hill (Colina do Sinal). A 12 de dezembro do mesmo ano, depois de uma sucessão de esperanças e desapontamentos, chegavam a Signal Hill os três pontos da letra S.

O sucesso de Marconi deu início a uma revolução mundial no campo das comunicações. Outros inventores passaram a ocupar-se do rádio, várias nações reivindicavam a primazia da invenção (na França era atribuída a Brianiy, nos Estados Unidos a Lodge, na Alemanha a Staby). O próprio governo italiano viria demonstrar tardio interesse e oferecer a Marconi o navio Carlos Alberto para outras experiências.

Em 1903, os chefes de duas das mais poderosas nações do mundo trocavam suas saudações através do rádio: de Massachusetts, EUA, Theodore Roosevelt comunicava-se com Eduardo VII, rei da Inglaterra.

Alarmadas com a concorrência, empresas telegráficas tentavam boicotar o rádio, numa quixotesca tentativa de conter a marcha do progresso. A necessidade das comunicações radiotelegráficas foi-se impondo em episódios dramáticos, como a guerra entre a Rússia e o Japão (1904 - 1905), a expedição polar de Pearcy (1909) e os naufrágios do Republic e do Titanic. A bordo de todos os navios passou a ser obrigatória a existência de aparelhos de rádio.

Sucediam-se também rápidos aperfeiçoamentos. Ambrose Fleming, em colaboração com Marconi, desenvolveu a válvula termiônica a díodo, que ampliava tremendamente a capacidade dos receptores. Seguiu-se a válvula de tríodo, com a qual o rádio pôde assumir a forma que manteria até o aparecimento do transistor.

No plano pessoal, Marconi viveu com a intensidade que a riqueza e a reputação podem permitir. Tão grande era seu prestígio que em 1927 conseguiu anulação do casamento contraído em 1905 com uma inglesa, Beatriz O'Brien. Sem essa concessão do Vaticano não teria podido, pela lei italiana, desposar Cristina Sealvi. Teve três filhos do primeiro casamento e uma filha do segundo.

Temperamento esportivo e combativo, sua audácia automobilística acabou por custar-lhe a perda de um olho, num desastre sofrido em 1912. Durante a I Guerra Mundial alistou-se no Exército, depois na Marinha e acabou como ministro plenipotenciário na conferência de paz. Era o homem mais importante que a Itália tinha para mandar representá-la.

Recebeu o título de marquês em 1929 e o de acadêmico da Itália em 1930. Mas, bem antes do governo italiano, o mundo já lhe havia prestado amplo reconhecimento: o Prêmio Nobel de Física, por exemplo, foi-lhe concedido em 1909.

Morreu em Roma, em 1937, vitimado por um ataque cardíaco. 

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