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Biografias


Blaise Pascal

  

 (1623 - 1662)

No século XVII, a Europa era um continente cansado. O pensamento cartesiano alastrava-se mas surgia como uma saída fácil. Aparentemente, a lógica e a razão dominavam. Na realidade, a maioria dos homens ainda tomava sua conduta pela sensibilidade, uma sensibilidade dirigida e alimentada pelo anseio de melhores condições de vida: era o reinado do espírito utilitário.

Esta é a época que, na França, sucede às guerras-religiosas. É o período no qual se evidencia o contraste entre o pensamento racionalista e a doutrina católica, que buscava reconquistar o terreno perdido. Espírito profundamente e, às vezes, fanaticamente religioso, Pascal sentiu e sofreu as contradições básicas de seu tempo. Foi um homem dividido, tentando conciliar e harmonizar tendências opostas.

Esse conflito íntimo, que conduziu a resultados positivos no campo literário e especulativo, impediu-o, no entanto, de realizar integralmente as suas potencialidades científicas: os escrúpulos religiosos atuavam sobre ele como freio para a criatividade e para uma verdadeira constância na pesquisa.

De família religiosa austera, pertencente à burguesia abastada de Clermont Ferrand, Blaise Pascal nasceu a 19 de junho de 1623. Após a morte da mãe, foi educado pessoalmente pelo pai, Étienne Pascal, magistrado de grande retidão moral. O menino recebeu, assim, uma educação rígida. Sofreu ainda a influência das duas irmãs, Gilberte e Jacqueline, que suavizaram certos rigores da educação paterna. A influência familiar contribuiu, desde cedo, para habituar o jovem ao raciocínio rigoroso, que seria característica fundamental de seu pensamento científico e filosófico.

Foram as irmãs que proporcionaram ao garoto o acesso às obras de Euclides, para as quais o pai o considerava muito jovem. Tinha doze anos quando leu os Elementos. Após uma leitura superficial, conseguiu apreender o sentido do texto a ponto de, fechando o livro, reconstruir o seu conteúdo, enunciando os teoremas fundamentais da geometria e a sua demonstração, na mesma ordem pela qual se sucediam em Euclides.

Pascal havia-se embebido da lógica mais íntima do autor, podendo seguir o caminho trilhado pelo ilustre grego, recriando, assim, a geometria em todo o seu desenvolvimento. Despertava nele um tipo de raciocínio peculiar, que seria aplicado em sua futura obra científica.

Por esse tempo, estava-se difundindo o método geométrico cartesiano, que consistia na transformação dos problemas de geometria em problemas de álgebra. Isto era possível mediante a atribuição de números - as coordenadas - às posições dos pontos que compõem os entes geométricos: pelo método cartesiano, as propriedades das figuras são deduzidas mais do cálculo que do próprio raciocínio.

Pascal repudiou tal expediente, atendo-se sempre ao raciocínio sintético, isto é, à dedução direta das propriedades das figuras. Isso permitiu-lhe tratar alguns dos mais difíceis teoremas de uma nova geometria, a projetiva, particularmente aqueles relacionados com as propriedades das cônicas, que não mudam se são projetadas de qualquer maneira de um plano sobre outro, a partir de um centro de projeção.

Em 1640 aparece seu tratado sobre as cônicas. Pascal tinha, então, dezesseis anos e tornava-se um centro de atração para os estudiosos da época.

Pela fama que desfrutava junto às autoridades, Étienne Pascal obteve de Richelieu um importante cargo administrativo em Rouen. O cargo implicava, porém, a execução de muitos cálculos, longos e difíceis. Blaise decidiu ajudar o pai. Achava que deviam existir meios mecânicos (superiores ao ábaco, utilizado até então) para facilitar o trabalho. O resultado de seus esforços foi a construção de um dispositivo que, em essência, não apresenta diferenças em relação às máquinas de calcular mecânicas.

(Máquina de calcular de Pascal)

Como inventor, Pascal introduziu o uso de um disco para a execução mecânica do cálculo. Essa invenção - patenteada com o nome de "La Pascaline" tornou praticamente possível a estrutura das modernas calculadoras. Mais de um século decorreria, no entanto, antes que as máquinas de calcular fossem construídas e difundidas em todo o mundo. O projeto e a construção de um modelo que realmente funcionava ocorreram quando Pascal tinha 21 anos de idade.

Com sua personalidade dividida entre a ciência e a religião, Pascal não podia aceitar o sistema filosófico mecanicista cartesiano. "Não posso perdoar Descartes: bem quisera ele, em toda a sua filosofia, passar sem Deus; mas não pôde evitar de faze-lo dar um piparote para pôr o mundo em movimento; depois do que não mais precisa de Deus".

No campo científico, longe de montar sistemas completos, sua tendência foi superestimar a experimentação. Pascal preferiu dedicar-se a experiências diretas, principalmente porque havia decidido resolver alguns problemas sobre os quais os cientistas discutiam há bastante tempo, sem conseguir chegar a uma conclusão definitiva.

Desejava-se refutar a experiência de Torricelli, afirmando-se que o vácuo barométrico não podia existir: segundo esses estudiosos, o que aparecia sobre a coluna de mercúrio do barômetro não era mais que ar rarefeito. Os defensores dessa estranha teoria eram chamados plenístas. E a refutação de suas idéias absurdas levou Pascal ao terreno difícil da mecânica dos fluidos, na qual pôde enunciar o princípio da constância da transmissão de pressão no interior dos líquidos.

Um acidente sofrido pelo pai constituiu um acontecimento decisivo em sua vida: praticamente passaram a fazer parte da família dois cirurgiões jansenistas, com idéias de reforma religiosa. O jansenismo (que negava o amor-próprio e contestava a autoridade papal) inflamou o ânimo do jovem Pascal, cuja saúde, já precária por constituição, foi piorando pelos excessos nos estudos e nas práticas de penitência. Em Paris, em 1651, os médicos sugeriram-lhe levar uma vida mais sossegada, apesar de seus 28 anos. Pensou então em retornar à "mundanidade", termo pelo qual entendia sua carreira científica e posição social.

Jamais pensou em casar-se. Os seus interesses dominantes, porém, eram agora os científicos; este foi o momento mais proveitoso para os estudos sobre o cálculo combinatório e sobre o cálculo da probabilidade. Tais ramos da matemática exigem uma mente adaptada ao raciocínio sintético, e Pascal contribuiu com notáveis resultados para o desenvolvimento das pesquisas.

(Cela de Pascal no Convento de Port Royal)

Logo depois, entretanto, em 1653, nova crise mística o convence a retirar-se definitivamente do mundo, e resolve viver em meditação, no Convento de Port Royal, onde já havia entrado, como freira, a irmã Jacqueline.

A sua saúde, após algumas melhoras ilusórias, agravou-se sempre mais; todavia, sem se abater, escreveu as Provinciais, dezoito cartas violentamente polêmicas em defesa do movimento jansenista, obra que correu o risco de ser condenada pelo papa e que, na opinião de Boileau, marca o início da moderna prosa francesa. Realizou ainda trabalhos sobre a ciclóide (a curva gerada pela rotação de um ponto situado sobre a periferia de um círculo que roda). Sob o pseudônimo de Amos Dattonville, publicou em 1658 uma série de trabalhos sobre a quadratura da ciclóide, desafiando os outros matemáticos a encontrar a solução que ele, obviamente, já havia conseguido. Foi esta a sua derradeira obra científica.

Os últimos anos foram atormentados pelo sofrimento físico e dominados por preocupações religiosas, que o induziram, inclusive, a renunciar às suas posses. Finalmente, a 19 de agosto de 1662, com apenas 39 anos de idade, faleceu na residência de sua irmã casada Gilberte. Esta, em homenagem ao mano, escreveu as memórias de sua vida, permanentemente torturada pela paixão do Absoluto.  

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