Capa(Fonte: ISTOÉ - Edição 1606 - 07/07/2000.)
Guerra aos planos - continuação
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Juliane Zaché, Lena Castellón e Mônica Tarantino
Mas ainda falta um bom caminho a percorrer. Só para dar uma idéia, desde que a lei entrou em vigor, ela já foi modificada por 28 medidas provisórias. Com isso, quem fica perdido, óbvio, é o consumidor. Não por acaso, os planos de saúde ficaram em segundo lugar no ranking de consultas do Procon de São Paulo, perdendo apenas para pedidos de informações sobre o sistema de telefonia. “Os usuários ligam porque não entendem os planos”, conta Lucia. Um dos principais pontos polêmicos da lei é a cobrança do valor adicional pago em casos de doença pré-existente. “As operadoras não concordam com a regulamentação, pois dizem não saber o quanto cobrar para o tratamento de doenças como Aids e câncer”, diz a advogada Flávia Reis Pagnozzi, do escritório Ferreira & Tramujas Bassaneze, em Curitiba, no Paraná. O presidente da Abramge, Arlindo Almeida, defende: “Ainda é preciso analisar a questão para as operadoras saberem o quanto cobrar.” Aumentos – Dados do Procon de Brasília também comprovam a insatisfação dos usuários. Um em cada dez casos que chegam refere-se à queixa contra os planos de saúde. Além de denunciarem os aumentos abusivos das operadoras, os consumidores reclamam da dificuldade em obter autorização para exames e conseguir internação. Outras 100 pessoas telefonam diariamente para se informar sobre seus direitos. No Procon do Rio, as reclamações contra os convênios ocupam o sexto lugar no ranking. Até o início deste mês, haviam sido recebidas por aquele órgão 275 queixas (a Golden Cross foi a campeã, com 42 reclamações). Em São Paulo, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) recebeu, no ano passado, cerca de 2,2 mil queixas. “Uma das principais reclamações são os reajustes abusivos das mensalidades”, informa Andrea Salazar, coordenadora de campanha do instituto. A indignação das pessoas chega a tal ponto que muitas vezes é preciso recorrer aos tribunais, como mostram algumas das histórias relatadas ao longo da reportagem. É o caso da cozinheira Normanei Rezende, 40 anos, de São Paulo.
Ela processou a Blue Life porque a empresa se recusou a pagar a fisioterapia garantida no contrato. O frentista Cícero Bezerra de Lima, 26 anos, residente em Brasília, também está disposto a processar o Saúde Bradesco. Há 15 dias, ele estava na mesa de cirurgia pronto para ser operado de uma hérnia umbilical. Na hora foi informado de que não haveria mais cirurgia. Houve um desentendimento entre o plano de saúde e o hospital, que queria cobrar um cheque-caução da operadora, e foi Lima quem acabou ficando sem a operação. “É uma covardia”, reclama. Os abusos dos planos são tão absurdos que Manuel Rios, 45 anos, também de Brasília, pagou R$ 1,6 mil por uma cirurgia de astigmatismo e não conseguiu ser ressarcido pela operadora. A empresa considerou a cirurgia estética. Irregularidades
– Os problemas com os planos de saúde acontecem tanto com os contratos
antigos quanto com os novos. Uma pesquisa feita por portadores de HIV (o vírus
da Aids) com 23 operadoras revela que a lei atual não está sendo
cumprida pelas empresas. “Nenhuma delas ofereceu o agravo”, denuncia Mário
Scheffer, diretor do Grupo pela Vidda, entidade que presta apoio às vítimas
da doença. Há outra evidência de que as empresas estão descumprindo a
nova legislação. Num levantamento ainda não concluído, o Idec está
realizando uma espécie de fiscalização para saber quem está de acordo
com as novas regras. Os resultados preliminares mostram que há
irregularidades. Para o presidente da APM, José Luiz Amaral, as
operadoras agem dessa forma porque só querem reduzir os custos – e
manter seus ganhos. O presidente da Abramge, Arlindo de Almeida, tem uma
forma bastante peculiar de justificar as atitudes dos planos. “O usuário
precisa se conscientizar que plano de saúde não é feito para tratar a
doença, mas uma forma segura de se prevenir contra futuros males.”
Traduzido pela ótica do consumidor, isso significa dizer que os planos são
feitos para quem está sadio, e portanto, não vai precisar recorrer a
nenhum dos recursos oferecidos, poupando as empresas de desembolsarem
qualquer centavo no seu atendimento. Colaboraram: Francisco Alves Filho (RJ) e Ricardo Miranda (DF) |