Hells Angels - Medo e Delírio Sobre Duas Rodas

Hell's Angels - Medo e Delírio Sobre Duas Rodas

Pessoas das mais várias idades, classes sociais, credos, gêneros e graus, costumam me parar nas ruas e praças das grandes cidades. Muitas são educadas, outras parecem jogar Rugbi, algumas me passam panfletos e as últimas tentam me vender cartelas do jogo-do-bicho, mas o fato é que todas me questionam um fato verdadeiramente relevante:
Como um fã de Hunter S. Thompson nunca leu nenhuma de suas obras?

Até algum tempo atrás eu precisava desconversar, falando que pelo menos tinha decorado todas as obras de Paulo Francis, e que poderia citar, inclusive, em quais colunas e em quais linhas ele citou Edmund Wilson, e que no momento eu estava tentando imitá-lo, ao escrever e-mails elogiosos à Folha de São Paulo enquanto assistia ao JN. Pobre inocência, ninguém acreditava que alguém na minha idade tinha colecionado o Diário da Corte, e gostado daquela merda. Mas isso não mais acontece, quando as pessoas me indagam sobre Thompson, ou sobre o Gonzo, eu costumo primeiro comentar sobre como ele escreveu este seu primeiro livro:

Um belo dia o caipira do Kentucky resolveu virar repórter, e algumas décadas depois foi contratado por uma revista pra fazer uma matéria. Acontece que ele pegou a verba e torrou com drogas, corridas de cavalo e aluguel de carros. Desistiu de escrever e nos meses seguintes ficou em companhia dos outlaws mais famosos do início dos anos 60, os motoqueiros do clube Hell's Angels, da Califórnia. Mais do que a vida ou os costumes, que ele registrou de forma quase antropológica, o que chamou a atenção na obra que ele trouxe de volta foi o texto e si, uma irônica crítica à nata jornalística de Nova Iorque, não, uma crítica anti-jornalística à classe toda, que incluia trechos mais ou menos assim:

"...qualquer um que tenha trabalhado em um jornal por mais de dois meses sabe como precauções técnicas são tomadas mesmo na matéria mais extravagante, sem a preocupação de não causar impacto sobre o leitor. E elas resultam basicamente na arte de publicar uma matéria sem ter responsabilidade legal sobre ela. A palavra "suposto" é indispensável nessa arte. Outras palavras-chave são "disse fulano" (ou "afirmou"), "relatou-se" e "de acordo com"..."

Supostamente de acordo comigo mesmo, a prioridade do Dr. Thompson nesse livro foi desmestificar todas as baboseiras que a grande imprensa criou ou aumentou sobre os motociclistas. Acabou criando um novo estilo de jornalismo, que foi muito influenciado pelo New Journalism e pela overdose de ácido lisérgico. Funcionou, a gente dá risada cada vez que ele conta que o motoqueiro deu risada ao ver a publicação do New York Times sobre si. Apesar disso, a obra ficou aquém do que eu esperava. Acho que deve ser a tradução. Uma tradução, se não estraga, pelo menos tira o brilho da obra original. Azar o meu não ter confiaça pra ler o livro todo no inglês, que fica além do meu egocentrismo. Mas isso fica entre nós, que eu não quero que as pessoas me parem na rua pra questionar meu orgulho ferido.

MORAL: Até o Johnny Deep virou .

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