A ORIGEM DO CHURRASCO
NO BRASIL
Dos Pampas às grandes cidades
Hoje em dia, a carne no
espeto é um alimento não só preparado com facilidade e higiene, mas também
de preço acessível a todas as camadas da população. No entanto, nem sempre
foi assim, como comprovam as suas origens. Muito tempo decorreu para que o tosco
churrasco dos festins populares dos pampas pudesse tornar-se até um prato
sofisticado, consumido nos melhores restaurantes do país. Originário do Rio
Grande do Sul, surgiu, no século XVII, nas imensidões dos pampas, quando essa
parte do Brasil, disputada por castelhanos e paulistas, era ocupada por milhares
de cabeças de gado selvagem, oriundas de Buenos Aires e de outras áreas da
Argentina. A princípio, o churrasco _ na forma pela qual o conhecemos _ era raríssimo,
pois, naquela época, não havia a preocupação com o comércio da carne
bovina, mas sim com a obtenção de couro e de sebo. Para isso, realizavam-se as
vacarias _ as matanças de gado _, que podiam ser oficiais, se autorizadas pelo
governo espanhol, ou clandestinas, quando realizadas por soldados desertores,
que acabaram por dar origem aos gauchos. Durante as famosas vacarias, os
vaqueiros, depois de correrem, cercarem e matarem os bois, cortavam o pedaço
mais fácil de partir e o assavam inteiro num buraco aberto no chão,
temperando-o com a própria cinza do braseiro, o que pode ser considerado a
origem mais remota do churrasco. Os restos dos bois, como não havia como
conservar tanta carne, eram abandonados, apodreciam ou eram consumidos por aves
de rapina ou outros animais. No final do século XVII, o churrasco tornou-se uma
prática mais difundida, criando-se, assim, novas técnicas para o seu preparo.
Em vez de usar-se a cinza, passou-se a temperar a carne com a carona, nome dado
pelos gaúchos às duas abas de couro que se colocam embaixo da sela do cavalo.
A carona, como estava impregnada do suor do animal, ajudava a salgar a carne.
Com a doação de terras para colonos portugueses e o estabelecimento de novas
estâncias, o churrasco tornou-se, definitivamente, um hábito e foi sendo
aperfeiçoado. Surgiram os cortes especiais da carne: a costela, a paleta e o
matambre _ este último nome proveniente do espanhol mata hambre (mata fome)
pelo fato de ser um pedaço de carne duro e de cozimento demorado, em geral o
primeiro a ser comido pelo gaúcho. A carne bovina, abundante na região,
transformou-se no alimento básico do gaúcho, que a comia em grande quantidade
(quase dois quilos por dia). Os efeitos dessas "verdadeiras orgias
proteicas" _ as intoxicações _ eram evitadas pelo também largo consumo
do chimarrão.
Mudança
de Estilo
A generalização do hábito
de comer churrasco acabou gerando diferentes estilos de consumo. Os
colonizadores italianos e alemães, por exemplo, realizavam churrascos de
grandes proporções, em que havia de tudo. Iniciava-se com uma terrina de sopa
fumegante, logo seguida de pratos como saladas, feijão, arroz, ensopado,
frango, macarrão e, até, polenta. Mas a carne era servida homeopaticamente, em
espetos. Esse estilo não agradava aos gaúchos, que o consideravam uma
verdadeira heresia. No Paraná, inventaram o espeto corrido, uma churrascada
semelhante a anterior, só que com maior quantidade de carne. Esses dois estilos
popularizaram-se entre os caminhoneiros que freqüentam os restaurantes à beira
das estradas. Levado para as cidades, o churrasco chegou à mesa dos paulistas,
que aos domingos se reúnem ao redor de uma churrasqueira para apreciá-lo. Os
paulistas também preparam o churrasco em espetos, já que esta maneira além de
rápida, evita desperdícios e permite que a carne seja servida em uma boa
temperatura. Como já foi dito, muitas foram as mudanças no modo de consumir o
churrasco. Uma em especial, o churrasco de pão com bife - cuja invenção aos
paulistas foi atribuída -, os gaúchos não suportam e ainda dizem que de todos
os estilos, esse é o que eles menos toleram.
CHURRASCO,
A ETERNA COMEMORAÇÃO
Na pré-história, o homem
era essencialmente caçador. Quando descobriu o fogo, passou a utilizar-se da
cocção ou cozimento, uma das mais antigas formas de preparo de alimentos.
Hoje, diante das diferentes formas de cozimento - por via seca ( o assado e o
grelhado) e por via úmeda (o cozido, o abafado e a fritura) - o homem tem uma
variedade de escolhas à mão.
UM
POUCO DE CIÊNCIA
O homem descobriu e aperfeiçoou
todos esses modos de cozimento, e criou outros recursos hoje conhecidos no âmbito
da gastronomia, aliando a ciência ao prazer. Agora, ele sabe que a gordura
torna a carne impermeável ao fogo, protegendo-a, para que o calor não
carbonize a albumina nela contida. À medida que impermeabiliza a carne, impede
a exsudação da hemoglobina, dos açucares e dos sais minerais. Ao mesmo tempo,
a gordura que não coagula, destila-se e carboniza-se ligeiramente, enquanto a
glicose se carameliza para que tudo resulte numa textura e num sabor perfeitos.
O fogo não pode ser excessivo. Se isso ocorrer, a albumina se carbonizará e a
gordura, decompondo-se, será transformada em acroleína, substância
prejudicial à saúde e à arte da gastronomia. Apesar de todas as suas
descobertas, o homem nunca abandonou a simplicidade dos grelhados, talvez pela
proximidade mística com o fogo. Apenas no século passado começou-se a
seccionar o boi do modo como se faz hoje, com uma ou outra diferença regional,
mas sempre com uma única ótica: do boi nada se perde, tudo é aproveitável.